Luisa Parkinson: A Companheira Fantástica escrita por Gizelle PG


Capítulo 105
Atrás das grades


Notas iniciais do capítulo

Hello!! :3

I want a boyfriends [insira notas musicais aqui] ^-^ *-*

kkkk ignorem. Eu sou doida.

Vamos ao capítulo:



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As portas da TARDIS escancararam-se e o som de risadas invadiu o interior da cabine. Melissa, que estivera sentada no braço da poltrona, ergueu a cabeça de sobressalto, atrapalhada e meramente surpresa com a reação deles. No mínimo, esperava que voltassem em silêncio, e talvez, ainda de mau um com o outro. Porém, não precisou de muito para perceber que sua teoria estava, no mínimo, ultrapassada.

—Rá! Ganhei! –festejou o Doutor, tocando na porta da TARDIS. Luisa chegou logo depois, parando bem ao seu lado, procurando recuperar o fôlego.

—Ah, assim não vale... Você trapaceou! –ela riu, dando-lhe um empurrãozinho brincalhão. Seguidamente, seus olhos varreram os arredores e depararam-se com a figura de Melissa, parada, olhando-os fixamente. Seu sorriso aumentou de tamanho. –Méli... Puxa, que bom ver você! –e correu até a amiga, bombardeando-a com um abraço de urso.

—Você... Está mesmo feliz em me ver? –Melissa pareceu chocada de início. Pelas costas de Luisa, trocou olhares de estranheza com o Doutor. O rapaz, por sua vez, apenas deu de ombros, lançando-lhe um sorriso bobo e fazendo gestos para que ela retribuísse o abraço. Ainda sem entender exatamente o que fizera para ser recebida com tanto entusiasmo, Melissa retribuiu o gesto, deixando um sorrisinho aliviado escapar. –Caramba... Eu devo ter feito alguma coisa muito boa mesmo para reverter a situação... Se importa de me dizer o que é para que eu possa usar em situações de emergência?

Luisa afastou-se dela, mal cabendo em si de tanta felicidade.

Você, Melissa Rivera, é simplesmente a melhor amiga que uma garota poderia querer!—sorriu, segurando-a pelos ombros. Melissa fungou, emocionada.

—Puxa... Isso é sério mesmo?

—É claro que é! Nem posso demonstrar a gratidão que senti quando soube que você foi fiel a mim, apagando aquele vídeo... Bem, quanto a isso não há o que discutir. Na verdade, fiquei sem palavras, mas acho que essas irão bastar para simbolizar a minha mudança de ares: Eu e o Doutor nos acertamos!

Melissa sorriu, boquiaberta.

—Mesmo? –ela levou as mãos à cintura, lançando um olhar admirado ao Senhor do Tempo. –E o que exatamente isso significa? Que vocês “só se acertaram”, “reataram de vez” ou “entregaram-se perdidamente há um amor maior? —sondou, curiosa.

O Doutor e Luisa sorriram um para o outro.

—Nós... Oficializamos nossa amizade. –explicou Luisa. Melissa olhou incrédula para ambos os amigos.

—Quer dizer que vocês terminaram?

Luisa fez suspense, lançando um olhar intuitivo ao rapaz, que tomou para si a palavra:

—Bom... Para ser exato, nós nem começamos —completou ele, assim como ela esperava. –Só ficávamos meio que “nos divertindo”. Nunca foi realmente pra valer... Certo, Luisa?

Os olhares voltaram-se para a garota da bolsinha.

—Eu não descreveria melhor –ela confirmou, enquanto dava uma olhada superficial em um revista, que encontrara sob o sofá. –A verdade é que nós dois nos envolvemos sim, mas de uma forma completamente incomum para um casal normal.

—Exato. Nós fomos conversando e aos poucos percebemos que, apesar de termos uma ótima química, há coisas mais importantes em jogo –emendou ele. Melissa encarou-os com expectativa.

—Tipo...? –instigou. A dupla entreolhou-se novamente. –Ah, tá. Já entendi: “Isso não é da minha conta”. -ela sorriu torto, afastando-se com as mãos nos quadris. –Tudo bem pessoal. Vocês não precisam me contar suas “particularidades” se não quiserem... Mas, vocês vão ter de concordar que é engraçado o fato de terem acabado de oficializar um término, e ainda sim, continuarem trocando segredinhos... –cutucou, pacificamente.

O Doutor e Luisa sorriram um para o outro.

—Pois é. Como dissemos antes: nós dois conservamos uma relação bem incomum.—Luisa respondeu por ambos. –Certamente, é um traço particular da nossa amizade... Um tanto distinta.

—E improvável. –emendou o Doutor.

—E completamente maluca. –sorriu Melissa, também completando.

O trio trocou olhares divertidos entre si, até o Doutor se dirigir ao painel de controles (passando por Melissa e dando-lhe um tapinha no ombro) e a loira estender a mão à Luisa, entregando-lhe de volta seu celular.

—Tome. Você esqueceu ele comigo...

—É verdade! Obrigada—ela assentiu, feliz em ter o aparelho de volta. Já ia guardá-lo no bolso quando Melissa abriu meramente a boca, indicando que pretendia dizer algo. –Sim?—Luisa instigou, achando graça na cara que ela fez, como se estivesse “desacelerando” uma careta.

—É que ele ficou tocando direto –Melissa comunicou, meio travada. –Me perdoe, mas eu tive que dar uma olhadinha na sua caixa de mensagens para saber quem é que estava querendo tanto falar com você...

—E? –Luisa ergueu as sobrancelhas. Não fazia a menor idéia de quem poderia ser.

—Bem, era o Ned.

Naquele momento, Luisa gelou intensamente. Foi então que um montão de coisas acumuladas e proteladas vieram à tona, como uma pilha de roupas amassadas, escondida dentro de um armário que atualmente havia sido aberto, revelando toda a bagunça oculta até então. Para ela, aquilo soara como um balde de água fria. Mal havia resolvido as coisas com o Doutor (ainda estava procurando assimilar a idéia de serem somente amigos de agora em diante), e agora já tinha outro problema com que se ocupar. Será que fazia parte dos projetos do universo, divertir-se às suas custas e jamais lhe dar folga?

Tentando disfarçar a possível palidez que seu rosto adquiriu, Luisa resolveu conferir ela mesma sua caixa de mensagens, de modo que seu cabelo escorregou para frente do rosto, encobrindo seu embaraço. O pior fora o Doutor. Será que ele ouvira o que Melissa dissera? A garota lançou um olhar de soslaio na direção do amigo e deparou-se com o rapaz ocupado com suas próprias atividades no painel de controles. Francamente, suspirou com sua falta de atenção. Depois tornou a fitar Melissa, e espantou-se ao ver um sorrisinho danado em seus lábios. Seus olhos não ficavam para trás: estavam com um ar pretensioso, que fez Luisa até se arrepiar.

—O que foi? Por que está me olhando desse jeito?

—Ora, bolas! Você está com o caminho livre agora –argumentou a loira. –Por que não experimenta tentar com o Ned? Você sempre teve uma quedinha por ele mesmo...

Luisa fez uma careta de indignação. Mas na real, não sortiu bem esse efeito: ela teve certeza de que gaguejou durante o processo e, muito provavelmente, enrubesceu também. Tudo o que menos queria ter feito naquele instante...

—N-não Melissa... Foi tudo muito recente! Não sei se devo passar a impressão de “descomprometida” ao Ned, assim, logo de cara. Você não acha que pegaria mal? O que o Doutor pensaria disso?

—Bobagem! “Vocês nem começaram”, o Doutor mesmo disse! –ela interveio, com convicção, passando o braço ao redor do pescoço dela. –Menina, você precisa relaxar... E prestar mais atenção nas informações que está deixando passar! Lembre-se de uma coisa: Você está assim receosa, porque sabe, assim como eu, de tudo o que vivemos ao lado do Doutor. Mas, você se esquece de que o Ned não sabe. Para ele, devem ter se passado algumas horas, desde a confusão com a Teselecta, e nós nem fizemos o favor de voltar para explicar tudo a ele. Imagine como ele deve estar se sentindo? Eu não gostaria de estar na pele dele agora...

—Como assim? –Luisa franziu a testa. –Você acha que ele ficou muito confuso? Que se chateou? Que não quer falar comigo nunca mais?—ela pareceu aflita. Melissa ficou satisfeita com a manifestação de seu senso de preocupação.

—Bem, essa ultima parte é mito na certa. Se ele não quisesse falar mais com você, não teria te ligado umas cem vezes. –ponderou. –Entretanto, você sabe que o Ned sempre foi um cara legal com você e que sempre demonstrou ser de confiança. No mínimo, ele deve ter ficado meio decepcionado... Afinal, ele procurou tanto por você...

—Puxa... E agora? O que eu vou dizer a ele? Não posso contar sobre o Doutor e as viagens no tempo...

—Bem, seria o mais lógico a se fazer, depois de tudo o que ele passou dentro de um robô diabólico, no formato de um ser humano... –comentou Melissa.

Luisa encarava o celular com nervosismo. Acabou negando no fim das contas.

Eu não devo. Posso acabar colocando a vida do Doutor em risco... E se ele espalhar, sem querer, que nós temos um amigo extraterrestre? Não podemos correr o risco de expor o Doutor...

—Tem razão –Melissa acabou concordando. –Precisamos de outra abordagem, mas que funcione tão bem quanto a original...

Luisa demorou-se fitando o amigo, remexendo distraidamente dentro do painel de controles, completamente indiferente à conversa delas. Ela precisava tomar uma decisão. Precisava conversar com Ned, mas aquilo não poderia ser feito por telefone. Ela necessitava ficar olho no olho com ele. Só então, talvez, saberia a coisa certa a dizer, e o modo como deveria fazê-lo.

Tornou a observar o telefone, pensativa. Melissa tocou seu ombro, amigavelmente.

—Ei... Pense nisso com carinho: talvez seja disso que você precise, no final das contas: Mudar de ares. Sossegar um pouco. Tornar a viver a vida cotidiana de “um dia após o outro e na ordem correta dos fatos”. Anime-se! Todos que viajam com o Doutor precisam disso, vez ou outra. É um fato! Não é a toa que há dias em que dou chilique dentro deste lugar... Sim, é tudo muito maravilhoso, eu sei. Mas, acima de tudo, nós somos humanas! Temos necessidades diferentes das do Doutor. Ué? Se ele se sente sufocado sem as aventuras e o perigo constante que o ronda, talvez nós precisemos de um tempinho para respirar, entende? Uma pausa só para nos situar um pouco e poder firmar as solas dos sapatos no nosso bom e velho planeta Terra. –propôs Melissa, sendo sincera. –Pense um pouco nas possibilidades: Voltar para a Terra e trocar uma idéia com nossos velhos amigos não será um “adeus ao Doutor e ao mundo mágico que o rodeia”. É apenas uma pausa; “Um intervalo”. Não significa que deixaremos de andar com ele ou viajar na TARDIS... Às vezes, uma parada é só uma parada. Só temos que tomar cuidado com o modo como apresentaremos a idéia a ele, e depois torcer para que o Senhor do Tempo acerte o caminho para casa, desta vez!—ela acabou rindo. Luisa sorriu também, um pouco mais decidida.

—Sabe que você tem razão? –constatou. –Não seria certo ter uma conversa tão importante com o Ned, pelo celular. Preciso me encontrar com ele. Talvez o Doutor nem precise saber... Assim, evitaria ter de dar mais explicações, e acabar causando uma sensação meio vazia entre nós.

—O que o Doutor não precisa saber? –perguntou a voz impertinente do próprio rapaz, dando-lhes um susto. Arrepiadas, as duas entreolharam-se, depois voltaram-se para ele, com cara de culpadas. Mas ele não reparou, estava muito ocupado lustrando uma arruela. –E então?

—Hã... O que exatamente você ouviu de toda a nossa conversinha particular?—questionou Melissa, com as mãos nos quadris. O rapaz soprou dentro da peça que estava limpando, antes de responder:

—Só ouvi a parte que se dirige exclusivamente a mim: “Que o Doutor não precisa saber” de algo... O que é?

Melissa cruzou os braços e fez cara de pouco caso.

—Se nós dissemos que “o Doutor não precisa saber”, então porque diabos “o Doutor está querendo saber sobre coisas que não devia saber”?

O rapaz ergueu o olhar na direção delas, com ar descontraído.

—Ora, mais que pergunta! –sorriu torto. -Porque é ridiculamente contraditório. E vocês sabem como eu não resisto a esse tipo de coisa...

Melissa lançou uma piscadela para Luisa.

—Bom, já que está tão interessando, então lá vai: Nós queremos dar uma pausa nas viagens e dar uma passada em casa.

O Doutor deixou a peça cair no chão, fazendo um tilintar irritante.

—Vocês querem ir para casa? –ele passou do nível “surpreso”, ao encará-las logo depois. Assim como previram, ele pensou que elas estariam se despedindo.  

Melissa deu uma cutucada leve em Luisa, que tomou a palavra em seguida. 

—É! Digo, não definitivamente. Na verdade, seria só uma parada rápida mesmo. É que nós estamos com muita saudade das nossas famílias... Será que não podíamos ir vê-los bem rapidinho?

O Doutor observou o celular em sua mão. Ignorou aquilo logo depois.

—Ah. Está bem. Não vejo problema nenhum nisso... –e ficou de costas para elas, tornando a mexer no painel de controles. 

Beleza!—Melissa comemorou baixinho, de modo que só Luisa pode ouvir. –Viu? Não foi tão difícil...

—Puxa, eu menti pra ele –Luisa parecia pasma consigo mesma.

—Mas foi por uma boa causa! –Melissa apoiou. –Não vai dar pra trás agora, né? Vocês dois acabaram de dizer que oficializaram serem apenas bons amigos...

—Eu sei –Luisa disse, apertando o celular contra o peito. –Mas, de uma forma ou de outra, alguma coisa muito forte existiu entre mim e ele. Não há como negar! Contudo, apesar de termos nos colocado na posição de “apenas amigos” de agora em diante, não posso simplesmente afogar esse sentimento dentro de mim de uma hora para a outra... É ridículo, além de ser praticamente impossível!

Melissa analisou aquilo tudo com muita atenção.

—Quer saber? Acho que você está é com medo de falar com o Ned. Mas tudo bem... Eu também acho que estaria me sentindo assim no seu lugar. Quero dizer, afinal, ele foi deixado sozinho depois da bagunça que a Teselecta causou... Imagine só: “um rapaz jovem e ainda por cima muito gato, perambulando sozinho e confuso na calada da noite, na tentativa de voltar para casa e se enfiar embaixo do chuveiro depois de um dia duro e estranho...” Não há dúvida de que choveria garotas querendo lhe oferecer uma ajudinha...  –ela jogou verde. Luisa imediatamente ergueu a cabeça, inquieta.

O quê? Não! Mais nem pensar! Se elas acham que vão poder me intimidar e roubá-lo de mim, estão muito enganadas!—falou um pouquinho mais alto do que pretendia.

Quando deu por si, o Doutor fitava-a intrigado, enquanto Melissa mordia o lábio, com uma expressão que descrevia bem a palavra “Ops”.  

Como é? Quem vai roubar o quê de quem?—o Doutor perguntou com ar de riso, colocando as mãos nas cintura. Luisa enrubesceu até o ultimo fio de cabelo.

—Hã... Não é nada. Estávamos repetindo as falas de um filme que vimos juntas certa vez...

—É... –Melissa entrou na dela. –Versava sobre um casal que terminou o namoro recentemente, e sobre como o cara foi gente boa em deixar o caminho livre para a ex-namorada seguir sua vida ao lado de outra pessoa... Ai!—Melissa gemeu, ao receber de Luisa uma cotovelada nas costelas, sem cerimônia. O Doutor olhou de uma das meninas para a outra, sem entender “qual o problema delas”. Ainda bem humorado, ele lançou-lhes um sorriso cativante.

—Puxa, parece ser engraçado. Quero saber qual o nome desse filme depois... 

—Ah, tá. A gente te conta, assim que eu inventar... Digo: Lembrar do nome! —emendou Luisa, cada vez mais possessa com suas próprias mancadas.

O Doutor ergueu uma sobrancelha.

—Está tudo bem com você?

—Claro, estou ótima!—ela sorriu, forçado. –Na verdade, nunca estive melhor...

O Senhor do Tempo encarou-as uma ultima vez, sem desconfiar de nada.

—Hã, tá legal. –e deu de ombros, voltando aos seus afazeres. Melissa e Luisa suspiraram, em silêncio.

—Caramba... Essa foi por POUCO! AH!—Luisa gritou, assustando-se quando o celular tocou inesperadamente em suas mãos. Fazia tanto tempo que não recebia ligações que até se esquecera do toque do aparelho. Surpresa, quase deixou-o cair. Ele escorregara de suas mãos suadas como um sabonete cremoso, mas ainda sim, conseguiu recuperá-lo no ar. Impediu que ele se espatifasse no chão, porém, não conseguiu disfarçar o novo constrangimento perante ao Doutor. Inacreditavelmente, parecia que ela só precisava ter terminado seu relacionamento com ele, para que as coisas começassem a sair rigorosamente fora de controle.

—Mais o que aconteceu? Estão repassando as falas do filme de novo?

—Não, não! Juro que desta vez foi improviso... O celular nem estava no script! –Luisa tocou na tela, acendendo-a para identificar a chamada. Era do Ned.

Naquele segundo seu coração quase pulou pela boca. Se ele ainda estava procurando-a, então era porque não desistira dela... Mesmo assim, por entre um e outro pico de felicidade, ainda assim, havia um certo tremor tomando conta dela. Deveria atender agora, na frente do melhor amigo?

Estava decidindo, quando a TARDIS se manifestou primeiro: uma de suas alavancas abaixou-se sozinha e eles levaram uma guinada inesperada.

A TARDIS estava decolando. O Celular não parava de tocar. O Doutor estava enroscado, segurando-se firme em alguns cabos pendurados para fora do painel de controles. Luisa e Melissa perderam o equilíbrio: sua sorte foi estarem próximas o bastante dos sofás, para conseguirem aterrissar neles.

Doutor! Faça isso parar!—exclamou Melissa, após vários segundos tentando incansavelmente parar sentada no estofado.

Não posso! Não sei o que a TARDIS fez... Bem, na verdade eu sei. Mas mesmo assim, não sei como parar isso...

E o que foi que ela fez? —guinchou Luisa, quase deixando o celular escapar das mãos, novamente.

—Vocês viram que eu estive limpando algumas peças? Bem, eu estava desmontando uma pequena parte do painel de controles. Minha intenção era só dar uma lustrada nas coisas, mas para isso tive que mudar a posição do interruptor que define o modo de navegação padrão da TARDIS...

Traduza para a linguagem do planeta Terra, por favor!—pediu Melissa, quase caindo do sofá.

O Doutor suspirou, aproveitando a pausa para melhorar se segurar.

—Eu a regulei provisoriamente para captar coordenadas de uma forma mais sensível. Não pretendia usar esse método de navegação, mas precisei ativá-lo, ou então a peça não sairia. No entanto, minha teoria é de que, com o navegador desconfigurado, o telefone de Luisa tocou e disparou um sinal em ondas que foi convertido em coordenadas pela minha nave. E agora, sem qualquer intervenção minha, ela está seguindo o alvo que está enviando o sinal em tempo real!

Simplifica isso, pelo amor de Deus!—berrou Melissa, atirando no rapaz o primeiro objeto que passou flutuando em sua frente.

Estamos voltando para o Planeta Terra! Rá! —gritou ele, gargalhando à beça.

Ah!—Luisa sorriu incondicionalmente. –Não acredito... O Ned está me puxando de volta para casa!—sussurrou, com seus botões.

 

*     *      *

Comicamente, apesar da nave aparentar estar toda desgovernada, a TARDIS materializou-se com tamanha leveza na calçada em frente às casas de Luisa e Melissa. Do outro lado da rua Bannerman, uma cortina foi cuidadosamente afastada na janela mais alta da casa de Sarah Jane Smith. Com tamanha surpresa, Luke Smith observou a cabine azul. Pensou em chamar a mãe, mas não o fez. Por algum estranho motivo, manteve-se paralisado no mesmo lugar, observando a nave azul com um olhar vidrado.

Logo o trio desembarcou e o ar gélido da noite veio lhes cumprimentar, fazendo sua face arder suavemente. Caminharam aos pulinhos (por causa do frio), mas Luisa, que ia na frente, acabou parando de chofre pouco antes de abrir o portão, quando notou, perplexa, que alguém havia forçado o trinco principal.

—Esperem. Tem alguma coisa errada... –ela avisou, desconfiada, fazendo sinal para os outros dois pararem atrás dela.

—Como assim? Que tipo de coisa? –perguntou Melissa, espichando o pescoço para poder olhar.

—O portão de casa está aberto. Minha mãe nunca esqueceria-o escancarado. Eu sei. Ela vive fazendo anotações; Funciona como um tipo de ritual: todas as noites, ela confere uma seqüência de coisas antes de podermos finalmente ir dormir; Por o lixo pra fora, fechar as venezianas, checar se o portão externo está trancado... Ela nunca se esqueceria!

O Doutor checou o relógio de pulso.

—São exatamente nove e meia. Talvez sua mãe ainda não tenha ido dormir...

—Independente disso, ela jamais deixaria o portão entreaberto desta forma... –insistiu Luisa, começando a ficar preocupada. 

O Doutor tocou seu ombro.

—Talvez ela estivesse aguardando seu retorno –supôs ele, pensativo. –Você acha que há alguma possibilidade dela ter descoberto sobre nós?

Luisa voltou-se para ele com o olhar inquieto.

—Não sei. Acho que não. Eu nunca mencionei para ela a verdade sobre você e as viagens no tempo. Creio que não haveria como ela descobrir...

—Muito menos minha mãe –afirmou Melissa. –Ela não presta atenção direito nem no que come, muito menos em detalhes como este!

O trio entreolhou-se mais uma vez. Luisa respirou fundo e deu um passo na direção do portão.

—Bom, só há um jeito de descobrir... –disse, tocando nas grades do portão de casa. Já ia empurrá-lo, quando novos passos ressonaram do outro lado da rua. Caminhando naquela mesma direção, vinha vindo Ned, com o celular na orelha. Ambos pararam de chofre, ao contemplarem-se a distância. 

—NED! –ela sorriu largo, acenando. –Ned, sou eu!

Luisa?—ele afastou o telefone, prendendo a respiração ao fitá-la. Estava bastante escuro na rua, e era meio difícil de enxergar mesmo com os postes de luz acesos, porém, ele jamais deixaria de reconhecer a voz de Luisa.  

—Ned? –o Doutor sussurrou para Melissa, fazendo uma careta. –Eu já o conheci antes? Esse nome não me parece de todo estranho...

—É o garoto que foi capturado pela Teselecta, lembra-se? –explicou Melissa, no mesmo tom abafado.

—Ah... O garoto de quem Luisa falou! –o Doutor refletiu momentaneamente. Então voltou-se para Melissa, meio consternado. -Ela me deixou de babá daquela vez para poder sair com ele?

Melissa deu tapinhas consoladores em seu ombro.

—Cara, da missa você não sabe a metade... —ponderou, deixando-o embasbacado.

Luisa, por sua vez, não perdeu tempo. Continuou acenando alegremente para Ned.

—Ei! Vem aqui em casa! Eu queria mesmo falar com você...

—Queria? –Ned estranhou, ainda parado no meio do caminho.

Queria?—o Doutor indagou, enciumado.

Ah, queria sim—Melissa sustentou, firmemente. –Pode crer. E como!

Indignado, o Doutor abriu a boca para dizer alguma coisa, mas acabou não dizendo nada, cruzando os braços no fim. Na calçada oposta, Ned fitou Luisa atentamente, como se estivesse sonhando em revê-la tão de perto.

—Por onde você andou? Estou te procurando há tempos!

Luisa corou de leve, embaraçada.

—Hã... Eu sei. Desculpe por isso. É que, estive meio fora de alcance...

É, eu notei. –ele assentiu, sem demonstrar reação alguma. Aquilo deixou-a meio insegura: o que será que ele pensara sobre sua ausência? –Estive te procurando incansavelmente... Todo mundo esteve!

Todo mundo?—Luisa franziu a têmpora. –Nossa... Mas pra quê tanto alarde? Eu só fiquei sem sinal de celular e Internet... Não é nenhum fim do mundo!

—Mas todos achamos que era! –ele disparou. Depois voltou, reformulando melhor a frase. –Bem, eu achei, especialmente. –ele sorriu, meio sem jeito.

Luisa mordeu o lábio. Sentiu que alguma coisa muito boa viria a seguir. Só lamentou por estar acompanhada naquele instante, senão poderia correr e se atirar nos braços do garoto de quem tanto gostava, mas nunca teve coragem de admitir.

Por essas e outras, mantendo o decoro, ela convidou-o novamente a entrar em casa. Alguma coisa mudou no seu semblante desta vez, e logo uma urgência pareceu percorrer sua face.

—Luisa, espere! –ele veio correndo. Luisa se animou com sua reação. Estava tão entusiasmada que nem percebeu que havia algo errado acontecendo. Sem pestanejar, apoiou a mão novamente no portão e arrastou-o, abrindo caminho para ela e seus amigos passarem primeiro. –NÃO! NÃO TOQUE NO...

Luisa fez cara de confusão. O que ele estava querendo dizer? Porém, sua dúvida não teve chance de pairar um pouco no ar. Logo em seguida, uma sirene policial foi acionada e vários carros de polícia apareceram, surgindo nas duas esquinas e embicando contra a entrada das casas das duas garotas. Luke Smith arregalou os olhos e recuou, receoso, afastando-se das janelas. Na rua, faróis fortes como holofotes foram ligados contra o portão da casa de Luisa e vários policiais desceram dos carros, com armas em punho.

Alto! Levantem as mãos!—gritou energicamente um policial forte e sisudo. –Vamos! Obedeçam!

O trio obedeceu, completamente em choque. Ned chegou ofegante até as viaturas, tentando dialogar com os guardas.

—Não! Seu guarda! Seu guarda, houve um engano! –anunciou, alarmado.

Saia do nosso caminho, moleque!—disse o mesmo guarda, enquanto outro que estava mais próximo do rapaz, barrou sua passagem com o braço comprido e forte.

—Não! Mais... Vocês não podem fazer isso! –protestou Ned, desvencilhando-se do guarda distraído.

Bigby, controle esse seu filho!—rugiu um segundo guarda armado, para um dos motoristas magricelas que dirigiam as viaturas.  

Seguidamente, a porta do carro referido abriu-se e um homem apareceu do lado do volante.

—Ned, afaste-se, por favor... Estamos trabalhando! –chamou-lhe a atenção, só que de um jeito mais moderado. Luisa reconheceu-o rapidamente: era o pai do Ned.

O garoto correu em sua direção para tentar convencê-lo.

—Pai! Pai! Diga para eles irem embora... Está tudo bem! Luisa está bem. A mãe dela até já tentou ir a delegacia retirar a denuncia... Não sei porque vocês ainda continuam com isso!

—Denuncia? Como é que é? –Luisa ficou ainda mais abismada. O pai do Ned voltou-se para ela.

—Nós recebemos uma denuncia vinda da casa ao lado. A mãe de uma garota chamada “Melissa Rivera Alcântara” registrou um boletim de ocorrência há poucos dias, para comunicar o desaparecimento de sua única filha e culpa este homem, que está junto de vocês, por esse incidente infeliz.

O quê?—Melissa gemeu. –Minha mãe fez o quê?—sentiu-se traída na mesma hora. Em seguida olhou para o Doutor, completamente sem chão. –Eu... Eu não sei o que foi que deu nela...

—Fique calma. –o Doutor aconselhou bem baixinho. –Não estou bravo com você por isso. Na verdade, isso é até mais comum pra mim do que você imagina. –afirmou. Melissa balançou a cabeça, incrédula.

—Como? Como isso pode ser comum pra você?

—Bem, digamos que as mães das minhas companheiras sempre causaram problemas para mim, de uma forma ou de outra... –ele comentou, casualmente. –Sinceramente estava tudo muito estranho: ninguém tinha dado chilique até agora, além de você. Eu já desconfiava que as coisas não ficariam “por isso mesmo” por muito mais tempo... É obvio que toda ação cria uma conseqüência, e mais cedo ou mais tarde, eu teria que pagar por ter feito ou deixado de fazer alguma coisa. É sempre assim, quando me envolvo com humanos... Já até me acostumei com essa ladainha.

Não podemos retirar a denuncia!—gritou um dos guardas gordinho, dispersando sem querer o rumo da conversa entre o Doutor e Melissa. –A única que pode fazer isso é a própria mulher que fez a denuncia. Afora isso, quaisquer outras testemunhas de opiniões diversificadas terão de aguardar o julgamento do caso, para poderem se manifestar. É a Lei!

Naquele instante, um homem baixinho, dentuço, de boné e óculos, também usando uniforme da polícia, surgiu com uma caderneta em mãos. Logo em seguida, passou a checar uma papelada, como se estivesse conferindo a lista de convidados de uma festa.

—Hã... Vejamos... Qual de vocês é Luisa Parkinson?

—Sou eu! Eu, aqui! –Luisa acenou, exasperada. –Moço, por favor... Cadê a minha mãe? Por que o portão da minha casa está destrancado? Onde é que ela está?

—Não se preocupe. Ela teve que viajar, mas deixou essa carta conosco e pediu que a entregássemos a você, assim que a localizássemos.

Luisa apanhou a carta, tremula. O pai de Ned emendou:

—Quanto ao seu portão, pedimos permissão para poder utilizá-lo como armadilha para apanharmos este homem –e indicou o Doutor com a cabeça. –Nós sabíamos que ele voltaria cedo ou tarde. A mãe da garota Melissa nos comunicou que vira sua filha andando com este rapaz algumas vezes, e que ele estava sempre na casa da Luisa Parkinson. A partir disso, instalamos sensores no portão, diretamente ligados às nossas viaturas. Se as grades se movessem, o rangido seria ouvido por todos nós e todas as viaturas nas proximidades disparariam para a rua Bannerman.

O Doutor refletiu por um instante, então levantou a mão, pedindo permissão para falar.

—Alguma pergunta? –instigou o pai do Ned.

—Sim, eu tenho: Vocês não acham esse plano meio bobo? Quero dizer: em teoria é muito bom, mas na prática, sai pecando em um monte de detalhes. Por exemplo: vocês ficariam plantados com as viaturas o dia todo, se fosse necessário, para poderem me pegar com a boca na botija. Não acham que tem uma falha grotesca nisso tudo?

—E qual seria essa “falha grotesca”? –o pai do Ned questionou, dando de ombros.

—Veja bem: Vocês instalaram sensores de movimento e som num portão que range por qualquer coisa, mas isso não seria auto-sabotador? Digo: E se uma brisa forte impulsionasse o portão? Não acham isso uma furada?

—Na verdade não. Afinal, funcionou muito bem. Você está aqui, não está?—interveio o pai do Ned. O Doutor teve vontade de morder a própria língua.

Luisa abriu o envelope de sua mãe. Dentro havia um bilhete bem curtinho e direto.

Minha querida Luisa,

Tive que me afastar momentaneamente. Eu, o tio Alam, sua prima Maria, o tio Dave e seus primos Os Esquilos, nos reuniremos até o final da semana na casa de seus avós. Tata e Vavá estão com muita saudades de você. Nos veremos em breve.

 03/12/2015

Decepcionada pelo bilhete curtíssimo e pouco explicativo de sua mãe, Luisa fitou os policiais por um momento, como se procurasse respostas em seus rostos.

—Mas... Ela escreveu 03/12/2015? Quando exatamente a mãe da Melissa fez a denuncia contra o Doutor?

—Ah... Acredito que um dia depois –informou um dos guardas, dando risada logo em seguida. –Mulherzinha esquisita aquela... Veio tentando retirar a denuncia um dia antes dela ser apresentada. –comentou, indiferentemente.

Luisa, porém, voltou-se para os amigos, pasma.

—Isso é esquisito. Como minha mãe poderia ter datado esse bilhete de antes da mãe da Melissa fazer a denuncia? Como ela podia saber?

O Doutor fitou a casa de Luisa de soslaio, raciocinando.

—Ora, deve ter sido coincidência –presumiu Melissa.

—Não –o Doutor interveio. –Tem mais alguma coisa no ar... Eu posso sentir.

Foi então que Luisa tornou a checar o envelope... E teve uma agradável surpresa: havia mais uma batelada de linhas exprimidas acima do rodapé da folha. 

“Foi mesmo uma pena termos que partir tão depressa, e não podermos esperar por seu retorno. A verdade, é que foi exatamente por causa disso que tivemos que nos afastar. –*Não se preocupe, filha. Essa mensagem é escrita com uma caneta especial, cuja ninguém além do “sangue do meu sangue” é capaz de ler.– Então, lá vamos nós às explicações: Toda a nossa família teve que se afastar justamente para não ter o nome incluído nesta investigação. Maria Jackson tem ligação direta com isso, pois andou encobrindo você e Melissa por todo esse tempo. Sim, eu sei disso porque descobri que ela é assistente da nossa vizinha da frente Sarah Jane Smith, que por sinal, tem ligação direta com esse seu novo amigo. Não se surpreenda com meus conhecimentos sobre suas aventuras, mas a verdade é que eu sei de tudo, Luisa. Sempre soube, na verdade. E, mais do que isso, eu também sabia que você tinha um destino traçado, desde o princípio, com aquele rapaz. John Smith, não é? Ou seria “Doutor”? Sim. Eu sei que você deve estar quase enfartando à uma hora dessas, mas não se exalte, querida. Ao invés disso, continue lendo essa carta, e não pare até terminar por completo. Bem, você sempre soube que herdara o seu dom de Visualizadora da sua avó; Isso é passado de geração para geração, e assim como você, acredite se quiser, eu também fui a única filha dentre meus três irmãos restantes, que herdou este dom. Aparentemente, só algumas mulheres conseguem assimilar o dom. (ponto para nós!). Sendo minha filha, você também conseguiu herdar este dom tão incrível, diferente de sua prima Maria, que pode não ser Visualizadora como nós, mas também é extremamente inteligente. Enfim, só introduzi tudo isso sobre “Visualização” porque queria explicar o motivo da minha carta ter sido datada um dia antes da denuncia de dona Naya Rivera. Francamente, eu não sei o que deu naquela mulher ultimamente... Anda tão fechada e carrancuda. Nem parece a Naya de sempre... (Pra dizer a verdade, estou começando a desconfiar de sua integridade). Tome cuidado com ela, filha. Não deixe Melissa se aproximar demais... Ela me cheira a problemas.

Tio Alam, Dave e Os Esquilos vieram se abrigar conosco a meu pedido, já que imaginei que a polícia pudesse querer me encontrar, e para isso, começasse a procurar pelos familiares e entes mais próximos de nossa família. Para não envolver mais ninguém nisso, nos exilamos de tudo e todos, momentaneamente.

Bem, em geral, é só isso. Ah! Mais uma coisinha: quando voltarmos a nos ver, teremos de ter uma conversa bem pessoal, sincera e profunda. Na verdade, o dever é mais meu do que seu: Eu já devia ter te contado certas coisas há muito tempo...

Pois é. Falhas acontecem, e eu com certeza cometi um monte delas...

Por hora, ocupe-se só em despistar os policiais. Cuidado para não ser presa também, hein! Ah! E se o Doutor (sim, vou passar a chamá-lo assim de agora em diante) for preso, certifique-se de que ele não precise passar mais de uma noite na cadeia. Cá entre nós: Eu sei que ele não fez nada de errado.

Estou do lado de vocês, acredite ou não. Porque sei de coisas que unem vocês. Seus caminhos estão interligados pelo cosmos... Talvez não do jeito que você esperava (lamento meu bem), mas de uma forma tão significativa quanto.

E vocês ainda terão que enfrentar muita coisa juntos, portanto, não o deixe escapar!

Ah! Ultimo lembrete: E não se esqueça de me apresentar aquele garoto bonitinho dos olhos azuis de quem você vivia falando. Afinal, se o Doutor não é a sua “cara metade”, então eu estou roendo minhas unhas de curiosidade para saber quem é o verdadeiro sortudo!

Beijos, e se cuida filha.”

Pode até parecer estranho, mas Luisa respirou bem mais fundo depois de ter lido aquilo tudo. Claro que o ar misterioso de sua mãe, dizendo que teria de ter uma conversa com ela e revelar coisas que já devia ter dito há muito tempo, deixou-a com coceira de tão intrigada. Mas por hora, era muito bom saber que sua família estava bem e em segurança.

Agora, ao menos Luisa entendera porque sua mãe nunca se opusera ao vê-la com o Doutor (que era muito mais velho do que ela), ou parecia nunca desconfiar de nada que eles tramavam, bem debaixo de seu nariz. É porque na verdade ela sabia de tudo o tempo todo! Porque ela também era uma Visualizadora! E, se Sally Jackson dissera que o “universo sempre tivera planos para sua filha e o Senhor do Tempo” então, quem era Luisa para discutir? Até onde soubera, ela devia até dar uma festa por ter uma mãe tão compreensiva. Afinal, a mãe de Melissa parecia não enxergar o Doutor da mesma maneira...

Quando voltou a observar o ambiente ao redor de si, deparou-se com ela e os dois amigos encostados contra a parede lateral da casa (nem percebera que havia sido escoltada até ali) e estavam sendo vigiados por dois policiais, enquanto um deles, sozinho, desligava o sistema de sensores acoplado ao portão da casa de Luisa. Olhou mais adiante e percebeu que várias viaturas haviam ido embora. Só sobraram duas agora: a do policial baixinho e sisudo e a do pai do Ned.

Falando nele, Ned estava conversando afastado com o pai, na lateral do veículo, provavelmente discutindo alguma forma de isentá-los de possuir alguma culpa (afinal, ele se lembrava do que o Doutor fizera por ele no ataque da Teselecta –não entendia bulufas do que aconteceu, mas pelo menos, reconhecia que ele havia salvado sua vida). Tentaria negociar, mesmo que fosse em vão, para diminuir a acusação que caíra sobre os ombros do Senhor do Tempo.

 Depois, Luisa pegou-se observando a casa de Melissa: era esquisito, pois estava tudo escuro. A mãe da melhor amiga não estava por lá... E bem na noite que toda aquela confusão se sucedera!

Olhou em frente, seguindo a direção da entrada de sua casa, deparando-se com o sobrado de Sarah Jane, do outro lado da rua. Teve a singela impressão de ter visto alguém na janela do sótão.

Por fim, terminou por observar a mensagem curtinha que sua mãe deixara no início da página, que, de acordo com ela, serviria apenas para despistar algum engraçadinho, na delegacia, que quisesse bisbilhotar a mensagem (enquanto o conteúdo original constava mais embaixo, invisível aos olhos comuns de pessoas não Visualizadoras). Mas não foi a mensagem em si que a intrigou, mas sim, a data no final.

—Dia três do doze... –murmurou, fazendo as contas. –Meu aniversário foi semana retrasada: dia 24/11. A formatura foi dia 30/11. Dia três do doze... Ainda é na mesma semana da confusão com a Teselecta e do Tormento também... Puxa! Parece que os dias nem passaram... –foi então que uma dúvida lhe ocorreu. E ela chamou o policial que estava mais perto. –Por favor... Será que pode me dizer que dia é hoje?

—Claro, moça. Hoje é dia 06/12. Quase 07/12, porque agora já são dez e meia... –e voltou aos seus afazeres.

Meu Deus!—Luisa encostou as costas contra a parede, quase perdendo todo o ar. Seu movimento brusco chamou a atenção dos outros dois companheiros.

—O que foi Luisa? –perguntou Melissa, até então, em silêncio.

Luisa riu de nervoso.

—Nós não voltamos assim que saímos... Hoje é dia 06/12! É por isso que a mãe da Melissa foi denunciar você, Doutor! Melissa e eu não sumimos por algumas horas... Nós sumimos por dias!

O Doutor arregalou os olhos. Estava tão surpreso quanto ela.

Opa... –gemeu, mordiscando o dedo mindinho.

Melissa fez um bico de reprovação para ele.

Muito bonito, né?Senhor Doutor”. –repreendeu, de braços cruzados. –E agora, o que você vai fazer para consertar toda essa bagunça?

O Doutor esfregou o queixo.

—Acredito que oferecer leite e biscoitos a eles não deve bastar, certo?

Melissa revirou os olhos.

—O que está pensando? Eles não são o Papai Noel!—retrucou, dando-lhe um chacoalham. –Mais que situação, hein? É melhor você ser honesto e acertar as coisas de uma vez por todas...

O Doutor considerou aquele argumento. Inspirado, estufou o peito, ajeitou a gravata e deu um passo à frente, dirigindo-se a todos os presentes.  

—Pessoal, por favor, escutem! –sua voz repercutiu em todo o quarteirão. Todos os guardas restantes voltaram-se para ele. -Eu errei. Admito! E, como sou um rapaz honesto, sei que devo arcar com as conseqüências de minhas ações mal calculadas... Então, por favor, façam o favor de me prender!—disse, estendendo os pulsos aos guardas.

Melissa estapeou a própria face, enquanto o rapaz era algemado.

—Só faltava essa agora!

—Parece que ele levou bem ao literal o que você disse... –observou Luisa. –“Honesto”, é só apelido carinhoso...

—E aí? O que vocês acharam? Eu me saí bem? –o Doutor sorriu para elas, cheio de expectativa, mas acabou perdendo o foco, quando um guarda cutucou suas costas e o escoltou para dentro de uma das viaturas mais próxima.

—Com certeza foi uma ótima decisão –aprovou o guarda, pensando que o Doutor lançara a pergunta a ele. –Em geral, não são muitos os que se entregam a policia com tanta facilmente... Você com certeza é um bom exemplo, filho. Quem sabe até não chegue a ganhar uma cela com colchão de palha, por bom comportamento? –ironizou. O Doutor fez uma careta, já dentro do carro.

—Hum... De repente não pareceu uma idéia tão boa assim.—comentou. Então esticou o pescoço para ver as amigas atrás das costas largas do policial. –Ei, garotas! Uma ajudinha aqui, sim?

Luisa debruçou-se na janela traseira para falar com ele, enquanto Melissa abria a porta da frente, já entrando no carro. Porém, o policial a deteve no último segundo.

—Não, não, não, não. Mocinhas, vocês duas vão para suas casas. Já está tarde, e agora que o culpado já foi capturado, vocês estão oficialmente liberadas.

As duas ficaram incrivelmente pasmas com a notícia.

—O quê? Quer dizer que nós não vamos com ele? –reclamou Melissa.

—Isso é loucura! O Doutor não fez nada de errado, seu guarda! –protestou Luisa. –Ele é nosso amigo! Não pode tratá-lo como se ele fosse um marginal...

—Basta! Vocês duas deverão se afastar desse veículo agora, ou então eu terei de tomar medidas drásticas... –ameaçou. Luisa e Melissa trocaram olhares sugestivos.

—Ah, é? E exatamente “de que tipo de medidas” estamos falando? –sondou Melissa. 

—Bem, -o policial refletiu. –Essa foi uma ordem direta das autoridades para vocês. Se vocês duas descumprissem minhas instruções, por exemplo, também seriam convidadas a nos acompanhar até a delegacia, e é obvio que vocês não vão querer uma coisa dessas! 

Luisa e Melissa sorriram de canto de lábios.

—Não. Imagine—disfarçou Melissa. –É que nós duas teremos que acompanhá-los de qualquer forma.

—Exato –Luisa emendou. –É que, como vocês já devem saber, minha mãe está fora da cidade no momento. Desta forma, a única com quem estou autorizada a ficar é Melissa. –Luisa lançou uma piscadela à amiga.

Isso mesmo!—Melissa prosseguiu, devolvendo a piscada. –A mãe da Luisa disse que ela poderia ficar conosco durante esse tempo. O único problema, seu guarda, é que não consigo encontrar minha mãe para poder avisá-la que teremos uma hóspede. Meu celular está sem crédito, e não posso sair vagando por aí a procura dela, a essa hora da noite. Não faço a mínima idéia de onde ela possa estar! Como pode ver, a casa está vazia... –indicou seu quintal todo em breu. –Agora, diga-me uma coisa: Vocês teriam coragem de deixar duas garotas desnorteadas, sozinhas numa noite fria como esta?

—Hã... –o guarda coçou a careca por baixo do quepe azul. –Bem, colocando desta forma...

Ned e seu pai se aproximaram para ver o que estava se passando ali. Luisa deu um sorrisinho motivado, ainda que disfarçadamente. O guarda comentou o caso com um colega mais próximo. Ambos avaliaram as informações. Luisa, Ned, Melissa e o Doutor, dentro do carro, aguardaram por uma resposta.

—Tudo bem então. Vocês ficam com a gente, provisoriamente. –o guarda abriu uma exceção. –Porém, vocês duas irão na outra viatura, junto com os Bigbys. Não é seguro deixá-las muito perto desta figura —e apontou para o Doutor, algemado no banco de trás do carro.

 -Ei, amigo! Eu estou preso, lembra-se? –comunicou o Doutor, mostrando as algemas. –Que tipo de “maldades” vocês acham que eu poderia fazer a elas? Roer seus fios de cabelo?—satirizou ele. O guarda não ficou nada satisfeito com seu bom humor. Luisa intrometeu-se entre eles, antes que as coisas pudessem ficar ainda piores para o Senhor do Tempo.

—Hã... Não se preocupe. Nós iremos na outra viatura. –assegurou para o guarda, depois lançou um olhar de censura para o melhor amigo. –O que importa é estarmos juntos.

O Doutor entendeu seu raciocínio. Seriam escoltados em carros diferentes, mas lá na delegacia, ao menos, poderiam obter o consolo da companhia uns dos outros. Com todo mundo aceitando as condições propostas, o combinado se seguiu. Luisa e Melissa sentaram juntas nos bancos traseiros, enquanto Ned e seu pai, ocuparam os bancos da frente.

 

*     *     *

Mal as viaturas afastaram-se, a caixa de correio da casa de Luisa deu para estremecer. Um ruído abafado foi ouvido; também alguns resmungos... E então, eis que a portinha da pequena caixa de aço inoxidável se escancarou, revelando seis esquilos falantes, usando roupinhas.

—Oh! Mais que lástima! –gemeu Brittany, a líder das esquiletes, tirando o pó das vestes e colocando-se em pé. –Droga, Alvin! Mais que grande plano!—satirizou. –Não só perdemos a chance de salvar nossa prima, como também eles já se foram!

—Qualé, Brith? Será que você nunca vai conseguir ser um pouco mais maleável? –interpôs Alvin, o líder dos esquilos cantores, esfregando a nuca peluda. –Tubo bem: foi uma idéia meio infeliz essa coisa de nós termos vindo para cá sozinhos, sem avisar ninguém, mas você tem que admitir que a intenção foi boa!

Brittany revirou os olhos.

—Ah... Francamente! –bufou, zangada.

—Brith, não vai adiantar de nada ficar brava, agora –Jeanette, a intelectual, pôs a mão no ombro da irmã. -Pense pelo lado positivo: pelo menos ninguém se feriu ou saiu prejudicado de tudo isso.

—É. Ninguém, exceto aquele moço alto –acrescentou Eleanor, a esquilete caçula, preocupada. –Vocês acham que ele vai ficar bem? A prima Luisa foi acompanhá-lo até a delegacia...

—É. Ela pareceu realmente se importar com ele. –comentou Theodore, o caçulinha dos esquilos. –Não acham que nós devíamos ir atrás deles?

O quê? Pessoal! Vocês... Perderam o juízo? Não inventem moda! Nós somos esquilos! Es-qui-los. “Pequenos e indefesos”, lembram-se? Não podemos nos arriscar assim... O Dave nos mata se descobrir o que fizemos! Arrr... Não quero nem pensar!—gemeu Simon, o mais responsável dos esquilos. -Como esperam que atravessemos ruas, e cruzamentos e andemos pelo transito? Seremos massacrados!

Indefesos? Quem disse que somos indefesos? –protestou Alvin, cheio de si. –Saiba que Eu não sou nada indefeso, meu caro irmãozinho medroso... 

Simon fez uma careta cética. Brittany mostrou as garras, sugestivamente.

E nem nós!—emendou, defendendo a honra dela e das irmãs. Simon bufou, limpando o embaçado dos óculos no blusão.

—Ora, vocês sabem que não foi exatamente isso que eu quis dizer...

—Será que não podemos comer alguma coisa? Eu estou morrendo de fome... -disse Theodore, quebrando o clima, felizmente. Todos entreolharam-se, pensando no que fariam a seguir; Contudo, alguma coisa fez com que os olhos danados de Alvin reluzissem de expectativa, no escuro.  

—Quem quer pensar em se defender, quando acabamos de encontrar algo mais interessante pela frente? –ponderou, aproximando-se com um andar “descolado”, do meio fio. Rapidamente, os outros seguiram-no, e juntos, pararam para observar a figura espantosa de uma cabine telefônica pública da polícia, azul, bloqueando a passagem na calçada.

Brittany boquiabriu-se; Jeanette tremeu o narizinho, em estase; Simon ajeitou os óculos, para ver melhor; Eleanor engoliu em seco, receosa; Theodore encolheu-se; Alvin foi o único a sorrir, confiante, perante a nova descoberta.

 -E aí? Quem tá a fim de dar uma fuçada nessa coisa esquisita?

Nenhum dos outros respondeu. Brittany esfregou o braço.

—Eu não sei, Alvin. Parece ser muito... Perigoso.

Ora vamos, Brith! Você precisa se aventurar um pouco de vez em quando! –disse, impertinente, passando o braço peludo ao redor do pescoço dela.

Simon deu um passo à frente, inesperadamente.

—Por que isso está aqui? –e caminhou na direção da cabine, sem medo. Alvin mal coube em si de tanto orgulho do irmão. Em geral, Simon quase nunca se permitia fazer parte de uma das idéias radicais do irmão do meio. Em parte, porque elas eram quase sempre inconseqüentes, e Simon era responsável demais para isso.

Yes, Simon! É isso aí!—aprovou Alvin, todo contente.

Simon, não faça isso!—suplicou Jeanette, por outro lado; detida pela pata peluda de Brittany.

—Não se preocupe, Jeanette. Eu só vou dar uma olhada... –tranqüilizou-a. Então esgueirou-se por uma fresta entreaberta da enorme porta azul, e adentrou na caixa. Por alguns longos e intermináveis segundos, ele ficou desaparecido, então tornou a por a cabeça para fora, todo maravilhado. -O-ro-rou! Venham! Vocês precisam ver isso!—Simon gargalhou, enfiando-se novamente dentro da caixa. Os demais trocaram olhares curiosos.

Vamos gente! Vai ser legal!—incentivou Alvin, deveras satisfeito, fazendo o mesmo caminho do irmão. Os outros quatro esquilos entreolharam-se uma última vez, até que finalmente cederam ao acaso. Um por um, esgueiraram-se em fila, para dentro da TARDIS.

 

*     *      *

A viagem nas viaturas não demorou muito tempo; Logo estavam desembarcando na delegacia do bairro. As garotas nunca tinham andado de viatura, muito menos parado numa delegacia.

—Caramba! Isso foi irado!—Melissa aplaudiu sem dar alarde; só para Luisa ouvir. –Se eu soubesse que ser presa era parecido com ser escoltada numa Limousine, por um chofer, eu com certeza teria virado sorveteira e assaltado minha própria fonte de renda! –brincou.

—Nossa... -Adentraram no espaço com curiosidade. O hall de entrada era maior do que imaginavam. Luisa e Melissa ficaram tão boquiabertas observando o lugar que nem perceberam quando o Doutor passou por elas, escoltado de imediato para dentro de uma cela. Ned foi quem percebeu, e chamou a tenção das duas.

—Ei! Não é por nada não, mas seu amigo está sendo levado pra cela –avisou ele. A expressão mudou de imediato no rosto delas. Desesperadas, correram atrás da comitiva de guardas que o acompanhavam. Ned veio junto.

—Vamos rapaz, agora terá muito tempo para pensar no que fez... –disse o guarda chefe, com ar de superioridade. –Espere, o que é isso?—perguntou, ao vislumbrar a chave sônica no bolso da calça do Doutor. Virou-se para os outros guardas, intrigado. -Vocês revistaram-no? –todos negaram, meio embaraçados. O guarda chefe suspirou, esfregando os olhos. –Certo. Então, eu fico com isso! Deste momento, para todo o sempre, está confiscado.

—Espere... “Todo o sempre”? –o Doutor ficou abismado. Ele amava sua chave de fenda sônica.

Entra logo aí!—o guarda empurrou-o dentro da cela, sem cerimônia.

—Não! Esperem! Esperem! –Luisa esgoelou-se. –Não!—gemeu, quando o rapaz foi fechado atrás das grades, ainda algemado. –Doutor... –ela estendeu as mãos através das grades para tocá-lo, mas Ned puxou-a para longe (antes que um dos guardas tivesse o ímpeto de fazer o mesmo –e sem tanta consideração). A garota não debateu-se em protesto, como imaginou que faria. Ao invés disso, apenas apertou os braços que a envolviam, com mais força, e começou a chorar. Melissa observou seu amigo na cela, em silêncio. Seus olhos estavam brilhantes –ela também estava querendo chorar –mas manteve-se firme. Não costumava dar o braço a torcer com tanta facilidade. Quanto a isso, o Doutor não se importava. Voltou-se para eles com toda a dignidade que lhe restava e sorriu, confiante.

—Não chore, Luisa. Eu vou ficar bem. –então lançou um olhar tranqüilizador à Melissa também, que assentiu em retorno; e depois, observou Ned por um momento. Por último fitou Luisa de novo, chorando desconsolada nos braços do rapaz: -Cuide dela. Leve-a para tomar ar fresco... Não é bom ela ficar aqui agora. –instruiu. Ned imediatamente concordou, afastando-se com a menina.

Por um momento, ficaram Melissa e o Senhor do Tempo, sozinhos. Melissa fitou-o com significância e ele devolveu a expressão erguendo as sobrancelhas, comicamente. Melissa riu e aproximou-se da cela, sem dar alarde.

—Você é impossível... Faz brincadeira com tudo! –criticou, em tom ameno. –Olha só onde tudo isso te levou...

—Foi sua mãe que me pôs aqui. Não se esqueça disso –ele interpôs, de um jeito não grosseiro.

Melissa baixou os ombros, respirando fundo.

—Nem me lembre disso, homem do tempo—suspirou, chateada. –Minha mãe não devia ter se metido...

—Hã... Melissa Rivera? –chamou o homenzinho com a caderneta, aproximando-se. –Nós encontramos sua mãe. Ela está aqui mesmo, na delegacia...

Melissa gelou. O Doutor também.

O quê?

Naquele exato segundo, dona Naya Rivera atravessou o hall de entrada, trazendo o cão de Melissa consigo, preso em uma coleira. Entregando a coleira de Nik para o guarda da caderneta, a mulher caminhou na direção da garota, ficando imensamente emocionada ao rever a filha –e causando um imenso estardalhaço também (pelo jeito, isso já era de família).

MELISSA! OH, MEU DEUS! ACHARAM VOCÊ! —gemeu escandalosa, quase estourando os tímpanos dos seguranças mais próximos. –MEU AMORZINHO! FILHA! VOCÊ ESTÁ BEM? OH, MEU DEUS... VOCÊ ESTÁ VIVA! NÃO SABE COMO ISSO ME DEIXA ALIVIADA... PENSEI QUE ESTIVESSE MORTA E ENTERRADA À UMA HORA DESSAS!—dramatizou, agarrando a menina num abraço de grude insuportável. Melissa mesma procurou desvencilhar-se dela, mas a força que a mãe dispunha nos braços, ao envolvê-la, dificultou um pouco as coisas.

—Mãe! Credo, que melação... –resmungou Melissa, limpando a bochecha onde dona Naya acabara de lascar uma beijoca bem estalada. –Parece até que você não me vê a cinqüenta anos!

—Pois para mim foi isso mesmo! –rebateu a mãe, ainda emotiva. –Cada segundo sem saber onde você estava foi um desespero só! Ai... Fiquei até de cabelos brancos de tanta preocupação e nervoso que passei nos últimos dias! –gemeu, com as mãos no peito. Melissa fez uma careta.

Mãe, você sofreu a toa! Eu estive muito bem acompanhada, se quer saber... –replicou Melissa, mas a mãe nem deixou-a terminar de falar; Bem de relance, vislumbrou o Doutor atrás das grades e seus olhos cintilaram, penetrantes.

—Ah! Então vocês o prenderam! Que ótimo! Maravilha! “Sempre confie no poder da justiça”; É o que eu sempre digo! –engrandeceu o ego dos policiais. Então afastou a filha do caminho e dirigiu-se exclusivamente para o rapaz, com a expressão deveras deleitada. –Hum-hum... Como se sente agora, incapacitado, atrás das grades? –zombou, desdenhosa. –Talvez, uma década preso aí te ajude a pensar dez vezes antes de seqüestrar garotinhas inocentes! –disse, ríspida.

Garotinha inocente?—Melissa fez uma careta indignada, ás costas da mãe, que só o Doutor pode conferir. –Inocente é a vó!

Melissa! Olha os modos!—dona Naya repreendeu, energicamente. –Comporte-se, se não quiser ficar de castigo.

Melissa boquiabriu-se, ainda mais incrédula.

Mãe! Eu já tenho dezessete anos! Pare de me tratar feito criança!

—Bobagem! –a mãe contestou, indiferente. –Você é que tem mania de se achar madura demais, só que não é, mocinha! Na verdade, é tão irresponsável quanto o avoado do seu pai... Oh, Deus! Por que será que os filhos sempre têm que puxar esses defeitos?

Melissa ficou desconcertada diante do comentário drástico da mãe. O Doutor não gostou nada daquilo.

—Com licença, mas a senhora não acha que está sendo dura demais com sua filha? Melissa é uma boa garota. Tenho certeza de que consegue enxergar suas qualidades tanto quanto eu e Luisa...

A mulher olhou-o com mais ódio ainda.

Você, cale à boca! Não ouse falar como devo comandar minha casa! Nem ouse se referir a minha família de novo, ou então eu entro aí dentro e te encho de pancada! —gritou, descontrolada. Melissa foi obrigada a segurar sua mãe, para ela não enfiar os braços por dentro das grades e tentar estapear o rapaz.

Mãe! Pare com isso! Pára! Você não é assim... –gemeu a menina.

—Não ajo assim normalmente, quando trato com gente de verdade.

—Não fale assim dele, o Doutor é meu amigo! –Melissa se doeu. Estava começando a ficar realmente irritada com os insultos da mãe.

Dona Naya encarou a filha, criticamente.

—Você chama isso de amigo? Que tipo de miolos você tem na cabeça? Foi ele quem te seqüestrou!

—MÃE! JÁ CHEGA! –berrou Melissa, farta daquilo tudo. –Eu estava muito bem na companhia dele e da Luisa... Mas você tinha que chegar e estragar tudo, como sempre faz quando se mete na minha vida!

Dona Naya fitou-a, possessa. O Doutor mordeu o lábio, olhando de uma para a outra. Melissa estava vermelha, de tão nervosa que se encontrava. A mãe fitou-a com impaciência:

Melissa Rivera Alcântara! Não foi essa a educação que eu te dei!—bronqueou, ignorando completamente a opção de tentar compreender o ponto de vista da filha.

Melissa respirou, alterada.

Que seja!—resmungou, dando-lhe as costas, pisando firme na direção contrária. Ao passar pelo homem da caderneta, pegou a coleira de Nik com ele e saiu para dar uma espairecida, dando uma última olhada feia para a mãe, antes de sair do ambiente.

Houve um clima tenso, em que dona Naya ajeitou os cabelos, fingindo que tudo aquilo não era com ela. Depois dirigiu-se aos guardas, em tom casual:

—Hã... Filhos. Crescem um pouco e já acham que são “donos de si”. –comentou, balançando a cabeça. –Perdoem minha filha por esse escândalo. A cabeça dela às vezes não faz as conexões certas...

Ouviu um “tisc tisc” de reprovação.

Que vergonha, senhora Rivera –O Doutor julgou, às suas cotas. –Falando mal da própria filha... E daí que ela lavou roupa suja em público? Também é uma forma de resolver as coisas, não concorda?—ele ponderou, defendendo Melissa, e fitando a mulher com seus olhos mais severos e intensos.

A mulher voltou-se para ele com ar de grandeza.

—Às vezes, “roupa suja” não passa de simples roupa suja. –a mulher averiguou, lançando-lhe um olhar desafiador.

—E às vezes, minha senhora, roupas limpas “escondem algo a mais por detrás das camadas de sabão em pó e amaciante” –o Doutor retorquiu, provocativamente.

Zangando-se, a mulher deu-lhe as costas e caminhou até a porta da frente da delegacia.

—Com licença... Já desperdicei demais meu valioso tempo!—dirigiu essa fala exclusivamente ao Doutor. Depois voltou-se aos policiais presentes. -Obrigada pelos seus serviços. E por favor, avisem Melissa que eu estarei em casa, á sua espera, quando ela resolver parar de bancar a teimosa e agir como gente grande! –e retirou-se, despedindo-se somente dos guardas.

Os guardas se entreolharam. O Doutor suspirou em sua cela, deixando o corpo escorregar até o chão.

E pensar que o pesadelo só estava começando...


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Notas finais do capítulo

Equipe TARDIS, agora diretamente da CADEIA!! kkkkk

Só pra deixar claro, eu que determinei que o pai do Ned Bigby seria policial. Não há nenhum vestígio na série do Manual, que esclareça algo sobre os pais deles, então eu pus a criatividade pra funcionar e deu no que deu.

Uma curiosidade sobre a mãe da Melissa é que ela tem o mesmo nome da atriz de Glee Naya Rivera (a Santana) kkk Admito que na época que decidi colocar esse nome pra personagem, eu não era fã de Glee, mas tinha uma amiga que era, então acabou ficando kkk Depois virei fã de Glee e as coisas fizeram mais sentido kkkk Hey, será que vocês conseguem imaginar uma Santana mais adulta, interpretando a mãe da Melissa? Eu consigo, porque a Santana era de causar confusão mesmo e a mãe da Méli também é dessas kkk

Enfim, enfim, enfim: temos o Doc no xilindró pra variar, uma Melissa a flor da pele, uma Luisa indecisa, Ned de volta à história, Nik, Dona Naya, Dona Sally Jackson afastada e Alvin e os Esquilos na parada. Hum... e ainda pode ficar mais lotado esse crossover? Veremos no próximo domingo! :D



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