Cem Anos Depois escrita por Adson Kamps


Capítulo 2
II – O Despertar da Princesa


Notas iniciais do capítulo

NÃO ESQUEÇA A INTRO:
https://youtu.be/Kh3nlGsPvhE



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ܔܢܜܔܢܜܔܔܢܜܔ♛ܔܢܜܔܢܜܔܔܢܜܔ

Enquanto subia os degraus de uma torre escondida na lareira daquele que um dia fora construído para ser seu quarto, Aurora era atraída por uma esfera de fumaça verde que flutuava bem na sua frente, incentivando-a a seguir sua subida. Aquela magia era mais forte que a princesa, fazendo com que seu corpo desobedecesse a mente, que insistia em recuar.

Chegando ao topo das escadarias uma porta semelhante aquelas de calabouços se abriu, revelando o sótão de uma torre que não era limpo haviam anos. Reparou – com o canto do seu olho, pois não conseguia desviar a visão daquela luz – que perto da janela repousava um banquinho de madeira com três pernas e só.

Como se tudo o que estivesse acontecendo não fosse estranho o suficiente, a esfera de luz avançou em direção a parede oposta à porta e transfigurou-se em uma roca mais negra que a escuridão, emanando ainda aquela assustadora energia verde esmeralda.

Toda aquela luminosidade e energia que emanava do objeto pareciam lhe atrair como uma mariposa à uma chama, e a garota sentia-se tão incapacitada como tal inseto. Tal energia parecia desafiar-lhe, incentivando-a a tocar no fuso da roca. Porém, antes que fizesse tal ato, algo, ou melhor, três vozes a pararam:

— Rosa! – Reconheceu a voz de Flora com um eco de Fauna e Primavera. – Não toque em nada!

A sensação de um enorme vazio sendo preenchido invadiu o seu corpo e clareou a sua mente, e Aurora sentiu retomar controle sobre suas ações. Começara a se perguntar o porquê de ter saído do quarto em que suas tias a deixaram e como havia chegado onde estava quando um sussurro demoníaco ecoou nas trevas, diretamente da roca:

— Toque no fuso. – Era um murmúrio baixo e macio como o veludo, porém este esbanjava autoridade. – Obedeça-me!

Sentiu seu braço fraquejar e se estender em direção ao fuso, as pontas dos dedos se aproximando da agulha impregnada com a maldição. Sentiu seu indicador sendo lentamente perfurado pela ponta afiada, e quando a primeira gota de sangue escorreu pela agulha, tudo escureceu.

Sabe aquela sensação de estar sempre em queda livre do ponto mais alto que você conhece? Aquele frio na barriga que você sente quando acorda desesperado por achar que está a centímetros de atingir o chão? Era exatamente isso que Aurora sentia com a única diferença de que ela nunca acordava.

A primeira “queda” que a princesa se recorda é logo após picar o dedo no fuso da roca: sentiu seu corpo amolecer e começar a ir em direção ao chão, mas eles nunca se encontraram. Era como se o seu espírito levasse sua consciência junto consigo para dentro do mundo dos sonhos, e esta atravessou as pedras que formavam o piso do sótão indo parar no salão principal do castelo e com um estalo surdo, parando em cima de algo macio: um berço bordado em ouro, digno de uma princesa.

O salão onde se encontrava estava com uma aura obscura, pois todas as velas dos candelabros e castiçais espalhados por aquela sala estavam quase completamente queimadas, o que lançava sombras que cresciam cada vez mais para cima do berço da pobre bebê.

A menininha no berço começou a chorar, exalando angústia e desespero por estar sozinha em um lugar tão sombrio quanto aquele. Seu choro ecoou por todo o castelo e parecia se estender para além dele – o que era totalmente possível em um sonho.

Foi então que a princesa percebeu um par de mãos indo em direção ao seu berço e a pegando no colo: era sua tia Fauna, com aquele olhar e semblante tão querido como Aurora sempre via em seu rosto. Logo atrás dela se erguiam duas sombras, uma maior e outra mais baixa, que só podiam ser suas outras tias. A fada verde se virou para as irmãs e com um aceno indicou que poderiam ir, e foi o que fizeram.

Conforme corriam em direção a porta de serviços que dava acesso direto à floresta, Aurora pode observar quando fizeram a curva no corredor duas sombras paradas em frente aos tronos de seus pais. Estava óbvio para a garota que realmente eram eles, mas o que não parecia fazer sentido era o porquê deles terem abdicado dela e terem-na mandado para viver com fadas.

Um vazio em seu peito começou à crescer, e mesmo sabendo que suas tias cuidariam bem de si durante seus quinze anos e trezentos e sessenta e quatro dias de vida, não pode deixar de sentir magoa de seus pais.

As Três Boas Fadas começam em uma corridinha leve em direção à floresta, mas conforme vão avançando em meio a escuridão seus passos se tornam mais apressados e seus olhos atentos, a espera de um ataque. Aurora as observava curiosa, pois era como se elas temessem estar sendo perseguidas. E era aí que o pesadelo realmente começava.

Fauna por algum deslize acaba deixando com que a princesinha caída de seus braços e saia voando em direção ao chão. A bebê sacode seus bracinhos gorduchos em câmera lenta conforme vai caindo de encontro à terra e lama que formavam o chão da floresta, e com um baque seu corpo as atinge.

Porém Aurora já não é mais uma criança de poucas semanas de vida, mas sim uma mocinha de nove à dez anos. Aqueles poucos segundos de queda pareciam anos para a garota, o que a fez mais velha assim que tocasse o chão.

Levantando com dificuldade, a princesa olha na direção que as três mulheres foram e, ao longe, vê elas passando por uma espessa neblina que flutuava entre as árvores. Porém, quando estas adentram a névoa, suas sombras se desfocam e fundem-se em uma só que atravessa do outro lado: Malévola, carregando em seus braços algo que parecia com um menino em vestes azuis, devendo ter no máximo dezessete anos.

Chorando de desespero, Aurora vira seu corpo na direção contrária àquela que a bruxa seguiu e parte para o castelo de seus pais. Enquanto corre o percurso de volta seu corpo vai crescendo assim como a mata ao seu redor, e em pouco segundos lá estava a princesa com seus dezesseis anos, parada entre uma densa floresta de espinhos com o castelo de seus pais à sua frente. Ou pelo menos o que sobrara dele.

O lar de seus pais, o lugar em que ela deveria ter crescido, aquele que ela devia ter chamado de casa, estava completamente destruído, caindo em ruínas. Seus olhos voltaram a encher-se de lágrimas e a garota não aguentou mais; desabou sobre seus joelhos e começou a suplicar em silêncio para que aquele pesadelo acabasse.

Parecia que uma eternidade havia se passado naquele sonho, e ele sempre voltava a se repetir: Aurora caía de joelhos e atravessava o chão, desabando sobre seu berço em forma de bebê e sendo levada para floresta por suas tias e logo depois voltando correndo na direção de onde veio.

Era um verdadeiro inferno sem fim aquele sonho, algo horrível e inigualável a quaisquer pesadelos que alguém veio ou virá ter no mundo. O sentimento de abandono era presente de uma maneira cada vez mais forte no amago da princesa, até que em determinado momento, o sonho mudou.

Aurora estava lá, caída no chão e rezando para acordar quando ergueu o olho e percebeu que não se encontrava no berço, mas sim na torre mais alta do castelo de seus pais, onde o feitiço de Malévola se concretizara. Girou e surpresa se viu deitada no esquife de ouro ao lado da janela. Andando em direção ao clone desacordado, percebeu que tinham a mesma roupa: um vestido de baile em três tons de azul e um único branco. Admirou-se ali, em dúvida sobre o que estaria acontecendo.

— Como isso é possível? – Murmurou. Seria aquela visão uma falha na maldição ou será que ela finalmente começara a se quebrar? Mas como, se não parecia haver uma única viva alma ao seu redor?

— Minha filha... – Afastou-se com um pulo, assusta, e viu o dono da voz que ouvira vindo da escuridão atrás do caixão. – Me desculpe por não ter ficado contigo na sua infância, eu fui fraco com tudo o que estava acontecendo. Tudo isso teria sido evitado se eu não tivesse ficado tão amedrontado perante Malévola. Eu sinto tanto.

Saindo da escuridão, Aurora pode ver um homem velho em vestes reais pretas e douradas, trazendo na sua cabeça uma coroa e prendendo seu manto amarelo em um dos ombros com uma pedra de rubi. Em choque, a princesa constatou que se tratava de seu pai.

— Oh, papai... – Aproximou-se do ancião para acariciar lhe os cabelos, mas ele simplesmente sumiu. Franzindo a testa, ela pensou se aquilo realmente estaria acontecendo ou se não passava de mais uma parte do sonho. Ela havia mesmo se visitado enquanto seu pai velava o corpo da filha desfalecido?

Enquanto olhava para o caixão, pode perceber que o tempo começara a correr mais depressa. O ouro e a prata que revestiam seu esquife começaram a perder o brilho e tornar-se opaco. A seda que cobria seu corpo e o mosqueteiro que protegia seu rosto estava servindo de criadouro de aranhas e ácaros, e até mesmo as pedras e madeiras que constituíam a torre estavam ficando mais gastas e trincadas.

— Adeus... – Ouviu um murmúrio baixo vindo da direção que era a janela da torre. Ergueu a cabeça até ela e quando viu, seus olhos se arregalaram e levantou rapidamente. – Adeus minha querida.

— Papai! NÃO! — gritou atirando-se em direção à janela ao mesmo tempo em que o corpo de Stefan despencava em direção ao rio que corria lá embaixo.

Encolhendo-se em posição fetal, chorou novamente a morte de todos que amava e observou o estrago que o tempo vinha fazendo na torre em que seu corpo repousava. O barulho da água que vinha do rio onde seu pai se atirara aumentava cada vez mais, assim como as lágrimas de Aurora – e a erosão que provocava na sustentação da torre.

Não sabia quanto tempo se passara, mas em dado momento ela pensou: Por que Phillip não veio me salvar? Tirar-me desse lugar? Ele nunca me deixaria na mão, a menos que algo tivesse acontecido.

Então, com um flash na memória, uma lembrança de seu sonho atravessou a mente: Malévola carregando um garoto para longe da princesa e do castelo. Não, não pode ser, pensou levantando do chão, agora já com as lágrimas enxugadas e uma determinação para saber o que havia acontecido. Não pode ser, mas é.

— Para o inferno você e essa sua maldição, Malévola! Eu vou descobrir o que aconteceu com Phillip, e quando isso acontecer, você vai pagar caro por tudo o que fez à todos!

Ergueu seu dedo e o focalizou, pensando nele com um furo de agulha. O lugar que visualizara começou a escorrer pequenas gotas de sangue vermelhas como vinho. Virou-se e olhou para o caixão, estendendo o dedo até a sua testa e a tocando, murmurou para si mesma:

— É hora de acordar, Aurora.

E então, desta vez, tudo clareou.

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Notas finais do capítulo

Estou muito feliz com o ritmo que a fanfic vem crescendo, não se tratando apenas de números como também o modo que eu a reescrevi parece algo mais "redondinho" de como ela era no ínicio, então queria saber de vocês o que estão achando dela :)



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