De Repente Papai escrita por Lady Black Swan


Capítulo 37
O poder das palavras.


Notas iniciais do capítulo

GLOSSÁRIO:

Onee-san ou nee-san: Irmã.



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Eleonor o recebeu com uma caneca de café na mão e um arquear de sobrancelha.

—Se você tivesse o mínimo de pudor na cara, pensaria um pouco antes de vir se enfiar na minha casa depois de ter estado com uma mulher. — comentou.

Ela tinha um senso de humor “peculiar” — para dizer o mínimo.

—Em primeiro lugar, se eu tivesse algum tipo de pudor, do seu ponto de vista, você não teria me apelidado como “Devasso-Sama” teria madame? — Sesshoumaru adentrou.

Mas ao menos ele tinha se dignado a ligar antes de aparecer para saber se Eleonor estava sozinha em casa, afinal Sesshoumaru não precisava e nem queria ter que lidar com ela estressada.

—Touché. — Eleonor fechou a porta às suas costas — E não que isso seja da minha conta, mas, levando em consideração a sua situação atual, acha mesmo que é o melhor momento para se envolver com alguém?

Entrando na cozinha Sesshoumaru serviu-se de um pouco de café.

—Não estou me envolvendo com ninguém Eleonor — negou bebendo um gole — No entanto, ainda tenho necessidades que precisam ser satisfeitas.

Eleonor girou os olhos e sentou-se à mesa com um maço de folhas encadernadas que pareciam ser um script.

—Devasso. — comentou — E você já contou a ela sobre o “não envolvimento” de vocês?

—Eu sempre conto. — respondeu.

Essa costumava ser uma das primeiras coisas que dizia. Não gostava de iludir os outros para que esperassem mais dele do que realmente estava disposto a oferecer… Muito pelo contrário: Se nunca esperassem nada dele, a tendência era que acabassem se surpreendendo até com o menor de seus esforços.

—No entanto ainda há o risco de que ela ainda assim espere mais de você. — Eleonor pegou-lhe o queixo entre os dedos e estudou-o meticulosamente antes de soltá-lo com um suspiro descontente, declarando: — Parece que seu rosto é uma maldição para as mulheres.

Sesshoumaru tomou um gole de café.

—Diferente do que possa pensar eu saí com bem menos mulheres do que você provavelmente imagina.

—Mas tenho certeza que foram o suficiente para se colocar em problemas e momentos complicados senhor “pai solteiro da filha da ex-namorada”. — Eleonor respondeu destacando com a caneta uma fala em seu script enquanto bebericava seu próprio café, e Sesshoumaru recebeu aquele comentário com um leve retorcer de lábios, era melhor ela continuar chamando-o apenas de “Devasso-Sama” mesmo. — E como está a menina?

—O advogado insistiu que eu deveria contar a verdade a ela o quanto antes. — respondeu — Ele acha que as consequências podem ser realmente muito ruins se ela descobrir por outros meios ou no tribunal, caso cheguemos a tanto.

—Um momento. — Eleonor pigarreou, e quando voltou a falar havia mudado completamente a entonação da voz, a substituindo por uma completamente preenchida de ódio e rancor: — Eu até esqueceria! Mas eu não posso perdoar, nunca poderei perdoar e não poderei ficar tranquila enquanto ela não estiver morta! — fez um leve repuxar de lábios e então anotou mais uma marcação no script — Estarei dando voz a uma feiticeira em “A Mestra dos Ventos”. Acho que seu advogado tem toda razão, nem sei por que você ainda não contou Sesshoumaru, já imaginou se o pai da garota aparece? Eu quero dizer o pai de sangue.

—Por que apareceria? — franziu o cenho — Duvido até que saiba sobre a existência de Rin, afinal Mariko sempre fez questão de dizer a Rin que eu era o pai…

—Já pensou na possibilidade de que ela estivesse com os dois, e depois não sabia quem era o pai então tirou na sorte? — ela afinal voltou a erguer os olhos para ele girando a caneta entre os dedos.

—Mariko não era assim. — bebeu outro gole de café — E Rin nasceu um ano depois que eu e ela já havíamos terminado. O que?

Questionou ao ver a expressão dela.

—Então já sabia desde o começo?

—Eu neguei desde o começo.

—Sim, mas todos negam. — Eleonor girou os olhos — Então se ela não estava com os dois, talvez ele fosse um canalha ainda pior do que você. — Sesshoumaru arqueou uma sobrancelha, mas deixou-a continuar — E quando ela contou-lhe da gravidez ele tenha se recusado a aceitar e assumir a criança, e se fosse casado? E então, desiludida, ela resolveu nunca contar à criança sobre o crápula que a havia enganado e quando ela começou a perguntar sem parar sobre o pai que nunca conheceu, só lhe ocorreu falar sobre você, um cretino um pouco menor.

—Me diga, qual de nós dois vive de criar histórias mesmo? — Sesshoumaru arqueou a sobrancelha.

Eleonor o estapeou de leve no braço.

—Não é nada tão fantasioso assim. — criticou impassível.

—E se tivesse realmente sido assim, porque ele iria querê-la agora?

—Culpa? — sugeriu, ele a encarou cético — Tudo bem então esqueça isso, só queria te lembrar de que é uma possibilidade. Mas se o pai é carta fora do baralho, o que me diz dos outros parentes? Ela tem avô e avó, não é? Se eles realmente querem a criança de volta agora, algum familiar poderia facilmente contar a verdade a ela.

—Ninguém sabe quem é esse homem, tão pouco eles, Mariko convenceu inclusive aos pais da minha paternidade.

—Se você diz. — Eleonor fez uma pausa para terminar seu café e voltou a estudar o script — Mas realmente acho que deveria falar com a garota logo.

—Vou falar. — assegurou. — O advogado também acha que deveríamos tentar entrar em termos amigáveis com os avós dela, para evitar o tribunal se possível, eu disse a ele que queria falar eu mesmo primeiro, os velhos podem se colocar na defensiva se um advogado já for batendo na porta deles.

—Sensato. — Eleonor aprovou levantando-se e pegando as canecas para levar até a pia onde passou a lavá-las, quando algo pareceu ocorrer-lhe — Diga-me Sesshoumaru, você por acaso já contou a mais alguém, além de mim, sobre esses seus tramites? — Sesshoumaru não respondeu — Entendi, então é por isso que está aqui. Bem, você sabe onde está o telefone ou, se preferir, meu celular está lá no quarto.

—Eu trouxe meu celular. — Sesshoumaru respondeu se levantando.

—Excelente. — Eleonor começou a secar as mãos — Eu tenho uma gravação amanhã cedo por isso preciso terminar de revisar meu roteiro, então estarei no meu quarto.

Avisou pegando o script sobre a mesa e saindo.

Retirando o celular do bolso Sesshoumaru também deixou a cozinha e foi acomodar-se no sofá de Eleonor, ligar de sua casa era quase impossível, seu irmão e os parasitas não sabiam nada daquela situação, eles eram todos barulhentos e imaturos demais para isso e não havia porque Sesshoumaru explicar qualquer coisa a eles ainda a essa altura, talvez mais tarde… Se acaso ele precisasse de testemunhas para a audição de adoção — seu advogado lhe avisara sobre aquilo — ou então ainda mais tarde quando os papéis já estivessem assinados, talvez até nunca lhes contasse, o que eles tinham haver afinal? Mas com certeza não lhes diria antes de contar a Rin, e ele nunca sabia quando Rin poderia acabar batendo na porta do escritório — a casa, portanto, não era segura.

—Aqui é Taisho Sesshoumaru. — apresentou-se assim que o telefone foi atendido. — Temos que conversar.

Mariko havia sido uma pessoa gentil — provavelmente gentil até demais — que dificilmente se irritava por muito tempo com alguém, mais propensa às lágrimas do que à fúria, mas os pais dela eram claramente de um material bem diferente.

Quem o atendeu foi a mãe de Mariko, a velha bufou e chiou exigindo por Rin de volta e praticamente não deixando Sesshoumaru falar coisa alguma, ainda que ele estivesse se obrigando a ser o mais controlado que conseguisse — em qualquer outra ocasião teria simplesmente desligado o telefone —, depois o marido dela também entrou na conversa “o que você fez a minha neta?” ele dizia, Sesshoumaru podia imaginar a saliva voando da boca do velho e respingando em todo telefone “Rin se recusa a voltar para casa! Você a ameaçou! Eu vou chamar a policia!”, embora Sesshoumaru tenha tido que segurar a língua para pergunta-lhes o que eles haviam feito a Rin, para a criança fugir de casa em primeiro lugar, ele sabia que as ameaças eram vazias, se o velho realmente fosse chamar a polícia já teria feito há tempos. 

—Temos que conversar. — repetiu — Mas não por telefone, estarei indo até aí, apenas digam o dia e a hora, o quanto antes melhor. — e por último acrescentou: — Rin não deve saber sobre isso por enquanto.

Ele conseguiu ouvir de forma abafada os velhos discutindo entre si, apesar de não conseguir compreender o que diziam. Até que por fim a mulher retomou a ligação e disse-lhe secamente “Amanhã, venha quando ela estiver na escola”, e desligou sem qualquer aviso. Mas o celular começou a tocar assim que ele o guardou de volta no bolso e Sesshoumaru estranhou ao ver o nome de Rin surgir ali, ela nunca havia lhe ligado antes.

—Pronto. — atendeu ainda no segundo toque. O que estava acontecendo?

—Hã... Sesshoumaru-Sama. — ouviu a voz hesitante de Rin, ela falava baixo, como se estivesse ligando escondida — Sou eu… Rin.

—Eu sei. 

Inuyasha havia ido parar no hospital de novo? Não, ela estava hesitante, mas não nervosa o bastante para algo de tal gravidade ter se passado… então aquele idiota e Domadora estavam de novo discutindo? Sesshoumaru queria mandá-la falar de uma vez, mas sabia que isso só a poria mais nervosa, então esperou.

—É hã… sinto muito por incomodá-lo, tio Inuyasha não queria que eu lhe ligasse. — Sim, sim, definitivamente aquele idiota e Domadora estavam de novo discutindo. — Mas será que o senhor poderia voltar para casa hã… o quanto antes. Talvez… agora?

—Muito bem, estarei aí em vinte minutos ou menos. — dispôs-se sem fazer perguntas.

Ouviu a menina suspirar aliviada.

—Que bom. — ela disse — Eu direi isso a Keiko-san, obrigada Sesshoumaru-Sama.

Keiko…?

—Rin, quem é…? — chamou-a, mas a garotinha já havia desligado.

Quem era Keiko?!

— Eleonor. — chamou saindo da sala — Eu estou indo agora!

No fundo do corredor, a porta do quarto de Eleonor entreabriu-se e seu rosto espiou por ali.

—Tão rápido? — arqueou uma sobrancelha, mas logo voltou a fechar a porta comentando: — É realmente complicado ter filhos, não é mesmo?

Filhos eram complicados? Talvez, mas com certeza os parentes eram muito mais. Assim como Rin fez questão de informá-lo ao vir correndo até ele debaixo de um guarda-chuva, pois uma fina garoa começara a cair naquele meio tempo, no instante em que ele colocou o pé para fora do veículo.

—Tio Inuyasha não queria que eu ligasse para o senhor. — repetiu com olhos arregalados exatamente o mesmo que havia dito por telefone — Mas é que Keiko-san está aqui para vê-lo! — ele já estava prestes a pergunta-lhe quem era essa “Keiko-san”, por favor, que não fosse outra criança afirmando ser sua filha, quando, apertando as mãos em torno do cabo do guarda-chuva Rin completou: — E ela disse que quer levar-me para casa!

Mas e isso agora?! Comprimindo o maxilar Sesshoumaru tomou-lhe o guarda-chuva das mãos enquanto simultaneamente a puxava para seu colo — naquela idade, não apenas Sesshoumaru, mas Inuyasha também já eram grandes e velhos demais para serem carregados no colo, no entanto Rin era tão pequena, não havia como ela já ser velha ou grande demais para ser carregada.

—Quem é Keiko? — perguntou dirigindo-se a passos largos para a porta da frente.

—Ela é prima de mamãe. — respondeu-lhe — E é muito temperamental.

Pelo visto Mariko era uma peça única em sua família.

—… não tem hora pra voltar! — pôde ouvir a voz de seu irmão estúpido assim que colocou os pés dentro de casa.

Ainda carregando Rin ele jogou o guarda-chuva de lado no porta guarda-chuvas ao lado da entrada e retirou os sapatos ali mesmo, não deixando de reparar os três pares extras de sapatos — entre eles um pesado par de coturnos — também jogados ali, o que significava a presença de ao menos dois parasitas.

—E esse é o seu argumento para tentar me convencer? — uma voz desconhecida de mulher, certamente a dona dos coturnos a tal “Keiko”, retrucou irritada — Que o homem que está agora com a tutela irregular da minha priminha não pode vir falar comigo porque a deixou aos cuidados de um adolescente qualquer enquanto está fora resolvendo alguns assuntos e não tem hora para voltar?!

Ela estava sentada na poltrona, impertinente com as pernas e os braços jogados sobre os braços da poltrona como se estivesse em algum trono, e a primeira coisa que Sesshoumaru notou foram os vários brincos em suas orelhas e que se vestia de preto dos pés à cabeça, até mesmo seu batom era preto, a segunda foi como ela era desconcertantemente parecida a Rin, muito mais do que a própria Mariko jamais havia sido — isso claro, se Rin fosse alguma punk, o que bem poderia vir a se tornar, quem poderia dizer com certeza que não? Ela agora era apenas uma meiga garotinha, mas não seria para sempre, e adolescentes eram imprevisíveis. 

—Nada muito diferente do que meus pais costumavam fazer. — argumentou entrando na sala, ainda carregando Rin no colo. — Embora eu deva admitir que Mariko era consideravelmente mais inteligente que esse aí.

Tal como já havia previsto os parasitas — com exceção de Domarora — já estavam em sua casa quando chegou, afinal eles aparentemente não tinham onde morar levando em consideração o tempo que passavam ali, mas não eram eles o problema dessa vez.

Inuyasha virou-se praguejando.

—Sesshoumaru, por que quando você tem que demorar, volta logo no dia seguinte?!

Sesshoumaru a olhou.

—E por que quando você tem que ficar quieto, começa a cuspir um monte de asneiras?

Sorrindo desajeitadamente pervertido comentou:

—Estávamos falando de você agora mesmo.

Gata Selvagem estava sentada bem ao seu lado, os três apertavam-se num único sofá enquanto a mulher baixa e magra se esparramava sozinha na grande poltrona, quase como se estivessem assustados com ela. 

—Bem e aí está ele finalmente. — debochou a mulher cruzando os braços — Que honra poder conhecê-lo enfim Canalha-san. — Canalha novamente, mas afinal qual era o problema das mulheres hoje? Levantando-se do sofá, Keiko prosseguiu: — Eu sou Kinoshita Keiko, e estou aqui para levar minha priminha… — seus olhos arregalaram-se — Você?!

Ela vinha até sua casa à sua procura e se surpreendia por encontrá-lo?

Gata Selvagem levantou-se saltando do sofá já protestando:

—Sesshoumaru não ouse…!

—Negado. — ele começou a atravessar a sala em direção à cozinha já levando Rin embora dali, sem lhes dar mais atenção — O que há para o almoço hoje?

A criança abençoadamente conseguia ignorar muito bem os seus arredores quando necessário:

—Hoje vou preparar Gyudon! — anunciou alegremente — Tio Inuyasha não queria que eu lhe preparasse uma porção Sesshoumaru-Sama. — confidenciou-lhe — Disse que o senhor com certeza não viria para o almoço.

—Inuyasha é um cachorrinho estúpido que merece ficar sem sua porção de r…

Foi então que, irritantemente recusando-se a desistir e ir embora de uma vez, Kinoshita Keiko correu até alcançá-lo e agarrando seu braço com ambas as mãos, o fez ficar onde estava.

—Espere um pouco cretino! — exclamou irritada — Eu quero falar com você!

—Chamo-me Sesshoumaru, mulher. — abaixando-se Sesshoumaru deixou Rin no chão, e a menina não hesitou em virar-se e correr para a cozinha no mesmo instante. — E você já me disse pelo que veio, veio levar Rin, e eu disse não. Sabe onde é a saída, não sabe?

O rosto da mulher avermelhou-se, ela usava maquiagem preta em volta dos olhos também, Sesshoumaru notou, mas mesmo sua expressão irritada era desconcertantemente semelhante à de Rin.

—Ouça…!

—Não tenho tempo para birras. — cortou-a. E olhando por cima de sua cabeça, ela sequer chegava à altura de seus ombros, lançou um olhar penetrante ao irmão estúpido e o casal de parasitas nos sofás — Pretendem ficar aí sem erguer um dedo sequer enquanto Rin está lá dentro se equilibrando precariamente num banquinho a beira do fogão? — arqueou uma sobrancelha — Depois encherão as panças com minha comida sem um pingo de vergonha, aposto.

Pervertido foi o primeiro a levantar-se, ele puxou Gata Selvagem consigo que, atrevida, se recusou a levantar puxando o braço irritadamente de volta querendo ver como aquilo terminaria, talvez por ter certeza que ele correria para o andar de cima e prepararia as malas de Rin assim que se virassem, o que era uma besteira completa é claro, — se ele realmente ainda tivesse intenção de se livrar da criança a entregaria com um belo laço de presente para aquela parenta punk com ou sem testemunhas, quem sabe até não lhe oferecesse as “testemunhas” como brinde? — mas o Pervertido voltou a insistir e dessa vez ainda que claramente contrariada ela obedeceu e sem pressa alguma Inuyasha seguiu os dois logo atrás.  

Naquele momento Sesshoumaru preferiria muito mais tomar um banho e depois ir dormir — havia passado a noite em claro em sua maior parte —, mas ao que tudo indicada, aquela não lhe era uma opção, poucas mulheres, mas o bastante para lhe dar problemas e momentos complicados, Madame Eleonor não dissera qualquer coisa parecida a isso? Bem e aí estava a prova, até mesmo mulheres com as quais ele nunca se encontrara na vida estavam vindo atormentá-lo agora.

Mas ali não era de forma alguma o lugar para falarem, ele podia perfeitamente imaginar Gata Selvagem e Inuyasha tentando ouvir por detrás da porta da cozinha — Pervertido certamente estaria mais interessado na comida.

—Venha. — chamou-a guiando-a para o escritório, e se aqueles parasitas ainda assim fossem atrevidos o bastante para segui-los até ali então Sesshoumaru os faria voar para a sarjeta. — Qual era mesmo seu parentesco com a menina?

—Mari-nee-chan e eu éramos primas, sua mãe é irmã da minha mãe. — respondeu a contra gosto — Mas quando éramos crianças sempre nos tomavam por irmãs, porque estávamos sempre juntas e éramos tão idênticas que poderíamos ter sido gêmeas se não fosse a diferença de idade.

Aquilo era sério?

—Oh sim. Posso ver a semelhança gritante. — ironizou abrindo a porta e indicando-lhe que passasse.

A mulher lançou-lhe um olhar petulante.

—Mari-nee-chan era um pouco mais alta, e seus cabelos e olhos eram mais claros, mas fora isso não havia grande diferença entre nós! — teimou.

Sesshoumaru encolheu os ombros e fechou a porta dizendo-lhe que sentasse, quer fossem parecidas ou não, não era para isso que aquela mulher havia ido até ali importuná-lo, porém ele não lhe daria o que ela queria. Isso nunca. Resoluto ele deu a volta na mesa e tomou assim o seu lugar, esperando que ela começasse a falar primeiro, coisa que a mulher não demorou a fazer:

—Sabe tudo pelo que Mari-nee-chan, passou? — quase lhe cuspiu as palavras por entre os dentes trincados, semicerrando os olhos até que fossem apenas duas fendas — Meus tios estavam doentes de dor para ter concordado com algo assim!

Ou loucos. Deixou por dizer.

Eles haviam permitido que a criança entrasse sozinha em um táxi com destino à casa daquela parenta punk que agora estava a sua frente insultando-o, e nunca se preocuparam em saber se ela realmente havia chegado ao seu destino, só descobrindo semanas mais tarde seu pequeno “desvio” — a avó, pelo menos, o avô ainda levou mais um ano para isso. Pequenos detalhes que Sesshoumaru não podia deixar de citar em um possível tribunal pela guarda.

Loucos certamente. 

—Rin está sendo bem tratada aqui. — finalmente se pôs a dizer — Não lhe falta nada, e ela é feliz, não há porque levá-la embora.

Keiko estalou a língua de forma cética.

Quando a onee-chan soube que estava grávida ela procurou-o, mas disse-lhe que tirasse a criança, que não era o pai. Nunca deu a ela um pacote de fraldas sequer. E agora você aparece dizendo que ficará com Rin?

Então Mariko havia contado ao pai de Rin sobre ela afinal.

“E então, desiludida, ela resolveu nunca contar à criança sobre o crápula que a havia enganado e quando ela começou a perguntar sem parar sobre o pai que nunca conheceu, só lhe ocorreu falar sobre você, um cretino um pouco menor.”

Sesshoumaru fez questão de expulsar as palavras de Eleonor de sua cabeça.

—Isso foi antes, mas agora Rin não vai a lugar algum. — negou em tom cortante — Ela veio até mim por vontade própria.

Nem um pouco impressionada a mulher bufou.

—Bem, é claro que ela veio. Nee-chan protegeu-a a vida toda, envolvendo-a em seu mundo perfeito de fantasias. — semicerrou os olhos — Vou levá-la.

—Não.

Será que ele teria que atirá-la para fora? Na verdade, já estava começando a se perguntar por que não havia feito isso ainda.

—Por que isso te importa?

—Rin precisa de mim.

Keiko suspirou balançando a cabeça lentamente, como se não pudesse acreditar naquela explicação tão simplória.

—Eu achei que esse tempo todo Rin estava com meus tios, minha tia havia me perguntado se eu concordaria em passar algumas semanas com ela no penúltimo verão, mas quando Rin ligou-me avisando que não iria mais… bem, ela evitou-me durante todo velório e nunca me retornou depois que a nee-chan se foi também, pensei que me odiava de alguma forma. — enganados por uma garotinha. Ingenuidade ou simples negligência? Fosse como fosse o juiz adoraria ouvir sobre tudo aquilo. — Não quis forçar nada e mantive-me à distância, esse foi meu erro, finalmente voltei a ligar no verão passado, talvez Rin quisesse me ver agora, nunca soube por que ela passou a evitar-me para início de conversa, eu ligava uma vez por semana, mas titia sempre dizia que ela não podia falar, achei que continuava a evitar-me. Por fim eu fui vê-la hoje, se Rin realmente não queria mais ver-me eu ao menos merecia saber o porquê, mas ela não estava lá, eu quis dar-lhe espaço e veja o que aconteceu.

—Seus tios também não pensam muito melhor de mim. — ele encolheu os ombros, fazendo-a cerrar os olhos numa forma irritadamente desconfiada — Mas Rin a esteve evitando por mais de um ano e claramente não quer ir com você agora, portanto não há nada que tenha para fazer aqui.

—Mari-nee-chan tinha um coração muito gentil. — ela resmungou mal parecendo ouvi-lo apoiando o cotovelo sobre a mesa e apoiando o rosto sobre a mão, olhando para uma direção qualquer bem distante dele — Ela era muito boa, e por isso acreditava que todos eram com ela também. Rin é da mesma forma.

—É mesmo? — perguntou irônico.

Já havia perdido as contas de quantas vezes Rin o descrevera como “cruel” — não que estivesse errada, é claro —, mas ainda assim continuava a declarar-lhe inúmeras vezes sua completa devoção e amor incondicional.

—Foi por isso que os seus relacionamentos, mesmo sendo poucos, foram tão trágicos afinal. Ela apaixonou-se por um moleque que lhe deu um pingente de ouro, mas ele nunca lhe retribuiu os sentimentos apesar de usá-la, mas ela era tão bonita… não era linda, mas era bonita. E ela era gentil, as pessoas sempre tiravam vantagem dela por isso. — olhou-o de canto. — Ela tinha um namorado, só que uma bosta de namorado insensível, e se ele não a amava para que continuar aquela relação? Não era melhor terminar de uma vez? — suspirou — Quando a nee-chan fez-me essas perguntas, eu não hesitei em dizer-lhe “Sim! Termine logo! Dê-lhe um chute na bunda!”. Nunca pensei que esses não eram os pensamentos dela afinal, eles estavam apenas sendo-lhe segregados aos ouvido como veneno. 

Ah sim, Sesshoumaru ainda se lembrava da última conversa…

—Se eu a amo? — repetiu pouco interessado — Por que está me perguntando isso agora?

—É que...

—Eu não me lembro de ter feito qualquer coisa para lhe dar tal esperança. — afirmou.

—Então... Você me odeia?

—Não. — respondeu — Nem por isso.

—Entendo. — ela sorriu tristemente e baixou a cabeça — Então, no final das contas, você apenas não sente nada em relação a mim. — e, apertando o cobertor mais firmemente contra o corpo, continuou com uma voz quase embargada: — Se é assim... Talvez seja melhor que paremos por aqui com isso.

Mas ele também não fazia ideia de que esses não eram seus próprios pensamentos… e sabia que certamente se soubesse não teria feito a mínima diferença. As coisas ainda assim terminariam exatamente como terminaram.

À sua frente Keiko continuava a falar:

—No fim ela acabou apenas saindo de um relacionamento de bosta para outro, e então Rin nasceu. Porém Mari-nee-chan nunca o esqueceu, sabia? Levou o medalhão junto consigo até o fim, nunca se separava dele, por isso fiquei surpresa ao vê-lo em torno do pescoço de Rin hoje, mas suponho que não seja possível transformar o ouro em cinzas, ou é? De qualquer forma, não era apenas o medalhão, era a foto, sempre a levava zelosamente junto ao coração: a foto do adolescente sem coração de rosto bonito que nunca a amou. Mari-nee-chan era uma tola.

Aquela mulher, ela sabia sobre o pai de Rin, podia talvez nunca tê-lo conhecido, mas sabia mais que os próprios pais de Mariko, ela sabia que ele fora um relacionamento posterior ao seu relacionamento com Mariko, no entanto ela também nunca o conhecera, então podia até ser que o estivesse confundido com aquele homem… 

“Você?!”

E foi só então que Sesshoumaru se deu conta: Ela sabia quem ele era.

Kinoshita Keiko sorria-lhe friamente:

—Então você se chama Sesshoumaru, Mari-nee-chan nunca quis contar-me seu nome, está mais velho agora, é evidente, mas ainda continua bonito e os cabelos loiros tal como a expressão austera e sem emoção são inconfundíveis. Mas independente do que Mariko disse à Rin, você não é o pai, não há como ser. — disse categórica — Eu podia ser só uma pirralha de quase quinze anos na época, mas foi para a minha casa que ela foi quando você a chutou, ela dormiu lá e encharcou meu travesseiro e também fui eu quem esteve na sala de parto com minha prima e segurei a mão dela, pode não parecer, mas Mari-nee-chan tinha uma força absurda, ela quase quebrou meus dedos naquele dia, e eu lembro perfeitamente: Rin nasceu prematura de trinta e quatro semanas e três dias e nessa época você já havia largado Mariko há um ano ou mais. — Keiko lançou-lhe um olhar compenetrado e acusatório — Então me diga de uma vez o que é que está pretendendo com toda essa farsa.

“Se eles realmente querem a criança de volta agora, algum familiar poderia facilmente contar a verdade a ela.”

Eleonor era definitivamente algum tipo de feiticeira, Sesshoumaru praguejou mentalmente, recostando-se ao encosto frio de sua cadeira de vidro.

—Rin precisa de mim. — afirmou.

Mas a mulher estava cética:

—Isso não tem nada haver com você, não sei por que quis se envolver, mas…

—Eu nunca quis envolver-me. — cortou-a — Aquela criança veio até minha porta, bateu e exigiu que eu tomasse conta dela enquanto insistia ser minha filha, eu tentei enxotá-la e tentei mandá-la de volta, tudo isso é verdade, mas ela persistiu, nunca soube que uma criança podia ter tamanha força de vontade. E quer saber por que ela estava tão determinada? Porque os avós, seus tão queridos tios, a convenceram de que foi ela a culpada pela morte da mãe, e agora já não suporta sequer vê-los sem cair em lágrimas e se afundar em culpa, porque acha que se ficar junto deles irá matá-los como acha que matou a mãe.  Você me disse que ela a esteve evitando desde que a mãe morreu, bem, talvez ela não a odeie, talvez só tenha medo de matá-la. — deteve-se por um momento, observando a forma como a pele de Kinoshita Keiko tornava-se ainda mais pálida e seus olhos e boca abriam-se cada vez mais e mais. — Se mesmo após ouvir tudo o que acabo de dizer, ainda insiste que isso não tem haver comigo e quer levá-la, ótimo, tente se puder, mas agora sou eu quem não irá largá-la. — levantou-se, se as palavras de Eleonor realmente tinham algum poder, então as suas também o possuíam, assim olhando-a de cima decretou: — Sim, sei bem que Rin não possui uma gota sequer de meu sangue, mas ainda assim eu também não vou abrir mão de minha filha.

Lentamente Kinoshita Keiko fechou a boca e engoliu em seco, sem nada responder.


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Notas finais do capítulo

Sentiram só a força do nosso Sesshy? ♥



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