Crossing Swords With The Devil escrita por Miojo-san


Capítulo 1
Crimson Devil, White Devil




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/75802/chapter/1

Estava frio, ventava muito, o céu estava nublado. Certamente era o dia mais feio do ano, e tudo conspirava para que Dante retornasse ao aconchego de sua cama e de seus cobertores, mas se havia algo que incomodava mais o Filho de Sparda do que o sono era a fome, e o rapaz estava desesperadamente faminto. O escritório do meio-demônio estava em um estado de caos primitivo, havia até mesmo uma cueca velha pendurada no ventilador, mas o caçador não se importava, pegou sua caixa de violão que usava para esconder Rebellion e saiu do local sem sequer trancar a porta. Dirigiu-se a uma lanchonete próxima do local, iria comer um delicioso hambúrguer triplo com bacon extra e dois ovos, e de sobremesa, um sundae de morango. Aliás, esta era uma das vantagens de ser um meio-demônio: tomar sorvete no frio e não ficar doente.

 

O casaco vermelho de Dante balançava ao vento, as ruas estavam com pouco movimento devido ao mau tempo e o caçador achou graça da fragilidade humana. Chegou rapidamente na lanchonete e sentou-se em sua mesa habitual, no fundo do estabelecimento.

 

“Vai querer comer o quê hoje Dante?” – perguntou Gibbs, o dono do local, que estava atendendo um casal de estudantes no balcão.

 

“Me manda o de sempre. Hambúrguer triplo com bacon extra e dois ovos. Ah, aproveita e pede meu sundae de morango também.” – respondeu o meio-demônio.

 

“Haha, o frio realmente não afeta você, não?” – brincou o gerente de lanchonete de meia idade.

 

Gibbs era um bom sujeito, tinha pouco mais de cinqüenta anos e muito mais que cinqüenta quilos. Era baixo e calvo, dono de um espesso bigode castanho e o melhor fazedor de hambúrguer da região. Dante era um velho conhecido, salvara o homem de um demônio que invadira a lanchonete alguns anos atrás e desde então o caçador passou a ser um cliente preferencial do local, entenda-se, comia sempre e não pagava nunca. O sanduíche do meio-demônio não demorou a chegar, mas quando Dante estava prestes a dar a primeira mordida, uma música estridente saiu do bolso do casaco vermelho.

 

“Ahh, essa não...” – balbuciou o caçador ao pegar o celular no bolso.

 

“Alô? Dante! Roubaram a Sparda!” – a voz de Lady, do outro lado da linha, praticamente furou os tímpanos do pobre caçador de demônios.

 

“Merda! Como isso foi acontecer? Você não trancou a porta antes de sair do Devil May Cry?” – perguntou Dante, visivelmente irritado.

 

“Dante, você foi o último a sair...” – respondeu secamente a garota.

 

“Isso não faz diferença agora.” – o meio-demônio tentou desconversar – “Quem roubou a espada provavelmente deve querer abrir um portal para o Inferno, pena que não vai conseguir sem os amuletos que estão comigo.” – falou enquanto brincava com o colar que unia os dois medalhões deixados por Sparda e Eva para seus filhos.

 

“E vai fazer o quê agora?” – perguntou Lady.

 

Dante respirou profundamente por um momento antes de responder, teria que ir atrás do ladrão, e tinha uma idéia de onde procurar, mas evitava ir até aquele local a todo custo. Não teria escolha desta vez, teria que ir até as ruínas da Torre Temen-Ni-Gru.

 

“Irei até as ruínas daquela torre.” – foi tudo o que o meio-demônio disse.

 

“Entendido...” – Lady sabia que aquele local trazia memórias dolorosas ao amigo, por isso, não prolongou mais a conversa.

 

“Hey Gibbs! Guarda isso aqui pra mim! Tenho um serviço urgente!” – berrou Dante, erguendo-se bruscamente e disparando porta afora.

 

O filho de Sparda perguntava-se quem seria seu oponente nas ruínas da demoníaca torre e por um momento, teve a esperança de ver seu irmão vivo novamente, mas esta logo se esvaiu. Temen-Ni-Gru ficava no centro da cidade, não era longe, mas Dante optou por um meio de transporte mais rápido que seus pés. Avistou um motoqueiro em sua Harley-Davidson e logo correu até ele.

 

“Mas ein?!” – bradou o motoqueiro antes de ser nocauteado por um poderoso soco do caçador.

 

“Desculpa aí, mas vou precisar dessa belezinha!” – disse Dante, jogando o motoqueiro inconsciente no chão enquanto sentava-se no assento da moto para conduzi-la.

 

A moto era de fato excelente, confortável e rápida, o meio-demônio fez seu caminho até as ruínas da torre com facilidade, ultrapassando carros e violando todo tipo de lei de transito imaginável no processo. Dante estacionou a moto a poucos metros das ruínas do Temen-Ni-Gru, e fitou o local com um misto de tristeza e nostalgia. Fora lá que ele derrotara seu irmão, pior, fora lá que ele sentenciara seu irmão a uma agonia inimaginável nas mãos do senhor dos demônios, Mundus. Restava apenas um andar da torre, e nenhum humano se arriscava a adentrá-lo por medo dos demônios que ainda residiam lá dentro. Isso, claro, não era problema para o meio-demônio.

 

“Showtime...” – disse para si antes de armar-se e entrar na torre.

 

Tudo estava do jeito como Dante se lembrava: as estátuas de aspecto demoníaco, os corredores altos e largos, o cheiro de morte. Caminhou com firmeza pelo salão de entrada, buscando com os olhos qualquer sinal de movimento e não demorou a avistar alguns demônios alados se refugiando atrás das gárgulas, visivelmente assustados com a presença do filho de Sparda. Após analisar o salão com calma, prosseguiu pelo único corredor desobstruído, que terminava em uma escadaria que Dante não se lembrava. Talvez a torre, apesar de morta, ainda sofresse mudanças em sua estrutura com o tempo. Pensando bem, talvez a torre não estivesse totalmente morta.

 

“Vamos brincar então!” – bradou Dante ao avistar meia dúzia de demônios vermelhos, que pareciam feitos de sangue, subindo pela escadaria em sua direção.

 

Os seres abissais eram absurdamente magros e portavam foices de aspecto grotesco. O caçador sacou sua espada e correu ao encontro dos inimigos sem qualquer tipo de precaução, não havia necessidade para isso. Desferiu poderosos golpes de espada que liquidaram instantaneamente dois dos seis demônios. Os outros tentaram acertar Dante com suas foices, mas os ataques foram defletidos pela lâmina de Rebellion, que logo em seguida mergulhou no ventre de outro abissal.

 

“Três caídos, faltam mais três!”

 

Dante sacou Ebony e disparou freneticamente contra os demônios, atingindo-os e forçando-os a se proteger. O caçador aproveitou o momento para saltar sobre os inimigos e desferir um poderosíssimo golpe cortante que partiu os três ao meio.

 

“Esta torre já foi melhor.” – disse enquanto guardava as armas e seguia descendo pela escadaria.

 

Acabou chegando a um grande salão circular que lembrava o antigo coliseu existente na torre, com a diferença de que no centro havia agora um altar no qual estava depositada a espada roubada. Em frente ao altar estava um homem que Dante nunca vira antes, deveria ter a mesma altura do caçador, mas usava um longo casaco branco, calças e colete negro e um cachecol também branco. Os cabelos curtos e negros do estranho estavam perfeitamente penteados em um estilo agressivo, e os olhos cor de rubi denunciavam que não se tratava de um humano comum.

 

“Como não tem mais ninguém com cara de inimigo aqui, eu acho que foi você que roubou minha espada.” – disse Dante, em um tom de deboche.

 

“Certamente, mas parece-me que apenas ela não era suficiente. Alguns detalhes escaparam à minha primeira leitura deste livro.” – disse o estranho, sorridente, enquanto mostrava um livro que Dante já vira antes, nas mãos de Arkham.

 

“Onde conseguiu isso?!” – perguntou um surpreso caçador.

 

“Em Fortune Island. Eles coletavam tudo que fosse relacionado à Sparda até pouco tempo atrás. Para ser mais preciso, até você acabar com o culto que lá existia.” – explicou o estranho - “Foi lá também que consegui isto.” – continuou, apontando a espada que carregava na cintura, uma espécie de sabre longo feito para ser empunhado com uma ou duas mãos.

 

“Bela espada, mas e você camarada, quem é?” – Dante perguntou.

 

“Chamo-me Julian.” – apresentou-se o estranho.

 

“E agora a pergunta premiada: quem diabos você acha que é para querer abrir o portão do inferno?” – berrou Dante, ao sacar Rebellion e apontá-la na direção de Julian.

 

“Você se acha no direito de me dizer o que fazer, não é, Dante? Mas aqueles a quem você ama não estão no inferno!” – replicou o adversário.

 

“Deixe-me adivinhar, você quer salvar alguém que acabou parando no inferno após uma morte trágica. Isso é realmente comovente, pena que você solta uns milhares de demônios no processo.” – zombou o caçador.

 

O homem de casaco branco fez um meneio com a cabeça, e Dante parou por um momento, aquele homem queria abrir o portão para salvar a alma de alguém, poderia mesmo impedi-lo? Venceu a hesitação ao lembrar-se de Vergil, de como arruinara o irmão ao vencê-lo na divisa entre os mundos.

 

“Má notícia para você, amigo. Vou impedi-lo de fazer isso.” – disse o meio-demônio com aspereza.

 

“Sobre isso, veremos.” – respondeu Julian sacando lentamente sua espada.

 

Dante avançou rapidamente na direção do adversário com o intuito de atingi-lo com uma violenta estocada, mas Rebellion foi defletida pela lâmina inimiga sem muita dificuldade. Julian passou para a ofensiva, tentando atingir o ombro do caçador com um golpe cortante, habilmente esquivado pelo filho de Sparda, que sacou Ebony e disparou na direção do oponente. O projétil atingiu de raspão o ombro de Julian, que pareceu não se importar com o ferimento. Dante saltou para trás rapidamente, e relaxando, apoiou sua espada no ombro.

 

“Você certamente não é um demônio, mas é muito mais forte que um humano qualquer. Vamos lá, diga qual é seu segredinho.” – ironizou Dante.

 

“Não vejo mal em responder-lhe. Sou exatamente a mesma coisa que você, só que nascido de um modo diferente.”

 

Dante arqueou uma sobrancelha, toda aquela situação estava ficando interessante, não se divertia tanto desde o incidente de Fortune Island. O meio-demônio, por alguma razão desconhecida, achava diversão nas situações mais absurdas.

 

“Para resumir a história, eu realizei um ritual para invocar os poderes do inferno e os submeti à minha vontade, selando-os dentro de meu corpo.” – explicou o homem de branco.

 

“Meus parabéns, você conseguiu se transformar em uma legítima aberração. Agora, me diga uma coisa, você acha que seja lá quem você quer salvar gostaria de ver você assim?” – inquiriu Dante.

 

“Que escolha eu tinha? Você não é idiota Dante, se eu abrir o portão do inferno, precisarei de poder para entrar lá e salvar Emily.” – replicou o outro.

 

Dante suspirou e andou de um lado para o outro, analisando o oponente. Derrotá-lo não seria fácil, aliás, não seria suficiente, as pessoas lutam até a morte por aquilo que querem proteger, é isso que faz um ser humano: a vontade e a força para proteger aquilo que é importante. O caçador apontou Rebellion na direção de seu oponente, não sorria desta vez, estava sério, tal qual na última batalha que travara naquela torre.

 

“Vamos reiniciar o show?” – perguntou Dante.

 

“Certamente...” – respondeu o homem de branco, adotando uma postura ofensiva com sua espada.

 

Julian saltou na direção de Dante, girando no ar ao mesmo tempo em que desferia rápidos ataques cortantes com sua espada, alguns bloqueados e outros esquivados pelo caçador, que não hesitou e aproveitar o momento da aterrissagem do adversário para apontar-lhe Ebony. Julian, entretanto já esperava por isso, sacou uma arma de fogo calibre 45 e a apontou na direção de Dante. Os dois dispararam, atingindo-se.

 

“Você está me dando um bocado de cansaço, garoto.” – reclamou Dante.

 

Avançaram um contra o outro, trocando golpes de espadas e tiros, sem que houvesse supremacia de um dos combatentes. Julian por fim aproveitou uma abertura de Dante que veio após um ataque de espada mal executado do filho de Sparda para atingi-lo com uma forte estocada. O caçador recuou alguns passos e cuspiu um pouco de sangue, apoiando-se em Rebellion.

 

“É o fim, Dante. Eu venci.” – sentenciou Julian

 

“Haha, desculpa te desapontar, garoto. Ainda não terminei.” – disse Dante, antes de cuspir mais um pouco de sangue.

 

O caçador invocou os poderes que lhe foram legados por seu pai e assumiu sua forma demoníaca, o casaco vermelho tornou-se parte dele, como se fossem asas, e as feições humanas deram lugar a um horrendo rosto de demônio. As feridas fecharam-se rapidamente e uma aura vermelha emanava do corpo de Dante.

 

“Então, este é o poder do sangue de Sparda. Não acho que possa me transformar desse modo, mas também tenho meus truques” – disse o homem de branco.

 

Julian cravou sua espada no chão e livrou-se de seu casaco para logo em seguida invocar enormes asas negras, envoltas em chamas. Retomou sua arma e voou na direção de Dante que não se intimidou e avançou contra o adversário. As lâminas se encontraram em um poderoso choque, que partiu a arma de Julian e permitiu ao caçador ferir com força o tórax de seu inimigo. Os guerreiros terminaram longe um do outro, Dante retomando sua forma humana, em pé, e seu inimigo tombando no chão, com suas asas ainda abertas, debatendo-se.

 

O rapaz cuspiu sangue e tentou em vão levantar-se, estava ferido demais. Dante guardou Rebellion e caminhou em sua direção lentamente, sentando-se próximo ao oponente derrotado.

 

“Sinto muito, mesmo.” – disse Dante de modo sincero.

 

“Haha, não quero sua piedade. Mesmo assim, preciso agradecer-lhe.”

 

Dante olhou com um misto de curiosidade e surpresa para Julian, imaginando o que ele queria dizer com aquilo. Estava ferido, à beira da morte, e não conseguira realizar seu desejo. Que diabos ele tinha a agradecer?

 

“Sabe, acho que estou indo pro inferno de qualquer jeito agora. Vou encontrar Emily lá...” – disse Julian antes de fechar os olhos, morto.

 

O meio-demônio ergueu-se, pegou o casaco branco de seu adversário e o colocou sobre o corpo dele antes de retomar Sparda e sair do Temen-Ni-Gru sem dizer uma palavra sequer. Julian era mais humano do que muitas das pessoas que Dante costumava proteger, e o caçador sentiu-se culpado, criminoso, por tê-lo matado. Céus, como odiava aquela sensação, sabia que só o tempo iria levá-la. Tomou novamente a Harley-Davidson e dirigiu alucinadamente pelas ruas, como de praxe. Precisava urgentemente de uma cerveja e de seu hambúrguer, melhor, precisava desesperadamente de seu hambúrguer e de várias cervejas.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Bom gente, leiam e comentem por favor!