No light, no light escrita por I like Chopin


Capítulo 7
Oráculos também leem revistas de moda


Notas iniciais do capítulo

Oieeee, demorei dnv. :v
Mas creio que vocês vão me perdoar, porque esse capítulo ficou legal. :v
Aliás, vocês abriram os links que deixei nas notas iniciais do capítulo passado? Cadê os comentários sobre o elenco? Volta lá e abre, gnt, qro a opinião de vcs. kkkkk



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/707916/chapter/7

—Então, qual é o plano? – Janine perguntou enquanto deixava Ibrahim conduzi-la pela mão.

—Inacreditável! Você não consegue ficar nem trinta segundos sem agir. – ele respondeu rindo.

Virando em uma pequena rua ao lado da boate, a ruiva assistiu com espanto quando ele a puxou para uma limusine preta.

—Você tem uma limusine? – perguntou esforçando-se para não deixar o queixo cair.

—Infelizmente o Batmóvel não estava à venda. – ele piscou.

Abriu a porta para deixá-la passar primeiro.

‘‘É exatamente como num filme americano. ’’, pensou ao vislumbrar os bancos de couro preto e o carpete cor creme no chão.

Em um dos bancos, a garota dampira estava inconsciente. Mesmo estando deitada, ainda sobrava espaço suficiente para que outra pessoa se sentasse confortavelmente ao seu lado.

Em frente a ela, Alicia e Gaby tinham um ar assustado e olhavam para a menina dampira sem entender nada do que estava acontecendo.

O vidro do motorista estava aberto e Pavel, virado para trás, conversava com as duas, tentando acalmá-las.

—Jenny! – Ally exclamou assim que a viu entrar. Alívio se espalhou pelo rosto das duas Moroi antes que Gaby continuasse.

—Onde você estava? Quase nos matou de preocupação! De um minuto para outro, desligaram a música e gente começou a sair da boate às pressas. Foi então que Pavel apareceu e nos trouxe até aqui.

—Eu sinto muito, mesmo. Não devia ter deixado vocês, é minha culpa.

A guardiã estava arrasada. Era a primeira vez em muito tempo que saía sem supervisão com suas protegidas e já conseguia arrumar problemas.

—Você não tem absolutamente nenhum motivo para se culpar! Pavel nos contou tudo que aconteceu. – Gaby enfatizou segurando sua mão com força – Tudo acabou bem, não foi?

—Acho que sim. – confirmou, mesmo que ainda estivesse cheia de incertezas.

Ainda um tanto decepcionada consigo mesma, arrumou o corpo frágil da dampira sobre o banco, apoiando a cabeça dela sobre suas pernas.

Ibrahim entrou logo depois, tomando o lugar vago ao lado de Janine e cumprimentando Ally e Gaby com um sorriso e um aceno de cabeça.

—Pavel, leve as garotas para hotel, por favor.

O guardião confirmou com a cabeça e deu partida na limusine.

Um breve silêncio se estabeleceu entre os passageiros. As Moroi pareciam ainda um pouco assustadas; Ibrahim olhava distraído pela janela e Janine se ocupava em afagar os cabelos loiros da dampira inconsciente.

Não havia qualquer assunto que pudesse uni-los. Além disso, falar sobre algo trivial, como o tempo, não parecia certo naquele momento.

Gaby apertava os olhos na direção de Ibrahim, como se estivesse tentando se lembrar de algo com todas as suas forças. 

—Eu conheço você... Você é Abe Mazur! Esteve uma vez na Corte para uma reunião de negócios com o meu pai, Kyle Badica. Você se lembra de mim?

Ibrahim sorriu e Janine olhou de um para outro sem entender o que estava acontecendo. Desde quando o apelido dele era Abe?

—Claro que lembro, Gabriella. Seria impossível me esquecer. Como vai seu irmão? – Janine esforçou-se para esconder sua repulsa. Ele tinha mesmo que jogar esse charme barato para cima de todas as mulheres que via?

—Ah, Hugo está ótimo, obrigada. – Gaby parecia extremamente contente por estar recebendo tanta atenção de Ibrahim – Faz muito tempo que não o vemos na Corte!

—É um lugar encantador, mas o clima não me agrada. – ele respondeu gracejando.

A limusine parou em frente ao hotel e Abe desceu primeiro, pronto para deixar a porta aberta para Alicia e Gaby.

—Tome conta dela direito, sim, Ibrahim? – Janine pediu, ainda relutante em deixar a menina que dormia no seu colo.

—Está tudo bem, Jenny. – disse Gaby, que tinha um sorriso bondoso no rosto – Pode ir com ela, eu e a Ally estamos bem.

—Eu sou a sua guardiã, Gabriella. – ela argumentou.

Gaby balançou a cabeça, sorrindo e com ares de quem não iria desistir.

—Ela precisa de você mais do que nós. Não vou contar à mamãe, prometo. – emendou piscando.

Janine abriu um sorriso genuinamente grato.

—Obrigada. – foi tudo que conseguiu dizer.

—Juízo. – ela disse, brincando. – Vemos você de manhã!

Gaby e Ally a abraçaram rindo e se despediram primeiro de Pavel e depois de Ibrahim, que esperava apoiado no vão da porta, acompanhando toda a cena.

Abe esperou que as duas entrassem no hotel para só então voltar ao carro, sentando-se dessa vez no assento em frente ao de Janine.

Pavel ligou o carro sem esperar por uma ordem, e a guardiã sabia que dessa vez estariam indo para a casa deles.

Três minutos se passaram em silêncio até que Ibrahim perguntasse sorrindo:

—Você quer me dizer alguma coisa, Janine?

—Do que está falando? – perguntou confusa e aborrecida ao mesmo tempo.

—É só que você deve estar me encarando já há... – ele fez uma pausa dramática para olhar o relógio de pulso dourado antes de continuar – Uma meia hora agora.

Janine revirou os olhos azuis antes de resolver fazer a pergunta que tinha em mente.

—Seu apelido é Abe?

Ele se arrumou um pouco mais no banco, divertido com a possibilidade de uma discussão próxima.

—Tem alguma coisa contra ele?

Jenny não pode deixar de revirar os olhos de novo, acrescentando ainda um impessoal balançar de ombros.

—Você não tem cara de Abe.

Ele riu da explicação e desviou os olhos para a janela.

—Tenho até medo de perguntar do que eu tenho cara.

—Essa é fácil; tem cara de perseguidor do deserto.

O rosto de Abe iluminou-se ao ouvir a risada verdadeira e divertida de Janine.

Como ele agora estava quieto, a guardiã voltou sua atenção para a menina adormecida. Deitada ali sobre seu colo, ela parecia tão pequena, tão frágil, tão vulnerável... Uma parte do seu subconsciente sussurrou que no fundo, Janine tinha tanta compaixão pela prostituta de sangue porque era exatamente assim que via a si mesma: apenas mais uma garotinha fraca.

Como que se tivesse adivinhado o rumo negro que seus pensamentos tomavam, Ibrahim retomou o assunto do seu apelido, preenchendo o vazio com seus sorrisos.

—Abe é na verdade um apelido americano, sabe. É que as pessoas tem mania de pronunciar meu nome errado e ‘‘Abe’’ é bem mais simples. Esses ocidentais... Tenho que facilitar tudo para eles... – ele balançou a cabeça, demonstrando pena.

Janine riu da brincadeira e perguntou sorrindo:

—E como é a minha pronúncia, Ibrahim?

Ele lhe deu um olhar admirado e um meio sorriso mais bonito ainda.

—Simplesmente perfeita.

A guardiã desviou o olhar, tentando controlar o sorriso que crescia em seu rosto. Por que diabos estava corando com um elogio tão bobo?

Pavel fez uma curva e entrou no estacionamento de um luxuoso prédio em um bairro nobre da cidade. Lá em baixo, Porsches e Mercedes confundiam-se e Janine teve o pensamento brincalhão de que todos aqueles automóveis juntos seriam suficientes para pagar a dívida grega.

Depois de encontrar uma vaga grande o suficiente para estacionar, ele desceu prontamente e ajudou Abe e Janine a tirar a dampira do carro, segurando-a nos braços.

Os outros dois o seguiam de perto enquanto ele subia as escadas para um enorme saguão com piso de mármore branco e preto.

—Não é o que parece, Amir. – Abe brincou ao passarem por uma mesa onde um sexagenário com feições egípcias folheava uma revista.

—Tenho certeza de que não é, senhor Mazur. – ele respondeu sem levantar os olhos, demonstrando o mínimo de interesse. Virou mais uma página da revista e continuou – Não vi nada. Boa noite.

—Sujeito adorável, o Amir. Muito prestativo. – ele comentou quando as portas do elevador se fecharam.

Pavel apertou o botão quinze e se esforçou para conter uma risada.

—Ele por acaso estava lendo uma revista de moda? – Janine perguntou curiosa, encarando o teto espelhado.

—Amir é assinante da Marie Claire. – ao ver o olhar estranho de descrença que ela lhe dirigiu, tentou argumentar – Não faça essa cara. Existe um pacto de silêncio nesse prédio; ele não vê o que os moradores fazem nem nós ficamos reparando nas revistas que ele lê.

—Tudo bem. – ela encerrou o assunto virando-se para o fundo do elevador, onde um espelho tomava conta de quase toda a parede.

Com um suspiro passou os dedos pelas pequenas manchas de sangue na sua camisa, agora também amarrotada. Nem ao menos sabia se aquele sangue era da menina dampira ou de Iuri Vasilinsky.

Ambas as possibilidades a deixavam enojada, mesmo que por motivos diferentes. De Iuri, não queria ter nem lembranças. Agora, pensar que o sangue poderia ter escorrido do pescoço dampira fazia com que sua situação degradante ficasse de alguma forma ainda mais evidente.

—O que foi? – perguntou Ibrahim, virando-se também para o espelho.

Resolvida a não se deixar abater por aquela longa noite, decidiu brincar um pouco também.  Ensaiou uma voz triste e fez um biquinho como o de Roxanne quando queria conseguir alguma coisa.

—Eu lavei essa camisa hoje.

Sem desviar os olhos do espelho, Janine viu Ibrahim desfazer o coque que ela havia arrumado há apenas cinco minutos e ajeitar o cabelo ruivo de forma que cobrisse as manchas na altura do tórax.

Depois, tombou a cabeça para o lado e olhou pensativo para sua imagem, como um artista que analisa a obra.

—Acho que isso resolve.

Janine balançou a cabeça, desviando o rosto do espelho.

—Esconder uma coisa quebrada não é a mesma coisa que consertá-la, Mazur.

O elevador se abriu nesse instante e Ibrahim segurou a porta para que ela e Pavel passassem.

Abe morava na cobertura e uma sequência de enormes janelas em um dos lados da sala dava uma vista espetacular da noite no Cairo. O ambiente era decorado com bom gosto, conforto e talvez uma pitada de luxo. Nada mais típico de um Moroi rico e bem relacionado.

—E o que fazemos agora? Você está no comando, Janine. – Ibrahim logo lhe deu todas as cartas e Jenny as aproveitaria o mais rápido que pudesse.

—Ok. Onde é o banheiro? – ela perguntou prontamente.

—Primeira porta à direita. – respondeu Ibrahim, mostrando o corredor com a mão.

— Pavel, me ajude a levá-la.

Os dois guardiões foram na frente. Pavel acendeu as luzes e assistiu quando Janine arregaçou as mangas da blusa e ligou o chuveiro com água gelada. Abe chegou poucos segundos depois, apoiando-se no batente da porta e observando tudo com curiosidade.

—Por acaso, posso perguntar qual é o seu plano?

—No momento? Dar um bom banho frio nela. Endorfina é mais ou menos como álcool quando o assunto é deixar a pessoa chapada.  – Jenny suspirou antes de fazer a próxima pergunta – Qual de vocês se dispõe a emprestar roupas limpas para vesti-la depois?

—Pavel tem uma camisola cor de rosa. – Abe comentou com fingido desinteresse, enquanto examinava o teto.

Janine primeiro pensou que era só mais uma brincadeira, mas olhou assustada para Pavel quando ele corou até a raiz dos cabelos.

—É da Cassandra. – murmurou desconcertado.

—Claro... Porque faz muito sentido a camisola da sua esposa estar no Cairo quando ela está em casa na Sibéria. – Ibrahim estava divertindo-se absurdamente torturando o guardião.

Pavel fez uma careta e sujeitou-se a explicar.

—É uma lembrança dela. Ninguém é de ferro, Mazur.

Abe riu, desarmando o outro homem.

—Vá pegar a bendita camisola, Belikov.

Janine adiantou-se e pegou a dampira no colo, tirando seus sapatos e entrando com ela debaixo do chuveiro. Começou a despi-la peça por peça; primeiro o vestido branco ensopado, depois as peças íntimas.

—Pode parar com isso agora. – a guardiã disparou com raiva.

—Com isso o que? – Abe levantou a cabeça, aparentemente sem entender a indireta. Estivera encarando os próprios pés durante todo o tempo em que Janine dava banho na dampira.

—De fingir que está incomodado com a nudez dela. Ou você me ajuda aqui ou pode cuidar da sua vida.

—Você quer que eu encare? – ele estava agora ainda mais aborrecido que ela.

—Quero que pare de agir como se fosse um rapaz virgem e tímido. Tenho certeza de que você não é.

Ibrahim cruzou os braços sobre o peito e sustentou seu olhar cortante.

—Você gostaria de tirar a prova? – sua pergunta não continha duplo sentido. A única interpretação era uma simples e direta alfinetada, que Jenny não teve como responder.

Aquilo era obviamente apenas uma ironia e não um convite.

Janine respirou fundo. Talvez realmente não tivesse direito de se dirigir dessa forma a Ibrahim, ainda mais quando ele estava na própria casa. Mas se perdoava com alguma relutância; aquela tinha sido uma noite bem mais complicada que a maioria.

Revirando os olhos, a ruiva esticou o braço direito e fechou a torneira. Pensava que o banho pudesse acordar a dampira, mas o máximo que conseguiu foi fazê-la mexer os olhos algumas vezes e murmurar algumas palavras desconexas.

Com uma toalha branca e fofa pendurada em um braço, Ibrahim se adiantou e pegou a dampira dos braços da guardiã, tirando-a de dentro do box e ajudando a secá-la com cuidado.

Jenny não disse nada, apenas sentou-se ao seu lado no chão de ladrilhos claros do banheiro e descansou a cabeça na parede.  Ibrahim trabalhava sem encará-la, com uma cara de poucos amigos no rosto.

—Estou fazendo direito ou posso ir cuidar da minha vida? –ele continuava incomodado com a repentina irritação dela.

—Ibrahim. – ela murmurou, segurando o braço dele com a mão úmida e gelada. Ele a olhou nos olhos com uma expressão neutra, e a guardiã teve que inspirar fundo antes de continuar. – Desculpa.

Ele continuou a encará-la, sem se alterar. Seus olhos negros percorreram todos os traços de seu rosto antes que ele desse de ombros e voltasse sua atenção para a menina nua em seus braços.

—Tudo bem. – ele respondeu por fim.

Fez um pequeno esforço e alcançou uma toalha amarela em uma prateleira acima de sua cabeça.

—Aqui, tente se secar um pouco. – disse enquanto entregava a toalha a Janine.

Ela arrumou o corpo e se enrolou no tecido macio enquanto murmurava um ‘‘muito obrigada’’.

—Podemos encontrar roupas secas para você, se quiser.

Ela recusou com a cabeça e conseguiu dar-lhe um pequeno sorriso.

—Está tudo bem.

Pavel voltou, lutando contra a reação natural de corar quando entregou a Janine em silêncio uma fina camisola de renda cor de rosa.

—A Cassie... Meio que me obriga a levar sempre alguma roupa dela na mala. Ela acha que tem alguma possibilidade de eu me esquecer dela. – ele tentou explicar enquanto passava nervosamente as mãos pelos cabelos castanhos curtos.

Ibrahim sorriu divertido quando comentou em ar de reprovação:

—Às vezes eu só imagino o que os outros guardiões diriam se soubessem de uma coisa assim sobre você, Belikov... Por fora, totalmente másculo e capaz de matar vampiros malignos com as mãos amarradas. Por dentro, uma pessoa que carrega uma camisola feminina por todos os lugares.

O guardião agora parecia estar perdendo a vergonha inicial e decidiu entrar na brincadeira de Abe.

—Espere só até se apaixonar de verdade por uma garota, chefe...  Você vai acabar fazendo tudo que ela quiser. – ele sorriu antes de continuar –  Principalmente se ela cresceu na Rússia derrubando árvores e matando ursos na floresta.

—Felizmente a guardiã Hathaway aqui não cresceu na Rússia. – ele comentou piscando.

Pavel riu e Janine, que acabava de vestir a dampira, olhou de um para outro, aparentemente sem entender o que acontecia.

—O que foi? – tinha estado tão absorta na sua tarefa de babá que não tinha dado a mínima atenção à conversa e às provocações entre os dois homens ao seu lado.

Belikov ajoelhou-se e pegou a dampira vestida no colo, sorrindo enigmaticamente para Janine.

—Acho que você acaba de perder uma grande confissão, guardiã Hathaway.

Ele piscou e ficou de pé, ainda a sorrir. Janine encarou o rosto descontraído de Abe com os olhos semicerrados por alguns segundos, antes de balançar a cabeça e desistir de tentar decifrá-lo.

—Eu preparei uma das camas do quarto de hóspedes. Posso levá-la para lá? – o guardião perguntou a Ibrahim.

—Sim, por favor.

—Acho melhor que eu durma na outra cama, para o caso de ela acordar no meio da noite. – sugeriu com boa vontade.

—Obrigado, Pavel.

Os dois trocaram um sorriso e ele olhou para Janine antes de sair.

—Boa noite, guardiã Hathaway. – ele se despediu com gentileza.

—Boa noite. Muito obrigada por tudo, Pavel. – ela lhe deu um sorriso genuíno, mas cansado ao mesmo tempo.

Com um último aceno de cabeça, ele se afastou e deixou Ibrahim e Janine sentados no chão frio do banheiro, ambos esgotados e em silêncio.

Abe suspirou fundo antes de retomar a conversa.

—Bem... Acho que depois disso tudo vou precisar de algo mais forte que café. Você quer alguma coisa? Uísque, café, chá...?

—Uísque, por favor.

Ele se levantou primeiro e estendeu as mãos para puxá-la para cima também. Janine o seguiu para fora do banheiro até a sala de estar novamente.

Ainda segurava a toalha amarela sobre os ombros, como uma espécie de manto mágico. A cidade vista de cima era ainda mais encantadora e contribuiu para fazer com que ela se sentisse novamente como uma criança pequena deslumbrada com a grandeza do mundo ao seu redor.

Com uma concentração absurda, Ibrahim derramou porções iguais de bebida em dois copos pequenos, arrumando depois a garrafa em uma mesa de vidro ao lado de um sofá cor creme.

—O melhor uísque escocês. – ele anunciou sorrindo ao lhe estender um dos copos.

Ela sorriu também, virando tudo de uma vez só. Entregou a Ibrahim o copo vazio; ele estava atônito.

—Vai com calma, Hathaway.

Seu sorriso era de orgulho de si mesma e de sua capacidade de aguentar grandes quantidades de álcool no sangue.

—A esposa do Pavel cresceu na Rússia caçando ursos e eu cresci na Escócia tomando uísque. Cada um tem sua história. – ela piscou.

Pelo visto, Ibrahim percebeu, ela não estava tão indiferente à conversa no banheiro como quis parecer. Virou-se para encher o copo dela de novo.

Conhecia Janine há pouco tempo, mas já sabia que aquelas variações de humor não eram próprias da personalidade dela. Todos os acontecimentos da noite tinham obviamente lhe tinham feito muito mal.

—Aqui. – ele lhe ofereceu a segunda dose – Você está precisando disso mais do que eu.

Janine lhe dirigiu um olhar reprovador, mas bebeu tão rápido quanto da primeira vez. Logo depois, ela mesma foi até a mesa de vidro se servir de uma dose decente de bebida.

—Agora seria uma boa hora para contar o que está acontecendo com você. – Ibrahim sugeriu, terminando a primeira dose e encarando o Cairo sob seus pés, como um rei que observa seus domínios. 

—Não sei do que está falando. – ela respondeu impassível.

Abe já sabia que ela seria extremamente complicada para se abrir. Autopreservação era uma de suas características marcantes.

—Não seja cínica, Janine. – rebateu calmamente.

Ela bateu o copo com força sobre a mesa e Ibrahim, mesmo sem vê-la, conseguiu imaginar perfeitamente suas mãos enrolando nervosamente as mechas ruivas.

Ele se aproximou vagarosamente, deixando seu copo vazio ao lado do dela. As mãos de Janine estavam brancas e seguravam firmemente as bordas da mesa.

—Você não hesita antes de matar um Strigoi, mas congelou quando o Moroi tentou agarrá-la. E não é qualquer pessoa que teria tanta compaixão por uma prostituta de sangue.

Ela inspirou e expirou com força algumas vezes antes de responder em voz baixa:

—Chega dessas suas teorias de conspiração, Mazur. Pare de fazer suposições.

Janine afastou-se dele, voltando à janela e encostando a cabeça no vidro. Precisava sair, precisava de ar... Precisava de escuro, de silêncio, de frio e talvez de várias lágrimas.

—Eu quero que você me conte. – a frase foi firme, metade pedido e metade ordem.

—Não confio em você. – respondeu sem se mexer.

Ibrahim se aproximou em silêncio, puxando-a para perto dele. A tolha amarela, o manto mágico e imaginário de Janine, caiu no chão. Seus rostos estavam próximos, a mão dele sobre seu braço lhe passava energia e calor em ondas de arrepios.

A respiração dela estava profundamente alterada e seu queixo tremia, talvez de frio ou vontade de chorar. Nem mesmo ela própria sabia ao certo.

—Mentirosa. – ele sussurrou, ainda cheio de calma. Estava obviamente controlando a situação, mesmo que Janine se recusasse ao máximo a colaborar.

Ela balançou a cabeça, irredutível.

—Essa é uma conversa que eu simplesmente não posso ter essa noite.

Ibrahim olhou para a guardiã cheio de afeto. Com a mão livre, segurou seu rosto, fazendo carícias leves.

—Não chore. – ele voltou a murmurar.

A frase produziu nela o efeito oposto: seu corpo todo voltou a tremer e seus olhos encheram-se de lágrimas, que ela teve dificuldade em impedir que caíssem.

—Não estou chorando. – ela respondeu com firmeza, mais para si própria que para ele – Eu nunca choro.

Ele não respondeu, apenas continuou a olhar fundo nos seus olhos azuis. Assim, à meia luz, ela ficava ainda mais linda do que ele pensava ser possível. Estava em um momento em que não saberia dizer se chamá-la de anjo seria ou não um exagero.

Ela apertou os lábios, sem saber se deveria contar suas dores, os medos que tiravam seu sono a noite e o peso que lhe esmagava o peito.

—Às vezes eu simplesmente acho que não vou mais aguentar. – ela disse de ímpeto ao soltar o ar.

A frase saiu falha, rápida, quase por acidente. Ibrahim não esperava qualquer tipo de confissão da parte dela, por menor que fosse. Foi surpreendido por um minuto, mas logo sua expressão se abrandou mais e ele sorriu.

—Claro que vai. É uma das pessoas mais corajosas que conheço.

—Você não tem ideia de quem eu sou. – ela balançou a cabeça. Detestava frases clichês de livros de autoajuda.

Só que daquela vez, Ibrahim realmente acreditava em cada palavra que dizia.

—Conheço o suficiente para dizer que você aguenta qualquer coisa no seu caminho. E se agora você está em uma fase em que não acredita mais em si mesma, pelo menos não duvide de mim. – ele respondeu com carinho e certeza ao mesmo tempo.

Janine piscou novamente para afastar as lágrimas, que voltaram a se acumular. Abe segurou seu rosto com mais firmeza, abaixando-se na direção dela e acabando com qualquer espaço entre os dois.

—Você é linda. – Janine quase não foi capaz de ouvir a frase que ele dissera quase sem pensar.

Também não teve muito mais tempo para tentar entendê-la. No instante seguinte os lábios dele estavam sobre os dela e foi como se o mundo todo tivesse parado por um segundo.

O contanto durou poucos segundos, mas que de uma forma bastante clichê pareceram para Janine como a eternidade. Quando ele afastou o rosto, rápido demais para o gosto dela, ela encarou seus olhos escuros.

O que viu dentro deles lhe foi completamente indecifrável.

Ainda sem pensar, pôs-se rapidamente na ponta dos pés e roubou-lhe um segundo beijo, quase tão único e fugaz quanto o primeiro.

Dessa vez, ao voltar os pés ao chão, ela não teve coragem de olhá-lo no rosto. Ibrahim a abraçou e beijou-lhe o topo da cabeça, ao mesmo tempo em que lhe acariciava os cabelos.

—Eu preciso ir, Ibrahim. – ela disse de repente, novamente mantendo a boca sobre o peito dele.

Era óbvio demais que gostava do carinho que ele lhe dava, e era exatamente isso que a deixava confusa.

Já tinha enfrentado batalhas demais naquela noite. Sinceramente, não precisava de mais uma guerra contra sentimentos que ela nem sabia que existiam.

—Eu sei. – ele respondeu após algum tempo de silêncio.

Seu tom de voz era também indecifrável. Se, como ela, seus sentimentos estivessem conflitantes e suas ideias embaralhadas, Ibrahim foi um verdadeiro mestre do disfarce.

Desfez o abraço, mas segurou a mão dela enquanto a conduzia até o elevador no outro lado da sala. Em silêncio, desceram mais uma vez para o salão de mármore onde Amir continuava a folhear revistas de moda.

Com da última vez, seus olhos nada viram. Mas sua intuição foi capaz de perceber que com certeza havia algo acontecendo entre a moça de olhos azuis e o homem dos olhos negros.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

PRA QUEM QUERIA BEIJO, OLHA AÍ 2 BJOS!
Demorou, mas foi. kkkkkk
A partir daí só melhora, juro. :v
QUEM DESCOBRIR O EASTER EGG (muito óbvio, aliás), FAVOR AVISAR. ;)
Comentem!! xoxo



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "No light, no light" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.