Cem Anos Depois escrita por Adson Kamps


Capítulo 3
III – A Fuga do Castelo


Notas iniciais do capítulo

NÃO ESQUEÇA DA ABERTURA:
https://youtu.be/PoQNWV4HUzE



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Ao contrário do que Aurora pensava, nem tudo o que acontecera ao Reino Morndämm era por culpa de Malévola. Logicamente as guerras que aconteceram foram sim, influenciadas pela sua maldição, mas não basta somente um dos lados do confronto estar em declínio para o outro atacar. Não, para que tamanho ato de crueldade ocorresse, era preciso um líder rabugento e de coração duro desse um passo à frente, assim como era o pai de Henry.

— Temos de fazer algo quanto ao reino de Stefan! Afinal, quem eles pensam que são para quebrar um contrato de anos como era o nosso de exportação? ­– Esbravejava o pequeno rei na ponta de uma das mesas.

Eram tempos tão difíceis para Minuitlands, pois o reino governado pela família d'Argent necessitava das exportações de prata vindos do reino vizinho, sendo que em troca este receberia ouro. Porém, desde a quebra do acordo com os Mongestern as relações entre as duas monarquias ficaram abaladas, o que gerou intrigas entre os lados.

O problema maior nessa desavença entre os dois reinos era promessa de casamento entre a filha de Stefan Mongestern e o filho de Hubert Dornenherz, Phillip Dornenherz, o príncipe de Traumplaces e como isso poderia gerar uma fusão entre os dois reinos. Roi d'Argent, o rei de Minuitlands sabia que isso aumentaria a proximidade destes com as montanhas que separam os Reinos Encantados das Terras Distantes: uma parte do mundo que acreditavam ser inexploradas e selvagens.

— Mas papai, você sabe que desde a praga rogada por Malévola sobre a filha de Stefan o reino deles começou a empobrecer! – Tentava argumentar o príncipe Henry. – Eles perdem cerca de 500 moedas por semana, imagine isso durante dezesseis anos! Morndämm não tem condições nenhuma de continuar comercializando!

— Não me importo com o que está acontecendo dentro dos muros daquele palácio, Kit! A quebra deste acordo com certeza irá desestabilizar toda a economia dos Reinos Encantados! – tentava argumentar o rei.

As transações comercias de prata e ouro entre os reinos dos Mongestern e d'Argent eram basicamente o que movimentava todo o mercado da península dos Reinos Encantados uma vez que a prata adquirida por Minuitlands era utilizada como moeda de troca com os reinos de Saltvand e Auradon, enquanto o ouro recebido por Morndämm era destinado também para Corona, Traumplaces e Arendelle.

— Não tem como os Sete Reinos se manterem unidos com este obstáculo no caminho! Imagine se as colônias e pequenos reinos que foram anexados ao nosso começassem uma revolução por conta disso? Essa crise poderia dizimar toda o equilíbrio que levamos séculos para criar!

— Pai! Pare um pouco e pense nas suas palavras, tente entender o lado deles! A Rainha Leah está adoecendo rapidamente e nenhum médico, curandeiro ou até mesmo mago sabe como trata-la! – Lembrou Henry. Às vezes parecia que seu pai não tinha coração, mas sim uma pedra bombeando sangue para o corpo.

Recostado no acento real, o rei fechou os olhos e com os dentes trincados contou até dez, esperando não perder a paciência com o próprio filho. Ele sabia que o príncipe era tão teimoso quanto ele fora um dia, e se este ainda tivesse algum traço da personalidade forte de sua mãe não havia muito o que fazer.

— Muito bem Henry, esperarei mais um pouco para tomar minha decisão, mas que fique claro que qualquer coisa que aconteça, o mínimo que seja, será diretamente direcionada ao senhor e você terá que tomar as devidas providências, e eu em nada ajudarei! – vociferou dando a sua cartada final, esperando convencer o filho. Mas não funcionou como ele queria.

— Obrigado papai – respondeu o Príncipe com um sorriso no rosto – Sei que essa guerra é desnecessária e que logo Stefan e seu reino se recuperarão da crise.

Com o rosto roxo de raiva, mas ainda assim com um pouco de orgulho do primogênito, o Rei Roi dispensou todos dando a reunião por encerrada meio a contragosto, permanecendo sentado até somente ele e o Grão-Duque restarem na sala.

— Com sua licença meu senhor, devo dizer que a atitude do príncipe é louvável, mas o senhor não teme que isso possa acarretar em um desequilíbrio ainda maior para os Sete Reinos? – perguntou o Duque, curioso.

— É claro que eu sei o que tudo isso pode gerar seu cabeça de pudim, não sou tolo. Mas também sei que meu filho é tão cabeça dura quanto à mãe fora... – O duque tossiu, atitude o que fez o rei franzir o cenho. —... e também como eu sou. – Completou a frase. – Ele não iria nem vai tirar essa ideia da cabeça até que ela se cumpra ou, por algum acaso, algo maior aconteça.

— Mas então qual é a sua estratégia, Majestade? Esse algo maior, é alguma coisa que o senhor estaria planejando? – perguntou o Grão-Duque novamente curioso.

— Meu filho deve aprender que as decisões levadas pelo coração nem sempre são as melhores para todos – suspirou um pouco decepcionado com a vida de monarca – E se ele tiver que aprender isso caindo do cavalo, que assim seja.

O duque olhou para o seu rei e viu que realmente havia um homem bondoso atrás daquela máscara de pedra; não sabendo o que dizer para confortá-lo, fez uma reverência e saiu da Sala de Reuniões.

Enquanto toda aquela reunião se passava, ninguém reparou no relevo presente na cortina de uma das grandes janelas. Ali, escondida em meio aos grossos panos cor de carmim, estivera escondida alguém que passara a reunião escutando tudo, desde o início até a última conversa do rei com o duque.

A jovem parara ali atrás por acaso. Estivera passeando pelo castelo e enquanto passava pelo salão onde eram realizadas as reuniões acabara sendo pega de surpresa por uma comitiva que se dirigia para lá em segredo, onde o sogro da moça vinha na frente de todos.

As cortinas, tão grandes quanto as da sua velha casa, foram o único lugar que se passou na mente da garota para um esconderijo e rapidamente ela as tomou como tal. Por sorte não fora pega antes de se esconder, pois sabia o quanto Prudência encheria sua cabeça de broncas e regras de etiqueta sobre escutar a conversa dos outros sem permissão.

Após Roi se levantar da cadeira e sair da sala a jovem pôde voltar a respirar novamente, aliviada e realmente agradecendo a sua sorte por não terem-na achado. Estava ciente que a estariam procurando por todo castelo, principalmente Henry, já que se casariam dali a 7 dias e nem tinham arranjado os comes e bebes para a festa.

Mas agora ela tinha outra missão a cumprir antes de juntar-se ao seu futuro marido, e ela sabia perfeitamente quem a poderia ajudar naqueles casos.

Afinal, o que seria de Cinderela sem sua Fada Madrinha?

— Então você não pode ajuda-los? – Perguntou Cinderela pela terceira vez. Mesmo sabendo qual seria a reposta ela ainda tinha esperança.

— Desculpe-me Cinderela, mas nem mesmo minha magia é tão poderosa para isso. Na verdade, nenhuma é! Nem mesmo se Flora, Fauna e Primavera juntássemos nossos poderes conseguiríamos fazer um grama de ouro – respondeu a Fada Madrinha como se já tivesse ensaiado aquele discurso mil vezes, ou até mesmo como se já houvesse dito a alguém – Sinto muito Ella, mas isso eu não posso fazer.

— Tudo bem – respondeu cabisbaixa. Sua ideia de estabilizar a economia com magia parecia algo perfeitamente possível, já que ela ouvira uma vez quando criança a história de um homem que fabricava ouro à partir de palha, mas agora tudo fora pelo ralo abaixo. Porém a garota ainda tinha uma outra coisa em mente - E sobre a maldição de Malévola? Você poderia quebra-la?

Pensando, a fada se levantou do lado de Cinderela e andou em círculos algumas vezes. A varinha pega pela ponta dos dedos estava apoiada por baixo do queixo enquanto o cérebro da fada parecia ir a mil por hora.

— Esse tipo de magia negra que Malévola utiliza só pode ser quebrado de uma forma: o beijo do Verdadeiro Amo. O máximo do máximo que posso fazer é tentar enfraquecer a praga com um feitiço de salto no tempo.

— Salto no tempo? – perguntou a Gata Borralheira.

— Sim. O salto no tempo é uma magia um tanto instável, mas que funciona fazendo com que as horas, dias e anos passem mais rápido no local onde ele fora aplicado. Adiantando o tempo conseguiremos confundir a maldição fazendo com que ela se enfraqueça mais rapidamente. Mas tem um porém: todos que estiverem dentro dos limites de Morndämm irão envelhecer mais rápido, inclusive as estruturas que lá foram construídas.

Cinderela parou para pensar sobre tudo que estava acontecendo longe de seu castelo e do conforto de seu quarto. Devia ser horrível para Stefan ter sua única filha em uma espécie de coma mágico e a esposa doente; sem contar um reino que empobrecia de maneira absurda. Por um lado aquele feitiço seria bom, mas por outro...

— Não temos direito nenhum de interferir em na vida de outras pessoas dessa maneira, mas acredito que isso será melhor tanto para o reino dos Mongestern quanto para a união entre os Reinos Encantados. – A loira suspirou. – Muito bem, faça isso.

Um brilho branco envolveu a fada e sua varinha com milhares de partículas prateadas, e como uma estrela cadente, o feitiço saiu pela janela do quarto de Cinderela, indo na direção do reino para o qual fora designado.

— Isso deve bastar por hora. – Comentou Fada Madrinha.

— Ótimo. Obrigada Fada... – Cinderela foi interrompida por um enorme estrondo vindo de sua porta, alguém havia entrado na sala. Era o Duque.

— Más notícias Cinderela – ele entrou correndo tentando recuperar o folego. Estampava um olhar alarmado e cheio de pena. – O Príncipe Henry sumiu.

Agora não mais escondida, Cinderela ouvia a reunião emergencial que seu sogro fizera sobre o desaparecimento de seu primogênito junta à Fada Madrinha, e sobre como os sapatos do príncipe foram encontrados no jardim com o que parecia uma carta com o selo de Morndämm, o reino de Stefan.

Passaram-se cerca de vinte e seis horas desde que a magia da Fada começara a fazer efeito sobre o reino que agora estava prestes a ser atacado, e de acordo com isso já teriam se passado vinte e seis anos naquele local.

— TRAIÇÃO! – gritou o rei do lugar de onde estava apontando o dedo para a bandeira de Morndämm que estava pendurada junto à tantas outras na Sala de Reuniões – Eles sequestraram meu filho em busca de um resgate de milhares de moedas de ouro que poderiam tirar-lhes da falência! Mas se pensam que é assim que resolvemos as coisas estão enganados! Em exatas quatorze horas TEREMOS GUERRA!

O rei estalou os dedos para um de seus guerreiros que estava posicionado perto das bandeiras. Este trazia em mãos uma madeira embebida em óleo e a acendeu nas chamas da pira ao seu lado. Estendeu a tocha até a bandeira de Morndämm e ateou fogo nela, selando a quebra do acordo.

A fada que observava tudo com espanto e horror não pôde deixar de pensar que os humanos eram a espécie mais desunida entre si, sempre tentando ultrapassar uns aos outros. Até mesmo demônios como Malévola ou Hades eram unidos com seus iguais.

Ela tinha que dar um jeito de parar aquele massacre que aconteceria caso Henry não fosse encontrado, então teve uma ideia. Passou a palma da mão aberta sobre a sua varinha, deixando essa com um brilho semelhante à Lua e colocou-a sobre a mesa. Retirou seu manto e com umas poucas batidinhas ele começou a tingir-se de um rubro cor de sangue, tornando-se um escudo contra magias que não fossem mais poderosas que quem o vestisse.

Virou-se para Cinderela que permanecia ignorante ao que sua protetora fazia. Estendeu então os objetos a princesa.

— Fuja para a Floresta dos Reinos – murmurou temendo ser ouvida – Procure a Casa dos Anões e ache o coração do lobo. Ele foi encantado por Selena a Peeira, então pingue uma gota de sangue na varinha e peça para achar a localização do príncipe, ela lhe guiará.

— Mas...

— Saia a meia-noite para que ninguém a veja. Tome cuidado quando chegar a Floresta para não perder a noção do tempo, lá você nunca irá envelhecer. Entendeu?

— Entendi. Mas e você? Como ficará sem a sua varinha?

— Eu darei um jeito – deu uma piscadinha para a menina – Agora vá se arrumar, já é quase meia-noite.

Ao longe Cinderela observava o luxuoso castelo, antes iluminado pela magia azul da Fada Madrinha, mas agora enegrecido pela sombra de um luto que ninguém sabia quanto tempo iria durar e, em breve, rubro pelo sangue derramado no reino vizinho.

Colocou o capuz e entrou na floresta. A partir de agora ela não era mais Cinderela, não era mais a Gata Borralheira. Ela era Ella, a Chapeuzinho Vermelho.

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