Kingdom Hearts: Motherland escrita por Kyra_Spring


Capítulo 3
A nuvem errante


Notas iniciais do capítulo

É isso aí, gente, agora começamos a entrar numa parte um pouco mais dark da fic. O nome já é uma pista do que (ou será que eu deveria dizer "de quem"?) aparecerá nesse capítulo. Na comunidade KHB: Fics, estou colocando uma música por capítulo, e o tema deste aqui é Boulevard of Broken Dreams, do Green Day. Ouçam e leiam, e vocês entenderão. Beijos, e vamos à fic!



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–Leene, afinal de contas, o que é que há entre você e a Yuffie? – horas depois, o grupo já estava todo na nave gummi, indo em direção a Twilight Town. Kairi fez a pergunta que todos estavam querendo ver respondida – Pensei que vocês duas iam acabar se matando lá!

–É uma longa história... – disse a loura, aborrecida – Sempre fomos rivais. Ela sempre tentou me superar em tudo, e pelo visto continua assim até hoje. Sério, ela era alguém que eu não queria ver mais!

–Acho que devemos deixar esse tipo de tolice para trás – observou Riku, sábio – Se ficarmos brigando entre nós, estaremos perdidos.

–Eu sei... e, caramba, ficar isolada de tudo em Waterfall City foi horrível – ela concordou – Nunca mais quero ficar longe das pessoas de quem gosto. É claro, fiz amigos lá, mas meu lar é em Radiant Garden. E é melhor estar lá do que em Waterfall City... com ou sem a Yuffie para me encher.

–Como é Waterfall City? – Donald ainda estava curioso e intrigado a respeito da cidade – Quem está morando lá, agora?

–Bem, a superfície está coberta de Nobodies até as tampas – respondeu a garota – Mas, sob a cidade antiga, os moradores construíram uma espécie de grande cidade-abrigo subterrânea, que eles batizaram de Crystal Fortress. Mas muitos fugiram para outros lugares, e hoje pouca gente mora lá. Conheci uma das feiticeiras mais poderosas que já vi na minha vida, lá, e ela me ensinou muita coisa. E, de qualquer forma, é quase como se desse para respirar a magia de lá. Ela parece emanar das paredes, é muito estranho. Eu sinto um tipo de energia, sei lá, emanando daquele castelo, e acho que é isso que afasta os Nobodies e os Heartless. Mas dizer de onde vem essa energia, ou o que exatamente ela é, eu não consigo.

Sora ouvia, mas não participava da conversa. Algo o perturbava profundamente.

O som que ouvira na noite do festival ainda ecoava em seus ouvidos. Era água, definitivamente, o som límpido e cristalino era inconfundível. Mas era completamente diferente do som de ondas do mar. Não... era mais suave, mais claro... e, quando ele pensava, só conseguia visualizar uma fonte.

Mas o que ela significava, num momento como aquele?

Ele estava confuso, isso era fato. E não saber ao certo o que esperar tornava tudo pior.

Ele ainda era o portador da Keyblade, e ainda era sua função proteger os mundos. E havia outros, que lutavam ao seu lado, e que certamente lutariam ao seu lado outra vez, se fosse preciso. Mas seus pressentimentos eram ruins, e algo lhe dizia que aquilo tudo ainda iria trazer muita dor a muitas pessoas, em vários mundos.

Eles seriam o suficiente? Afinal, eles já eram tão poucos, e seus inimigos pareciam mais fortes...

Pela primeira vez, a responsabilidade de ser o portador da Keyblade pesou em seus ombros. E se ele falhasse, o que aconteceria? Ele sabia, de alguma forma, que estava profundamente ligado a tudo o que estava acontecendo. Mas não era capaz de dizer como sabia, ou como era essa ligação.

A verdade é que estava com medo. Mas estava determinado a não deixá-lo transparecer.

–Você está quieto demais, Sora – observou Goofy – Está tudo bem?

–Ahn? – a pergunta o despertou de seus pensamentos – Ah, sim, tá tudo bem. Só estou preocupado com Twilight Town, só isso. E com o pessoal de lá, Hayner, Pence, Olette... Espero que esteja tudo bem.

–Ah, eles estão bem, você vai ver – Donald deu de ombros, despreocupado – Não precisa esquentar a cabeça com isso!

Sora se esforçava para acreditar nisso, mas não era fácil. Afinal de contas, eles estavam quase às portas de um reino de escuridão e medo.

Riku lançou a ele um olhar de esguelha. Ele era perito em decifrar pessoas e emoções. E Sora era péssimo em disfarçar seus pensamentos e sentimentos. Na certa, Riku sabia como ele se sentia, e podia compreender. Não que isso pudesse realmente ajudá-lo, de alguma forma, mas era apenas com isso que podia contar.

–MAS QUE DROGA! – então, a voz de Leene despertou sua atenção para o mundo real – O QUE ESTÁ ACONTECENDO ALI?

Todos correram para as janelas, e viram, embasbacados, uma profusão de pequenas naves rumando rapidamente na direção de Twilight Town. Naves Heartless, muito rápidas e esquivas. Leene usava os canhões e raios da nave Fantasia, sem sucesso.

–O que vamos fazer? – sussurrou Kairi – Eles são muitos!

–Sora, assuma os controles! – então, a piloto deu os comandos, decidida – Aproxime-se mais de Twilight Town, e não pare de atirar. Quando eu der o comando, você abre a porta, OK?

–O quê? – ele disse, sem acreditar – O que acha que vai fazer?

–Um truquezinho de Waterfall City – ela deu um sorriso – Quanto a vocês, tem alguns canhões alternativos nas extremidades da nave, então atirem em qualquer coisa que se mover!

Sora assumiu o controle da nave, forçando-se a não pensar no que Leene estava prestes a fazer. Usando toda a potência da nave, foi se aproximando da cidade cada vez mais, até que...

–ABRA A PORTA AGORA!

Com um puxão de alavanca, a porta se abriu, enquanto ele continuava se aproximando. Os canhões de todos os cantos da nave disparavam insanamente, abatendo muitas naves, mas parecia que, para cada nave derrubada, outras três surgiam. Até que...

Uma onda de choque violentíssima varreu o céu. A nave inteira estremeceu, e Sora foi jogado para frente como se tivesse levado um chute nas costas. Quando conseguiu olhar de novo, só viu destroços de naves Heartless caindo, e umas poucas naves inteiras batendo em retirada.

–O que diabos foi isso? – ele disse, assim que se lembrou de como articular palavras outra vez. Leene deu uma risada, vinda da porta da nave, e disse:

–Foi o que eu disse, um truquezinho de Waterfall City – e, para o lado de fora – E isso é pra vocês aprenderem quem manda aqui!

Sora teve que rir. Era oficial: ela era louca. E isso a tornava perfeita para aquele grupo.

–NUNCA MAIS FAÇA ISSO CONOSCO! – Kairi berrou, em algum lugar da nave – SE VOCÊ QUISER SE EXPLODIR, ÓTIMO, VÁ EM FRENTE, MAS NÃO LEVE NINGUÉM MAIS COM VOCÊ, ENTENDEU?

–Isso foi incrível! – disse Riku – Arriscado, sem dúvida, e muito imprudente, mas ainda assim incrível!

–Não me chamam de Hollow Bastion Thunderbolt à toa, sabia? – ela deu de ombros, enquanto reassumia os controles da nave – Durante o meu treinamento, me especializei em feitiços elétricos, e até hoje eles são meu ponto mais forte.

–Alguém te chama mesmo de Hollow Bastion Thunderbolt? – rebateu Sora, irônico, mas Leene o ignorou solenemente.

Logo eles pousaram a nave gummi em uma clareira, um pouco afastada da cidade. Os destroços fumegantes das naves Heartless estavam espalhados por todos os lados, e uma fumaça densa cobria a clareira. Eles olharam em volta, chocados.

–Eles estavam preparando um ataque e tanto – observou Riku – Mas por quê? Eles poderiam ter dominado Twilight Town com menos da metade de naves!

–Isso tá muito estranho... – disse Donald – Eles poderiam ter dominado Radiant Garden com menos da metade de naves, mesmo que estivéssemos lá para ajudar. Não faz sentido.

–Acho que a questão mais importante é: quem tem todo esse poder de fogo? – disse Sora – Nem mesmo Maleficent, no auge do seu poder, conseguiria tudo isso.

–Podemos discutir isso depois – retrucou Goofy – Precisamos ver como está a cidade.

Eles começaram a andar mais depressa, até chegarem ao portão principal da cidade. Havia um tumulto nas ruas, e havia também alguns destroços de naves espalhados. Todos falavam alto, havia algumas crianças chorando, e era possível sentir o medo e a perplexidade no ar.

–Que droga! – sussurrou Leene – Tudo por minha culpa! Alguém deve ter se machucado!

–Não diga isso – Kairi respondeu – Seria isso ou um monte de Heartless destruindo tudo o que vissem.

Enquanto tentavam cortar caminho pela multidão, eles avistaram, enfim, seus amigos, Hayner, Olette e Pence, assustados e ansiosos. Hayner nem sequer os cumprimentou, e já foi logo dizendo:

–O que diabos foi aquilo?

–Heartless – respondeu Sora – Um monte deles. Conseguimos impedi-los de chegar à cidade.

–E fizeram também o show de fogos mais estranho da história! – disse Pence – Foi assustador!

–Estou tão feliz que vocês estejam bem! – disse Olette, suspirando – Vocês não dão notícias há algum tempo, e ficamos preocupados pensando que talvez estivessem com problemas!

–Estamos bem agora – disse Goofy – Ah, sim, esta é a Leene e este é o Riku. Eles são nossos amigos. A Kairi você já conhece, não é?

–Sim... Ah, então você é o Riku! – exclamou Olette – É um prazer conhecê-lo! Fico feliz que você e Sora tenham se reencontrado e estejam em segurança agora!

Riku lançou um olhar profundo a Sora. Qual era a história que ele estava contando aos outros a seu respeito?

–Vamos para o nosso lugar de sempre – sugeriu Pence – Assim, poderemos conversar em paz.

Eles seguiram os três até um beco, onde ficava seu ponto de reuniões. Estava diferente da última vez: agora, cobrindo as paredes, não havia cartazes a respeito da próxima Struggle, e sim recortes de jornal, esquemas manuscritos e fotos. Sora se aproximou de um dos recortes, e o leu em voz alta:

–Incêndio na estação de trem... testemunhas acusam monstros negros... – virou-se para outra parede, lendo outra notícia – Professor desaparecido... quarto desaparecimento em um mês... – e, então, arregalou os olhos – O que está havendo aqui?

–Esperávamos que vocês pudessem nos responder – disse Olette – De alguns meses para cá, pessoas estão desaparecendo, e várias pessoas pela cidade estão vendo coisas bizarras. Muitos falam de "monstros negros", outros falam de "demônios brancos"...

–Heartless e Nobodies – disseram Sora e Riku ao mesmo tempo. O último emendou – Mas como é isso? Quantos foram avistados até agora? Quando começou?

–Tudo começou há quatro meses – respondeu Hayner, andando de um lado para outro – O vendedor da loja de acessórios desapareceu sem deixar rastros. Depois dele, várias pessoas estão sumindo. Além do mais, estão acontecendo coisas bizarras por toda a cidade, incêndios, roubos... E, quase sempre, alguém diz ter visto um desses monstros. Nós três começamos a investigar e reunir provas, e todas as informações que conseguimos estão aí, nas paredes.

–Mas o que aconteceu hoje supera qualquer outra coisa – continuou Pence – Até agora, muitos ainda acreditavam que era apenas alguma gangue de desordeiros, mas depois de hoje... sei lá, acho que a cidade vai entrar em pânico!

–Gawrsh, então, chegamos numa boa hora! – disse Goofy, coçando a cabeça – Precisamos de tudo o que vocês reuniram até agora! Quem sabe, se todos trabalharmos juntos, conseguiremos traçar algum padrão e descobrir o que está havendo aqui.

–Não podemos fazer isso agora! – grasnou Donald – Temos trabalho a fazer aqui!

–E, por isso, vamos ignorar o que está havendo aqui? – protestou Leene – Isso pode esperar um pouco, vamos ajudá-los primeiro!

–Donald está certo, Leene – disse Riku – Temos um trabalho aqui. Nós três precisamos seguir em frente, e Donald, Goffy e Kairi ficam aqui e os ajudam.

Os outros concordaram, relutantes. Donald ainda tentou protestar, mas Goofy o cortou.

–Vocês já vão? – Pence não gostou – Mas vocês acabaram de chegar! E se houver mais naves lá fora?

–Precisamos ir – explicou Sora – Vamos tentar descobrir quem pode estar por trás disso. Mas logo estaremos de volta. E, quem sabe, até consigamos alguma informação útil!

–Por favor, tratem de voltar inteiros, está bem? – disse Olette, aflita – Não temos idéia do que está acontecendo, e não queremos que se machuquem.

Sora apenas sorriu e acenou com a cabeça. Ele também estava preocupado, mas eles sabiam se virar muito bem. E, de qualquer forma, eles seriam mais úteis se procurassem pistas fora de Twilight Town, enquanto os outros vasculhavam a cidade.

Então, os três saíram, Sora na frente, em direção à mansão. Era lá onde ficava a passagem para The World that Never Was, e ela estava completamente intocada, como estava desde a última vez em que estivera lá. Quando chegaram ao portão, porém, ele sentiu algo estremecer dentro de si, e novamente sua cabeça começou a doer furiosamente.

E o som de água... o som da fonte... mais claro do que antes...

–SORA! – ele ouviu alguém chamá-lo, mas pareciam ser duas vozes. Duas vozes diferentes, vindas de lugares diferentes...

–Sora, está me ouvindo?

Sora... preste atenção...

–O que deu nele, Riku? Por favor, diga o que ele tem de errado!

Escute com atenção... – ele olhava para frente, sem enxergar. A dor preenchia todas as suas terminações nervosas, impedindo o seu cérebro de processar o que via – Escute... Você irá encontrá-la... você será aquele a encontrá-la...

–Por favor, cara, não faz isso comigo! Olhe pra mim, ouviu? Olhe pra mim, droga!

Assim como os que vieram antes de você... você irá encontrá-la...

–SORA! – então, inesperadamente, Leene deu um sonoro tapa em seu rosto, puxando-o de volta à realidade. Levou algum tempo para que ele percebesse onde estava, e o que estava acontecendo.

–O que houve aqui? – murmurou ele, quase sem voz – Argh, minha cabeça!

–Você teve outro daqueles ataques, cara – respondeu Riku, preocupado – Igual àquele da noite do Festival. Você ficou com os olhos perdidos, uma cara de dor... sério, foi assustador!

–Parece que alguém me bateu com uma cadeira – gemeu o outro – Vamos em frente, OK?

Eles entraram, Sora ainda conduzindo o grupo, mas ele podia sentir os olhares de estranhamento dos amigos às suas costas. Ele também não entendia o que estava acontecendo. Mas decidiu que não diria nada a ninguém até que tudo fizesse mais sentido. Eles caminharam até a sala onde estava o computador que os transportaria a The World that Never Was, e quando chegaram, Riku disse:

–Vocês não perceberam algo estranho por aqui?

–Além das teias de aranha, não – respondeu Leene – E o que seria?

–Tá fácil demais! – respondeu Riku – Não é estranho que, numa cidade onde todo dia acontece alguma coisa provocada por Heartless ou Nobodies, justamente a passagem para o mundo deles esteja limpa?

–Eu não tinha pensado nisso – disse Sora, cauteloso – Bem, a verdade é que precisamos estar atentos e, quando estivermos lá, bater em qualquer coisa que se mexa – e, então, estendeu a mão, preparando a Keyblade e sendo imitado por Riku – Todos prontos?

–Pronto – concordou o outro.

–Com certeza! – Leene tirou um par de adagas douradas de bainhas presas às pernas – Vamos fazer a eles uma visita que nunca mais vão esquecer!

Então, Sora tocou no pequeno facho de luz que conduzia ao outro laboratório, e rapidamente eles foram até a passagem. Leene foi a primeira a atravessar, destemida. Sora foi logo depois, e Riku, depois de alguns instantes de hesitação, foi por último.

Mas nada poderia prepará-los para o que veriam ali...

Definitivamente, The World that Never Was já não era o mesmo. Os prédios estavam todos em ruínas, e a grande lua em formato de coração perfurado – os resquícios de Kingdom Hearts – ainda estava lá, brilhando, implacável. Tudo estava destruído, como se tivessem passados séculos desde a última vez que estiveram lá.

–Mas o que diabos aconteceu aqui? – exclamou Riku – É como se... LEENE, ATRÁS DE VOCÊ!

Ela se virou rapidamente, e com um movimento rápido das adagas, destruiu o Heartless que se preparava para atacá-la pelas costas.

–Bem, pelo menos essa parte não mudou – disse Sora – Mas ainda assim não faz sentido algum!

Eles começaram a caminhar pelo que restou das ruas. Era possível ainda ver o castelo, ao longe, aparentemente intocado. De vez em quando, eles sentiam que algo passava por eles – pequenos vultos, rápidos demais, silenciosos demais – mas nunca conseguiam saber ao certo o que eram.

–Esse lugar me dá arrepios – murmurou Leene – Mas, pelo choque de vocês, não foi sempre assim.

–Esse lugar sempre foi arrepiante – explicou Riku – A diferença é que, da última vez, os prédios estavam de pé. Agora, como ele ficou assim, eu não faço idéia.

–Talvez a nossa última luta tenha feito isso... – arriscou Sora, mas o outro disse:

–Dificilmente. Essas não são ruínas de uma destruição recente. É como se tivéssemos estado aqui há mil anos atrás – ele olhou em volta – Isso nem parece uma cidade! É mais como um... um...

–...como um cemitério? – os três ouviram uma voz às suas costas – É, eu também pensei nisso.

Eles se viraram. A alguns metros de distâncias deles, estava Cloud Strife, observando a cidade com uma expressão facial ilegível.

–Nossa, é bom vê-lo! – disse Sora, amigável – O que aconteceu aqui?

–O mesmo que aconteceu com outros mundos antes desse – respondeu ele – É como se eles... envelhecessem, essa foi a palavra que usaram. Ouvi vários relatos desse tipo no caminho para Hollow Bastion, e encontrei todos os sinais disso quando passei por aqui.

–Mundos que envelhecem? – Leene ergueu uma sobrancelha – Isso é estranho...

–Mas não é absurdo – replicou Riku – Mundos são como pessoas, com almas, corações. Eles podem envelhecer em sua essência, como uma pessoa.

–Mas... droga, Maleficent está aqui, não está? – Sora não se conformava – Como ela permitiria isso?

–Pense bem, talvez ela esteja ganhando algo com isso – observou Cloud – É uma possibilidade a ser considerada.

–As coisas estão piores do que pensávamos – murmurou Leene – Precisamos voltar para Radiant Garden o mais rápido possível e contar ao rei o que está havendo! – e, para Cloud – Você vem conosco, não é?

–Não posso – ele respondeu, austero – Não ainda. Irei para lá assim que puder.

Sora o encarou. E, de repente, percebeu algo interessante.

Havia qualquer coisa no olhar de Cloud que era idêntica a algo no olhar de Riku. Algo profundo, inatingível. Algo que era difícil de definir.

–A propósito, ela está bem – acrescentou a garota, quando ele dava as costas e saía – Obrigada por perguntar.

Ele parou um instante, e depois voltou a andar, até sumir na escuridão. Os dois garotos e ela, então, seguiram seu caminho na direção oposta.

–Cretino insensível – sibilou ela, raivosa – Ele bem que podia ir até lá, não é?

–Talvez ele só precise de tempo – observou Sora – Ele deve ter os seus motivos para não ir agora.

–Será que Maleficent é a responsável por isso? – disse Riku – Mas o que ela ganharia envelhecendo o mundo onde ela própria estabeleceu sua base?

–Quem pode saber? – disse Leene – A questão é que isso não é algo que acontece só aqui. Outros mundos já passaram pela mesma coisa. E se...

Mas ela não terminou essa frase. Um monstro enorme surgiu das trevas, partindo para cima deles. Ele se preparava para investir sobre eles, e os destroços dos prédios bloqueavam as possíveis rotas de fuga.

–É um Behemoth – murmurou Sora – Se conseguirmos acertar o chifre dele, poderemos derrotá-lo.

–Não faça isso – sussurrou Riku, em resposta – É uma armadilha. Enquanto tentarmos lutar contra o Behemoth, outros Heartless vão aparecer e nos emboscar.

–Como você sabe disso? – Leene ergueu uma sobrancelha – Onde eles estão?

–Você não estava sentindo aquelas coisas passarem por nós? – explicou o garoto – Então, aquilo são Heartless. Mas não como esses!

–Então aqueles fantasminhas são Heartless? – Sora não acreditava.

–Exatamente – o outro concordou – Mas são Heartless que ainda não assumiram uma forma corpórea.

–Como é que você sabe dessas coisas? – ela ainda insistiu, mas ele não respondeu.

Sora também não sabia, mas podia imaginar uma resposta. Era inegável que ele havia aprendido muitas coisas enquanto estava no reino da escuridão. Pelo menos agora elas se mostravam úteis.

–Eu tenho um plano, mas é arriscado – continuou Riku – Um de nós ataca o Behemoth, e os outros dão cobertura. Precisamos chegar até o castelo, então vamos avançando na direção dele enquanto lutamos.

–Posso lutar contra ele – ofereceu-se Sora – Já lutei contra outros desses.

–E eu posso ir cuidando das bordas – acrescentou Leene – Acho que alguns feitiços serão suficientes.

–Isso, pelo menos, confirma uma suspeita – disse o primeiro – Estava fácil demais antes. Eles provavelmente esperavam que viéssemos aqui.

Os três se encararam, decididos, e concordaram com o plano. Ele esperavam, em silêncio, pelo momento certo de atacar.

Sora se lembrava bem da sensação. Tudo ficava em silêncio, estático, e ele ficava completamente consciente de tudo ao seu redor. Ele podia sentir a tensão no ar, palpável, sufocante e quase sólida, em contraste com o vento suave e frio em seu rosto. Seu coração, disparado, esmurrava seu peito, e cada pequeno estímulo, cada som, cada vibração, tudo era amplificado. Seu corpo se tornava uma antena, sensível à menor mudança de situação – um gatilho prestes a disparar.

–Ao meu sinal – ele sussurrou – Um... dois... três... AGORA!

Então, os três correram para direções opostas. Sora investiu diretamente contra o monstro, saltando sobre as costas dele. Era mais fácil das outras vezes, quando lutava tendo Donald e Goofy ao seu lado, mas dessa vez só poderia contar consigo mesmo.

Uma, duas, três vezes, ele golpeou o chifre do Behemoth com a Keyblade, enquanto tentava se equilibrar. De onde estava, era possível ver que Riku tinha razão: outros Heartless brotavam de todos os lados, e Riku e Leene lutavam contra muitos de uma só vez. Pela primeira vez, ele teve a chance de vê-la lutar: ela era leve, ágil como uma corça, e muito graciosa em seus movimentos. Era como se ela dançasse entre os Heartless, ao invés de lutar contra eles. Mas, por mais que se esforçassem, eles eram muitos, e continuavam aparecendo mais e mais.

E o Behemoth não caía. Àquela altura, ele já devia ter sido destruído. Algo estava errado.

–Sora, não vamos conseguir segurá-los por muito tempo! – berrou Riku – Ande logo!

–Não está dando certo! – berrou Sora, em resposta – Eu não consegui nem arranhá-lo ainda!

Então, o monstro deu uma guinada violenta, arremessando Sora contra uma parede parcialmente inteira, e no segundo seguinte partiu para cima de Leene e Riku. Ele tentou se levantar e correr para ajudá-los, mas não conseguiu sair do lugar. Tudo o que ele pôde fazer foi observar, desesperado, o gigantesco monstro correr na direção dos dois, indefesos...

"Não...". Ele não conseguia se mover, e não conseguia nem mesmo gritar.

Não terminaria daquele jeito, terminaria? Não de uma forma tão estúpida.

–AFASTEM-SE! – então, para seu alívio, eles ouviram a voz de Cloud, que no segundo seguinte atacava o Behemoth, desviando a atenção dos dois – VÃO EMBORA DAQUI AGORA MESMO!

–Não podemos! – replicou Riku – Vamos ajudá-lo! Além do mais, precisamos chegar ao castelo!

–Vão embora, eu já disse! – retrucou o primeiro, esquivando-se de um ataque – Vocês não vão sobreviver cinco minutos aqui! VÃO LOGO!

Sora, enfim, conseguiu se levantar e correr até eles. Por um instante, os três observaram Cloud lutar contra o Behemoth. Por fim, Leene conseguiu arrastá-los na direção da passagem para Twilight Town (derrubando alguns Heartless com feitiços pelo caminho). Quando já estavam se afastando, ainda ouviram a voz dele, dizendo:

–Ei, garota!

–O que foi? – Leene se virou.

–Diga a ela que eu vou voltar em breve – por um instante, Sora pôde ver uma faísca passar pelos olhos dele – É uma promessa.

No instante seguinte, ele se voltou para a luta, esquecendo-se completamente da presença deles ali. Essa foi a deixa para que os três corressem até a passagem, e voltassem para a cidade.

Por um instante, eles desabaram no laboratório, completamente exaustos. Assim que conseguiu rearticular as idéias, Sora perguntou:

–De onde você conhece esse cara?

–De Radiant Garden, assim como você – ela respondeu – Uma vez, ele passou pela cidade. Meu pai, na época, era o dono da loja de equipamentos. Nossa, eu fiquei fascinada por ele – e, então, deu uma risadinha – Sabe como é, eu era criança, então logo pensei nele como um herói de armadura e tudo o mais. Depois, a Aerith me falou sobre ele um pouco mais. Mas acho que ele nem sequer se lembra de mim. E eu o vi outras vezes pela cidade, mas nunca cheguei realmente a falar com ele.

–Bem, pelo menos temos algo a reportar para o rei – disse Riku – As coisas por lá estão muito feias. Heartless que não morrem, a cidade toda destruída... mundos que envelhecem...

–...e alguém que é capaz de detectar Heartless até quando é impossível vê-los! – ela lançou a ele um olhar profundo e intenso – Sabe, um dia você vai ter que me explicar como fez aquilo.

Riku engoliu em seco. É, ele sabia. Um dia, ele teria que explicar. E isso seria doloroso demais.

–Não vou te encher de perguntas agora, cara – então, a expressão facial dela relaxou – Você deve ter seus motivos para não ter contado nada, antes, e eu vou respeitá-los. Mas preciso que confie em mim.

–É melhor irmos atrás da Kairi e dos outros – disse Sora, por fim – Precisamos... ugh! – e, então, sentiu uma pontada violenta no ombro direito – Droga, essa doeu!

–Deve ter sido de quando você bateu contra aquele muro – disse Riku – Você deve ter deslocado o ombro, vamos atrás de alguém que possa cuidar disso.

Ele concordou com a cabeça. De repente, percebeu que estava completamente exausto. A visita a The World that Never Was foi esclarecedora – e perturbadora. Alguém que podia envelhecer mundos definitivamente era um inimigo muito perigoso.

E ainda havia aquela voz. Ele encontraria algo – mas o quê? E o que isso tinha a ver com o que estava acontecendo?

Quando saíram da mansão, perceberam uma coisa, no mínimo, emblemática.

O céu estava nublado. Nuvens pesadas, de tempestade. Ventava forte, e as folhas farfalhavam, dando origem a um som triste e monótono.

Nuvens errantes. Vagando ao sabor do vento, sempre em lugares diferentes.

Será que estava nublado daquele jeito em Radiant Garden? Ou em Destiny Islands?

Será que um dia as nuvens voltavam para o lugar de onde vieram?

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Notas finais do capítulo

Nota da autora: Nada a dizer. Aliás, só uma coisa: estejam aqui no próximo capítulo, pois teremos o primeiro mundo da Disney. Três pistas: tem uma personagem super-bonita, não é um filme antigo e o tema de abertura é cantado por uma mulher. Fácil, né? xD Beijos, e até mais!