No More Secrets: Segunda Temporada. escrita por CoelhoBoyShiper


Capítulo 11
O gênio mais estúpido que já existiu. (A Musa - Parte 3)


Notas iniciais do capítulo

Boas festas a todos!
Como eu ainda não sei se vou conseguir lançar o próximo capítulo a tempo desse mês acabar, então já estou adiantando o "feliz natal" e o "próspero ano novo" [CAPÍTULO POSTADO EM DEZEMBRO DE 2017 NO SPIRIT]
Esse capítulo é um pouco maior do que a maioria, mas voces vao entender porque quando lerem rsrs
Espero que não desmotive a leitura
Sem mais delongas...



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O zunido das luzes incandescentes ligadas do laboratório penetrava seus ouvidos, martelando sua consciência que tinha dificuldades de se concentrar. Ford já estava numa etapa do seu trabalho na qual ele começara a fazer toda a tarefa na inércia. Defronte para ele, estava um dos seus diários abertos, ele estava devidamente anotando todo o progresso feito nas últimas semanas; era um trabalho, era um dilema, era tanto que ele queria escrever, mas pouco tinha realmente a falar. Porque a maioria das suas observações mal eram científicas. Ele vinha percebendo isso, desde quando Bill passou pela brecha dimensional de Gravity Falls para morar com ele, as ocorrências do dia a dia dos dois mal se concentrava em descobertas das ciências ou das anomalias da cidade.

Stanford tinha muito o que falar, mas eram coisas... banais. Ele tinha uma vontade enorme de descrever sobre o processo social que Bill estava fazendo, queria listar os componentes de sua aparência humana, os entraves provindos da sua personalidade de outra realidade...

O cientista não conseguia tirá-lo da cabeça.

Ele já notara que gostava muito de Cipher desde as primeiras vezes em que havia batido o olho nele, mas era quase incômodo o modo com que aquele afeto só tendia a aumentar com o passar do tempo, e na medida em que o loiro ficava mais habilitado a casa, a cidade, as pessoas, ou seja, na medida em que eles ficavam mais confortáveis um com o outro e mais íntimos.

Quase contra a sua própria vontade, Ford havia se pegado inúmeras vezes, incluindo o momento de agora, fazendo rabiscos e rascunhos pelas páginas de seu caderno que anatomizavam o corpo de Bill. Quando acreditava que o garoto estava distraído o suficiente com qualquer tarefa civil que tomasse a sua atenção, Ford se colocava a observá-lo. Ele acreditava agora saber cada mínimo detalhe do rosto da criatura – e ele amava cada detalhe dele.

Não pôde deixar de, num descuido de sentimentalismo, folhear as páginas do diário livremente, permitindo-se se perder nos desenhos que havia feito de Cipher. As imagens olhavam para ele; no começo, ele havia desenhado apenas as feições do ser, mas, com o passar do tempo, havia arriscado em ser mais ousado... agora as imagens representavam o menino de corpo inteiro, muitas vezes com poucas peças de roupas, e até em posições... bem, digamos que, até mesmo provocantes.

— EI, SIXER!

O urro de Cipher, vindo detrás dele, o arrancou de suas fantasias e fez Ford ter uma reação instintiva de pânico, fechou o diário apressadamente com um estrondo – temendo que o outro descobrisse sobre sua fascinação intensa.

— O que você está fazendo? — perguntou o loiro, se aproximando. — Eu estive te chamando há um tempão!

— E-eu só estava organizando algumas coisas no diário... nada de mais. Você chegou cedo, né? — mesmo com o nervosismo à mostra, Ford não tinha mentido. Mesmo assim, Bill sentiu-se desconfiado o suficiente para que olhasse de soslaio para o caderno que jazia debaixo da palma grande dele. O cientista notou e tratou de guardar o objeto dentro do bolso do jaleco. — Uau! Alguém aqui foi às compras. — disse assim que viu o que o amigo vestia. Bill estava equipado com o conjunto de um sobretudo amarelo, uma camisa social por baixo com uma grava borboleta de nó pronto, calças de linho e uma bengala na qual Ford jurava já ter visto antes em um dos brechós da cidade. — Onde vai ser o baile?

— Aqui. — respondeu ele, sua voz transparecia um resquício inconfundível de animação. — Já trabalhamos demais, não acha? Merecemos um descanso. Comprei algumas coisas, estão na cozinha.

Na verdade, não. Ford não achava que eles tinham trabalhado demais depois que Bill tinha chegado. O projeto do portal estava congelado, quase sendo mandado para a gaveta, ele chegou até a cogitar a possibilidade de ligar novamente para Fiddleford e descobrir se ele tinha algumas ideias para sobrepor aquele beco sem saída no qual se deparavam. Mas, por algum motivo estranho que ele não compreendia, Bill não parecia tão preocupado com aquilo.

Ele, então, rendeu-se ao convite do loiro, despretensiosamente. Não podia negar que adorava a companhia casual dele, e, naquele instante, até mesmo supôs que um pouco de distração habitual, como um simples jantar descontraído, pudesse abrir as vias da sua mente para novas ideias posteriores ao projeto.

Assim que subiu, sendo guiado pela voz de Bill através da escuridão daquela casa durante aquele horário da noite, não pôde deixar de notar o adereço particularmente íntimo que o mono-olho havia deixado pelo caminho: ele havia acendido inúmeras velas. As paredes da casa tremeluziam sob as chamas atraentes, a atmosfera ganhando um aspecto esteticamente sedutor de cores quentes. Ao chegar à cozinha, onde o número de iluminações naturais aumentou, Stanford não deixou de observar a mesa posta para duas pessoas, com uma caçarola lacrada, uma garrafa de bebida, pratos, talheres e taças reluzentes.

— Eu não tenho paciência com essa coisa de cozinhar — crocitou Cipher, puxando uma das cadeiras para que ele mesmo pudesse sentar. —, então já comprei tudo pronto. Desculpe quebrar as suas expectativas, Seis-dedos.

— Isso é... ótimo. — declarou ele, sem jeito. Em seguida, puxou a sua cadeira para se acomodar no ambiente, tirando o jaleco e o deixando apoiado no espaldar. — Não lembro de ver a energia caindo dessa vez. — fez a piada interna, referindo-se às velas. Cipher demora um pouco a compreender, porém ressurge com o um sorriso controlado, sem mostrar muito os dentes.

— Eu já deixei claro o porquê de eu gostar tanto das luzes de velas por aqui, não foi? — ergueu uma sobrancelha de intenções incógnitas para Ford. O coração do cientista se aperta e ele, estranhamente, começa a sentir as suas palmas ficando mais escorregadias uma sobre a outra.

— Então... o que temos pra hoje? — prosseguiu com a casualidade, achando bizarro o modo com que ele reagia diante a qualquer tipo de implicação buliçosa de Bill. Ford até hoje não sabia discernir se ele apenas brincava com ele, ou se eram brincadeiras com um fundo de verdade... como sempre, ele tinha aquela dificuldade de ler os outros.

— Guisado de carneiro.

— Excêntrico. — surpreendeu-se. — Escolha interessante para quem não gosta de comer. Onde você conseguiu ao menos encontrar um lugar que vendia uma coisa dessas aqui em Gravity Falls?

— Hum... essa cidade é cheia de surpresas. — sorriu ao colocar em evidência o duplo sentido que os dois entendiam naquela frase. Enquanto isso, Pines estava a retirar a cobertura de papel isolante do recipiente, o cheio sedutor do prato se levantou, mergulhando o aposento no seu aroma. Uma mistura de temperos e condimentos que já atiçava a fome apenas ao se conectar com o sistema olfativo.

Stanford serviu a ele mesmo e ao companheiro diante dele, sempre colocando menos quantidade no prato do outro. Após, ao ver o saca-rolhas deitado na toalha quadriculada nas cores vermelho e branco, rumou até a garrafa de vinho e desenroscou a rolha do bico com um estalo. Bill olhou com curiosidade, ele não podia gostar muito de comer, mas tinha certa atração por líquidos, faziam o seu estômago menos pesado ao mesmo tempo em que prolongava a sensação de satisfação no seu sistema corporal. — Já bebeu isso alguma vez? — quis saber Ford, Cipher devolveu com o olhar de quem não tinha certeza.

Colocou a mesma quantidade da bebida em cada uma das duas taças. Começaram a comer em silêncio, de vez ou outra dando pausas para beberem ou comentar uma coisa trivial ou outra sobre como a refeição estava boa, e derivados. De repente, a mente de Ford se pegou submergindo a si própria no céu estrelado que estampava o final do horizonte visto através da janela. A noite estava fabulosa. E, bem claramente imprimido no véu de pontículos luminosos, Stanford mal podia acreditar no que via com os próprios olhos: a constelação da ursa maior.

— Impossível... — pensou em voz alta sem perceber, num sussurro de deslumbre.

— O que foi? — quis saber a criatura paralela a ele, já, impressionantemente, se servindo de outro copo do vinho. — Você também está vendo ela?

— A ursa maior? Sim. Eu não fazia ideia de que era possível enxergá-la a olho nu.

— E não é. — Cipher deu uma risada.

— Gravity Falls e suas peculiaridades... me interessa o quanto esse lugar possa atrair tantas... aberrações.

O queixo de Bill se retesou.

— Você me acha uma aberração?

A pergunta inesperada arranca o chão sob os pés de Stanford e o clima amigável despenca dentro deste buraco, como estrelas brilhantes sendo sugadas para dentro do buraco negro do arrependimento. Ford mal tinha percebido a tamanha besteira que ele havia dito.

— N-NÃO! Claro que não penso isso de você! Eu... — deu um baque assim que percebeu o quanto ele se apressara para contornar o mal entendido, deixando que o seu sentimentalismo incontrolável se sobrepujasse.

— Você o quê?! — a postura irritadiça do novo humano adiante dele continuava proeminente.

— Eu só me expressei mal, desculpa. — deu mais um gole demorado na bebida, tentando disfarçar o nervosismo iminente e torcendo para que mais da bebida ajudasse-o a se tranqüilizar naquele entrave no qual era pouco comum para ele.

— E você? Você também acabou vindo pra cá por acaso, não foi? Também se acha uma aberração?

O peito de Pines congela. Paralisado devido ao obstáculo intangivelmente emocional, qualquer movimento que ele realizava fazia o som das suas juntas estalando e dos ossos se reorganizando parecer estrondosamente incômodo.

— Olhe — começou. —, nós dois precisamos entender que nós não somos o tipo de coisa mais normal por aí.

Bill virou o resto do vinho, empertigando-se contra o assento, pronto para uma briga.

— E daí, Sixer?! O que o fato de nós sermos diferentes nos faz automaticamente sermos um problema?!

— Você sabe que eu não queria dizer isso. Acredite, eu... — o coração dele colidia com violência contra os seus pulmões, deixando estes debilitados e Stanford quase sem ar. Ele não acreditava que estava a ponto de fazer aquilo, ressuscitar aquelas lembranças abomináveis. Respirou fundo. Era a hora de ele deixar aquilo claro não só para Bill, mas como para ele mesmo. — Eu sei como ninguém o quanto é ruim ser taxado de “aberração”.

Os ombros de Bill caíram, tamanho o peso da sinceridade encadeada à frase do amigo. Curvou-se sobre a mesa, tentando observar o rosto de Ford que encolhia cada vez mais na medida em que ele o escondia pela vergonha, cabisbaixo.

— Sabe de uma coisa — recomeçou Bill, dessa vez com a voz baixa e reconciliadora. —, você já perguntou quem eu era, de onde eu vinha, e eu já te contei diversas vezes. Mas você nunca me falou especificamente de você, Six’... Por quê?

Ford continua quieto, sem encará-lo. Aquilo entregava tudo.

— O assunto da “aberração” tem a ver com isso? — teve que perguntar, precisava trazer o assunto à tona. Não houve resposta. — O seu passado... a sua vida antes dessa cidade, antes de mim, você... você quer conversar sobre isso?

— Por que alguém iria gostar de ouvir sobre um estorvo como eu? — resmungou feito um adolescente, levantando a mão para esconder uma lágrima que se formava no seu olho direito, botando a palma de volta à mesa em seguida. Bill se exasperou.

— Stanford, por favor, eu sou o seu amigo... não sou?

Cipher avançou para pegar a mão do outro, foi quando, involuntariamente, se deteve, disfarçando ao pegar na garrafa novamente, mas já era tarde demais – os dois já tinham percebido as intenções dele. Foi assim que a noção daquela estranha reação se abateu sobre os dois:

Eles nunca haviam se tocado antes.

Nunca. Jamais.

Desde quando Bill tinha saído do portal, nem ele nem Ford tinham sequer apertado a mão um do outro. Nenhum abraço, carinho, toque de companheirismo, tampouco tapas ou socos. É como se houvesse uma barreira natural que mantivesse os dois no mínimo com um metro de distância na maior parte do tempo. Bill não podia explicar o porquê daquilo, muito menos o ilustríssimo cientista renomado.

Há certas questões que nenhum estudo explica.

Seria aquele o momento certo para fazer aquilo?

— Eu não gosto de falar sobre isso. — persistiu insolúvel.

— “Tem que botar pra fora para se sentir melhor”, não é isso que vocês costumam falar por aí? — forçou-se a sorrir. — Vamos. Não faria isso... por mim?

O rosto sombreado de Ford virou-se até o dele, Bill conseguiu ver os seus olhos marejados à beira de uma catarse emocional.

— Eu sempre me senti como se não pertencesse a esse mundo. Você acreditaria se eu te dissesse que você é a primeira pessoa na qual eu posso chamar livremente de amigo? — a muralha começara a ruir, lentamente, tijolo por tijolo. — Eu tive um irmão gêmeo até certa parte da minha juventude, Stanley. Foi a partir dele que eu pude notar as diferenças que eu carregava da maioria das outras pessoas. Stanley sempre fazia muitas amizades, ele era extrovertido, brincalhão, a pessoa que todos queriam chamar para ser amigo e ir a festas, clubes, eventos e passeios. Eu não. Eu devo admitir que até invejava ele algumas vezes. O modo com que ele se encaixava com o resto... eu me perguntava como ele conseguia. Ser assim, tão... normal. Eu tentava me espelhar nele além da nossa aparência. “Por que somos tão parecidos e, ao mesmo tempo, tão, tão distantes?” Eu sempre quis ter o que ele tinha, por mais que ele tentasse me enquadrar nos grupos de amigos e conversas que eles tinham, eu sempre me sentia deslocado. As pessoas ao meu redor conversavam comigo como se tivessem que falar por obrigação. Era notável o quanto a minha presença, ou a falta dela no caso, incomodava. Não há sensação pior do que se sentir solitário no meio de tantas pessoas...

O loiro foi capaz de sentir na pele as reticências relutantes que ecoaram do homem, e fez para ele um gesto com os olhos, encorajando-o a continuar.

— Foi por isso que eu comecei a me interessar pelas áreas cientificas. Tudo começou quando eu era bem novo, com menos de dez anos de idade eu consegui ler um livro de neurologia inteiro. O motivo? Eu queria entender o que tinha de errado comigo. Por ver tantas pessoas iguais, e eu lá, diferente, sem conseguir me aproximar de nenhuma delas nem me interessar pelo o que o resto se interessava, eu cheguei a cogitar a possibilidade de ter algum distúrbio mental. Consumia milhares de acervos científicos sobre doenças e atrasos mentais. Foi quando eu percebi uma coisa: por mais que eu não conseguisse achar qual era o problema exato comigo, eu consegui descobrir sobre pessoas que eram iguais a mim. Pessoas e animais com anomalias, partes do corpo faltando ou em quantidades maior do que o normal, mentes mais desenvolvidas e dotadas. Se tinha um lugar no qual eu parecia dominar sem nenhum problema, era os números e as biologias do mundo ao meu redor. Eu amava os livros, porque lá era onde eu sentia que, de algum modo, eu podia ser entendido. Tirando notas altas, ganhando prêmios e destaques acadêmicos, eu sentia recompensado por ser sabe... eu mesmo. — inspirou fundo, e se serviu de outro copo da bebida assim que Bill fez o mesmo.— Foi assim que eu vim parar nessa cidade, ela parecia chamar por mim, sabe? Parecia ter sido feita para mim.

— E por que você reage a isso como se fosse uma coisa ruim? — perguntou Bill, severo e compassivo ao mesmo tempo. Stanford deu de ombros. — Você deveria se orgulhar de quem você é. Se orgulhar da grande capacidade que há dentro de você. Você ser diferente de todos não é o problema, é a salvação!

— É. E onde isso tudo me levou, Bill?! — inquiriu ele, transtornado. — Me diz. Olhe para mim. Olhe para onde eu estou agora! Você me vê com um grande status social? Me vê portando algo que as mães humanas diriam “se orgulhar” do filho que tem? Eu já tenho quase trinta anos e não tenho mulher nem filhos, e nem sei se um dia terei capacidade de ter. Do que adianta ter uma grande mente com um coração medíocre?! — levantou-se num rompante, quase derrubando a mesa, já caminhando com passadas firmes para fora da sala. As palavras duras dele serviram de corda para o ego impulsivo que era novidade dentro das percepções humanas de Bill, e, sem pensar racionalmente sobre o que estava fazendo, o loiro se levantou e literalmente correu até ele.

Eles já tinham saído da cozinha, chegando no corredor, próximo à porta da sala de estar quando um sentimento desesperador derramou-se por cima de Bill: uma pontada afiada logo abaixo do seu coração, uma sensação desconfortável que só aumentava cada vez mais quando ele via Ford se afastando, o que o fazia urgir pela sua presença imediata que cessasse aquele desconforto. Então, apertou o passo aos sons do choro desvairado do homem e, recusando todas as cerimônias, se jogou na direção dele, o segurando com força nos dois braços.

Assim que eles se tocaram, a descarga de uma energia diferente nasceu para cada um, como um arrepio movido à eletricidade que ergueu todos os pelos do corpo dos dois.

Ford parou, virando-se para o outro, atônito. Bill o içou contra a porta, impedindo-o de fugir mais ainda. Uma vez um defronte para o outro, agora ele escutaria.

— Então você ter me encontrado foi um erro, Stanford?! Nossa amizade foi um erro?! Vamos, me diz!

— Não... — a voz dele era tão retida pelos soluços que Bill pensou não ter escutado de primeira.

— Foi o que eu pensei. Nunca mais diga isso novamente, ouviu bem?! Eu não admito ouvir você, um homem tão magnífico, se rebaixar desse modo. Eu não admito ouvir você falar de nós desse modo, nunca! Eu... E-eu... — ele não percebeu que começara a soluçar também, aquilo era novidade. “O que eu estou fazendo?!” — Eu te trouxe para cá, Ford. — revelou. — Observando o mundo humano durante todos esses anos, eu senti que tinha alguém diferente, alguém diferente de todo mundo... alguém que podia fazer a diferença para mim, alguém que tinha capacidade suficiente para abrir o portal, alguém... alguém que desse sentido a minha existência! Você. Eu esperei alguém como você por tanto, tanto tempo... — por mais que ele tentasse, ele não conseguia deixar a voz audível de novo, não conseguia manter o autocontrole. Permitiu-se cair sobre o peito de Ford, escondendo as lágrimas, o corpo dele era quente e confortável, e Bill parecia se encaixar perfeitamente nele. “Que porra eu estou fazendo?!”

— Eu também, Bill. Eu também. — consolou o outro e a si mesmo, colocando a mão sobre a cabeça dele relutantemente, seus dedos afundaram naquele cabelo loiro liso e macio.

— Eu sei como é a sua situação, Ford. Eu sei exatamente como é. Eu estive sozinho por quase um trilhão de anos. Dá pra imaginar o quanto de tempo é isso? Eu não notei o quanto eu me sentia péssimo até me tornar isso... esse... humano sentimental asqueroso.

Pines tirou as mãos do cabelo do outro e passou para as costas, abraçando-o enquanto os punhos de Cipher continuavam fechados sobre o peitoril dele.

— Eu não te acho asqueroso desse jeito. — todos os ossos de Stanford se contraem, querendo manter aquele menino na frente dele a salvo.

— E eu não acho que você tenha um “coração medíocre”. Eu acho o seu “coração” incrível. — disse, mal percebendo que ele, justamente, escutava as batidas desenfreadas do dito cujo ao deitar a cabeça sobre o tórax do amigo. — E é verdade o que você disse mais cedo, nós não somos a coisa mais normal que existe. Não somos a coisa mais harmônica desse mundo. Mas é como você tinha dito aquele dia na cafeteria. É como o outono. Agridoce. A vida não seria tão perfeita se não tivesse suas imperfeições. — a sua respiração, cada vez mais próxima contra Ford, era quente, enrolando-se o pescoço dele. — Nós dois... somos imperfeitos... — sua voz já sumia, estando tão próxima a pele do homem. — e, exatamente por isso, juntos... somos perfeitos. — aproximando-se pela última vez, eles fecham o espaço restante entre os dois assim que os lábios finalmente se tocaram.

A luz daquela energia adejou no interior deles, afugentando para longe as sombras frias de cada um e substituindo-as com calor.

O elo entre os dois era macio, lento, perfeitamente contraditório a fome que cada um tinha pelo outro, demarcada pelas batidas cada vez mais colidentes de seus corações. Cipher retira as os punhos de entre eles e os abre em palmas, fechando-as em torno do pescoço de Ford – ele o queria, muito. As pernas de Ford vacilam diante a sensação, abrindo, dando espaço para que ele pudesse puxar Bill com mais força para próximo dele. A perna do loiro escorrega entre as duas do maior, e o toque naquela área tão sensível só os faz quererem mais.

Só pararam quando já não conseguiam mais respirar. Eles não disseram nada, apenas deixaram-se guiar para dentro da sala, onde a sofá residia bem próximo da entrada. Ford caiu ajeitado no assento almofadado, trazendo Bill para mais perto dele. O garoto de um olho só engatinha pelo sofá, subindo no colo de seu guardião, ele aperta os seus lábios contra os dele mais uma vez, acarretando em um gemido contido da parte do outro.

Cipher colocou as mãos em volta da cintura dele, garantindo desesperadamente que aquele homem ficasse perto dele o tempo todo. Stanford encapsula o rosto triangular do loiro com as duas mãos, guiando a mandíbula dele para mais perto. Os sentimentos entre os dois se tornam inegáveis e irresistíveis. A última coisa que aconteceu que foi capaz de tirar Pines do seu êxtase de prazer, fazendo sua mente se ajustar racionalmente, foi quando ele sentiu as mãos esguias de Bill penetrando o cós da sua calça.

Afastou-se dele, súbito.

— Eu sou virgem. — disse ele, mortificado.

— Tudo bem. Eu... eu também sou, tecnicamente. Eu nunca fiz isso como humano, nem com outro humano, então... será a minha primeira vez também. — a gema púrpura de Bill chamejava feita a luz da vela mais brilhante na penumbra agradável da sala. A voz dele estava rouca, baixa e murmurada, fazendo cada centímetro da vertebral de Ford se arrepiar.

— Mas você... está muito vulnerável agora.

Ele fez uma expressão que mostrava que não havia entendido.

— Como assim, Six’?

— Quantas taças de vinho você teve, Bill?

— Mais do que eu costumo ter de qualquer outro líquido. Por sinal, aquilo é muito gostoso. — riu-se.

— Você está bêbado, amigo. — segurou o riso, não podia negar a si mesmo a graça que era ver ele, o deus imponente, abrigador de todo o conhecimento, tão humano e bobo daquele jeito. Ele era completo.

— Estou? — soluçou.

— Inteiramente chapado. — Ford fez um cafuné na nuca dele, dando espaço a um sorriso bobo no rosto.

— Ah! Então é essa a sensação? Céus, estar chapado é hilário! — e curvou-se para voltar a beijá-lo.

A virilha de Bill roçava contra a de Ford, as roupas dos dois ficando cada vez mais apertadas e desconfortáveis. Separaram-se por um instante. Ford traçou o seu dedo indicador pelo maxilar de Bill, indo em direção ao pescoço dele e tirando a gravata borboleta em um só puxão. Enquanto isso, com a outra mão, acariciava os lábios úmidos do loiro – Bill conseguia sentir o sangue de Pines pulsando por sob sua pele, quente e vivo, e apressou-se em beijar o pulso dele delicadamente.

— Você é perfeito, Stanford. — sussurrou, suas percepções quase virando um devaneio ao se perderem naquele labirinto de descobertas. O volume protuberante nas calças do outro já estava a incomodar os dois. Bill se desfez da sua camisa rapidamente, ajudando Ford a se livrar do suéter em seguida, seus dedos percorrendo toda a extensão daquele corpo firme e definido, mas que, ao mesmo tempo, pertencia a um indivíduo tão delicado e quebradiço.

Cipher o tocava com cuidado, com medo de partir o outro em dois, embora fosse quase impossível controlar aquela sensação que graduava dentro dele, só o impulsionando cada vez mais à beira da virilidade. Desabotoou a calça e o membro de Ford estava ali, despontando urgentemente sob o tecido da sua samba canção xadrez vermelha. Nenhum dos dois aguentava mais. Bill terminou de se despir, permitindo que ambos ficassem apenas de roupa íntima um sobre o outro. Era impossível até mesmo notar o frio do ambiente, os dois se sentiam tão quentes, as peles em brasas ao deslizarem uma sobre a outra.

Os dois se olharam mais uma vez, ofegantes. Ford pensa sobre tudo que tinha acabado de ocorrer, tentando se convencer de que aquilo estava mesmo acontecendo. Perguntou-se se tinha algo de errado em ter se aberto tanto para Bill daquele modo – as infelicidades do seu passado, a sua sexualidade... porém, no entanto, a mera ideia de simplesmente ir para o quarto sozinho e tentar dormir com os demônios do seu psicológico abalado é demais para ele suportar.

— B-Bill — pediu nervoso. —, fique comigo, hoje, por favor.

Bill deu um sorriso e seus dentes afiados dilaceraram todos os medos e incertezas na aura de Ford. E, como se ele fosse a pessoa que mais o entendia no mundo (e talvez fosse), ele se aproximou e respondeu:

— Não se preocupe. Eu vou fazer essa noite ser menos escura.

O calor inesperado da frase derrete o resto de temores solidificados nas ações de Stanford, e, nisso, Cipher pega nas mãos dele. Ford sente uma vibração incomum nos dedos, uma formigação que percorre o seu corpo, se concentra e fluí atrás dos seus seis dedos em particular – quase come se Bill causasse aquilo— e o loiro o guia até a sua cintura, usando as mãos de Ford para descerem a sua própria cueca.

Uma vez completamente desnudo, Bill nunca pareceu tão completo para o homem. Pines se lembra o quanto ele imaginava ver aquele corpo assim, tão vulnerável, diante dele, lembra-se dos desenhos que fazia, e o quanto nenhum deles se aproximava de tamanha magnitude que aquele ser irradiava nele. Nenhum dos seus rascunhos, desenhos, fantasias, nada se comparava àquilo. E ele estava cansado de ver aquelas cenas como só ficando nos papéis. Levantou a coluna, aproximando os rostos e colando os lábios um no outro, dessa vez ele o beijou.

Bill solta um gemido e Ford consegue sentir a fisgada do membro do loiro colidindo contra o dele. O maior passa o outro para mais acima do seu colo, fazendo os dois se acomodarem melhor, e desce o resto da parte de baixo da sua roupa.

Não havia mais nada que os separassem.

— B-Bill, eu... não estou aguentando... mais. — difícil era a tarefa de falar algo audível em meio a tantos suspiros e respirações entrecortadas.

O mono-olho deslizou as mãos suavemente até o falo de Ford, que se retesou no mesmo instante ao toque imprevisto, a cabeça estava transbordando com o pré-líquido e o resto do mastro, até a base, pulsava e se contraía, impaciente. — Eu também não. — sussurrou ele voluptuoso, colocando-se por cima de Stanford. O membro, rígido, resvalou sobre a entrada dele e Bill teve que suprimir um gemido que ele temia sair alto demais.

— Vai com calma. — instruiu Ford, tirando paciência de lugares desconhecidos. — Você não quer se machucar.

Bill soltou um grunhido displicente, empertigando-se sobre o outro, as testas se encontrando à medida que Bill tentava colocar Ford dentro dele. — R-Relaxe — pediu o cientista de novo, preocupado, afagando a nuca e as costas do menino, dando o seu máximo para que ele se acalmasse. —, você consegue.

O loiro respirou fundo e fechou os olhos com força, seu corpo todo a tremer enquanto ele ia descendo cada vez mais fundo sobre o colo de Stanford, parando uma vez ou outra pra readquirir o ar. Quando finalmente se sentou todo sobre ele, ergueu o olhar para o outro, e Ford o sustentou com um compassivo e encorajador.

Passando as mãos das costas dele até as nádegas, Ford começou a fazer movimentos investidos contra Bill, que relutou de primeira com o desconforto, se soltando aos poucos no que seu organismo se readaptava a presença do novo componente dentro dele. Ford beijou de leve a ponta do nariz dele — Estou te machucando?

— Não. Por favor, não para. — suplicou, a boca entreaberta escorrendo saliva.

Lascivo, Ford sorriu e deu uma investida agressiva nele. Bill cerrou os dentes e puxou o couro cabeludo do seu par — M-Maldito... — conseguiu entrar na provocação dele, forçando-se a sorrir enquanto ainda mantinha os olhos semi-fechados.

Pines repudiou o riso de sair, deu um pequeno belisco atrevido na bunda de Cipher antes de voltar com as investidas. — Você está muito tenso, apenas relaxa, ok? — cutucou-o com o nariz para que ele pudesse olhá-lo nos olhos. — Preste atenção em mim agora, ok? Siga o ritmo.

Bill fechou os olhos, focalizando-se nos seus sentidos, Stanford tomou o pênis dele com a mão direita, massageando-o na mesma ordem de suas investidas. Bill quase dá uma exclamação, todos os componentes do seu corpo entram em pane e param de funcionar direito, sem sua autorização, as suas entranhas se enchem de comichões, que só se multiplicavam infinitamente a cada movimento, a cada beijo, a cada toque, a cada respiração, a cada mísero segundo daquela memória inolvidável.

Ele sente aquela pressão aumentando dentro dele na medida em que ele começa a perder os sentidos do que acontecia em torno dele, por um segundo, não havia mais nada; só eles. O aperto, concentrado na base do seu estômago, intensifica, e todo o seu corpo estremece e ele precisa realizar um esforço hercúleo para que fosse capaz de se dirigir ao homem que gerava tudo aquilo nele:

— F-Ford... eu... não sei o que está acontecendo comigo! — sua voz é quase um estrépito animalesco, os seus joelhos não paravam de tremer. — Tem algo de errado! E-eu nunca senti isso antes...Ahn–!

— Só relaxa, Cipher. Só deixa acontecer. — os gemidos roubam a fala de Ford e ele se aprofunda mais no outro, mais veloz e designado na sua ação. — Se solta.

— For...!

Um frenesi desgovernado jorrou dentro da sua razão, e sua consciência ficou inundada de descontroles tórridos. Por um segundo, Bill sentiu como se sua mente tivesse desaparecido, já que ele sentiu-se como se não estivesse ali, seus pensamentos pareciam ter dado uma falha elétrica, pois, quando deu por si, estava caído sobre Ford, os braços e pernas fracos debruçados paralelamente a ele, ao som dos dois a arquejarem desesperadamente para recuperarem o fôlego perdido. Ele sentiu uma umidade incomum escorrer por fora da sua barriga e dentro dele, e a revelação veio à superfície do seu mar agitado de fascínios:

“Oh! Então é isso que é o tal orgasmo. Agora eu entendo porque os humanos adoram tanto fazer isso e se reproduzem feito coelhos.”

— Como foi? Como você está? — ameigou Stanford, com a mão inerte e os seus dedos ainda sob o estranho efeito do formigamento.

— Bom. Cansado. — replicou Bill simplório quase num sopro, a resposta devidamente incompleta por causa da sua respiração e pensamento entrecortados.

Ford riu-se, satisfeito, e abrangeu o loiro mais ainda no conforto dos seus braços. — Obrigado. — disse ele.

“Obrigado digo eu”, pensou Cipher ácido. Ele agora sentia uma protuberância incomum por debaixo do seu tapa-olho, ao passar os dedos discretamente sobre ele, pôde compreender: o seu outro olho, o que supostamente não existia antes, estava ali, fechado – a confirmação de que seus poderes haviam retornado devidamente.

 

*

 

Stanford não se lembra de quando havia dormido, só lembra de ter tido algum pesadelo funestamente abstrato que o fez despertar num impacto deliberado, se levantar do sofá em um pulo.

— Bill! — ele chamou, ainda entremeado nos estágios do sonho e da realidade, porém, a única resposta que ele recebeu de volta havia sido o silêncio. Um temível silêncio frio.

O seu pânico desentendido aumentou quando sua mão avançou para o seu lado e ele nada encontrou, o resto de espaço no assento estava vazio. “Bill? Onde...?”, perguntou-se, notando que abraçara o vazio. O nada era a presença ilustre naquela cena e não era um hóspede bem-vindo.

O homem olhou para todos os lados, tentando olhar algo no breu. Sem sucesso, acendeu o interruptor perto da parede. A luz alaranjada lavou as sombras e Ford conseguiu ver o que mais o perturbava: nenhum sinal dele.

“Por que eu estou tão preocupado assim?”

Como se seguisse o seu estado emocional, os seus dois dedos extras em suas mãos começam a formigar. Uma resposta corporal nada amigável. O frio decai e ele se abraça, tentando se aquecer e detestando o quanto sentia falta do calor de mais cedo. Ele se dirige próximo aos pés da poltrona e recolhe as suas vestimentas e, vestindo-as despretensiosamente, ele saiu da sala.

Os passos dele arranham a quietude inquietante da casa assim que ele se depara com uma luz forte dimanando pelas fendas da porta entreaberta do porão. Fosse o que fosse, ele sentia que era lá onde Bill estava, e, por algum não saber angustioso, ele não estava gostando nem um pouco daquilo.

Suprimindo a vontade de dar as costas e sair correndo do conflito iminente, Ford abriu a porta e desceu as escadas, cada passo fazendo-o ter a impressão de se afundar na parte ominosa de um enredo de suspense.

Ao identificar de onde vinha a luz, se segurou para não deixar o queixo despencar.

O portal estava aberto.

Completamente.

— B-Bill...? — ele ouvia vozes sibilando sorrateiramente daquela porta para outra dimensão, feito sussurros fantasmagóricos se arrastando para fora de uma cova. “Como o portal foi aberto?! Eu não tinha conseguido, então, como isso foi possível?! O que Bill tem a ver com...?”, seus pensamentos se estagnaram durante a compreensão da surpresa, as frases antigas de Bill voltaram a lhe cochichar no ouvido:

Eu falei que se eu tivesse meus poderes, eu poderia facilmente terminar de abrir o portal que você está tentando construir no porão. Eu seria a chave mestra para tal.

“Mas... como ele teve os poderes de volta? Ele encontrou uma pessoa Índigo nesse meio tempo e transou com ela?!”

Ele já estava na beira do portal – contemplado a magnitude sedutora das ondulações daquele tecido cósmico a tremular adiante, como se acenasse para ele, convidando-o a entrar – quando suprimiu um arquejo de espanto.

Ele havia entendido tudo:

Fizemos os Índigos nascerem com características... singulares. Marcas no corpo e na mente que os diferenciam dos humanos normais, para, assim que batermos o olho neles, sabermos identificá-los com mais facilidade e num curto espaço de tempo.

As suas mãos de seis dedos tremeram em resposta, de forma tão assustadora quanto um aviso apocalíptico, fazendo a ficha despencar.

— Não...!

Incrédulo com o que acabara de descobrir e com o que estava prestes a fazer, Stanford saltou para dentro do portal.

A luz diminui gradualmente uma vez que ele reconhece o lugar no qual ele já esteve antes: o mindscape. As vozes que antes pareciam apenas sussurros distantes se ressaltam, virando uma conversação completa. Era Bill, falando com mais alguém:

— ... eu fiz tudo que você me mandou fazer.

A cena espanta o cientista. Bill (de volta à sua forma geométrica simplista de um triangulo flutuante amarelo, por estar na dimensão que o trancafiava obrigatoriamente nesse formato) estava de frente para uma frincha rasgada no meio do nada – um portal dimensional incompletamente formado para outro lugar não identificado – que parecia, assustadoramente, a ponto de se romper feito uma represa frágil prestes a alagar e matar toda uma população.

Bill estava conversando com uma criatura de aparência tenebrosa, porém pouco se podia ver devido ao véu translúcido-quase-opaco do novo portal vermelho que se abrira, mas que dava a entender ser muito maior e bem mais poderosa e intimidadora do que Bill, tanto que o mesmo mantinha uma postura educada e inferior diante de quem conversava do outro lado da “janela”.

— Bill, você mentiu para mim!

Stanford não aguentou. Berrou em voz alta, conturbado.

Um silêncio inquietante perdurou até Bill se virar, ele havia parado, mas não parecia surpreso com a presença de Ford. Impassividade resplendia no único olho do triângulo. Perturbado com a situação, o outro continuou:

— Para onde esse portal realmente leva?! — inquiriu num misto de estresse e medo.

Bill riu, uma risada cortante, maligna e completamente diferente do garoto que ele ouviria mais cedo. Ford estremeceu.

— Parece que o Senhor-cérebro finalmente ficou esperto. — debochou. — Vamos apenas dizer que quando aquele “portal” termine de carregar, a sua dimensão vai aprender a... festejar. Não estou certo? — virou-se para a criatura que se escondia atrás da fenda, dessa vez foi ela quem riu, e foi pior ainda do que Bill. Um riso gutural, alto, reverberou pela segunda dimensão e no espírito de Ford e um frêmito de pânico passeou nele.

“Ele mentiu para mim! Todos esses meses, nossas conversas, promessas... essa noite...!”, lutava contra as lágrimas, não era hora de fraquejar; mas a sua mente era teimosa, continuando a evocar uma pequena voz agressiva nos fundos do seu raciocínio: “Ele mentiu para você, Ford. Ele nunca foi seu amigo! Você continua sozinho!”

— Não! Eu vou parar você! Eu desligarei o portal! — ameaçou alto.

— Trato é trato, Sixer! Você não pode impedir a ponte entre os nossos mundos de colidirem, mas seria divertido ver você tentar, fofo até.

A película da ilusão termina de se desintegrar sob a acidez destilada da realidade. Ford recua. “Isso é impossível, não está acontecendo... Eu devia ter percebido antes, eu devia ter impedido meus sentimentos de cegarem o meu lado racional; era tudo perfeito demais para a minha vida miserável. Eu sou o gênio mais estúpido que existe!”

— Me observe! — aproveitou enquanto o triângulo estava distraído ao se virar do lado contrário, para dar as costas e correr em disparada na direção oposta, pronto para sair pelo mesmo lugar que entrou.

— Não deixe ele escapar! — a voz absurdamente alta do monstro desconhecido retumbou, dando ordens a Bill.

Mas Ford, miraculosamente, fora mais rápido e conseguiu atravessar a passagem, despencando de volta no seu mundo. A dor da queda que teve sobre o chão do seu laboratório no porão não se comparava nem de longe a dor que ele sentia esfrangalhar o seu coração pouco a pouco.

Apertou o passo e, sem pensar duas vezes ao realizar o que era – provavelmente – a coisa mais difícil que teria que fazer na sua vida, apertou o botão principal da máquina, que residia na frente de tudo diante de todos os comandos. Houve flashes das luzes da máquina e o som rascante de tudo sendo desligado e da energia caindo. Tudo que antes parecia glorioso naquele inventário esmoreceu ao reinado sublime da escuridão gelada do aposento sem vida – tal como o próprio Stanford, desolado.

Ele havia prendido Bill, na sua forma original, novamente no lugar de onde havia vindo. E agora, ele esperava, que para sempre.

O único som que ele ouvia agora era o da mágoa solidificada na forma das batidas combalidas do seu cerne, preenchendo todo o mundo dele com aquelas marteladas letíferas.

Mil e uma coisas corriam por sua mente, desesperadas: “Eu preciso esconder as instruções, preciso esconder os diários! Preciso garantir que Bill não poderá sair dali nunca mais!”

Em seguida, veio a lástima. O arrependimento. A decepção.

“Eu transei com ele... eu me abri com ele como nunca antes com alguém... eu acreditei nele...!”

“Não chore, não chore...”

Ele nunca havia sentido algo parecido, aquela humilhação.

Havia sido tudo tão rápido, que ele nem teve tempo suficiente para pensar mais sobre aquilo até o momento:

“Quem... quem era aquele? Quem era aquele monstro que estava dando ordens a Bill?

 

Enquanto isso, do outro lado da dimensão, o triângulo amarelo de um olho só flutuava sem reação, observando a passagem para a terceira realidade fechada para sempre à frente de si, ao mesmo tempo em que falava, com convicção de que suas palavras ainda chegassem, de algum jeito, ao homem no qual ele havia acabado de quebrar o coração:

— Me perdoe, Stanford, mas eu preciso fazer isso.


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Notas finais do capítulo

Pois é, né.
Do nada essa fanfic virou +18 kkkkkk
Espero que tenham gostado, obrigado por ler.
Fiquem na paz ♥



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