Carpe diem: Viva Intensamente escrita por Pauliny Nunes


Capítulo 6
Capítulo 5




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/742188/chapter/6

Eva/Roberta/Carla estaciona o Mustang em frente a uma casa bem chique. De fato o bairro todo é bem classe alta, o que confirma que eu realmente não conheço mesmo São Paulo. Além disso, já tenho uma ideia da personalidade da Eva/Roberta/Carla: garota rica querendo testar seus limites. Ela toca o interfone, sendo atendida prontamente pelo porteiro.

— Bom dia, senhorita Sarah - ele diz. Pronto, mais um nome para a minha coleção. — O senhor Roberto a aguarda.

—Obrigada, Leonardo - agradece a Eva/Roberta/Carla/ Sarah, com toda a polidez que ela não teve comigo.

Entramos naquela enorme casa, enorme mesmo, só a Sala era do tamanho da minha casa e é terrivelmente branca para quem está de ressaca. Caminho um pouco mais rápido para acompanhar os passos de Eva (sim, só Eva. Vai saber quantos nomes essa criatura tem?). Sorrio para chamar sua atenção o que eu consigo facilmente.

— Do que está rindo, Odin? - pergunta Eva me encarando.

—Ao olhar essa casa, já entendi muita coisa sobre você.

— Ah... Tem certeza? - pergunta Eva, torcendo a boca.

—Absoluta- respondo confiante.

— Sarão! - grita um cara do topo da escada. Ele é bem diferente do tipo de pessoa que achei que encontraria dentro da casa.

O rapaz deve ter seus vinte anos, cabelos cumpridos com dreads, camiseta com o rosto do Bob Marley e de samba calção. Ele desce a escada pelo corrimão e praticamente salta em cima da Eva, a erguendo com seu abraço de urso. Pelo cheiro, não toma banho desde que nasceu.

— Olá, Bob- diz Eva sorrindo. Ela aponta para mim e diz — Esse é o Odin. Odin, esse é o Roberto, ou melhor, Bob.

— Não Marley, mas - digo tentando fazer uma piada. Pelo olhar deles não funcionou muito, então dou um soco no ar fingindo que tinha um mosquito ao redor. Estendo minha mão na direção do Bob — Prazer, Bob.

— Na paz, irmão - diz Bob me abraçando. Quando ele finalmente me solta olha para a Eva e diz — Vocês vieram participar da sessão?

— Sim- responde Eva, olhando para mim enigmática — Preparou tudo?

— Sim, como você não me avisou, tem mais pessoas que irão participar. Eu sei que você só faz entre duas pessoas...

— Eu não me importo. Na verdade, será até bom ter mais gente participando, assim ele não vai ficar tão inibido com todo mundo fazendo o mesmo- responde Eva. Ela olha para mim e diz — Pode ter certeza que você vai gostar. Todo mundo no fundo gosta, mas tem medo de assumir. Os homens até admitem que gostam...

— Okay... Quer dizer então que agora vou participar de uma orgia?- pergunto.

Eva e Bob me encaram atônitos. Não sei se eu acertei o que iríamos fazer, mas os dois começaram a subir as escadas em silêncio. Respirei fundo e comecei a subir atrás deles.

Fico pensando em como seria participar de uma orgia. Meu corpo não é do tipo que atrai as mulheres, na verdade ele nem se quer me atrai. Desculpa corpo, mas essa é a verdade. Melhor parar de pensar no meu corpo e me preocupar com coisas maiores e piores. Se for uma orgia, terão outros caras... E mulheres... Isso vai ser estranhamente estranho. Talvez por isso a Eva simplesmente só participe a dois. Agora, a dois é ela e um cara, ou a dois é ela e um casal, ou dois caras, ou duas mulheres... Anões? Será que a Eva curte anões?

Bob para em frente a uma porta de madeira branca e se vira em minha direção. Ele sorri e diz:

— Antes de entrar preciso que você faça o nosso juramento.

— Okay... - digo balançando os ombros, fingindo não me importar com nada. Na verdade eu me importo, pois lembrei que não tenho camisinha no bolso.

— Erga a mão direita e fale junto comigo - diz bobo, sério — Prometo não falar sobre nada do que acontecer na sessão.

— Prometo não falar sobre nada do que acontecer na sessão - repito.

— Não falarei sobre nada do que acontecer na sessão.

— Não falarei sobre nada do que acontecer na sessão.

— É sério, prometo que não falarei sobre nada do que acontecer na sessão - diz Bob, segurando meus ombros. Meus olhos se arregalam diante da força de Roberto. Pelo visto, o lance é bem sério.

— Acho que ele já entendeu sobre não falar nada a respeito - alega Eva, tirando as mãos de Roberto dos meus ombros. Ela revira os olhos e diz - Prossiga Bob.

—Não irá julgar sobre o que ver sentir, beber, cheirar, tocar e principalmente, as outras pessoas que estarão na mesma sala que você. - continua Bob.

— Não irei julgar sobre o que ver... Sentir... Beber, cheirar, tocar e principalmente, as outras pessoas que estarão na mesma sala que você - repito. Okay, Cheirar?

— Ao colocar os pés naquela sala irei aceitar tudo o que meu chefe mandar: no caso, eu - diz Bob apontando para si. — O senhor supremo do universo, Soberano das artes artesanais... Bob.

—Sério? - pergunto olhando para a Eva — Isso pode ferir a condição do nosso acordo...

— Não vai. -garante Eva — Jure.

— Ao colocar os pés naquela sala irei aceitar tudo o que meu chefe mandar: O senhor supremo do universo, Soberano das artes artesanais... Bob. - repito sem muita motivação.

—Gostei... - diz Bobo sorrindo. Ele abre a porta e diz — Bem vindos a Verdade.

Entro logo atrás de Eva e encontro... Um quarto vazio. Não totalmente vazio, mas sem móveis. As únicas coisas que tem no quarto é uma mesa no centro e ao redor dela almofadas vermelhas.

—Sente-se que eu já volto - diz Bob fechando a porta.

Eva senta, cruza suas pernas e fecha seus olhos. Eu tento fazer o mesmo, mas a minha mente não para nem por um segundo. Respiro, mas fico pensando no que acontecerá a seguir.

O silêncio da sala começa a me incomodar, então a porta se abre novamente, entrando mais um casal. Ele segue o estilo do Bobo, sem os Dreads e a garota segue a linha nerd com seus óculos fundos de garrafa e dentes metálicos, eles sentam nas almofadas junto com a gente. Bob coloca uma chaleira em na mesa de centro e entra os copos para cada um de nós. Logo em seguida ele pegue a chaleira e serve a cada um de nós sem dizer nada. Olho para dentro do meu copo e um líquido transparente com umas folhas verdes.

— Podem beber agora - ordena Bob sentando em seu lugar.

O casal é o primeiro a beber, pela careta deles o gosto não é muito bom. Olho para Eva que está me encarando, curiosa. Percebo que ela está esperando eu beber, mas não farei isso. Dessa vez eu não caio na armadilha dela.

—Primeiro as damas - digo apontando meu copo para ela.

Eva sorri e coloca o copo em seus lábios, o virando lentamente. Assim que termina aponta o seu copo em minha direção. Droga, agora eu tenho de beber. Viro em uma golada, aquilo é horrível demais!

— Vamos começar a sessão - diz Bob bebendo também. — Delícia. Agora eu vou explicar...

— Qual é o seu nome?- pergunto para Eva.

—Ei, parceiro. Eu sou o líder – intervém Bob.

— Você não tem cara de líder - solto.

—Não tem mesmo - diz o outro rapaz.

— Desculpa Bob, mas você... - diz a menina

—Você é péssimo como líder - solta Eva, colocando a mão na boca.

—Tudo bem, então façam o que quiser, eu ligo muito para isso, mas acreditem que não ligo... - diz Bob , cruzando os braços.

—Qual é o seu verdadeiro nome? - pergunto para Eva.

—Não sei - responde ela sorrindo. — Eu não sei qual é o meu verdadeiro nome. Há muito tempo que tenho tantos que ele se perdeu no meio deles... Mas eu gosto que me chame de Eva.

— Pra que servem os nomes? - pergunta o namorado da menina nerd — Meu nome é Lucicraldo, o que fez a minha mãe olhar para mim e dizer ele vai se chamar Lucicraldo? Eu acho que nomes só servem para nos envergonhar.

—Eu acho que existe vida após a morte - diz a garota nerd — E quem sabe na próxima seu nome será mais bonito. Eu gosto do meu. Betina. Be-ti-na.

— Não há como saber se tem vida após a morte - diz Bob, sério — Pois podemos estar vivendo a próxima vida só que não sabemos...

— É como um jogo de vídeo game. - digo, empolgado com o assunto — Toda vez que damos game over e resetamos, perdemos todas as informações.

— Então podemos estar mortos agora!- exclama Betina.

— Se estamos mortos eu sei exatamente quando o Odin morreu - diz Eva — Você morreu ao pular do prédio.

—EU não pulei do prédio. - alego sorrindo.

— Sim, você pulou - diz o elefante rosa do meu lado.

— O que é isso? - grito olhando para o elefante. Vocês não tem ideia do quanto é estranho ver um elefante rosa, do seu lado.

— Um elefante rosa - diz o urso de pelúcia vindo em minha direção. — Acalme-se, as coisas ficarão piores. - ele olha para o elefante e diz — Você não deveria ter contado isso para ele.

Olho para frente e não tem mais ninguém na sala, só o elefante o urso... Percebo que a cortina da janela está sacudindo rapidamente, então me levanto para ver o que pode estar fazendo isso.

— Cara... Não vá a janela. - alerta o urso de pelúcia. — Você não vai querer ver isto.

Não dou ouvidos ao urso de pelúcia, claro por ele ser um urso que não deveria estar falando. Sigo em direção à janela, abro a cortina e um enorme tornado vem em minha direção, me afasto da janela e encaro o urso que sacode a cabeça me repreendendo. De repente o tornado toma a casa, vejo o telhado saindo e quando olho para o quarto, Eva está sentada com os olhos fechados. Corro em sua direção e a abraço. Vejo o tornado carregar tudo consegue então fecho meus olhos apertando mais ainda a Eva. Sinto o tornado carregar meu corpo...

—— Agora só nos resta esperar...

Abro meus olhos e estou sem Eva e em uma sala branca. Vou em direção à porta, mas está trancada, então decido ver pelo vidro, há várias pessoas do lado de fora, mas que não conseguem me ver. Uma delas abre a porta, passando por mim como se eu estivesse invisível. Ela vai em direção à cama no final da sala. Decido acompanhá-la. Ela troca a bolsa de sangue e sai, mas eu me aproximo da cama. O doente está com o lençol no rosto. Minha curiosidade não me permite deixar pra lá, então eu tiro o lençol e o que vejo me assusta.

— Odin! Odin!

— Cara, acho que ele chapou mesmo.

— Você deve ter dado muito pra ele.

— Odin!

Meu corpo é puxado para fora da sala branca, vou em direção à voz que me chama. Uma luz me suga por completo.

— Odin - chama Eva me dando um forte tapa no rosto. Eu acordo com aquela dor e percebo que estamos dentro do Mustang— Até que enfim. Vamos.

— Para onde? - digo olhando para o lado de fora da janela. Não posso acreditar no que vejo — O que estamos fazendo em um aeroporto?

— Estou atendendo ao seu pedido. - diz Eva, séria.

—Que pedido? - pergunto sem entender nada.

— Pular de paraquedas. Uhuuuuuuuuuuuuu!- grita Bob surgindo na janela — Vamos lá, pessoal!

***

 

— EU NÃO VOU PULAR DE PARAQUEDAS!- grito segurando na porta do carro, sendo puxado por Eva, Bob e o casal esquisito.

—Parem - ordena Eva aos outros. Ela aperta o meu ombro e diz — Escuta aqui, Odin, você encheu a paciência de todos nós durante a sessão, então não me venha com essa de que deseja desistir agora.

— Você me drogou! - acuso apontando meu dedo pra ela— Você acha mesmo que eu ia aceitar fazer uma coisa dessas?! Eu morro de medo de altura!

— Então como ia pular de um prédio? - pergunta Eva, séria.

— Eu... Estava desesperado. Desespero leva as pessoas tomarem medidas desesperadas! – explico— Agora eu não estou mais desesperado...

— E nem foi drogado - retruca Eva com os braços cruzados — De onde tirou isso?

— De onde? Daquela bebida estranha que esse doidão aí me deu- digo apontando para o Bob.

—Cara, era só erva chinesa que ativa um componente no seu cérebro que o faz ficar relaxado a ponto de falar a verdade. Não é uma droga- diz Bob erguendo os braços. - O que achou que fosse?

— Não sei algum alucinógeno? - questiono.

— Brow, eu não curto essas paradas não - diz Bob rindo.

—Entendi... Você teve um ataque de histeria - diz Betina — Sabia que um ataque de histeria do riso matou um vilarejo inteiro na França?

— Para tudo. - digo olhando para eles — Quer dizer que eu não vivi nada daquilo.

— Depende do que você viveu - diz Bob.

— Do que se lembra, Odin? - pergunta Eva, curiosa.

— Eu bebi o chá, perguntei seu nome e você disse que não sabia. Depois eu vi um elefante rosa, um urso, tornado, quarto branco e... Eu me vi deitado em uma cama de hospital.

Todos me encaravam sérios, logo em seguida, um olha para o outro e começaram a rir , menos Eva que ainda me encara com um olhar misterioso.

— Realmente você teve histeria, meu caro - diz Betina.

— Cara, você só gritava "Quero andar de paraquedas" a sessão inteira - diz Bob.

— É mano... Você noiou - confirma Lucicraldo. - Então decidimos pular de paraquedas.

— E nós vamos - confirma Eva — Todos nós.

— Eu não vou - digo olhando para a Eva.

— Ah, não vai? - pergunta Eva indo em direção do carro. Ela pega a chave e risca a lateral do carro. Por que ela é tão má? Ela vai para o outro lado e pergunta — Você vem ou não?

— Eu irei, mas antes quero rever as nossas condições.

— Tudo bem - diz Eva que acena para o pessoal ir em direção ao avião. Ela cruza os braços e me encara - O que deseja agora?

— Nada de arranhado no carro. Nada de me embebedar ou me drogar - digo sério. - Por enquanto é isso que eu me lembro.

— Eu não droguei você - argumenta Eva.

— Tá, mas caso queira, isso está fora de cogitação.

—Como quiser - diz Eva levantando os braços — Eu também quero acrescentar algumas condições.

— Pode falar - digo cruzando os braços.

— Não quero mais preconceitos vindo de você - diz Eva apontando em minha direção — E não pode se apaixonar por mim, entendeu?

— Apaixonar-me por você? - pergunto confuso. — Só vamos passar sete dias juntos, ninguém se apaixona em sete dias.

—Promete que irá cumprir essa condição? - pergunta Eva, irritada.

—Não se preocupe, não estou com planos de me apaixonar por ninguém - respondo sério. Passo por ela e continuo — Não se esqueça de que foi por amar alguém que estou nessa situação. Que só de me lembrar de me deu vontade de pular de paraquedas.

***

Depois do treino e das orientações sobre como saltar, os instrutores se dividiram para cada um saltar com um de nós, exceto Eva que ia saltar sozinha.

—Ela pode saltar sozinha? - pergunto para o meu instrutor olhando para a Eva.

— Quem, a Lúcia? Ela já é instrutora de paraquedismo - revela meu instrutor — E olha que nem faz muito tempo que ela estava no mesmo lugar que você. Só que sem a tremedeira e o medo.

— Vamos lá - grita o piloto.

Entramos naquele avião e a primeira que faço é sentar no meu canto e rezar. Rezar para a porta do avião não abrir e sermos obrigados a voltar, caso ela abra, meu instrutor não consiga saltar e a gente volte para o chão. Se nada disso acontecer, que pelo menos meu paraquedas se abra e tudo acabe bem. E quando digo bem, eu vivo e inteiro. Inteiro mesmo, sem nenhum arranhado. E se cairmos no mar? O mar não está tão longe assim... E se cairmos no Tietê? Na marginal? E tiver um caminhão. Meu corpo todo está soando... Sinto uma mão segurar a minha.

— Vai dar tudo certo, Odin - diz Eva, sorrindo. O sorriso dela é tão reconfortante. É incrível como ela consegue ser tão mandona e tão legal ao mesmo tempo. Sorrio de volta...

— Vamos lá! - diz o instrutor abrindo a porta. Ele se posiciona com o Bob e em poucos minutos ele salta.

Depois um por um vai saltando com Betina e Lucicraldo. Eva se posiciona perto da porta, sorri para mim e salta. O frio na minha barriga é insuportável, estou prestes a morrer...

— Nossa vez - avisa o meu instrutor nos acoplando. Ele nos posiciona em frente à porta — Aproveite a vista.

— OHHHH MEU DEEEEEEEEEEEEEEEEEUUUUUUUUUUUSSSSS!!

***

Você já andou de montanha Russa? Sabe aquela sensação de frio na barriga, medo, alegria? Saltar é muito mais!

O Vento no meu rosto, aquela sensação de liberdade, alegria, poder, medo tudo ao mesmo tempo e quatro mil pés separando eu do chão. No vazio da liberdade, eu me tornei uma águia. Nem todo o grito do mundo conseguiria expressar aquele momento.

Olho para o lado e encontro Eva. Ela está com seus olhos fechados e de braços abertos, como se tivesse nascido para voar. Aquele é o seu lugar. Ela mergulha naquele espaço sem se importar com nada. Um anjo... Então ela abre os olhos e mergulha mais saindo do meu campo de visão. Olho o chão se aproximando cada vez mais, mas o meu instrutor não se importa. Estamos muito perto, muito perto. Eu vou morrer... Tenho certeza de que vou morrer... É o fim... Meu instrutor puxa o paraquedas e somos levados a alguns metros para cima. Nossos pés tocam o chão.

Sim, aquela foi a melhor coisa que já fiz na minha vida.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!




Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Carpe diem: Viva Intensamente" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.