O Garoto dos Olhos Castanhos escrita por Alison


Capítulo 19
Capítulo XIX - Dia 1


Notas iniciais do capítulo

Espero que gostem!



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Ainda era bem cedo quando acordei, olhei no relógio com o formato de um coração na parede e me mostrava que eram apenas seis horas. Fiquei bem pistola vou confessar. Demorei pra dormir e agora acordo super cedo.

Essa noite foi um tanto complicado de dormir. Lucas se mexe muito quando dorme, parece um cachorrinho com pulga ou um gato tendo pesadelos. Várias vezes acordei com ele me dando pontapés e tapas na cara. Ainda acostumo.

Mas creio que logo minha mãe iria nos chamar mesmo. Meu pai gosta de ir na praia no período da manhã, onde o sol não está tão quente e tem poucas pessoas na praia, mas mesmo assim muitos vendedores ambulantes com diversas comidas maravilhosas.

Sai devagar da cama para não acordar Lucas e fui indo até a cozinha. Minha mãe estava lá, arrumando a mesa. Colocou uma toalha com desenhos de vaquinhas nas bordas. Bem fofo.

— Acordou cedo, hein? Seu pai foi comprar alguns pães e leite numa padaria que tem aqui perto.

— Ah...

Ainda estava bem lerdo pra pensar e muito mais pra falar. Minha mãe soltou uma risadinha e continuou colocando as coisas na mesa. Xícaras, colheres e facas já estavam em nossa disposição.

— Rafael?

— Eu mesmo. – Fiz um leve sotaque carioca no “mesmo”, falhei mas gostava de tentar.

Minha mãe não falou mais nada. Sua expressão que antes era de “comum”, virou uma expressão meio envergonhada ou quem sabe nervosa? Não consegui definir, mas sei que não e uma expressão de que coisa boa irá vir.

— Fala, mulher! – Falei ainda descontraído, não tirando o tom de brincadeira.

— Você não anda ficando... – Ela fez sinais entre aspas - ...com o Lucas, não é?

Gelei. Por um momento senti que meu rosto tinha feito meu sorriso sumir. Na mesma hora eu fiz ele voltar, não podia deixar que ela percebesse nenhuma mudança facial. A região da minha boca tremia pra fazer o sorriso sumir. Cheguei até mesmo a sentir um imenso calor no meu corpo. Um calor gigantesco.

— Como assim, mãe? Ficando? – Tentei ao máximo falar com convicção. Não tremer a voz e nem demonstrar insegurança.

— Não sei... – Ela não parava de me olhar e eu só queria desviar o olhar. – É que eu ando tendo uns pressentimentos meio estranhos ultimamente.

— Como assim? – Ainda firme.

— Você sabe... Eu sonhei com minha avó está noite. Na verdade ando sonhando muito com ela...

Gelei mais ainda. Isso pode parecer muito estranho, mas quando minha mãe sonha com esta avó é como se fosse um grande aviso que ALGO está acontecendo com algum membro da família. Não estou brincando, isso funciona mesmo. Teve uma vez que minha mãe me contou que sonhou com ela e dias depois meu pai bateu o carro devido a um grande estresse que ele não contava pra gente.

Teve várias outras vezes, diversos motivos, parece que era como se essa avó quisesse sempre avisar minha mãe de coisas que nos dá família estivéssemos escondendo dela. Minha mãe amava ela e o falecimento dela dói até hoje pra minha mãe.

— Mãe! Eu não estou ficando com ele, somos apenas amigos! Ele é tipo meu irmão, tipo alguém do meu sangue!

— É... Devo está pensando demais. – Ela soltou uma risadinha.

Engoli seco.

— Mas... E se eu tivesse? Não que eu esteja, só curioso pra saber como seria sua reação! Iria surtar né? – Fiz o máximo pra conseguir soltar uma risada.

— Você sabe que eu não gosto muito. Não acho certo! – Ela me olhou – Pra mim tem que ser homem com mulher.

É. Ela nunca me aceitaria numa boa. Ela iria lutar muito contra mim. Talvez até aceitar a cura gay que está passando na televisão atualmente. Absurdo.

— Fique tranquila! Irei ter uma linda mulher, com muitos filhos. Te darei vários netos, aliás... Que nojo ficar com homens.

— Acho bom!

— Bom dia... – Lucas apareceu na cozinha.

Olhei pra ele. Acho que ele escutou aquilo que eu disse. Espero que ele não fique chateado. Falei aquilo da boca pra fora só pra me livrar dos questionamentos da minha mãe.

— Lucas, querido! Já já teremos o café da manhã. O pai do Rafa foi buscar e já deve estar voltando.

— Tudo bem. – Ele voltou pro quarto.

Fui atrás. Chegando lá ele estava arrumando a cama. Foi fofo. Ele estava fofo. Seus cabelos completamente bagunçados. Sua roupa de dormir toda amassada e aquele rostinho de sono o deixava ainda mais lindo.

— Ei... – Cheguei perto dele. – Desculpa, acho que você ouviu a conversa...

— Não se preocupa. Só espero que você não me troque por uma mulher... Você sabe que podemos ser uma família e ter filhos mesmo assim? Que sua mãe poderá sim ser avó!

— Eu sei... É que ela estava desconfiada e só falei agora pra eliminar isso dela...

— Eu entendo, mas foi meio difícil escutar aquilo. – Ele olha pra mim – “Nojo de ficar com homens”, foi meio pesado! Você tá alimentando o preconceito dela.

— Fui idiota né? Sabe, não estou preparado ainda pra isso. Falar pra ela...

— Você terá que falar um dia. Ela é sua mãe, irá te amar de qualquer jeito, acredite nisso e encontrará forças um dia pra contar.

— Entendi...

Lucas me deu um selinho e me abraçou forte. Depois me soltou e olhou nos meus olhos enquanto passa a mão em meu rosto. Sorriu pra mim, me confortando como ele sempre fez.

— Vamos lá com ela! Sua mãe é legal.

Concordei com ele. Voltamos pra cozinha e então minutos depois meu pai chegou com as compras da padaria. Tomamos o café da manhã todos juntos na mesa das vaquinhas. Meu pai estava bem contente, comia com alegria e contava tudo que tinha visto na rua.

Chegou até mesmo contar que viu um gato correndo atrás de um cachorro e que isso foi a coisa mais impressionante que ele já tinha visto na vida.

— O mundo tá mudando! – Falou ele num suspense.

— Aí querido. Tudo isso por causa de um gato correndo atrás de um cachorro?

— Claro! Era pra ser o contrário. Onde já se viu? Um GATO, miau, bichano, bola de pelo, língua áspera correr atrás de um cachorro gigantesco daquele? Gente vocês tinham que ver! O cachorro estava cagando de medo.

— Aí pai!

— Literalmente!

— Estamos comendo! – Minha mãe quase gritou, mas rindo.

Foi engraçado. Meu pai tinha o dom de fazer todo mundo rir não importava o que fosse. Pode ter certeza que ele irá contar isso para todos do trabalho dele. O dia que o cachorro correu de um gato. Acho normal, afinal tem gatos que parecem estar possuídos pelo demônio, mas amo eles e meu sonho é ter um igual a da Hermione dos filmes de Harry Potter, o famoso gato de cara achatada, como diz minha mãe.

Depois de comermos, ficamos sentados olhando pra TV até dar umas oito horas. Iríamos então para a praia. Meu pai já estava louco pra dar um mergulho gigantesco na água do mar.

— Vou engolir litros de água pra ver se é salgada mesmo! – Ele soltou uma risadinha semelhante a: hihihi

Ele se trocou. Estava com um short de nadar com desenhos de dragão. Eu que comprei pra ele! Por isso tem esse desenho de dragão lindo. Queria pra mim, mas não cabe e não tinha do meu tamanho. Bem triste.

Minha mãe também já estava pronta. Ela era tímida e jamais usaria um biquíni, então colocou seu belo maio simples e pra completar um short pequeno neutro pra dar aquela escondida básica. Ambos pegaram seus chinelos e óculos de sol e saíram com o protetor na mão.

Olhei pra Lucas e ele me olhou. Demos risada.

— Seus pais são um lance!

— Tenho que concordar. Já vamos descer também?

— Ah, vamos colocar o short e dar uma volta por aí, depois só tirar a blusa e entrar na praia.

Concordei. Fui buscar o meu short. Ele era até que bonito. Azul marinho e seu único detalhe era um minúsculo golfinho na parte direita, mal dava pra ver ele. Lucas também pegou o seu. O dele era rosa, parece que é sua cor oficial. Queria um rosa, mas não pude comprar!

Lucas tirou a blusa e o sua bermuda de dormir, ficando apenas de cueca vermelha na minha frente. Sorri pra ele.

— Nossa! Deixa eu secar um pouco.

— Aí Rafael! Nem tem o que secar aqui, vou sumir desse jeito.

— Ah, então vamos sumir juntos! – Ri e comecei a tirar a minha roupa. Fiquei só de cueca também. – Vamos tirar uma foto?

— Assim? Bora!

Fui atrás dele. Ele pegou meu celular e esticou a mão. A primeira foto foi eu simulando agarrar os peitos dele. A outra eu esmagando o pescoço dele e então a mais bonita de todas surgiu. Eu estava beijando o pescoço dele e ele mostrando a língua. Ficou perfeita e ótima para plano de fundo! Ele concordou.

Por fim estávamos pontos. Coloquei uma blusa branca e ele uma da mesma cor, trancamos a porta e fomos direto pro elevador. Aquele elevador! Lembrei dos momentos e comecei a soltar umas risadinhas básicas. Lucas percebeu e riu também, quando ele abriu fomos saindo pela porta principal.

Foi quando um rapaz chamou a gente. Eu e Lucas olhamos e vimos que ele estava numa salinha pequena. Quando nos aproximamos eu consegui ver que tinha várias telas mostrando as filmagens das câmeras. Era o segurança safado que estava nos espionando!

Ele até que era bonito. Devia ter uns vinte e oito anos. Tinha a pele bronzeada, cabelo bem cortado e seus olhos eram quase pretos. Seu sorriso era totalmente branco e percebi isso na hora quando ele sorriu pra nós dois.

— Aproveitaram a noite? – Ele riu.

— Aí! Nós perdoe por ontem. – Lucas foi fofo, como sempre.

— Magina! Foi divertido. É bom saber que tem gente LGBT aqui, além de mim.

— Então você também é... – Não consegui falar a palavra. Não saia!

— Gay? Sim. Sou sim! Fico feliz de ver vocês dois juntos. Me lembrou eu e meu ex namorado. – Ele sorriu pra gente.

— Só não conte para meus pais. – Falei sem pensar. Vai que ele fala e acaba com a semana? Daria muita merda, cara.

— Hum. Tudo bem, não assumido. Faz parte! Pode deixar que não irei contar nada pra ninguém.

Sorri e agradeci. Lucas inventou uma desculpa pra sairmos dali. Rapidamente já estávamos na calçada do hotel. Lucas estava rindo e estava impressionado com aquilo. Ele até falou que o cara deve ter batido uma vendo nos dois se pegando. Fiquei pasmo na mesma hora que ele falou.

***

Andamos por toda redondeza da praia, foi divertido. Já tínhamos aonde ir quando anoitecer. Iríamos nas feiras! Tinha um lugar aqui pra isso, iria funcionar apenas a noite e deve lotar de barracas de comida, brinquedo. Tinha até aqueles box próprios, seguia por uma rua inteira praticamente. Era enorme. Com toda certeza aqui a noite deve ser muito movimentado. De dia na praia de noite na feira! Importante é não parar de comer.

Na praia ficamos sentados. Alugamos um daqueles guarda-sóis e de lá minha mãe e meu pai não saia. Eles já tinham ido na água fazia tempo. Dava pra ver pelo cabelo da minha mãe que estava todo estranho! Era engraçado. Meu padrasto já estava com um espetinho na mão, se deliciando e fazendo charme com seus óculos de sol. Família doida.

— Último que chegar é um frango assado cantor de sertanejo! – Falei qualquer coisa que me veio em mente. Escutei meu pai soltar um “Ei”. Ele ama sertanejo.

Corri. Escutei que Lucas já estava atrás de mim também. Comecei a rir e correr muito. Era muito estranho, eu só queria me jogar no chão e ficar rindo. Será que eu tô drogado?

Quando cheguei perto suficiente da água eu me joguei completamente. ME ARREPENDI. Fui com as duas mãos na areia e doeu. Cara como doeu isso! Não esperava por isso, mas fingi que nada aconteceu e continue pleno na água.

Lucas se jogou do meu lado. Olhei pra ele e dei mais risada. A gente estava se divertindo tanto que eu não tenho nem como explicar! Estava tudo tão incrível.

— Que delícia! Água do mar é muito boa, não é? – Ele disse chegando perto de mim.

— Muito mesmo! Queria poder ver mais pra frente! No fundo! – Joguei água nele.

— Aí seu babaca! – ele jogou também.

Ficamos ali. Jogando água um jogo outro e dando risada, não se importando com as pessoas que estavam por perto. Estava feliz e isso que importava. Essa viagem com ele é a melhor coisa que aconteceu este ano! A melhor!

Finalizamos o dia na areia, bem na beira da praia aonde a água ainda chegava perto da gente. Gostava de enfiar a mão na areia. De pegar a areia molhada e apertar. Quando eu apertava ela ficava totalmente dura, eu soltava a força e ela ficava toda molenga. Era muito legal. Eu parecia uma criança de oito anos pela primeira vez na praia.

Almoçamos até mesmo na praia. Tinha o quiosque aqui perto e fizemos uma bela refeição. A tarde que passamos aqui também só foi comendo. Meu pai não podia ver um vendedor ambulante que já tava gritando e comprando seja lá o que ele estava vendendo. Foi a primeira vez que tomei açaí. A primeira fez que Lucas comeu cupuaçu. E nossa primeira vez que comemos camarão. Deus! Como é gostoso aquilo. Era caro, mas pra mim valeu cada centavo pago.

Estávamos agora, no final da tarde, voltando pro hotel. Meus pais iriam descansar, mas eu e Lucas só iríamos tomar banho e nos arrumar pra ir na feira que já deve estar abrindo. Meu pai até queria ir, mas ele ficou bem queimado já nesse primeiro dia que queria passar a noite toda na cama com minha mãe passando creme nas costas dele. Tadinho.

***

Lucas não podia ver um box de acessórios que já ia entrando. Este já era praticamente o quinto que ele entrou só está noite. Tinha diversos colares, pulseiras, brincos. Tudo feito, eu acho, artesanalmente. Tinha conchas e várias outras coisas que lembrariam a praia. Já tinha comprado dois colares daquelas pedras de significados. Não entendo nada disso, mas ele me deu um.

Era uma Ágata Rosa e diz o vendedor que ela é indicada para amizade, amor, justiça e mais algumas coisas. Ela transmite calma, tolerância e muito amor em um relacionamento. Talvez seja isso que fez Lucas comprar para mim.

— Olha isso, Rafa! – Lucas pegou um uma baleia feita de madeira. Era muito bonita e bem detalhada, tinha duas falhas mas eram coisas minúsculas. – Eu amo baleias, você sabe disso né?

— Vou comprar pra você! – Peguei a baleia e analisei.

— Não precisa! Eu tenho dinheiro. – Ele falou meio sem jeito, mas não deixaria ele comprar. Queria recompensar o presente que ele tinha acabado de me dar.

— É um presente pra meu pequeno lírio. – Apertei as bochechas dele com força.

Não percebemos que estávamos falando isso na frente do balcão, onde uma senhora que deve ser a dona da loja estava sorrindo pra nós.

— Vocês formam um belo casal. – Ela sorri pra gente como uma linda vovó.

Confesso que isso me surpreendeu um pouco. Pensei que ela iria reagir negativamente com isso. Já que no meu pensamento os senhores e as senhoras são de outra época, não estão digamos, acostumados com isso. Mas essa senhora me surpreendeu totalmente. Parece que sua mente é bem atualizada e longe de qualquer tipo de preconceito.

— Ah, obrigado! – Sorri e coloquei a baleia de madeira no balcão – Vou levar.

A velha pegou e embrulhou com todo cuidado a baleia de madeira. Ela disse enquanto fazia isso, que essa baleia poderia ser o símbolo do nosso carinho. Nos contou a história do seu falecido marido, que era artesão e fez um lindo pássaro de madeira que ela guarda até hoje e diz ela que com aquele pássaro, ela sente seu marido e nunca se vê sozinha.

Achei linda a história de amor dela. Talvez realmente essa bela baleia seja nosso símbolo, afinal é o animal que o Lucas mais ama em toda vida. Um dia ainda vou levar ele pra ver alguma baleia de verdade. Ele me disse que nunca viu uma, mas que só pelas fotos e vídeos na internet foram o suficiente pra de apaixonar por essas criaturas.

Continuamos andando pela multidão no meio da feira. Realmente lotava muito aqui a noite, era pessoas de todos os tipos e tamanhos. Coisas pra comprar aqui também era diversas. Dava pra gastar pouco e levar muito.

As coisas estavam tranquilas, por enquanto. Afinal, estamos no primeiro dia ainda.


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Notas finais do capítulo

Vejo vocês no próximo!