Girls and Blood — Reimagined Twilight escrita por Azrael Araújo


Capítulo 23
Twenty Two


Notas iniciais do capítulo

Jesus, Iara. Tu é muito chata.



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Andamos pelas sombras densas até a varanda. Eu sabia que ela podia sentir minha tensão. Ela esticou a mão livre até meu antebraço por um segundo. Depois, seguida, abriu a porta da frente e entrou, me puxando junto.

O interior era ainda menos parecido com o que eu esperava do que o exterior. Era muito iluminado, muito aberto e muito grande. Originalmente, devia ter tido muitos cômodos, mas a maioria das paredes do primeiro andar fora derrubada, criando um único espaço amplo. A parede de trás, voltada para o sul, fora inteiramente substituída por vidro. Para além dos cedros, o gramado era aberto e se estendia até o rio largo. Uma enorme escada em curva dominava o lado oeste da sala. As paredes, o teto alto, o piso de madeira e os tapetes grossos eram de tons variados de branco.

Os pais de Edythe estavam nos esperando. Estavam um pouco à esquerda da porta em uma pequena plataforma em frente a um piano de cauda enorme. Também era branco.

É claro que eu já tinha visto a Dra. Cullen, mas me impressionei de novo com o quanto era jovem e o quanto era absurdamente linda. Estava de mãos dadas com Earnest, imaginei — ele era o único da família que eu nunca vira. Parecia ter a mesma idade da Dra. Cullen, talvez alguns anos mais, e as mesmas feições pálidas e perfeitas do resto deles. Tinha cabelo ondulado da cor de caramelo, um pouco mais curto do que o meu. Havia algo muito... gentil no rosto dele, mas não consegui identificar o que me fez pensar isso. Ambos estavam com roupas informais de cores claras que combinavam com o interior da casa.

Eles sorriram, mas não se aproximaram de nós. Achei que estavam tentando não me assustar.

— Carine, Earnest, esta é Bella — disse Edythe.

— É muito bem-vinda aqui, Bella.

Carine deu um passo à frente, lenta e cuidadosa. Ergueu a mão com hesitação. Dei um passo à frente para cumprimentá-la, e fiquei meio surpresa com o quanto foi tranquilo fazer aquilo. Talvez fosse por ela me lembrar Edythe de muitas formas.

— É bom vê-la novamente, Dra. Cullen.

— Por favor, chame-me de Carine.

Eu sorri para ela, surpresa com minha súbita confiança.

— Carine — repeti.

Edythe apertou minha mão de leve.

Earnest também se aproximou e estendeu a mão para mim. Seu aperto frio e pétreo era exatamente o que eu esperava.

— É muito bom conhecer você — disse ele com sinceridade.

— Obrigado. Fico feliz por conhecê-lo também. — E estava mesmo. A sensação era de coisa certa. Aquela era a casa de Edythe, a família dela. Era bom fazer parte daquilo.

— Onde estão Archie e Jess? — perguntou Edythe.

Ninguém respondeu, pois eles tinham acabado de aparecer no alto da escada.

— Ei, Edy está em casa! — gritou Archie, e correu escada abaixo, uma mancha de pele branca, vindo parar subitamente diante de nós. Vi Carine e Earnest lançaram olhares de alerta para ele, mas até que gostei. Era natural para ele, era como eles se moviam quando não tinham que se preocupar com estranhos olhando.

— Bells! — disse ele, me cumprimentando, como se fôssemos velhos amigos. Ele esticou a mão e, quando fui apertar, me puxou para um daqueles abraços de urso, me apertando um pouco e espalmando as mãos em minhas costas.

— Oi, Arch! — falei. Minha voz saiu sem fôlego, mas eu ainda estava sorrindo e me senti surpresa por estar tão animada em vê-lo.

Fiquei chocada e também um pouco satisfeita de ele realmente parecer favorável. Mais do que isso, já gostava de mim.

Quando deu um passo para trás, vi que eu não era a única chocada. Carine e Earnest estavam olhando meu rosto com olhos arregalados, como se estivessem esperando que eu saísse correndo. O maxilar de Edythe estava travado, mas não consegui perceber se era preocupação ou raiva.

— Seu cheiro é mesmo bom, eu nunca tinha reparado — comentou Archie.

Meu rosto ficou quente, e mais quente ainda quando pensei em como isso devia ser para eles, e ninguém pareceu saber o que dizer.

E então, Jessamine apareceu. Edythe tinha se comparado a um leão caçando, o que tive dificuldade de visualizar, mas consegui imaginar com facilidade Jessamine dessa forma. Havia alguma coisa de leoa nela agora, só parada ali. Mas, apesar disso, fiquei totalmente à vontade de repente. Parecia que eu estava em um lugar familiar e cercado de gente que conhecia bem. Era tranquilo, como quando Lauren estava por perto. Era estranho sentir isso ali, mas me lembrei do que Edythe me contou sobre o que Jessamine podia fazer. Foi estranho pensar. Não parecia que alguém estava usando magia em mim.

— Olá, Bella — disse Jessamine. Ela não se aproximou nem ofereceu um aperto de mãos, mas não foi constrangedor.

— Oi, Jessamine. — Sorri para ela e depois para os outros. — É ótimo conhecer vocês todos. Vocês têm uma bela casa — acrescentei, convencionalmente.

— Obrigado — disse Earnest. — Ficamos felizes por você ter vindo. — Ele falava com sentimento, e percebi que me considerava corajosa.

Também percebi que Royal e Eleanor não estavam em lugar nenhum à vista e, apesar de estar aliviada, também fiquei decepcionada. Teria sido bom fazer logo isso com Jessamine ali, me deixando calmo.

Reparei em Carine encarando Edythe com intensidade. Pelo canto do olho, vi que Edythe assentiu de leve. Senti que estava xeretando e afastei o olhar. Meus olhos vagaram novamente para o belo piano no tablado. De repente, me lembrei de uma fantasia de infância na qual, quando fosse mais velha e super rica, compraria um piano de cauda para que Lauren pudesse tocar para mim. Ela não era muito boa, só dedilhava para si mesma em um piano de armário de segunda mão que foi presente de seu falecido avô, mas eu adorava vê-la tocar. Ela ficava tão feliz e absorta, parecia um ser novo e misterioso para mim. Ela até tentou me dar algumas aulas, mas aceitamos o fato de que eu era uma atleta e não uma música.

Earnest percebeu meu olhar.

— Você toca? — perguntou ele.

Eu balancei a cabeça.

— Nem um pouco. Mas é lindo. É seu?

— Não. — Ele riu. — Edythe não contou que gostava de música?

— Hã, ela não disse nada. Mas acho que eu devia ter percebido, não é?

Earnest ergueu as sobrancelhas, confuso.

— Tem alguma coisa que ela não faz bem? — perguntei retoricamente.

Jessamine deu uma gargalhada, Archie revirou os olhos e Earnest olhou para Edythe com expressão paternal, o que foi impressionante considerando o quanto parecia jovem.

— Espero que não tenha se exibido — disse ele. — É grosseria.

— Ah, só um pouco. — Edythe riu, e o som foi contagioso.

Todo mundo sorriu, inclusive eu. Earnest deu um sorriso maior, e ele e Edythe trocaram um olhar rápido.

— Edythe, você devia tocar para ele — disse Earnest.

— Você acabou de dizer que me exibir era grosseria.

— Abra uma exceção. — Ele sorriu para mim. — Estou sendo egoísta. Ela não toca muito, e adoro ouvi-la.

— Gostaria de ouvir você tocar — falei, maneando a cabeça para o lado.

Ela deu um olhar longo e exasperado para Earnest, depois para mim. Em seguida, me puxou pela mão até o banquinho, sinalizando para que eu sentasse com ela.

Assim que me sentei, os dedos dela começaram a fluir pelas teclas, enchendo a sala com uma composição tão complexa e intensa que era impossível acreditar que só uma pessoa a tocava. Senti meu queixo cair e ouvi risinhos baixos atrás de mim.

Edythe olhou para mim casualmente, a música ainda em volta de nós sem pausa.

— Gostou?

Percebi na mesma hora. Claro.

— Você compôs.

Ela assentiu.

— É a preferida de Earnest.

Eu suspirei.

A música mudou lentamente para algo mais suave... familiar. Era a cantiga de ninar que ela cantarolava para mim, só que mil vezes mais complexa.

— Pensei nesta — disse ela baixinho — enquanto via você dormir. É a sua música.

A música ficou ainda mais suave e doce. Não consegui falar.

A voz dela voltou ao normal.

— Eles gostaram bastante de você, sabia? Especialmente Earnest.

Olhei para trás, mas agora a sala imensa estava vazia.

— Aonde eles foram?

— Nos deram privacidade. Sutis, não?

Eu ri, mas franzi a testa.

— É legal eles gostarem de mim. Eu gostei deles. Mas Royal e Eleanor...

A expressão dela ficou tensa.

— Não se preocupe com Royal. Ele é sempre o último a chegar.

— E Eleanor?

Ela riu.

— Ela acha que sou maluca, é verdade, mas não tem problemas com você. Está tentando ponderar com Royal agora.

— O que eu fiz? — Eu tive que perguntar. — Quer dizer, nunca falei com...

— Você não fez nada, amor, sinceramente. Royal é o que mais tem dificuldade com o que somos. É difícil para ele que alguém de fora saiba a verdade. E ele tem um pouco de inveja.

Olhei para ela em descrença, mas a vampira apenas deu de ombros.

— Você é humana. Ele também queria ser.

Isso me fez pensar.

— Ah.

Prestei atenção à música, a minha música. Ficava mudando e evoluindo, mas a base permanecia igual. Eu não sabia bem como ela fazia. Ela não parecia estar prestando muita atenção às mãos.

— Aquela coisa que Jessamine faz é bem... não estranha, eu acho. Foi bem incrível.

Ela riu.

— Palavras não fazem justiça ao que ela faz, não é?

— Não mesmo. Mas... ela gosta de mim? Ela pareceu...

— A culpa é minha. Eu lhe falei que ela era a mais recente a tentar nosso jeito de viver. Alertei-a para ficar longe.

— Ah.

— Pois é.

Esforcei-me para não tremer.

— Carine e Earnest acham você maravilhosa — disse ela.

— Ah. Eu não fiz nada de empolgante. Só apertei algumas mãos.

— Eles ficam felizes por me verem feliz. Earnest provavelmente não se importaria se você tivesse três olhos e pés de pato. Em todo esse tempo, ele se preocupou comigo, com medo de que eu fosse jovem demais quando Carine me transformou, de haver alguma coisa faltando na minha constituição básica. Ele está aliviado. Cada vez que toco você, ele praticamente bate palmas.

— Archie está entusiasmado.

Ela fez uma careta.

— Archie tem uma perspectiva própria da vida.

Olhei para ela por um momento, avaliando sua expressão.

— O quê? — perguntou ela.

— Você não vai me explicar o que quer dizer com isso, não é?

Ela apertou os olhos enquanto me olhava, e um momento de comunicação sem palavras se passou entre nós, quase como vi entre ela e Carine antes, só que sem a vantagem da leitura de pensamentos. Eu sabia que ela não estava me contando alguma coisa sobre Archie, uma coisa que a atitude dela em relação a ele indicava havia muito tempo. E ela sabia que eu sabia, mas não ia soltar nada. Não agora.

— Tudo bem — falei, como se tivéssemos dito tudo isso em voz alta.

— Humm — disse ela.

E como eu tinha acabado de pensar no assunto...

— Então, o que Carine estava dizendo a você antes?

Ela estava olhando para as chaves agora.

— Você percebeu, não foi?

Dei de ombros.

— Claro que sim.

Ela me olhou pensativamente por um momento antes de responder.

— Ela queria me contar algumas novidades. Não sabia se era algo que eu quisesse partilhar com você.

— E você quer?

— Acho que seria uma boa ideia. Meu comportamento pode ficar... meio esquisito nos próximos dias. Ou semanas. Meio obcecado. Então é melhor eu me explicar logo.

— Qual é o problema?

— Não há nenhum problema, exatamente. Archie só vê alguns visitantes chegando logo. Eles sabem que estamos aqui e estão curiosos.

— Visitantes?

— Sim... como nós, mas ao mesmo tempo não. Seus hábitos de caça não são como os nossos. Não devem entrar na cidade, mas não vou perder você de vista até irem embora.

— Uau. Não devíamos... quer dizer, existe algum jeito de avisar as pessoas? — franzi a testa.

O rosto dela estava sério e triste.

— Carine vai pedir que não cacem por aqui, como cortesia, e eles provavelmente não vão criar caso por isso. Mas não podemos fazer mais, por vários motivos. — Ela suspirou. — Eles não vão caçar aqui, mas vão caçar em algum lugar. É assim que as coisas são quando se vive em um mundo com monstros.

Eu tremi.

— Enfim, uma reação racional — murmurou ela. — Estava começando a pensar que você não tinha nenhum senso de autopreservação.

Deixei essa passar, virando a cara, meus olhos vagando novamente pela sala espaçosa.

Ele seguiu meu olhar.

— Não era o que esperava, não é? — perguntou ela, a voz divertida de novo.

— Não — admiti.

— Não tem caixões, nem crânios empilhados nos cantos; acho que nem temos teias de aranha... Que decepção deve estar sendo para você.

Ignorei o escárnio.

— Eu não esperava que fosse tão claro e tão... aberto.

Ela estava mais séria quando respondeu.

— É o único lugar que nunca precisamos esconder.

Minha música chegou ao fim, os últimos acordes passando para um tom mais melancólico. A última nota pairou por um longo momento, e alguma coisa no som daquela única nota foi tão triste que um nó se formou na minha garganta.

Eu me recompus e disse:

— Obrigado.

Parecia que a música também a tinha afetado. Ela me olhou com atenção por um tempo, depois balançou a cabeça e suspirou.

— Quer ver o resto da casa? — perguntou ela.

— Vai haver crânios empilhados em algum canto?

— Lamento decepcionar.

— Ah, tudo bem, mas minhas expectativas estão bem baixas agora.

Subimos a enorme escada de mãos dadas. Minha mão livre acompanhou o corrimão, macio como cetim. O corredor no alto da escada era revestido de madeira da mesma cor clara do piso de tábua corrida.

Ela foi indicando conforme passávamos por portas.

— O quarto de Royal e Eleanor... O escritório de Carine... O quarto de Archie e Jess...

Ela teria continuado, mas estaquei no final do corredor, olhando com sobrancelhas erguidas o ornamento pendurado no alto da parede. Edythe riu ao ver minha expressão.

— Irônico, eu sei — disse ela.

— Deve ser muito antiga — conjecturei. Senti vontade de tocar, de ver se a pátina escura era tão macia quando parecia, mas consegui perceber que era bem valiosa.

Ela deu de ombros.

— Mais ou menos do início dos anos 1630.

Desviei os olhos da cruz para encará-lo.

— Por que vocês têm isso aqui?

— Nostalgia. Pertenceu ao pai de Carine.

— Ele colecionava antiguidades?

— Não. Ele mesmo entalhou. Ficava pendurada na parede acima do púlpito da paróquia em que ele pregava.

Virei-me para olhar a cruz enquanto fazia uma conta de cabeça. A cruz tinha mais de 370 anos. O silêncio se prolongou enquanto eu lutava para apreender o conceito de tantos anos.

— Você está bem? — perguntou ela.

— Que idade tem Carine? — perguntei, baixinho, ainda olhando para cima.

— Ela acabou de comemorar o aniversário de 362 anos — disse Edythe. Ela observou minha expressão com atenção enquanto continuava, e tentei absorver a informação. — Carine nasceu em Londres por volta de 1640, segundo ela acredita. O tempo não era marcado com precisão na época, pelo menos pelas pessoas comuns. Mas foi pouco antes do governo de Cromwell.

O nome despertou alguns fatos desconexos na minha mente, de uma aula de história do mundo que tive no ano anterior. Eu devia ter prestado mais atenção.

— Ela era filha única de um pastor anglicano. A mãe morreu dando à luz. Seu pai era... um homem difícil. Acreditava fortemente na realidade do mal. Ele liderou perseguições a bruxas, lobisomens... e vampiros.

Era estranho como a palavra mudava as coisas, deixava a história menos com cara de aula de história.

— Eles queimaram muita gente inocente. É claro que não era tão fácil pegar as criaturas reais que procuravam. Carine fez o que pôde para proteger esses inocentes. Ela sempre acreditou no método científico e tentou convencer o pai a olhar além da superstição e procurar evidências reais. Ele desencorajou o envolvimento dela. Ele a amava, e quem defendia os monstros costumavam ser tratadas como eles.

“O pai dela era persistente... e obsessivo. Apesar de tudo, conseguiu encontrar provas de monstros de verdade. Carine implorou para que ele tomasse cuidado, e ele ouviu, até certo ponto. Em vez de atacar cegamente, ele esperou e observou por um longo tempo. Espionou um esconderijo de vampiros de verdade que viviam nos esgotos da cidade, e alguns saíam à noite para caçar. Naquela época, quando os monstros não eram só mitos e lendas, era assim que muitos viviam. — Edythe riu de forma sombria — As pessoas reuniram seus forcados e archotes, é claro , e esperaram no local onde o pastor tinha visto os monstros saírem para a rua. Havia dois pontos de acesso. O pastor e alguns de seus homens jogaram um barril de piche em chamas em um enquanto os outros esperavam que os monstros emergissem pelo segundo.

Percebi que estava prendendo a respiração de novo e me obriguei a expirar.

— Não aconteceu nada. Eles esperaram muito tempo e foram embora, decepcionados. O pastor ficou muito zangado. Devia haver outras saídas, e os vampiros tinham fugido de medo. É claro que os homens com suas lanças e machados rudimentares não ofereciam perigo para um vampiro, mas ele não sabia disso. Agora que eles tinham sido avisados, como ele encontraria os monstros de novo?

A voz dela ficou mais baixa.

— Não foi difícil. Ele devia tê-los irritado. Os vampiros não podem se dar ao luxo da notoriedade, senão aqueles provavelmente teriam massacrado o grupo todo. Mas o que aconteceu foi que um deles o seguiu até em casa.

“Carine se lembra da noite com clareza, considerando que é uma lembrança humana. Era o tipo de noite que ficaria na memória. O pai voltou para casa bem tarde, ou melhor, bem cedo. Carine esperou acordada, preocupada. Ele estava furioso, reclamando e resmungando pelo que perdera. Carine tentou acalmá-lo, mas ele a ignorou. E apareceu um homem no meio da pequena sala deles.

“Carine diz que estava maltrapilho, vestido como um mendigo, mas o rosto era lindo e ele falava latim. Por causa da vocação do pai e de sua própria curiosidade, Carine tinha muita informação e estudo para uma mulher daquela época; ela entendeu o que o homem disse. Ele falou para o pai dela que ele era um tolo e que pagaria pelo mal que fez. O pastor se jogou na frente da filha na tentativa de protegê-la... Eu sempre penso nesse momento. Se ele não tivesse revelado o que mais amava, será que nossa história teria sido diferente?

Ela ficou pensativa por alguns segundos, mas prosseguiu.

— O vampiro sorriu. Ele disse para o pastor: “Vá para o seu inferno sabendo do seguinte: o que você ama vai se tornar tudo que você odeia.” Ele jogou o pastor para o lado e pegou Carine...

Edythe parecera perdida na história, mas então, parou. Seus olhos voltaram para o presente, e ela olhou para mim como se tivesse dito alguma coisa errada. Ou talvez tenha achado que me chateou.

— O que aconteceu? — sussurrei.

Quando ela falou, parecia que estava escolhendo cada palavra cuidadosamente.

— Ele quis que o pastor soubesse o que aconteceria com Carine, depois matou o pastor muito devagar com Carine olhando, se contorcendo de dor e horror.

Eu me encolhi. Ela assentiu em solidariedade.

— O vampiro foi embora. Carine sabia qual seria seu destino se alguém a encontrasse naquelas condições. Qualquer coisa infectada pelo monstro teria que ser destruída. Ela agiu por instinto, para salvar a própria vida. Apesar da dor que estava sentindo, rastejou até o porão e se enterrou em uma pilha de batatas podres por três dias. É um milagre ela ter conseguido ficar em silêncio e não ser descoberta. Depois de três dias, o processo acabou, e ela se deu conta do que tinha se tornado.

Eu não sabia como estava meu rosto, mas de repente ela parou de falar de novo.

— Como está se sentindo? — perguntou ela.

— Estou bem.

Ela deu um meio sorriso por causa da minha intensidade, depois deu virou-se no corredor e me puxou junto.

Paramos diante da última porta do corredor.

— Meu quarto — disse ela, abrindo-a e me puxando para dentro.

O quarto dava para o sul, com uma janela de parede inteira, como o salão embaixo. Toda a parte dos fundos da casa devia ser de vidro. A vista do quarto dava para o rio largo e sinuoso, que concluí que devia ser o Sol Duc, e para o outro lado da floresta intocada até a cadeia de montanhas Olympic. As montanhas ficavam muito mais perto do que eu achava.

A parede oeste era completamente coberta de prateleiras de CDs. O quarto era mais bem abastecido do que uma loja de música. No canto havia um aparelho de som sofisticado, do tipo que eu tinha medo de tocar porque tinha certeza de que quebraria alguma coisa. Não havia cama, só um grande sofá de couro preto. O chão era coberto de um tapete dourado grosso, e as paredes eram forradas com um tecido pesado num tom um pouco mais escuro.

— Acústica boa? — deduzi.

Ela riu e concordou.

Pegou um controle remoto e ligou o aparelho de som. Estava baixo, mas o jazz suave dava a impressão de que a banda estava no quarto conosco. Fui olhar a estonteante coleção de música.

— Como organiza tudo? — perguntei, incapaz de encontrar uma ordem nos títulos.

— Hmmm, por ano, e depois por preferência pessoal dentro dessa categoria — disse ela, distraída.

Eu me virei, e ela estava olhando para mim com uma expressão que não consegui identificar.

— Você ainda está esperando que eu fuja aos gritos, não é? — perguntei.

Ela assentiu, lutando contra um sorriso.

— Odeio romper sua bolha, mas você não é tão assustadora quanto pensa. Não consigo imaginar sentir medo de você — falei, casualmente.

Ela ergueu as sobrancelhas, e um sorriso lento começou a se espalhar em seu rosto.

— Você não devia ter dito isso — disse ela.

E ela rosnou, um som baixo do fundo da garganta, que não pareceu nada humano. Seu sorriso cresceu até virar uma exibição de dentes. Seu corpo mudou, ela ficou meio agachada, as costas esticadas e curvadas, como um felino prestes a atacar.

— Hã... Edythe?

Eu não a vi atacar, foi rápido demais. Não consegui nem entender o que estava acontecendo. Por meio segundo, fiquei no ar, e o quarto girou ao meu redor, ficando de cabeça para baixo e voltando para a posição normal. Não senti o pouso, mas de repente ela estava de costas no sofá preto e eu estava em cima dela, com os joelhos nos seus quadris e as mãos dos dois lados da sua cabeça. Ela mantinha os longos braços firmes ao redor do meu corpo, de forma que eu não conseguisse me mexer. Os dentes à mostra estavam a centímetros do meu rosto. Ela fez outro barulho baixo que era algo entre um rosnado e um ronronar.

— Uau — sussurrei.

— O que você estava dizendo? — perguntou ela.

— Hã, que você é um monstro muito, muito apavorante?

Ela sorriu.

— Bem melhor.

— E que estou completamente apaixonada por você.

O rosto dela se suavizou, os olhos se arregalaram e as defesas despencaram de novo.

— Bella — sussurrou ela.

— Podemos entrar? — perguntou uma voz suave no corredor.

Eu me encolhi e teria batido com a testa na de Edythe se ela não fosse tão mais rápida do que eu. Em outra fração de segundo, ela me puxou para que eu ficasse sentada no sofá com ela atrás de mim, minhas costas em seu peito e suas pernas ao redor das minhas.

Archie estava na porta, com Jessamine atrás, no corredor. Meu pescoço começou a ficar vermelho, mas Edythe estava totalmente relaxada.

— Entrem — disse ela para Archie.

Archie pareceu não ter reparado que estávamos fazendo alguma coisa de incomum. Andou até o meio do quarto e se sentou no chão com um movimento tão gracioso que foi meio surreal. Jessamine ficou na porta e, ao contrário de Archie, parecia meio chocada. Ficou olhando para o rosto de Edythe, e eu me perguntei que sensação captava no quarto.

— Parecia que você estava almoçando a Bells — disse Archie — e viemos ver se podíamos dividir.

Eu enrijeci até ver Edythe sorrir, embora não conseguisse saber se por causa do comentário de Archie ou da minha reação.

— Desculpe — respondeu ela, passando um braço possessivo pelo meu pescoço. — Não estou a fim de dividir.

Archie deu de ombros.

— Tudo bem.

— Na verdade — disse Jessamine, dando um passo hesitante para dentro do quarto — Archie disse que vai haver uma tempestade esta noite, e Eleanor quer jogar bola. Está dentro?

As palavras eram bem comuns, mas o contexto me confundiu. No entanto, parecia que Archie era um pouco mais confiável do que o meteorologista.

Os olhos de Edythe se iluminaram, mas ela hesitou.

— É claro que deve trazer Bella — disse Archie.

Pensei ter visto Jessamine lançar um olhar rápido para ele.

— Quer ir? — perguntou Edythe. Sua expressão estava tão ansiosa que eu teria concordado com qualquer coisa.

— Claro. Hã, aonde vamos?

— Precisamos esperar os trovões para jogar bola. Você verá por quê — prometeu ela.

— Devo levar um guarda-chuva?

Todos riram alto.

— Deve? — perguntou Jessamine a Archie.

— Não. — Archie pareceu seguro. — A tempestade vai cair na cidade. Vai estar seco o bastante na clareira.

— Que bom — disse Jessamine, e o entusiasmo na voz dela foi contagiante, naturalmente.

Eu me vi ansiosa com a ideia, apesar de nem saber qual era.

— Vamos ligar para Carine e ver se ela está dentro — disse Archie, se levantando em outro movimento fluido que tive que ficar olhando.

— Como se você não soubesse — brincou Jessamine, e eles saíram.

— E então... o que vamos jogar? — perguntei.

— Você vai assistir — esclareceu Edythe. — Nós vamos jogar beisebol.

Olhei para ela com ceticismo.

— Vampiros gostam de beisebol?

Ela sorriu para mim e depositou um singelo beijo na minha bochecha.

— É o típico passatempo americano.


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Notas finais do capítulo

TT: @pittymeequaliza



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