O Senhor Cupido escrita por jduarte


Capítulo 3
Capítulo 3


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!
Beijos,
Jay.



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Bati o lápis na mesa, tentando surgir com mais uma ideia para aquela foto. O ar agradável do parque deixava o dia perfeito para fazermos as fotos que a editora havia pedido. O sol brilhava na direção certa, e nenhum dos balões tinha estourado ainda por causa do calor.

A única coisa absolutamente fora de contexto era o casal que participaria da foto. Os dois pareciam se odiar. Ele gritava com ela o tempo inteiro e ela devolvia os gritos no mesmo tom.

A maquiadora estava tendo dificuldades para retocar a maquiagem que havia escorrido pelo calor. Respirei fundo e mantive a calma. Aquelas pessoas estavam ali para fazer o meu trabalho mais fácil, mais animado. Era para eles serem fotografados para a coluna “Casal do Ano – a lista dos casais mais hot do ano.”

Aparentemente, este casal estava quase beirando Chrissy Teigen e John Legend no quesito “perfeição”. Ela era uma vlogger de moda e ele um entrepreneur que investia na bolsa constantemente e ainda era dono de uma das empresas de plástico que dominava o continente norte americano.

Pelas fotos e informações que nós tínhamos colhido, de todas as diversas viagens e comemorações de meses de aniversário, eles eram a definição de casal it.

Se conheceram em um daqueles reality shows onde o cara escolhe com quem vai se casar, depois de alguns vários encontros pensados pela equipe do programa.

— Isso é uma péssima ideia. – Kathy Morgan, a parte sensata daquele casal, disse enquanto a maquiadora lhe aplicava mais pó na testa brilhante de suor.

Phillipe nem ao menos olhou da tela do celular, para encarar uma então noiva, e de onde eu estava – atrás das lentes como sempre –, pude vê-lo revirar os olhos.

Kathy percebeu. O olhar traído em seu rosto me fez querer enfiar o equipamento na bolsa e pedir para a equipe toda recolher os equipamentos e ir para casa. Aquele casal era exaustivo demais para nós. Ela pegou a coisa mais próxima que tinha perto de si e atirou nele.

Uma embalagem muito bem amassada de papel alumínio.

Isso chamou a atenção dele.

— Será que dá pra parar de olhar a porra do telefone por cinco segundos, Phillipe?

— Será que dá pra você parar de ser chata por cinco segundos, Katherina? – ele rebateu.

Ela atirou novamente mais uma bolinha de papel amassado em sua direção e eu vi a cor de Phillipe passar de normal para “vermelho-irritação” em questão de segundos. A parte racional de meu cérebro achou melhor intervir antes que algo pior acontecesse. Mas a parte irracional mal podia esperar para que eles continuassem a expor os podres um do outro.

Casal nenhum era perfeito como todos julgavam ser, e eles eram a prova disso.

— Para com isso, Kathy! Você é maluca ou o quê?

Oh, não... Péssima escolha de palavras, amigão...

— Você é um grande babaca, Phill. Se eu pudesse, teria ouvido minha mãe e nunca aceitado ficar com alguém com o ego tão grande.

O homem pareceu enfurecido.

— Então ligue para ela e diga que você está levando as suas coisas para lá hoje!

— Ok, está na hora das fotos. – a maquiadora disse e eu me posicionei.

Os dois ficaram pertos um do outro, mas não suficientemente perto para que eu conseguisse tirar a foto perfeita. Levantei o rosto da câmera e pedi para o assistente lhes levar os balões que já estavam até mais caídos.

— Phill, - chamei sua atenção. — quero que segure Kathy pela cintura e sorria como se fosse o dia mais feliz da sua vida. – eu disse.

Ele fez exatamente como eu quis, sorrindo forçadamente, mas ninguém perceberia. Ela parecia estar nas nuvens, ou era uma atriz muito talentosa. As cores de suas roupas combinavam, os sorrisos também, até mesmo os penteados harmonizavam entre si. Eles agiam como se a briga anterior nem ao menos estivesse acontecido.

E assim que eu anunciei que a sessão de fotos tinha acabado, cada um foi para o seu canto sem nem ao menos falar nada.

Respirei e inspirei diversas vezes para manter minha compostura.

Casais eram uma merda.

Arrumamos todo o equipamento e eu olhei no relógio. Ainda dava tempo para pegar um sanduíche antes de irmos para a revista, e um grande sorvete para matar o calor.

— Eu estou com fome. – anunciei e Jared, o assistente, riu enquanto enfiava mais um dos equipamentos no banco de trás do carro lotado.

— Isso foi um dia e tanto. – Mel, a maquiadora disse. — Eles eram insuportavelmente chatos, meu Deus do céu. – ela se jogou no banco da frente, no passageiro e se espreguiçou.

Eu concordei e entrei no banco do motorista, ligando o rádio e esperando Jared se acomodar e colocar o cinto de segurança antes de sair do estacionamento.

— Como é que eles conseguiram o segundo lugar dessa matéria, mesmo? – Jared perguntou enquanto colocava o cinto.

Dei de ombros.

— Só sei que não quero encontrar com nenhum dos dois por muito tempo. – respondi e a risada ecoou pelo carro.

— Posso ver as fotos, Jar? – Mel perguntou. — Quero ver se a maquiagem ficou de arrasar o coração daquele playboyzinho ridículo.

— Você foi sensacional hoje, Alex. Se eu estivesse com os dois sozinho, já teria surtado há muito tempo.

Dirigi pela cidade até encontrar uma rede de fast food que não estivesse com a fila do drive-thru enorme, enquanto Mel passava as fotos e assobiava para elas.

— Caramba, garota, você mandou bem para uma novata.

Eu sorri em resposta.

Eu estava na revista há pouco tempo, e mesmo com toda a experiência com fotografia anteriormente, este era o trabalho que mais exigia de mim, e eu tinha medo de não alcançar as expectativas de todos. Ouvir que eu tinha mandado bem de Mel, já fazia meu dia completo.

— E uau, que cara gato.

Ri.

— Claro, se o tipo “playboy multimilionário e fissurado por um telefone” te agrada, podemos até dizer que ele é gato.

Mel me olhou com seriedade no olhar.

— Eu não falando do imbecil do Phillipe. Eu to falando desse cara aqui, menina. – ela virou a câmera para mim e deu zoom em uma foto.

Meu coração parou. Eu conheceria aqueles olhos azuis em qualquer lugar. Ele era absolutamente maravilhoso.

Franzi o cenho. Eu não me lembrava de ter o visto em lugar nenhum.

— É, ele é mais bonito do que eu me lembrava... – deixei minha frase no ar, e Mel me olhou com descrença.

— Ah, qual é? Você conhece esse deus grego? – ela me perguntou, cética.

Jared estava calado demais no banco de trás, e eu olhei para ver se ele ainda estava vivo. Sim, Jared estava vivo e não parecia disposto a me ajudar a me esquivar das perguntas pessoais que Mel jogava em minha direção, porque como Phillipe, seu telefone parecia muito mais interessante do que seres humanos palpáveis.

Suspirei.

— Mais ou menos. Ele é um amigo da família. – respondi, rangindo os dentes com a lembrança podre do casamento de minha irmã. Ou flashbacks dela, pelo menos.

Eu lembrava demais do rosto de Eros. Aquela barba por fazer, seus olhos que pareciam brilhar embaixo das luzes do bar e seus dentes branco e perfeitamente alinhados, tão diferentes dos meus levemente amarelados pela quantidade absurda que eu ingeria de café e Coca-Cola.

— Ele é tão bonito pessoalmente quanto é por fotos? – Mel perguntou, encarando a foto na câmera como se Eros pudesse saltar da tela e beijá-la na boca.

Pensei por um instante.

Sim. Ele era bem mais bonito pessoalmente. As fotos não faziam jus à sua beleza.

“Bem vindos à Cindy’s Burger, o que vão querer?” a voz monótona da menina do outro lado da linha me fez parar para olhar o cardápio.

Mel praticamente se jogou em cima de mim.

— Três hambúrgueres com queijo extra e bacon, e dois sucos de laranja, com batata frita média. E vocês? O que vão querer?

Olhei para Mel como se ela fosse maluca.

— Que foi? – ela me perguntou, rindo. — Eu tenho fome!

— Eu vou querer um hambúrguer simples com batata frita, e uma coca-cola grande. – Jared pediu.

— Então são dois desse. – eu disse à menina do outro lado da linha.

Ela me mandou para a próxima cabine.

— Você vai conseguir comer tudo isso sozinha? – perguntei, incrédula.

— É claro. Eu estou com fome, Alexis. E quando Mel está com fome, nada de bom acontece. – Mel se referiu à si mesma em terceira pessoa e eu fiz um check mental de que ela provavelmente fazia muito disso. Ela mexeu nas tranças fininhas que tinha no cabelo e eu balancei a cabeça para mim mesma.

— Para uma pessoa tão pequena, Mel consegue comer o dobre do que o The Rock comeria. – Jared disse, parecendo muito atento à nossa conversa. — Quem era o tal deus grego que vocês estavam falando?

Mel nem me deixou respirar para responder, e estendeu a câmera – que ainda estava ligada e com zoom naquela mesma foto – e Jared assobiou.

— Ele é um pedacinho de mal caminho.

Mel arrancou a câmera das mãos de Jared como se fossem uma coisa preciosa e estalou a língua em desaprovação.

Isso daqui, meu amor, é um mal caminho inteiro.

Jared explodiu em uma gargalhada gostosa que encheu o carro. Depois de pagar e recebermos os nossos lanches, continuei dirigindo até chegarmos na revista. Mel e Jared já tinham terminado o lanche deles, mas eu ainda nem ao menos tinha tocado em algo que não fosse minha bebida. Meus pensamentos vagavam regularmente para o homem de olhos verdes que tinha cuidado de mim no casamento e desaparecido da face da Terra.

Sim, aparentemente Eros nunca nem ao mesmo tinha comparecido ao casamento de minha irmã com Rogers. Ew.

Desci do carro com o hambúrguer enfiado inteiro na boca, e o resto de minha comida dentro de um pacote de papel para manter minhas batatas-fritas quentes. Todo o equipamento de fotografia estava em uma mala que Jared carregava nas costas.

— Preciso rever todas as fotos e escolher as melhores, depois encaminho para Ellen.

Os olhos de Mel foram para atrás de mim e ela fez uma careta.

— Falando no diabo... – ela sussurrou e se mandou para longe de mim.

Eu senti a presença de alguém atrás de mim e me virei devagar. Ellen estava parada com o maior sorriso que poderia colocar no rosto. Aquele sorriso de alguém que com certeza vai pedir algum favor. O tipo de sorriso que era a personificação do olhar de um cachorro pedinte.

— Oi, Ellen.

— Ah, querida, como foi a viagem? – ela perguntou cordial demais para ser a Ellen normal. Ela definitivamente queria alguma coisa. — E o casamento?

Ah, não.

— Eu preciso de um favor seu.

— Claro, Ellen, o que você precisa?

Por favor, que não seja o que eu estou pensando.

— Esse mês é o mês das noivas na revista, e como de costume, escolhemos sempre o melhor casamento para dedicarmos 10 páginas.

Ellen, não se atreva.

— Hm. E o que precisa que eu faça? Vá caçar casamentos nessa região? – perguntei enquanto ria de nervosismo.

Meu corpo antecipou a notícia antes mesmo que minha mente. Foi quase um soco físico.

— O casamento escolhido foi o da sua irmã, e como você é parente, quero que escreva a matéria. – Ellen me disse.

Ela poderia muito bem ter pedido um rim meu, e eu nem ao menos piscaria. É, Ellen deveria muito bem ter pedido meu rim ao invés de ter me mandado cobrir o casamento de minha irmã como uma mera repórter.

— Ellen, não acho que seja uma ideia boa.

Ela sorriu azeda.

— É uma chance única. Isso pode te dar muito mais visibilidade do que somente uma nota de rodapé nas imagens, como credibilidade. É uma matéria, Alex.

— Eu sou fotógrafa, e não escritora.

Ellen rolou os olhos nas órbitas.

— É por isso que eu quero que você faça. Porque quero a verdadeira sensação de quem esteve lá e de quem presenciou tudo de pertinho. Uma repórter não conseguiria captar a emoção em tudo.

— Você quer uma amadora fazendo a matéria mais importante da revista, é isso mesmo? – tentei entender.

Ela assentiu e tocou em meu ombro amigavelmente.

— Sim, Alex, você entendeu isso mesmo. Preciso dessa matéria até daqui 4 semanas. Acha que consegue me entrar tudo pronto?

Meu rosto caiu.

— Fotos, matéria e design da matéria.

Ela me olhou como se eu fosse maluca.

— Você está estranha hoje, Alexis. Está tudo bem em casa? Eu estou falando em grego? — Ellen, a grossa, estava de volta, e com menos paciência do que tinha quando havia saído de férias.

Jesus, eu esperava que as Maldívias tivessem lhe trazido paz espiritual, - pelo menos era isso o que o panfleto sobre o hotel que ela ficaria, que Ellen havia deixado em cima de sua mesa, dizia – mas aparentemente ela tinha voltado com uma bagagem de insultos novos na mala.

— 4 semanas. Entendi. – foi tudo o que lhe respondi.

Minha cabeça girava. Ellen se afastou de mim.

Parte de mim queria ir até a sala dela e gritar em sua cara, dizer que tudo não tinha passado de um grande erro e que eu tinha que ser a ovelha-negra da família, a menina rancorosa que dormira a cerimônia inteira da irmã mais velha e babara no vestido novo. Eu não tinha que ser a “escritora-amadora-de-merda” que gostaria de escrever uma matéria sobre a porcaria do casamento da porcaria da minha irmã.

Eu daria um jeito, como sempre.

Eu sou fantástica, vou conseguir fazer isso num piscar de olhos, tentei me encorajar, mas acabei chorando por dentro.

Não, você não vai não, minha outra parte, a racional, me disse.

Deus, eu nem ao menos lembrava-me de nada do casamento, como é que eu poderia fazer uma das matérias mais importantes da revista sobre aquilo?

Pontos de interrogação se formavam em minha cabeça, e toda vez que eu pensava em uma imagem que fosse nítida da cerimônia, meu cérebro se recusava a processar a imagem, como um vírus.

É, o casamento de minha irmã definitivamente tinha sido como um vírus para mim.

Mas para mim, porque o restante da família nem ao menos respirou direito quando Clarice anunciou o casamento. Aquilo me irritava. De repente todos amavam Clarice e a tratavam como a rainha do Nilo.

Isso era uma tremenda idiotice.

A única coisa que eu não desejaria à minha irmã, é que ela se casasse com um traidor como Jax. Mas foi exatamente o que ela decidiu fazer com a vida dela. Se casar com um traidor.

Minhas palmas coçaram e eu decidi respirar fundo três vezes antes de voltar à minha mesa de trabalho. Mel estava me esperando, sentada na mesa, analisando toda a composição das fotos que tínhamos tirado.

— Você acredita que ela quer que eu faça a matéria de casamento esse ano? – perguntei.

Mel sorriu para mim e depois de ver minha cara, arregalou os olhos.

— Ela não fez isso. – ela disse, já imaginando de qual casamento estávamos falando. — Caramba, Ellen não tem noção mesmo.

Rolei os olhos nas órbitas.

— Acho que a palavra “noção” nem ao menos existe no vocabulário dela, Mel.

Mel explodiu em uma gargalhada e voltou para sua mesa, deixando-me ver todas as fotos e revisar tudo.

As fotos eram de outra data, algumas boas semanas atrás, que faziam parte de toda a temática preparada da matéria do “Casal do Ano”. Elas eram coloridas, todas com o mesmo tom pastel de rosa e azul, decorações exageradas e poses de afeição que pareciam forçadas demais. Uma coisa me chamou atenção na foto e eu prendi a respiração.

Meu coração bateu mais rápido ao analisar uma foto com um zoom.

Oh, meu Deus. Puta merda.

Havia um cara na minha foto, atrás do casal, olhando diretamente para a câmera. Sorrindo. Como se ele fizesse parte do cenário. Mas eu não lembro de tê-lo visto no cenário.

Havia um cara na foto. E esse cara era Eros.

Seus olhos azuis sorriam em minha direção, como se ele soubesse que estava me observando. Ele estava vestido com uma roupa similar àquela que estava usando nas fotos que tiramos hoje. Calça jeans escura, jaqueta de motoqueiro e botas. Ele parecia um badboy.

Meu corpo ardeu ao lembrar de como ele havia me carregado com os braços fortes para o quarto de hotel, e em como seus dedos esbarraram em minha pele quando ele foi desabotoar o vestido para que eu o tirasse.

Palavrões cabeludos passaram por minha cabeça e eu quis gritar.

Não, era impossível isso.

Eros aparecia em várias fotos.

Em todos os ensaios que eu fazia, era nítida a presença dele atrás do casal, às vezes olhando para a câmera e sorrindo sorrateiro, às vezes somente olhando para algo além do que eu consegui capturar com minhas lentes. Mas sempre lá.

— Puta merda.


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Notas finais do capítulo

Continua?



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