Bohémienne escrita por Ananda Ayira


Capítulo 14
Elle resemble à une hirondelle...


Notas iniciais do capítulo

Título: "Ela se parece uma andorinha..." (Continuará no próximo capítulo). É parte da música "Ou Est Elle? (Onde está ela?)" do musical "Notre-Dame de Paris".
Linkzinho: https://www.youtube.com/watch?v=dGWI8RrVKiU
Olar, rs. Não me matem pelo grandíssimo atraso. Lembram que eu falei que ia começar a faculdade de "Design Gráfico"... Então, rsrsrs. To terminando agora e, levei esses dois anos de curso tentando escrever essa fic junto com os mil e um trabalhos. Mas, rs, falhei toda!
Já to terminando o curso, logo, logo volto a postar mais! ^^ ♥
Fiquem com esse capítulo lindo, que eu só demorei dois anos pra escrever, rs.
Desculpem erros, eu queria muito postar logo. Vou dando uma corrigida conforme der! ♥
Beijos ♥ ♥



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A fumaça dissipou e Peter apareceu ao lado da tenda de Clopin.

— Clopin. – Chamou ele. – Clopin!

Quando Peter adentrou pela cortina, o cigano já tinha o semblante de que adivinhara que o pior finalmente ocorrera.

Quando viu o rapaz, o cigano descontrolou-se. Desferindo um tapa no rosto do gadjê, aturdindo-o. Logo em seguida, tomado de fúria, segurou-lhe pelo pescoço até que seus pés pairassem acima do chão de pedra.

— O que você fez com ela?!

Peter, porém, desapareceu da mão do cigano antes que ele apertasse mais seu pescoço e afastou-se do homem.

Irredutível, sem uma resposta, Clopin avançou pisando com tanta força que se seus pés não estivessem há muito calejados de arrastarem-se pelo chão sujo e duro, teria esfolado as solas dos pés.

— O que você fez!? – Repetiu rosnando.

Peter riu.

— Agora, ela sabe quem ela é. Só isso!

— Desgraçado! – Bradou ele. – Eu o mato!

O homem veio com a intenção de agredi-lo. Quando deu por si... Hélène!

— Onde ela está?...

Prison de La Santé, Ilé de La Cité, Paris...

Hélène acordou no chão duro e frio da cela. O corpo dolorido dos empurrões e dos tapas gratuitos desferidos pelos soldados, de ter desacordado após ser jogada no chão de pedra com violência e, fora, o cansaço extremo que sentia. Sentia-se suja, imunda. Os toques do homem do lado de fora da taverna lhe voltaram à mente assim que abriu os olhos. Tentava acalmar-se, lembrando de que ele não conseguira nada. A parte interna de suas coxas gritava por algum bálsamo que desenrijecesse sua musculatura, de tanta força que fez para impedir que o homem tocasse sua intimidade. Tentava se levantar, mas seu corpo não obedecia. Um sentimento de impotência subiu em seu peito, apertando-a mais do que um espartilho.

Quando conseguiu se levantar, já deviam fazer horas que estava desperta. Não havia nada que lhe entregasse se era dia ou noite. Apenas encolheu as pernas para dentro da saia, tentando aquecer-se. Sentiu seu estomago revirar de fome, não sabia se haviam se passado dias ou horas desde que fora jogada na cela. Sentia frio. A blusa de tecido fino, surrado e que ficara fino depois de anos de uso além de não ajudar a mantê-la aquecida não cobria seus ombros e o caimento não era exatamente do seu tamanho, ou seja, suas costas também ficavam descobertas até a parte em que o grosso cinto de couro apertava em seu ventre e segurava suas saias e a blusa juntos. Descalços, seus pés tremiam. E não como quando ela fazia as batidas da música reverberarem em seu corpo, tremendo dos pés ao quadril. Sentia seus dedos adormecendo, congelando.

Hélène arrastou-se pela cela, até estar de costas para as grades que a prendiam ali. Encolheu-se. “Só há duas maneiras para que eu saia daqui...”A voz de seu pai. Há anos não se lembrava dele, ou de qualquer coisa dele. “...morto ou para morrer.” E esta frase foi a primeira que lhe ocorreu ao se ver ali. Não era o buraco dos ratos, onde ele estivera preso. La Santé lhe daria um julgamento. Mas sabia que a justiça de parisienses para ciganos, mesmo os ciganos que eram nascidos em Paris, apenas o fato de ter sido criada e fiel àquela gente lhe fazia uma cigana. A justiça que aplicariam seria qualquer coisa, menos justa.

— Quem diria, meu pai... – Suspirou. Aceitando seu destino, qualquer que fosse. Mas que ela sabia como terminaria. Na ponta da corda.— Eu estou indo para ti, finalmente.

Hélène sentia-se ceder para o frio e a fome. Não demoraria muito para que seus lábios congelassem juntos. Pensou em abri-los, mas não havia nenhum motivo. Ninguém ali lhe escutaria. Seu pai a escutaria. Onde ele estivesse. Então começou a cantar o que lhe veio à mente:

Vous, mon père, mon guide, mon ami Ma raison d’exister — Sorriu e chorou quando seus lábios racharam ao abrir sua boca. — Vous étiez ma seule compagnie Pourquoi m’avoir quittée?

As lágrimas começaram assim que aquela pergunta lhe veio. Ele a deixara, para salvá-la. Por ela, ele perdeu tudo.

Revenez-moi, je dois vous parler Reprenons comme autrefois — Tomou fôlego e engoliu suas lágrimas. - Est-il assez de vous rever Pour retrouver vos bras?

A saudade dos abraços de seu pai lhe invadiu. Como ele dizia que ela era a favorita da Lua, sua madrinha. Que trocara seus poemas por ter a filha salva em seus braços, quando sua mãe faleceu.

Revenez-moi pour me raconter Ce que nous avons été – Os sonhos em que se lembrara dele. Convenceu-se por tanto tempo de eram só sonhos. -  Tout devient flou quand je rêve de vous Je dois m’être égarée

Ele ficaria decepcionado por ela tê-lo deixado de lado por tanto tempo? Ela não soube de mais nada dele depois de acordar no Pátio dos Milagres, com outro nome e outras memórias, falsas. Não sabia se quer se ele havia sido enterrado, ou onde...

Cloches en pierre et anges sculptés Figures dures et austères Ne sont pas ce qu’il vous faudrait... — Ele dizia tantas vezes que ela iluminara sua vida vazia, de vadio. Trazendo-lhe luz. Sem ele, ela era quem sentia-se no escuro. - Vous étiez ma lumiére!...

Bien trop d’années à vous pleurer Pourquoi vivre au passé? — Hélène perdeu-se em seus sentimentos de saudade, de tristeza, de culpa. A perda de seu pai, tudo aquilo voltou com tal força... - Revenez-moi, je dois vous parler Il me faut vous dire au revoir Pardonnez-moi, permettez-moi... Plus de vains regrets Plus d’amères pensées Cessons de ressasser nos rêves fanés— ...que sua canção foi saindo de dentro das feridas de sua alma. Preencheu a cela.

Je vous dis au revoir... Je vous dis au revoir... — Hélène, em lágrimas, repassava cada último momento que esteve com Gringoire...

O frio lhe devorava a pele. A fome, digeria sua carne. E a tristeza, encarregou-se de sua alma. Ela fechava os olhos, talvez, acordasse em um lugar melhor...

Minha filha, tens frio? – Uma voz familiar, mas abafada. Como se falasse de outro lugar.

Alucinação. Não havia ninguém ali. Então respondeu, com os lábios trêmulos:

Papa... — Sussurrou, delirante. - Tenho frio. Tenho fome. Não como há dias...

— Que fizeste para ser posta aqui? – A voz vinha do outro lado das grades. Mas não passava de um delírio. Não tinha passos, respiração ou se quer um calor perto de Hélène.

Não era ninguém, apenas sua imaginação. A saudade de seu pai, uma lembrança dele. Por isso a voz lhe soava familiar, doce e amiga.

— Eu não fiz nada, mon père. E morrerei por nada... – Respondeu ela.

— Eu sei que és inocente. Por isso estou aqui... – A voz era como um sonho bom.

Hélène começava a fechar os olhos, novamente. Sentiu-se prestes a escorregar para os cuidados da morte.

— Não feche os olhos, mon ange! Vais viver para sair daqui. E sairá para viver! – Exclamou a voz boa.

Hélène sentiu quando um manto foi posto sobre suas costas. E depois sentiu um cheiro, um calor em suas mãos. Um pedaço de pão sem fermento. Comida!

Ela atacou o alimento, como um animal. Escondeu-se inteira no cobertor. Absorveu todo o calor do tecido e sentiu o alimento descer por sua garganta, com felicidade. Ah, quão maravilhoso estava aquilo!

Em instantes o pão ázimo desaparecera. Quando o frio diminuiu e seus pensamentos conseguiram passar da dor de morte que vivenciara. Percebeu... Um anjo. Enviado por seu pai, a salvou. Sentiu-se grata.

Pátio dos Milagres, 01 de junho de 1499...

A fúria do cigano estava efervescendo sob sua pele. Todos os sacrifícios que ele fez para proteger a sua amada afilhada. Os acordos que fez para conseguir a pedra da lua, quando o sangue dela veio e a Maldição Do Lua se tornou um risco para a própria Hélène. E, quando, descobriu que esta já não tinha mais utilidade com a perda da virgindade da menina. Foi atrás do amuleto de Esmeralda que a protegeu da ambição dos homens, prestando-se à ver o cadáver putrefato da amada afilhada e do azarado Corcunda.  

— Diga onde ela está seu moleque, insolente! – Berrou Clopin, avançando novamente para agredir Peter.

— Clopin! Clopin, pare! – Interveio Rosalie, segurando-o com seu corpo. – Ele sabe!

Ele parou, por um instante.

— Ele sabe sobre a Maldição que a Luce carrega... – Ela falou, olhando nos olhos de seu rei. – A Maldição que Hélène, carrega... – Corrigiu.

Rosalie afastou-se, mas permanecendo entre Clopin e Peter.

— Agora, vocês podem continuar ladrando como dois cães ou podemos nos retirar para uma conversa. – A mulher concluiu. A face serena escondia os turbilhões do coração cigano.

Rosalie levou os dois para dentro de sua tenda. O alecrim queimando nos potes de barro exalava o cheiro forte que limpava as energias dos que ali adentravam. O sol da tarde deixava a tenda abafada e a luz adentrava pelo tecido vermelho, colorindo tudo em tons rubros.

— Eu não permito ninguém se comportando como menos do que homens dentro da minha tenda. – Avisou ela.

— Ele não é homem. Não passa de um moleque! – Retrucou Clopin.

Este riu-se com escárnio.

— Bom, ele foi homem o suficiente para casar-se com Hélène, consumar o ato e ainda tentar aproveitar-se da maldição dela, não é mesmo? – Falou Rosalie, dirigindo-se a Peter. Tomando as dores de Clopin, porém raciocinando melhor que ele. - O mínimo que ele deve fazer agora é explicar onde ela está!

Peter calou-se por alguns instantes. Inalou a fumaça do alecrim, aquele cheiro forte apesar de queimar o nariz, esclarecia os pensamentos de quem o respirava. Por mais que detestasse estar contra a parede, admitia que, se quisesse a garota fora da cela de uma prisão, só podia contar com os ciganos.

“Traidor!”. O grito de Hélène ecoou em sua memória

— Guardas a capturaram. – Finalmente respondeu.

— Você deixou que guardas a capturassem!? – Bradou Clopin. E Rosalie, novamente teve de segurar o cigano de avançar contra o rapaz.

— Eu tentei salvá-la! – Peter gritou de volta.

Clopin recuou, como se processando a informação de que Peter realmente tentara salvar sua afilhada.

— Eu tentei salvar, Hélène. Eu quase cheguei tarde de mais. Haviam dois homens e eles...

— Peter... – Nesse momento Rosalie interveio. Com os olhos cheios de medo pelo que podia ser o final daquela frase. – O que aconteceu?...

Prison de La Santé, Ilé de La Cité, Paris...

Devia ter caído no sono de novo. Afinal, era a única coisa que conseguia fazer. Mas, pelo menos, agora tinha um manto para se esquentar. Era um manto escuro, como tudo naquela cela, mas a cor não era muito diferente da do escuro.

Um pássaro cantava. Ela não se mexia, o corpo doía. A fome voltara, mas recusou-se a dar fim do pássaro. Estava deitada sobre o tecido, enrolada nele como um recém-nascido em seu primeiro lençol. Ou um defunto em sua mortalha.

O canto do pássaro ficou mais alto, mais irritante. E Hélène não se moveu. “Só saio daqui morto ou para morrer.”. Ela sabia a que estava sentenciada, não fazia sentido lutar contra.

Quando o canto do pássaro parece estar vindo de dentro de sua cela. Ela se levantou, mesmo que vagarosamente. E virou-se para as barras, procurando o animal. Encontrou...

— Peter! – Ela exclamou, mas baixo demais para sair algum som. Concentrou-se em fazer sua voz ecoar. – O que você acha que está fazendo?

— Salvando você. – Ele disse. E se desfez em fumaça como fez quando ela foi presa.

Mas, no instante seguinte a fumaça se rejuntou na forma dele, dentro da cela.

— Eu estou alucinando. – Explicou a si mesma. – Eu não estou acordada.

— Sim, está. E Clopin exigiu que eu retorne com você. Imediatamente. – Despejou Peter.

Ele fez menção de pegar a mão de Hélène. Ela esquivou-se rapidamente, dando um grito seco.

— Hélène, sou eu. Você sabe que não precisa ter medo de mim. – Ele falou, procurando os olhos dela. Que estavam fixos no chão.

— Hélène?... – Peter lembrou-se do medo de Rosalie quando contou o que havia acontecido. – Hélène, eu cheguei a tempo? Eles... – Ele ponderou as palavras. Mas não tinha nenhum talento para tanto -  Eles fizeram alguma coisa com você?

— Se eles me fizeram de esposa? Não deu tempo. Continuo sendo apenas sua esposa, Peter. – Ela respondeu fria. Parecia milhões de quilômetros longe, estando na frente dele.

 - Por que está aqui? – Ela perguntou, depois de instantes de silêncio.

— Clopin me mandou aqui. Eu tenho que te contar toda a verdade e, quando eu terminar, você tem que vir comigo. E confiar em mim de que eu vou te proteger, aonde quer que formos. – O semblante dele era uma mistura de estar sendo forçado àquilo com o genuíno arrependimento pelo que se sucedeu com ela.

— Por que eu deveria? Você acabou de admitir que mentiu para mim. – Disse ela, dando as costas. – Assim como todo mundo no Pátio dos Milagres.

— Todos mentiram com a intenção de proteger você. O seu pai...

— Não ouse falar dele! – Ela teria gritado se o grito não fosse delatar que havia alguém na cela com ela.

— Como quiser, mas você tem que me deixar falar. E temos que sair daqui...

— Clopin, pode ter tido a melhor das intenções, - Ela interrompeu. - mas ele me negou o mínimo que eu podia ter. Ele negou-me de ser “A filha do meu pai”.

Ela olhou Peter nos olhos. As mágoas de todos lhe invadiam os olhos de luar e eles alimentavam marés de lágrimas que lhe caiam do rosto.

Hélène ia dizer mais alguma coisa, quando passos vieram da entrada do corredor das celas.

— Vamos, agora! Eu posso te explicar depois. Deixe-me te tirar daqui! – Insistiu ele.

— Você ainda não entendeu? – Escorraçou ela. - Eu não iria ao paraíso, ou inferno, com você!

Os passos iam chegando mais perto. “Volte, Peter!”. A ordem de Rosalie, ecoou dentro dele. E ele desapareceu na fumaça. Novamente, deixando Hélène à mercê do que quer que fossem fazer com ela.


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Notas finais do capítulo

Tradução da música que Hélène cantou na cela:
"Você, meu pai, meu guia, meu amigo Minha razão de existir
Você era minha única companhia Porque me há abandonado?
Volte para mim, eu quero lhe dizer Vamos voltar ao que éramos
É suficiente para recuperar-me os teus braços?
Volte para mim para me contar o que éramos
Tudo fica confuso quando sonho contigo
Eu devo ter me perdido
Sinos de pedra e anjos esculpidos Figuras duras e austeras
Não são o que você precisa Você era a minha luz!...
Muitos anos a chorar por você Porquê viver no passado?
Volta para mim, eu que lhe dizer
Tenho que lhe dizer adeus
Perdoa-me, permita-me
Mais vãs lamentações, mais amargos pensamentos
Deixemos de recordar os nossos sonhos mortos
Eu quero dizer adeus, eu quero dizer adeus..."
Essa música é originalmente do musical "O Fantasma da Ópera", na versão em francês. Eu já usei a versão de "Think Of Me", aqui na fic rs. ♥

Well... Mais uma vez, desculpas pelo atraso. Dedico este capítulo À todos vocês que ainda estão aqui. Não desistam de mim! Agora vai, eu prometo!
INCLUSIVE, A HISTÓRIA ESTÁ CAMINHANDO PRA RETA FINAL ! ! ! ♥ ♥
Um grande beijo e até os reviews! ♥ :*



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