A Menina que Roubava Livros escrita por Owl KodS


Capítulo 1
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

- Essa é mais uma história para o Café com Letra (https://fanfiction.com.br/u/617370/), o tema desse mês: Doppio, n° 17.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/725468/chapter/1

Lívia estava sentada no banco do ônibus. Um livro no colo, semi abandonado com um número total de zero indicações do local onde havia parado a leitura. Ela iria voltar a ler em exatos, olhou para o braço. O que estava pensando mesmo? Só mais 1 minuto, disse a si mesma enquanto os olhos vagavam pelas ruas semi desertas da cidade. Algumas pessoas passavam como pontos disformes pela rua, em telefones, com fones de ouvido ou apenas andando ao som dos carros que passam.

Voltou os olhos para o livro. A página exata se abriu, as palavras se enrolavam e criavam um mundo novo, sem ônibus, sem pessoas falando alto no telefone, sem crianças chorando.

O ônibus parou após se arrastar por longuíssimos 25 minutos até parar em frente ao shopping.Lívia odiava o shopping, odiava o formigueiro efervescente que era aquele pequeno lugar. Andou encolhida no meio da multidão que se acotovelava para chegar nas vitrines ou nos estandes do meio do corredor.

Lívia parou em frente a livraria, estava cansada de lutar contra a multidão e por sorte a livraria estava vazia como sempre. Havia proposto por uma cafeteira e alguma coisa doce para vender, faria uma renda maior e chamaria mais gente para a livraria, mas havia sido piamente ignorada, como sempre.

Respirou fundo e entrou. O ar repleto do cheiro de livros novos recém retirados das caixas foi de encontro a ela que quase riu e girou como uma criança, mas se conteve.


~~ o ~~

Já era próximo ao fim do dia quando finalmente Lúcia resolveu sair para o almoço . Lívia estava mais uma vez sozinha na livraria, mas dessa vez iria se comportar como deveria.

Andou pela loja. Alguns jovens pareciam matar tempo sentados nos enormes puffs que ficavam espalhados no canto dos livros infantis. Na estante de estrangeiros estava aquele livro, ela já o tinha, em todas as versões possíveis, com todas as capas, pelo menos 5 de cada. Se aproximou, acariciou as lombadas, haviam seis na prateleira, seria muito óbvio e não podia, estava se controlando, estava avançando na cura pela sua cura.

Por sorte seu celular vibrou no bolso. Uma mensagem no whattsap revelava que o namorado tinha urgência, ele nunca começaria uma conversa com “Lívia, minha querida”, a menos que fosse algo muito importante, talvez algo dele que ela houvesse jogado fora ou algo assim.


“Enzo, o que houve?”

A resposta não foi rápida, por longos minutos que lhe pareceram horas, na qual o status mudava de ‘escrevendo’ para ‘online’, não era algo bom com toda a certeza.


“Eu vou embora”.

Aquilo era um choque para ela. Como assim ia embora? Foi como se uma onda de água congelante passasse por seu corpo e se instalasse em seu coração, suas mãos tremiam demais para escrever.


“Como assim ‘embora’?”

Ela conseguiu escrever após várias tentativas, os olhos já estavam cheios de lágrimas e ela não precisava da resposta, mas quando ela veio, preferiu não interromper.


“Nós já falamos sobre isso, querida”
“Eu não posso viver em uma casa onde me sinto sufocado”
“Eu te dei um ultimato”
“Eu não queria partir”

Ela não podia mais ler aquelas coisas, estava exausta das desculpas dele, estava cansada da desculpa não é sobre mim, é você, ela sabia que a culpa não era dela, não poderia ser. O que ela fazia de tão terrível? Tinha uma par de livros em casa, talvez umas duas centenas, mas foi isso que chamou a atenção dele em primeiro lugar.


“Então porque?”


“Porque eu não posso mais Liv”
“Não dá”
“Sinto muito”

Ela não pode responder, não pode nem ao menos imaginar o que aquilo significava. Simplesmente largou o telefone no chão, não se importava se iria quebrar ou não, só tinha uma coisa em mente. Os jovens saíram apressados, nervosos com a ação repentina da vendedora.


~~ o ~~


— Lívia!

A voz sumiu em meio aos livros. A mulher de curtos cabelos cacheados e negros estava ajoelhada em meio a quantidade sobre humanas de livros. A mochila semi-aberta revelava a verdade: uma pilha de livros, ainda com as etiquetas por cadastrar no sistema da loja.

Choque era pouco para descrever a sensação de ambas as partes. O suor frio que escorria pelas costas de Lívia, a cena toda parecia correr em câmera lenta. O olhar duro da chefe e a triste complacência da colega. Lúcia que abaixou a cabeça quando a outra passou por ela.
Lívia estava perdida e agora não tinha como voltar.


~~ o ~~


“Enzo, eu sinto muito, por favor volta.”

Não houve resposta. Lívia estava atirada no chão, ao seu lado estava uma xícara de chá ainda fumegando de quente e pelo menos quatro livro descansavam abertos, todos meio lidos por cima, mas sem qualquer compromisso. Poderia se dar um desconto e tomar um vinho, mas tinha medo de acabar se tornando um costume e acabar viciada, já tinha problemas demais e não precisava de um AA.


“Se não vai responder, vou transformar seu whattsap em confessionário”
“É sério Enzo, eu não sei o que fazer”
“Eu acabei de perder o emprego, Enzo”
“Eu sinto a sua falta”
“Essa casa é vazia sem você”
“Dorme de conchinha com os livros”

Lívia não podia mentir, não era a resposta que esperava. Queria que Enzo a confortasse, dissesse que estava voltando para o pequeno loft, mas no fundo nunca tivera esperanças reais que isso acontecesse. Sorveu um gole de sua bebida quente.


“Você leu a parte que fui demitida?”
“Eu queria dizer que sinto muito”
“Mas a verdade é que era uma questão de tempo”
“Você sabe disso melhor que eu”
“:/ (decepção)”

Ela não respondeu, deixou o celular atirado ao seu lado. Olhou para os livros ao seu redor, centenas, milhares. Ocupando cadeiras, o sofá-cama, a mesa de canto que fazia a divisória sala/cozinha. Sorveu outro gole. Os livro se empilhavam altos, escalando a estante, tapando a tv, sufocando.

Baixou o olhar, havia mais uma mensagem na piscando na tela bloqueada do celular, mas não leria agora. Enzo mandaria mais alguma coisa sobre sua decepção, ou Lúcia estaria pedindo desculpa. A verdade é que Enzo estava certo e Lúcia não tinha que se desculpar. Olhou para os livro, encarapitados pilhas altas ao lado das costas do sofá, quase um dosel. Quantos eram roubados? Tentou se lembrar, mas a resposta era apenas “muitos”.

Soltou o ar pelo nariz. Estava cansada de pensar. Se levantou. Tirou três livros da bolsa.

Três livros com a etiqueta por cadastrar no sistema da loja. Três livros para a pilha daqueles que nunca foram pagos e nunca seriam.

Três livros sobre uma, a única, menina que a entendia.

Três livros exatamente iguais.

Três livros sobre Lisel Meminger, A Menina que Roubava Livros.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Não esqueçam de deixar um comentário.

E nem de conferir as demais histórias do mês, no perfil do CcL (https://fanfiction.com.br/u/617370/)

Essa semana saiu resenhas sobre 'A Menina que Roubava Livros" no blog: http://econtosepontos.blogspot.com.br/2017/02/eu-li-menina-que-roubava-livros-de.html (na verdade foi hoje, e não foi de caso pensado, eu juro)

Beijos e até!