Azul & Violeta escrita por TSLopes


Capítulo 11
Capitulo 10 - Angel


Notas iniciais do capítulo

Sentiram saudades da nossa professora?



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/733458/chapter/11

Mais uma vez encontrei-me no mundo dos sonhos, onde o passado e o presente em que eu me situava oscilava conforme minhas lembranças.

Encolhi-me no pequeno espaço de um metro quadrado, trancado por uma janela com grades. Estava escuro e quente, minhas mãos presas por algemas soavam. Escutei risadas vindas do lado de fora da janela e eu sabia que estavam rindo de mim. Lágrimas escorriam pela minha face, pois o medo me envolvia por completo.

Medo de continuar presa. Medo de jamais ser livre. Medo deles abrirem a janela e fazerem o que ameaçavam.

Já contei para minha mãe sobre isso, mas ela apenas sorrira e dissera que seria ótimo pra eu ter um relacionamento com eles. Para ela, eu teria de ser apenas um objeto, uma marionete, uma boneca.

Mas eu não queria ser um objeto! Olhei para mim mesma e senti nojo. Por que estou com uma camisola de seda tão curta? Por que estou levando a sério o que mamãe falava? Por que deixei eles fazerem o que quisessem de mim? 

O asco misturado com repugnância de mim mesma era tão forte que grudava em minha pele. Foram minhas atitudes que me levaram a ser o brinquedo deles. Fora minha insegurança que os motivara a me aporrinhar.

Então me lembrei da frase que meu irmão me dissera.

Você é dona do seu próprio destino.

Ergui a cabeça. Sim! Sou dona do meu próprio destino, sou eu que vou escolher o que vou fazer da minha vida! Chega de me esconder. Chega de tentar me disfarçar. Chega de me deixar ser manipulada.

Com força, quebrei as grades e me levantei. 

— Eu não temo mais vocês! Sou eu que escolho o que faço e eu escolho se livre! – anunciei aos berros.

A janela se abriu e eu pulei para dentro dela. Estava na sala cheia de ferramentas agrícolas e enferrujadas, e os garotos que antes zombavam de mim agora me olhavam surpresos.

Senti-me uma idiota. O que estou fazendo? Não é nada adequado sair quebrando as janelas e ir gritando desse jeito. O senhor careca, com a barba preta e uma carranca na cara veio até mim e segurou meus braços, dizendo entre dentes.

— Não gosto de garotas tentando serem homens. Por isso, vou te colocar no seu lugar.

Eu entrei em pânico, porque sabia o que iria acontecer. A recordação da dor do chicote fincando em minha pele me fezsacudir e tentar empurrá-lo como louca.

Infelizmente, não consegui impedi-lo de me prender dentro do pequeno espaço novamente . Ele afastou meus cabelos, rasgou minha camisola e levantou o chicote.

— Edgar – choraminguei baixo, torcendo por sua ajuda. Não sei exatamente o porquê deu ter chamado justo ele.

Edgar apareceu quebrando a parede como um príncipe encantado das histórias. Então bateu no homem e me tirou de lá em uma velocidade frenética.

Vestindo trajes elegantes, Edgar me pôs no colo e me levou embora para a luz. Senti-me destituída de qualquer aflição ou dor que aquele lugar já me causara. Ele estava me livrando de meus próprios pesadelos. Então me recordei dele ter confessado baixo.

— Tive tanto medo de te perder.

Essa fala entrara em meu coração e encobrira meu maior medo: de jamais ser amada. Tudo que eu sempre quisera fora ser querida pelos que eu mais amava, e agora a declaração de Edgar causara certo calor, como uma coberta aconchegante em dias chuvosos, em meu coração. Esse medo se tornara bobo para mim. A sensação era tão boa, que tive vontade de abraça-lo. Mas não consegui.

 .....||.....

Acordei no quarto da mansão. O som da chuva era tranquilizante e a luz do dia passando pelas frestas da cortina e iluminando levemente o quarto me trazia uma sensação de paz. Apenas o som dos pingos de chuva caindo no telhado já era o bastante para me relaxar por completo.

Contudo, será que isso é a realidade? Ou ainda estou presa e isso é mais um sonho? Pois era isso o que vinha acontecendo comigo desde o instante em que saí da mansão e entrei no covil daqueles mal feitores. Tenho sonhado, desejado, torcido para que tudo voltasse ao normal. Eu nunca desejei tanto estar de volta à fazenda, mesmo que para aturar minha família novamente.

Estava de bruços e tentei me levantar, mas deitei novamente porque meu corpo doía, principalmente nas costas. A dor quase que familiarizada em meu dorso ainda me prendia ali. Jamais vou esquecer a forma como consegui essas feridas.

No início de minha estadia em meu cativeiro, eles me deixaram no quartinho minúsculo de cimento, com apenas uma pequena janela, porém, sem me prender a parede. Fiquei lá, escutando eles falarem sobre o governo tirano, indiscutível e onipotente do rei Theomir, e de vez em quando discutirem sobre o que o conde Edgar faria, quando finalmente ouvi algo que me perturbou mais do que eu já estava.  Um ataque à família do rei.

Não sei dizer qual exatamente fora o motivo de minhas próximas ações. Eu estava exausta, aflita, presa, desesperada, irada, com medo e esses elementos meio que causaram minha insanidade. Minha mente estava turva e ao mesmo tempo alerta, da mesma forma que eu podia escutar tudo o que eles diziam com clareza, eu não podia escutar minha própria razão. Parecia que meu cérebro tinha entrado em pane.

Movida pela irracionalidade, exigi que me contassem, batendo na janela e gritando com eles, mas eles me ignoraram. Insisti tanto que o homem careca entrou no meu cômodo e me bateu. Ignorando a dor, continuei a exigir e ele continuou a gritar e me bater. Quando meu corpo não aguentava mais, um homem de cabelo ruivo entrou e me contou.

A família real estava em uma casa de verão quando foram atacados por rebeldes. Não se sabe se houveram feridos.

Depois disso, quietei. Isso seria o máximo que eu era capaz de conseguir deles. Horas depois, alguém me deu comida e esqueceu de trancar as grades, deixando a janela retangular aberta. Como minha ânsia por liberdade  era maior do que a razão, esperei ele ir embora e fugi. O homem careca me pegou – surgindo de um canto com o qual eu não me lembrava -; prendeu-me na parede e me chicoteou três vezes.

Meus braços estavam agora em um roxo leve e não doía mais abrir meus olhos, que tinham sido acertados quando o homem careca me bateu pela primeira vez. Por algum motivo, meus machucados sempre se curam quase que totalmente depois de uma boa noite de sono. Essa era uma das minhas maiores habilidades. 

 Ignorei a dor ardente em minhas costas e me levantei. Meu vestido estava aberto nas costas, eu o fechei com dificuldade e caminhei até a janela. Sarah provavelmente me vestira enquanto eu estava inconsciente.

O buraco que eu fiz na janela estava fechado por tábuas. Observei a chuva forte cair sobre o gramado verde da mansão e então sorri, me dando conta da verdade. Esse cheiro de água misturado com a madeira das tábuas, esse som de chuva, o meu coração batendo descompassadamente não poderiam ser apenas minha imaginação.  

— Estou viva - sussurrei e depois disse mais alto - Estou viva! Obrigado Deus, por ter me dado a chance de voltar para cá!

Senti uma imensa vontade de sentir essa chuva roçando em minha pele. Era isso o que eu sempre sonhara desde menina, e que fizera escondida poucas vezes, desfrutando dos poucos minutos em que podia sentir a água fria me ensopar, o vento balançar meu vestido e a intensa emoção de poder brincar em meio ao um fenômeno natural. Sem regras, sem resguardo, apenas apreciando a natureza fazer seu trabalho. Era isso o que eu iria fazer agora, pois naquela prisão fora o que eu mais desejara. Sentir a água da chuva roçando em minha pele novamente.  Corri para fora do quarto e desci para o salão de entrada. Na ponta dos pés, atravessei o cômodo para não chamar atenção e abri a enorme porta. Agradeci baixinho por não ter ninguém nesse momento.

Devagar, saí da área coberta e entrei na chuva forte. Com certeza, isso não era um sonho. Eu não seria capaz de imaginar o frio, o vento, as gotas e o som da chuva.

Senti tanto medo de morrer ou deles fazerem algo pior. Durante todo o tempo, eu pedira a Deus por ajuda. E ele me ouvira e ainda me mostrara que eu não estava sozinha. Que podia contar com alguém para me ajudar, que as coisas não eram mais como antes.

Girei no meu lugar, com um sorriso satisfeito nos lábios. A chuva era tão refrescante e boa, fiquei parada até que ela lavasse todos os meus medos, minhas angústias e minhas lembranças.

Depois de muito tempo, meu corpo estava extremamente dolorido. E o frio me fazia tremer convulsivamente. Sentindo-me revigorada, apesar desses maus estares físicos, entrei de volta na mansão.

Foi aí que vi Sarah com uma bandeja cheia de frascos no meio do espaço e eu prendi a respiração.

— Angel! O que fazia na chuva? – questionou brava.

Não achei nenhuma desculpa decente.

— Você não devia nem ter se levantado! - caminhou até mim - Venha! Vou lhe preparar um banho e depois é para ficar deitada!

Tremendo de frio, acompanhei-a. Estava feliz por vê-la novamente. Quando entramos na sala da fogueira, olhei tristemente os móveis rasgados e a falta que os quadros e os enfeites faziam.

— Fique de frente a fogueira e espere que vou preparar seu banho - depois resmungou - Que ideia! Sair na chuva nesse estado.

Foi embora. Fiquei em pé de frente a fogueira, feliz por ela não ter perguntado demais. Tremi inquietantemente e olhei ao redor, procurando algo para me cobrir.

— Por que está molhada? - Rubens apareceu atrás de mim.

Fiquei calada para evitar outra briga ou um assunto constrangedor. Ainda não gostava da presença dele. Ele ficou ao meu lado e, silenciosos, escutamos a chuva bater no telhado. Então ele se virou para mim.

— Por que me defendeu naquele dia, no almoço? - ele perguntou de repente - Por que impediu o senhor Borchacell de vir até mim?

— Por que ele iria te matar – respondi em um murmúrio.

— Seria totalmente justo, já que eu tentei matá-la – contradisse em um tom provocador.

Ele estendeu a mão e eu vi a faixa envolvendo sua mão direita.

— Me desculpe - abaixei o olhar - Pela sua mão.

Rubens olhou para a mão. Ele não conseguia fechá-la por inteiro.

— Vai contar para ele que eu a deixei ir, não é? – questionou baixo.

Suspirei. Era lógico que eu pensara nisso enquanto estava presa pelas correntes após ser chicoteada. Nisso, e em tantos outros assuntos. Dormir ou relaxar era impossível, então eu refletira sobre Rubens. Cheguei à conclusão de que ele não era diferente de muitos que eu já conhecera: preconceituoso, prepotente e orgulhoso. O fato de ele ter chegado ao extremo de tentar me matar mudava um pouco as coisas, mas não minha familiaridade com esse tipo de gente.

— Não. Você fez aquilo porque queria ver Edgar livre de mim. Eu entendo – suspirei novamente, cansada.

Ele me olhou perplexo.

— Como assim? Você devia me odiar.

Eu ri.

— Sinceramente, não gosto do senhor. Mas eu conheço o seu medo e sei do que muitas mulheres são capazes por dinheiro. Nós só temos que aumentar a confiança um no outro.

Rubens me encarou pensativo. Eu suspirei mais uma vez e estendi a mão para me esquentar.

— Então me diga, quais suas intenções com o senhor Borchacell?

Eu sabia que essa era uma conversa franca.

— Nenhuma. O que eu quero aqui é apenas ensinar Sarah. A amizade dele é apenas um bônus – respondi calmamente.

Ele franzira o cenho.

— Tudo bem, vou assumir. Não consigo acreditar nisso – sorriu incrédulo.

Suspirei de novo, exausta pelas dores em meu corpo e desse tipo de gente.

— Então continue a proteger Edgar desse tipo de gente. Com o tempo, vai aprender a diferenciar – repliquei, olhando as chamas alaranjadas do fogo a nossa frente.

Ele se virou e sussurrou.

— Obrigado - depois foi embora.

Sorri por essa ser nossa primeira conversa amigável e depois de alguns minutos, Sarah aparecera.

.....||.....

Meu corpo estava muito dolorido para eu conseguir me lavar sozinha, então pedi para Sarah me ajudar. A minha ida a chuva só piorou minha rápida recuperação, pois eu devia ter ficado parada na cama, em vez de ter corrido para fora. Entretanto, nesse momento, eu não estava me importando muito com meu bem estar físico.

— É incrível! Hoje quando chegou você estava com hematomas horríveis e agora olhe, estão até desaparecendo - ela disse espantada com um sorriso nos lábios.

Eu ri.

— Obrigada por ter cuidado de mim.

— Imagine, eu que tenho de agradecer por ter ido no meu lugar.

— Eu fiz o que qualquer um faria – retruquei.

Ela balançou a cabeça.

— Você foi muito corajosa, e eu duvido que muitos fariam o que você fez – disse orgulhosamente.

Abaixei a cabeça e confessei.

— Não sou corajosa, naquela hora eu estava morrendo de medo.

— Mas mesmo assim você fez. E isso sim é a verdadeira coragem.

— Obrigado.

Voltou a me esfregar. O fato de Sarah ter orgulho de mim fez meu peito se inflar a ponto de que eu pensara ser capaz de voar.

— Quando Edgar descobriu, correu feito um louco para te achar, você tinha que ver a cara dele – ela contou satisfatoriamente.

Fiquei vermelha com essa notícia e questionei em um sussurro.

— Ele ficou muito preocupado?

— Preocupado é pouco.

— Mas por quê? Sou apenas uma garota qualquer.

Não era exatamente isso o que eu quisera falar. Essa frase fora deveras insegura, mas era assim como eu me sentia em relação ao conde, totalmente insegura. Odiava não entender os motivos de uma pessoa.

Ela segurou minha mão com força, e então declarou.

— Você não é uma garota qualquer, Angel. Você é especial, e todos nós sabemos disso. Edgar não fez mais do que sua obrigação.

Meus olhos se encheram d'água.

— Vocês também são especiais para mim – admiti.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Capitulo betado pela lady mikaelson. O que acharam? Comentem!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Azul & Violeta" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.