Reencontro escrita por Lucca


Capítulo 37
Capítulo 36


Notas iniciais do capítulo

Não sou boa com despedidas. Então...

Boa leitura



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/755106/chapter/37

4 meses depois

Kurt estacionou o carro e seu coração parecia querer saltar pela boca ao ver a casa na sua frente. Uma alegria indescritível tomava conta dele toda vez que retornava ao lar. Ele nunca imaginou que seria tão feliz. Nunca imaginou que cada reencontro ao final da tarde seria tão especial.

Contendo a explosão de felicidade que agitava seu interior, entrou da forma mais silenciosa que pode. Era melhor não arriscar, Ben poderia estar dormindo.

Correu os olhos pelo ambiente aberto do andar térreo. Sala e cozinha vazias, convite perfeito para subir as escadas e alcançar os quartos. Os degraus foram vencidos dois a dois tamanha era sua ansiedade por ver sua família. Mas desacelerou ao chegar próximo ao quarto do filho. A porta parcialmente aberta mostrava Jane ninando o filho enquanto cantarolava baixinho.

 

Like an image passing by

My love, my life

In the mirror of your eyes

My love, my life

I can see it all so clearly

All I love so dearly

Images passing by

Like reflections of your mind

My love, my life

Are the words I try to find

My love, my life

But I know I don’t possess you

With all my heart, God bless you

You will be my love and my life

You’re my one and only”

 

“Como uma imagem passando

Meu amor, minha vida

No espelho dos seus olhos

Meu amor, minha vida

Eu posso ver tudo tão claramente

Tudo que eu amo tão carinhosamente

Imagens passando

Como reflexos da sua mente

Meu amor, minha vida

São as palavras que eu tento encontrar

Meu amor, minha vida

Mas eu sei que não te possuo

Com todo meu coração, Deus te abençoe

Você será meu amor e minha vida

Meu primeiro e único.”


 

Seus lábios se curvaram num sorriso. Não havia visão mais bela no mundo para ele. E era impossível descrever o amor que sentia por aquelas duas pessoas tão especiais: sua Jane e essa criança que foi gerada com o amor mais intenso que um casal pode sentir. Era tão singular e tão perfeito.

Ao observá-la colocando Ben no berço, entendeu que era o momento de entrar. Foi recebido com o sorriso amplo e sincero dela. Era incrível como ele podia ver ali refletido no rosto dela seus sentimentos. Não havia necessidade de palavras e declarações para ele saber que o coração de Jane pulsava mesmo compasso que o dele, acelerado pela adrenalina do sentimento que os unia. Sorriso e olhar conectados fez brotar o beijo suave. Ainda em silêncio, os dois deixaram o quarto.

— E então, como foi seu dia? – Jane perguntou envolvendo os braços ao redor do pescoço do marido.

— Acho que estou me acostumando à papelada sem fim. E até me sinto útil porque sei que as relações que estou entrelaçando e os casos que estou trazendo de volta à pauta serão fundamentais para impedir novos crimes e colocar muita gente perigosa atrás das grades. – Kurt respondeu levantando as sobrancelhas e depois se curvou e sussurrou ao ouvido dela - Mas, com certeza, a melhor parte foi chegar em casa, voltar pra vocês.

Jane sentiu um fluxo de eletricidade disparar por seu corpo deixando-a arrepiada, uma sensação que Kurt despertava sempre que usava esse tom de voz. Deu um beijo rápido no pescoço do marido e insistiu na conversa:

— Hum, eu sei que não deve estar sendo fácil se adaptar ao trabalho burocrático e ficar fora de toda ação em campo. Eu voltarei daqui há algumas semanas e sei que terei a mesma dificuldade, mas nossa família merece mais segurança. Falando em família, Avery ligou e virá nos ver no final do outono.

Kurt finalmente desistiu de se manter colado ao pescoço da esposa e se endireitou buscando olhar diretamente para ela enquanto afastava uma mecha de seu cabelo para trás da orelha:

— Algum problema com Avery?

— Não, não. Tudo bem.

— Mas??? – ele insistiu considerando que Jane trouxe sua filha à pauta por algum motivo.

Jane suspirou e disse:

— Foi tão bom visitá-la e participar um pouco da vida universitária dela. – e sugou o ar demonstrando sua emoção – Ser apresentada como mãe depois de tudo que passamos, foi indescritível. Sabe, eu quero que Bethany e Ben tenham essa experiência: que possam ir para a universidade após o ensino médio.

— Estamos trabalhando para isso, não estamos? Já fizemos os cálculos, sabemos quanto temos que economizar...

O olhar e os lábios de Jane se entortaram para o lado demonstrando alguma insatisfação, mas ela tentou disfarçar em seguida e sorriu:

— É...

— Não, não é. Tem alguma coisa te incomodando e quero saber do que se trata.

Ela respirou fundo pensando se deveria compartilhar isso com ele. Ocultar sentimentos e acontecimentos nunca fez bem aos dois. Então, decidiu se abrir:

— Não é nada sério, só... – e engoliu seco, procurando a coragem para prosseguir – eu sinto vontade de ter outro filho.

O rosto de Kurt foi se iluminando num sorriso enquanto ela continuava:

— Eu sei que tenho mais do que mereço com nossa família. Mas essa vontade parece que cresce a cada dia. Claro, não agora, talvez depois que Ben estiver um pouco maior...

E sentiu os lábios dele se unindo aos seus num beijo que rapidamente se aprofundou relembrando que o amor dos dois foi forjado pela compreensão. Esses momentos, essa troca de carinho, era tão importante porque trazia de volta a paz e a certeza de que juntos eram melhores. Continuaram ali até precisar de ar. Então, Kurt disse:

— Nós já superamos tanta coisa, Jay. Um outro filho seria apenas uma felicidade ainda maior.

O rosto de Jane se iluminou e ela estreitou o olhar de forma maliciosa:

— Então, que tal levarmos essa babá eletrônica até o banheiro e começarmos a treinar lá?

Kurt respondeu com um olhar carregado de desejo e cobriu seus lábios novamente com beijos enquanto suas mãos se posicionavam firmemente no seu quadril convidando-a a impulsionar seu corpo contra o dele e envolver as pernas ao redor de sua cintura. Ela fez exatamente o que ele esperava e se deixou ser carregada até o banheiro.

Lá, os dois se livraram rápido das roupas. Os último meses ensinaram uma lição valiosa aos pais de Ben: o tempo urge e o sono de seu filho é leve, melhor aproveitar enquanto podem.

Assim que estavam despidos, Kurt depositou um beijo suave e provocante na pele macia atrás da orelha dela enquanto suas mãos deslizavam por suas costas. Jane soltou um gemido e disse:

— Por favor, eu preciso que cheguemos até o final dessa vez...

— Nós precisamos. – ele respondeu e aproximando-se de seu ouvido, sussurrou com a voz pesada e baixa – você pode gemer mais baixo, meu amor? – e lambeu a curva da orelha dela enquanto uma de suas mãos deslizava para a frente e encontrava o mamilo de seu seio direito para beliscá-lo suavemente.

Envolvida pela provação entre o pedido de silêncio e as carícias que exigiam o contrário dela, Jane fechou os olhos e colou seus lábios aos deles para obrigá-lo a engolir seus gemidos. Os dedos delas se cravaram nas costas do marido antes de iniciar uma descida lenta até muito mais abaixo. Uma de suas mãos migrou para a frente em busca daquilo que ela já sentia firme e louco de desejo por ela. Correu os dedos ao redor do pênis dele e brincou com movimentos suaves enquanto depositava beijos molhados em sua clavícula.

— Jane... – ele gemeu.

— Shshshs. Silêncio, lembra-se? – e o empurrou para dentro do box.

Chuveiro ligado. Os dois se entregaram àquele ritual mágico de amor. A forma como se tocavam, as poucas palavras que sussurravam confessando o amor, foi lento e suave, denso e intenso ao mesmo tempo. Talvez tenha sido mais rápido do que sentiram, porque a imensidão que viviam nesses momentos não permitia mensurar de forma clara o tempo. Enquanto seus corpos se conectavam um ao outro, a realidade cedia lugar ao mar de sensações e emoções mutuas que desfrutavam. Juntos, encontravam o ritmo que os conduziria ao ápice e, ao alcançar o céu, deixaram seus corpos relaxarem enquanto recostavam suas testas e se entreolhavam em mais uma promessa de que seria eterno.

Dois meses depois

Jane tentou abrir os olhos, mas parecia difícil demais. Ela não insistiu. Vinha lutando contra esse pesadelo já há algum tempo, tinha se habituado à ele. O cheiro estranho, algumas pontadas agudas de dor, a respiração pesada e difícil, os calafrios. Aquela sensação horrível de querer acordar e não conseguir... Era melhor não lutar contra isso e se permitir dormir mais.

Mas, dessa vez, novas imagens adentraram nesse sonho como uma lembrança: o cheiro de gasolina, o carro descendo sem controle pela encosta íngreme...

— Kurt! – ela gritou... ou será que nem chegou a falar realmente? De qualquer forma, seus olhos se abriram.

Acordar de seu pesadelo foi mergulhar num mar de incertezas. Ela não estava em casa. Não estava em nenhum local do qual se lembrava. Ela tinha um soro conectado à veia de seu braço, mas ali não era um hospital. Assustada, ela tentou se levantar, mas foi impedida por pessoas que se aproximaram:

— Não, não, não. Você não pode se levantar. Por favor, fique deitada. – uma moça lhe disse com a voz carregada por um sotaque estranho.

— Onde eu estou? Quem são vocês? – Agora ela sentia uma dor forte da perna esquerda além da tontura por tentar se levantar. Fraca, cedeu as mãos que a empurravam de volta ao leito.

— Ela está com febre de novo? – Uma voz masculina perguntou.

— Não. Acho que só está acordando mesmo. – a moça respondeu.

Jane respirou repetidas vezes com os olhos fechados. Talvez se ela voltasse a dormir, acordasse em casa. Os rostos daquelas pessoas... eram nativos americanos. Só podia ser uma espécie de delírio ou algo assim.

— Quando ela se acalmar, conte o que aconteceu. – a voz masculina disse ríspida.

Imediatamente, Jane abriu os olhos. Ela não fugia de seus problemas. Pesadelo ou realidade, conhecer a verdade é sempre o melhor caminho:

— Eu estou calma. – disse procurando manter a voz firme. – Por favor, me digam onde estou.

— Há três semana atrás, seu carro foi solto pela ribanceira muito íngreme da autoestrada que corta nossa reserva. O carro incendiou em poucos minutos. Para sua sorte, alguns dos nossos estavam por perto e viram o que aconteceu. Você saltou do carro durante a queda, mas teria sido consumida pelas chamas se eles não te afastassem do veículo. Sua roupa estava encharcada de gasolina.

— Por que estou aqui? Por que não me levaram a um hospital? Preciso que chamem as autoridades competentes. Eu preciso avisar meu marido...

— Nós não acionamos as autoridades porque foram dois carros oficiais do FBI com cerca de seis homens uniformizados que efetuaram o descarte do carro com você dentro. O local é praticamente desértico. Nem mesmo meu povo costuma ir até lá com frequência. Achamos que, para sua segurança, seria melhor cuidarmos de você por aqui mesmo. Talvez assim você teria uma chance.

Jane sentiu sua respiração descompassando. Não podia ser verdade. Kurt! Ele devia estar desesperado.

— Eu preciso de um telefone. Preciso falar com meu marido. Vocês têm telefone por aqui?

A moça sorriu e revirou os olhos.

— Claro que temos. Mas preciso que me garanta que isso será seguro para você e para nós.

— Sim, sim. Eu garanto. Meu marido jamais faria algum mal à vocês. Por favor, ele deve estar destruído com o meu desaparecimento.

A moça trouxe um celular e Jane discou trêmula o número de Kurt.

“Esse número de telefone não existe.” – informou a voz digitalizada do outro lado da linha.

Inconformada, tentou repetidas vezes sem sucesso. Ainda sem aceitar desistir, tentou os números dos amigos. Nada. Mais receosa e sem outra opção, tentou números do SIOC. A resposta era sempre a mesma: “Esse número de telefone não existe.”

Os primeiros dias foram terríveis, mas depois ela aceitou. Algo muito grave havia acontecido. A última coisa da qual se lembrava é que estava saindo da academia quando tudo apagou. Restava-lhe esperar e se recuperar para depois apurar os fatos. Foi o que ela fez.

Três semana mais e Jane já estava bem melhor. Conseguia caminhar bem, apesar de ainda sentir dor na perna. Era hora de partir, de voltar e descobrir o que aconteceu. Se despediu dos novos amigos que a levaram até a cidade mais próxima. Enquanto não soubesse com mais detalhes por que atentaram contra sua vida, decidiu usar roupas discretas que cobrissem as tatuagens.

NYC não era tão longe dali. Ela não tinha dinheiro, mas com algumas caronas conseguiu chegar até à cidade. Foi até sua casa, se aproximou discretamente prevendo problemas. Observou por horas. A conclusão, apesar de esperada, doeu mesmo assim: havia uma outra família morando lá. Seja lá o que aconteceu, afetou muito mais que apenas ela. A bile subiu deixando um gosto amargo em sua boca.

“Eles estão bem. Kurt e Ben estão bem. Só não estão aqui. Eu vou encontrá-los” repetiu a si mesma como um mantra capaz de mantê-la com um propósito diante do filme de terror que sua vida havia se tornado.

Mesmo sabendo que era perigoso, o desespero a levou até o SIOC. Lá alguém a ajudaria. Talvez o povo que a acolheu tenha visto errado o emblema do Bureou nos uniformes e carros que forjaram seu acidente.

Jane se aproximou da portaria fingindo normalidade. É claro que os agentes conhecidos não estavam ali.

— Bom dia. Por favor, estou aqui para me encontrar com o agente especial Kurt Weller.

— Bom dia. Acho que a senhora está enganada. O Sr. Weller não é um agente especial. Ele é o diretor do FBI. Vou verificar se ele está no NYO nesse momento. Por favor, o seu nome.

— Jane ... – e ela pensou na melhor forma de chamar a atenção de Kurt – Jane Weller. Sou a esposa dele.

Os três agentes da portaria se entreolharam preocupando Jane que assumiu uma postura defensiva. Mesmo assim, eles entraram em contato com a diretoria e informaram a presença dela. Agente experiente, ela percebeu quando receberam comandos pelos comunicadores.

— Senhora, o Sr. Weller não está no momento. Mas precisamos que a senhora nos acompanhe.

Seus instintos gritaram “Fuja!” e ela fez o que podia:

— Se ele não está, por favor, digam que estive aqui. Não posso acompanhá-los no momento...

Jane viu quando o agente da esquerda sacava a arma e, imediatamente deferiu um golpe o derrubando. A sequência foi uma luta com os outros dois agentes. Felizmente, ela conseguiu derrubá-los e correr a tempo de alcançar um táxi na rua. Saltou duas quadras depois e se embrenhou num prédio residencial e depois em outros, evitando as câmeras de segurança até sair numa rua longe dali e acessar o metrô. Vagou por horas até encontrar um beco onde se sentiu segura e pode descansar entre dois containers de lixo.

Kurt agora era diretor do FBI. Uma ascensão rápida demais em seis semanas. Ela precisava chegar até ele, mas teria que ter paciência. Nos próximos dias, observaria o prédio do NYO por horas e horas a fio. Chegaria antes do dia amanhecer. Sairia só depois do último funcionário. Um dia, ela o encontraria, ela tinha certeza.

Sala da Diretoria do NYO – na manhã seguinte

 A porta do elevador principal se abriu e Nas adentrou no saguão principal. Sua pequena estatura contrastava com a imponência de sua presença. Todos os agentes a cumprimentaram com sorrisos e gestos discretos. Ela tinha o respeito de todos ali.

— Preciso falar com o Diretor Weller. – disse sendo objetiva.

E foi encaminhada para a sala dele que a recebeu com um sorriso amplo, apesar de não ser totalmente sincero. Kurt estava mergulhado na resolução de difíceis questões burocráticas naquele momento. E a presença de Nas ali àquela hora do dia só podia significar novos problemas.

— Bem vinda. – disse ficando em pé para recebê-la – Por favor, sente-se. - e puxou a cadeira para ela.

— Kurt, - ela começou e fez um breve pausa selecionando as palavras. – Tenho uma assunto sério a tratar com você. É, ao mesmo tempo, algo profissional e ultra confidencial entre nossas agências, mas também terá uma carga pessoal. Temos um incidente que pode colocar a segurança de todo país em risco.

— Estou à sua disposição. Por favor, fale.

— É sobre o caso Sandstorm. Você se lembra da complexidade que enfrentamos para solucioná-lo e devolver a tranquilidade à esse país?

— Sim, eu jamais me esqueceria. – e seu rosto se abriu num largo sorriso – Mas o mérito é muito mais seu do que nosso. Sua atuação para derrubar a maior organização terrorista doméstica desse país foi espetacular e a fez merecer o cargo de Diretora da ASN. Nossa participação foi pequena. Ajudamos em casos isolados. Isso já tem quase três anos.

— A ajuda de vocês foi fundamental. E sempre serei grata por isso, Kurt. Mas existe uma questão pendente ou nova. Nem sei como classificar isso. A cúpula da Sandstorm era formada pela família de Shepherd. Ela e seus dois filhos, Roman e Remi.

— Pensei que eram só Shepherd e Roman.

— Todos pensamos. Acreditávamos que Remi tinha morrido em uma das missões no Afeganistão.

— Mas não morreu...

— Não. Ela está viva e agindo para trazer a Sandstorm de volta. - então, Nas abriu sua pasta, retirando o laptop e mostrando arquivos com fotos de Remi Briggs em eventos de gala. – As fotos não estão completamente nítidas, mas o leitor facial conseguiu identificá-la. Ela tem viajado pelo mundo, utilizado diferentes nomes e se infiltrado em diversas empresas desviando fundos para sua causa. Seus alvos são específicos: homens com dinheiro e influência que ficaram viúvos recentemente. Em algumas ocasiões, ela chegou a se apresentar como a falecida esposa de alguns deles, conseguindo acesso ilimitado dentro das empresas. Ela é bonita e joga com a sedução diante da fragilidade deles para conseguir que se apaixonassem por ela. Esses três que foram vítimas do seu golpe acabaram mortos, aparentemente de causas naturais. A ASN vai investigar isso mais a fundo agora que sabemos do envolvimento dela.

— Realmente ela parece perigosa. É um caso internacional, melhor você acionar a CIA.

— Eu já fiz isso, Kurt. Mas ontem soou um alerta diferenciado para Remi. Ela está aqui em NYC. – Nas respirou fundo buscando coragem para continuar. Endireitando ainda mais sua postura, falou de forma objetiva, mas com os olhos carregados de preocupação: - Remi tentou entrar nesse prédio dizendo que era a sua esposa.

O sangue de Kurt ferveu imediatamente. Uma terrorista tentando se passar por sua esposa era uma forma de abuso totalmente revoltante. Imediatamente, sua mente traçou paralelos mais amplos, isso poderia colocar em risco sua família era algo além de qualquer limite que ele poderia aceitar. Ele estreiou os olhos e esperou mais informações.

— Ela disse que queria falar com você. Provavelmente só queria acesso ao prédio. Os agentes da recepção desconfiaram e resolveram detê-la para interrogatório. Mas ela reagiu e fugiu.

— Não se preocupe, Nas. Vou colocar uma força tarefa especial em busca dela e vamos prendê-la.

— Não é com Remi que estou preocupada, Kurt. É com você. Temo que ela use esse subterfugiu para tentar se aproximar como fez com outros homens ao redor do mundo.

Kurt sorriu com uma ironia discreta:

— Nas, agradeço sua preocupação, mas não sou como aqueles milionários excêntricos e fragilizados que cairiam na sedução e mentiras de uma terrorista. Sou um agente treinado do FBI. Além disso, agora já sei quem é ela. Se Remi ousar se aproximar, eu mesmo vou prendê-la.

— Kurt, por favor, tenha cuidado. Não sabemos exatamente com que tipo de pessoa estamos lidando. Ela pode usar estratégias muito diferentes daquelas que conhecemos. Também temo pelas crianças, ela pode tentar se aproximar delas. Redobre a segurança.

— Farei isso imediatamente. – e pegou o telefone para organizar a questão.

Final da tarde naquele mesmo dia

Finalmente Jane tinha conseguido ver Kurt de longe. Ele estava saindo do NYO e caminhou rapidamente pela rua até um café não muito distante dali. Haviam locais discretos por perto que permitiriam uma abordagem assim que ele saísse. Elaborar uma estratégia de abordagem exigiu mais dela do que imaginava. Seu coração insistia em bater tão acelerado no peito que era complicado raciocinar. Também estava cansada, suada e um pouco zonza, não tinha se alimentado ainda naquele dia. Mas finalmente encontraria Kurt e juntos resolveriam tudo. Se posicionou próxima à vidraça para acompanhá-lo dentro do estabelecimento. Ele se dirigiu à uma mesa onde alguém o esperava: Nas. Jane agradeceu aos céus, a ajuda da amiga seria necessária e ficou observando os dois. Seu corpo todo estremeceu ao ver que os dois se cumprimentaram com um beijo.

“Não, não pode ser. – por um momento o chão parecia ter desaparecido. – Kurt e Nas juntos? – ela respirou algumas vezes tentando se acalmar – Calma, ele acha que estou morta. Está tentando seguir sua vida. Eu preciso ver isso como algo bom... – e secou uma lágrima que insistiu em rolar. – Kurt precisa saber a verdade. Depois poderá escolher. É um direito dele.”

Dentro do Café

Após a troca do beijo, Kurt disse:

— Nem sei como agradecer sua compreensão por nos encontrarmos aqui ao invés de você ir lá pra casa. Bethany tem me dado tanto trabalho e hoje a escola ligou de novo. Minha mãe está com ela agora. Por tudo isso achei melhor que hoje à noite fosse só eu com eles lá em casa.

— Não precisa agradecer. Sabe o quanto me preocupo com ela.  E com você. Kurt, por favor, prometa que vai pensar com carinho na sugestão de sua mãe. Bethany é tão pequena. É preciso decidir pelo que é melhor pra ela. E as escolhas que você têm feito não estão funcionando.

Ele respirou fundo, deixando a tristeza percorrer seu corpo com sensações ruins ao constatar que Nas estava certa. Tinha errado muito ultimamente com sua filha.

— Eu sei. Acho que vou acabar cedendo já que realmente parece que será o melhor para minha pequena Bee. Mas é tão difícil pra tomar essa decisão. Queria tanto que tudo fosse diferente... queria que passássemos por tudo isso juntos...

— Eu sei o quanto tem sido difícil. Mas você não está sozinho. Estou aqui com você. Essa fase vai passar e vocês ficarão bem.

Cerca de meia hora depois

Nas e Kurt se despediram com outro beijo e tomaram rumos diferentes na rua. Jane seguiu Kurt por alguns quarteirões até encontrar um beco discreto onde poderia forçar o encontro. Ela acelerou o passo até alcançá-lo e o empurrou para dentro do local cobrindo sua boca para que não chamasse atenção de outras pessoas. Uma vez lá, encobertos pela discrição do localugar, ela tratou de esclarecer a situação:

— Kurt, Kurt, sou eu, Jane. – e sorriu para ele que não reagiu e ficou apenas a observando intrigado. Ela tirou a mão de sua boca e continuou – Finalmente eu consegui te encontrar... tem sido um pesadelo... – e o abraçou trêmula.

Kurt foi completamente surpreendido por aquele abraço, mas mais ainda pelo cheiro daquela mulher, tinha algo de familiar nele. Por alguns instantes, inebriado pela sensação de familiaridade, se entregou àquele aconchego. Recobrando auto-controle após a surpresa, suas mãos se apoiaram no ombro dela a afastando:

— Quem é você? – perguntou com seu cérebro já traçando semelhanças com as imagens pouco nítidas que Nas mostrou mais cedo encobrindo as sensações e sentimentos que queriam aflorar de seu coração.

— Jane... – ela disse fraco com os olhos já transparecendo desespero. – Sou eu, Kurt: Jane, sua esposa.

— Acho que você deve estar me confundindo com alguém. Minha esposa não se chamava Jane e ela está morta.

— Morta... – ela repetiu tentando encontrar uma ordem na tempestade emocional do seu interior – Sim, claro. Eles fizeram de tudo pra você acreditar nisso. Tentaram me matar sim, mas eu escapei. - se afastou um passo para que ele pudesse observá-la - Olha pra mim, sou eu, Jane. E eu te amo mais que tudo, lembra? – então ela percebeu a diferença na forma como ele olhava para ela. Kurt realmente não se lembrava... – Ah, não. Kurt, por favor, me diz que você se lembra de mim. Eles devem ter zipado você...– e, movida por seus instintos, pegou a mão dele colocando-a sobre seu rosto. – Por favor, tente se lembrar.

Novamente se deixando guiar por estranho instinto dentre dele, cedeu a ela por alguns momentos, tocando seu rosto.

Ela pode usar estratégias muito diferentes daquelas que conhecemos.” – a voz de Nas soou nas suas lembranças clamando por racionalidade. Então, puxou sua mão e sacou sua arma, apontando-a para ela:

— Minha esposa era Allison Knight e ela morreu no parto. Eu não sei quem é você ou onde quer chegar com essa mentira.

— Não, Kurt, não. Por favor... você precisa me ouvir... – ela disse recuando.

— Chega! Seja lá o que fosse, termina aqui. Acabou. Vire-se, ajoelhe-se e coloque as duas mãos na cabeça.

Aquela bizarra repetição de um dos momentos mais tristes que os dois já viveram fez Jane sentir toda a esperança escapando dela. Sem mais vontade de lutar, fez o que ele pedia enquanto as lágrimas corriam por seu rosto. De joelhos, mãos na cabeça, esperando se algemada por Kurt, ela se entregou à destruição completa que tramaram contra ela.

— Remi Briggs, você está presa.

Como lutar contra isso? Como convencê-lo a ouvi-la? Havia alguma razão para insistir?

Casa da família Weller, duas horas depois

Kurt chegou exausto. Já era tarde e aquele dia tinha exigido tudo dele. As crianças já dormiam e Madeline, sua mãe o esperava. Trocaram um abraço, ela informou tudo que a escola tinha dito sobre Bethany e insistiu:

— Filho, tudo aqui lembra demais a mãe para ela. Você lembra a mãe para ela. Mandá-la para um colégio interno é melhor opção para que Bethany se recupere da morte de Allie.

— Estou cada vez mais certo disso, mãe. Obrigada por me ajudar com isso. Não sei o que faria sozinho.

Madeline tocou suavemente o braço do filho descrevendo movimentos suaves que demonstravam seu apoio e compreensão.

— Você tem sido um pai incrível e vai superar mais esse problema. – Então recuou e disse - Nas me contou sobre Remi Briggs. Ela parece ser perigosa.

— Remi não é mais uma ameaça, mãe. A CIA vai cuidar dela. Obrigada por sua preocupação. Agora vá descansar. Eu cuido de tudo aqui.

Assim que Madeline saiu, ele acessou as câmeras de segurança para garantir que tudo estava bem na casa. Agentes garantiam a segurança ao redor do imóvel. Depois disso, entrou no banho. Deixou a água quente cair sobre seus músculos tenso e cansados. O encontro com Remi Briggs tinha o impactado muito mais do que previa.

Após o banho, ele vestiu uma calça confortável de moleton e uma camiseta, se deitou na cama por alguns minutos. Fechou os olhos e ficou imóvel. Então se levantou e voltou a mexer no firewall das câmeras de segurança. Pronto.

Desceu as escadas rápido, pegou sua arma e foi até o carro na garagem. Abriu a porta de trás e a pegou pelo braço puxando-a pra fora do veículo. Ela continuava algemada:

— Se um terço do que você me contou enquanto rodamos por quase duas horas pela cidade fosse verdade, você teria fugido fácil daí no tempo que te dei. – disse seco

— Kurt, você e nossa família é tudo que tenho. Se eu não puder ter isso de volta, não me importo com o que acontecerá comigo...

Ele não respondeu. Seus olhos permaneciam frios quando a observavam. Ainda a tratando como uma prisioneira perigosa, a empurrou até a cozinha, sentando-a numa cadeira e prendendo suas mãos atrás do móvel. Novas lágrimas correram pelo rosto de Jane:

— Isso não pode me segurar, Kurt, mas nem isso você se lembra, não é? Precisamos falar com Patterson, ela tinha doses extras do antídoto escondidas. Podemos usá-lo e você se lembrará de tudo.

A conversa que se seguiu foi difícil. Os embates foram constantes e pareciam não levá-lo a lugar algum. Kurt estava cansado da forma como ela insistia nas mentiras e parou o interrogatório para apenas observá-la como se assim fosse possível captar qualquer sinal que a incriminasse e justificasse que ele a entregasse a CIA, coisa que deveria ter feito a duas horas atrás. Mas a única coisa que conseguiu foi perceber que a magreza excessiva dela demonstrava que ela não tinha se alimentado bem ultimamente. Sem entender porque agia assim, fez sanduíches e soltou suas mãos para que ela pudesse comer:

— Coma. Depois continuamos.

Jane sabia que ele nunca aceitava uma negativa à alimentação, então se esforçou em comer, mas foi inútil, só engoliu dois bocados com muita dificuldade. Enquanto isso, Kurt avaliava tudo aquilo. Se ela mentia, por que estava tão abalada a ponto de, mesmo faminta, não ser capaz de comer? Ela seria uma mentirosa tão perfeita assim?

De repente, foram interrompidos pelo choro do bebê. Instintivamente, Jane tentou se levantar, fazendo Kurt apontar a arma pra ela de novo.

— Ben...

— Não ouse se mover!

— Por favor, vá até ele. Eu não vou fazer nada. Não vou sair daqui. Não deixe ele chorar...

Kurt subiu e voltou pouco depois com o filho ainda em prantos nos braços. Jane terminava de  preparar a mamadeira. Ao vê-la, o bebê parou de chorar e se jogou em seu colo. Ela o acalentou e ofereceu a mamadeira. A reação do filho foi fundamental para Kurt confiar um pouco mais na história que aquela estranha lhe contava.  

— Graças a Deus que ele está bem. Eu tive tanto medo. – ela disse beijando a cabecinha macia do filho.

Sentindo-se mais tranquila com o filho nos braços, ela conseguiu terminar de comer o sanduíche. A conversa continuou. Kurt, aos poucos foi compartilhando algumas informações. Jane descobriu que Madeline agora era dona de uma grande empresa multinacional farmacêutica. O NYO era comandado por Christofer Stocker, seu irmão, que estava casado com Kathy Gustafsona, hacker louca que era a especialista forense que substitui Patterson. Todos achavam que Sophia era filha dos dois. Nessa nova versão tenebrosa da realidade, Rich nunca tinha entrado para o team e continuava na prisão. Roman seguia dopado numa instituição psiquiátrica enquanto esperava sua execução no corredor da morte. Shepherd já tinha sido executada. Patterson vivia isolada em sua mansão na Califórnia cuidando seus pais que tinham Alzheimer e recebia dividendos altos dos aplicativos que criou. Zapata vivia com o filho na Europa, trabalhando uma milionária empresa de segurança de lá. Reade estava em Quântico. Weitz era candidato à presidência dos EUA. Kurt não sabia sequer quem era Avery.

— Se a sua história for verdadeira, porque teriam feito isso? Quem está por trás dessa conspiração? – Kurt questionou.

— Eu não sei... Eu confio totalmente nas pessoas que faziam parte do nosso team. Todos devem ter sido zipados. Quanto aos outros, terei que tomar muito cuidado até descobrir quem foi zipado e quem colaborou com esse plano. Também não faço a menor ideia do porquê fizeram tudo isso ou onde pretendem chegar...

Casa de Madeline Burke, paralelamente a isso

Madeline entrou, deixou o casaco e a bolsa no armário de entrada e foi direto até o bar na sala onde se serviu de uma generosa dose de uísque. Depois se sentou no sofá. Ela não chegou tão longe para ter seus planos arruinados por Jane. Aquele praga parecia imortal. Sobreviveu ao ZIP, sobreviveu ao parto quando todos os prognósticos que escondeu de Kurt indicavam o contrário e sobreviveu até mesmo ao acidente e carbonização do carro...

— Você demorou a chegar. Fiquei preocupada.

— Eu estava na casa de Kurt. Finalmente estou convencendo-o a mandar Bethany para um colégio interno. Se sua preocupação era por causa da minha “querida nora”, fique sossegada. Ela não virá atrás de mim. Não existe nada que a faça suspeitar de mim.

— Eu sei, mas ela é astuta e difícil de controlar. Acredite, eu sei.

— Todas as agências de segurança estão atrás dela. No máximo amanhã estará num black site e lá a executaremos. Agora venha aqui. Estou precisando sentir você próxima a mim.

A outra mulher se sentou ao lado de Madeline no sofá e trocaram um beijo nada casto. Quando se afastaram disse:

— Nós estamos quase lá. Weitz vai se eleger e, depois dele, será a vez de Kurt, como nós sempre sonhamos.

— Keaton e Nas seguirão fieis à você enquanto não souberem de nossa ligação.

— Sim, eles são leais. Executam suas funções com determinação porque acreditam que assim fazem o melhor para seu país. E nunca descobrirão sobre nós. Todos acreditam que você foi executada, Ellen.

— Com o total controle da vida política e econômica desse país, garantiremos que toda e qualquer forma de oposição ao sistema que estamos implantando seja eliminada. E precisamos começar já, eliminando Remi. Depois, também será necessário agilizar a execução de todos os outros que faziam parte da equipe de Kurt. Não podemos correr o risco dele se lembrar.

— Ele não vai se lembrar. Vamos seguir o plano com calma para não levantar suspeitas. Mas, por hoje, chega de falar na Remi, você dedicou tempo de mais da sua vida a essa traidora. Essa noite tem que ser só nossa.

Se entreolharam, sorriram e brindaram.

Casa de Welller

— Precisamos forjar minha morte. É a única forma de deixá-los sentindo-se seguros o bastante para cometerem erros.

— Isso não será difícil. Podemos simular um acidente de avião. Fingir que você tentou assumir o controle da aeronave e acabou derrubando-a. Será fácil conseguir um corpo carbonizado que comprove essa versão.

— Kurt, eu prometo que vou conseguir o antídoto e vou descobrir e impedir o plano deles o quanto antes.

— Nós vamos fazer isso juntos.

— Não. Se suspeitarem de você, sua vida e a das crianças estará em risco. Eles precisam acreditar que você está com eles de forma incondicional.

— Com certeza minha posição dentro do FBI vai permitir que as investigações avancem mais rápido. Mas de forma alguma deixarei você enfrentar tudo isso sozinha. Você tem que me prometer que trabalharemos juntos, como uma equipe. E nenhum de nós tomará qualquer decisão sozinho.

— Ok.

Nesse momento, os dois foram surpreendidos por Bethany que entrou na cozinha sonolenta e coçando os olhinhos:

— Papai, você está aí?

Kurt tentou ser rápido e interceptar a filha antes que ela visse Jane, mas era tarde:

— Tia Jane, Tia Jane. – a garotinha gritou e correu para os braços de Jane e subiu nos seu colo exigindo espaço junto ao irmão. – Que bom que você voltou. A mamãe foi morar no céu. E tem muita gente má aqui perto de nós. Eu senti tanto medo. Mas você é a melhor ninja do mundo e vai acabar com eles.

— Calma, meu amorzinho, eu estou aqui agora e vamos proteger você. Por favor, me conte quem são essas pessoas más.

— A vovó é má. A Nas também é má.  – disse fazendo franzindo a testa e continuou – Mas o papai disse que não posso falar isso...

Jane a abraçou mais forte e lançou um olhar suplicante para o marido. Kurt se aproximou e acariciou as costinhas da filha:

— Por favor, Bee, me perdoe. O papai vai te proteger agora. Ninguém vai conseguir te afastar de mim.

Pouco depois a família estava no quarto principal da casa. Kurt sugeriu que Jane tomasse um banho. Ela o fez e depois vestiu uma camiseta dele enquanto suas roupas eram lavadas e secas pela máquina.

— Kurt, se eu puder dormir na garagem... Eu preciso muito descansar.

— Não! De jeito nenhum.

Ela baixou os olhos, mas não o culpou. Era realmente mais seguro se ela se afastasse da casa o quanto antes.

— Você vai passar a noite aqui. A partir de amanhã veremos uma forma de te acomodar no porão para ter onde descansar toda noite. Eu vou isolar as câmeras de segurança daquela área. Eles não desconfiarão que está aqui.

Aquela oferta soou para ela como um bálsamo relaxando seus músculos e reacendendo a esperança de que, apesar de não ser capaz de se lembrar dela, ainda existia um elo de confiança entre os dois:

— Eu não sei como agradecer. Sei o quanto deve ser difícil para você ter se permitido me ouvir, me deixar ficar, me deixar me aproximar das crianças...

— Não precisa me agradecer. Amanhã teremos um dia cheio. Tente descansar agora. Eu vou ficar vigiando.

Jane deitou-se na cama com Bethany e Ben. Junto com Kurt, combinou uma nova brincadeira com Bethany. A regra era não deixar ninguém saber que a super ninja estava de volta para juntos derrotarem as pessoas más. A pequena concordou empolgada, bateu palmas e depois se aconchegou junto à madrasta. Mesmo exausta, ao observar os olhinhos das crianças vidrados nela, Jane começou a cantarolar para dormirem.

Like a angel passing by.?My love, My life…”

Kurt sentiu uma estranha sensação de familiaridade invadindo novamente seu interior. Ele não se lembrava, mas algo muito bom tomava conta do seu peito diante daquela cena.

Em minutos, Jane e as crianças adormeceram. Kurt andou pelo quarto pensando nos últimos acontecimentos. Nas mostrou provas contundentes que aquela mulher era uma terrorista perigosa que precisava ser detida. Ele não deixaria o melhor de seus agentes enfrentá-la sozinho. No entanto, ela estava aqui, dentro de seu quarto, na sua cama, dormindo abraçada ao que ele tinha de mais precioso: seus filhos.

Por sua vida inteira, ele construiu barreiras ao redor de si para garantir que enfrentaria a vida com a imparcialidade necessária para proteger seu país e, no âmbito pessoal, aqueles que amava. Especialmente após a morte de Allie, essa barreiras se tornaram ainda mais espessas e altas...

Ele parou as reflexões sobre si mesmo por um minuto para observar Jane dormindo. Essa mulher entrou em sua vida há pouco mais de duas horas e plantou uma montanha de incertezas. Ela parecia tão frágil e vulnerável ali na cama. Mesmo assim, tinha confiado nele e adormecido. Por que ela agia assim?  Que provas ela tinha de que ele não era mais um dos seus inimigos? Se ela estivesse dizendo a verdade, tiraram tudo dela. Ainda assim, ela olhava para ele com total confiança e amor.

Enquanto a observava, percebeu que a respiração dela estava pesando. Será que era algum mal estar?

Pesadelos.” Ele não sabia porque, mas tinha certeza disso. Se aproximou e colocou sua mão sobre a dela apertando-a suavemente. Ao pé do seu ouvido, sussurrou com a voz terna:

— Está tudo bem, Jane. Eu estou aqui. Nós vamos ficar bem.

A meio caminho entre o sono e a vigília, ela disse:

— Kurt, não me deixe sozinha, por favor.

Ele se aproximou ainda mais e aspirou o cheiro dela. As dúvidas desapareceram. Ele conhecia muito bem aquele aroma doce. Era sua esposa, ele não se lembrava, mas algo dentro dele dizia que era verdade.

— Jamais. Nós vamos passar por isso juntos. E vamos fazê-lo pagar por tudo que tiraram de nós.

Jane embalou novamente no sono envolvida pela segurança de estar em casa. Kurt deitou-se ao seu lado. Ele não se permitiria adormecer, mas queria estar ali com eles, com aquilo que ele tinha de mais valioso: sua família. Toda e qualquer certeza parecia tê-lo abandonado, mesmo assim as três pessoas que o acompanhavam naquela cama precisavam dele mais que tudo e ele não falharia.

Sentimentos são construídos numa longa trajetória de cumplicidade e companheirismo. Sem essas experiência guardadas na memória, tudo se perde na incerteza. Nossas memórias determinam quem somos, nossos valores e impulsionam nossa vida no presente caminhando para o futuro. O amor deles seria mais forte que o esquecimento?

Barreiras enormes cercaram Kurt Weller por toda a vida. Agora, diante de um perigo eminente, ele deveria torná-las ainda maiores. Não havia qualquer memória de Jane em seu passado para não fazê-lo e garantir sua proteção. Mas, de alguma forma inexplicável racionalmente, ela estava lá, como parte dele. E não importa quantas barreiras ele levante, Jane sempre estará do lado de dentro o convidando a sair e viver plenamente esse sentimento que poucos conhecerão de verdade: o amor.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Não tenho palavras para agradecer todos vocês que acompanharam essa história até o final. Cada um de vocês, cada leitura é foi muito importante para me incentivar a continuar.
Por favor, se você leu e gostou, favorita essa história e clica em "marcar esse capítulo como lido". Isso ajuda novos leitores a entenderem que vale a pena continuar a leitura até o final.
Adoraria saber sua opinião sobre tudo que leu. Por favor, compartilhe isso comigo. Deixe um comentário aqui ou em alguma rede social na qual temos contato.
Espero não tê-los decepcionado.

Mais uma vez, muito obrigada.



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Reencontro" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.