Cebola abriu os olhos vagarosamente se deparando com Anne ao seu lado,lhe observando.

—Suponho que já tenha melhorado…-A mesma acarenciou os cabelos do garoto com um tom de voz calmo e sereno.

—Onde ela está?!-Cebola ainda parecia perturbado depois do que havia acontecido.

—Esta falando daquela sua amiga?-A mulher o encarou com desprezo.-Ela estaria melhor se você tivesse seguido as nossas orientações…

—Como assim?-A cobaia se levantou aos poucos da cama do seu aposento,recobrando a consciência.

—Você não deu o adesivo a ela…

—é claro que eu dei!-Cebola tentou manter a sua farsa,mas não conseguiu.

—Você mente tão mal…-Anne respondeu com um sorriso divertido no rosto.-Pelo menos você tem mais sorte do que juízo, já que eu não te entreguei para os funcionários e nem para o Dr.Jeremy...mesmo que alguns funcionários tenham que pagar muito caro pelo seu erro.

—Mas isso não é justo!-Cebola protestou

—Nada nesse mundo é justo meu querido.

—Eles não podem pagar por algo que eu fiz!

—Mas terão que pagar de uma forma ou outra,é assim que as coisas funcionam aqui...as vezes temos que abrir mão de certas pessoas e valores pra sobreviver.-Anne se aproximou da cobaia,susurrando em seu ouvido.-Tenho certeza que faria o mesmo pela sua amiga...

—Sim...eu faria…-Cebola virou-se para o lado oposto da mulher,numa tentativa de afastar.-Mas eu não teria coragem de prejudicar outra pessoa…

—Mas teria coragem de prejudicar a si mesmo.-A mulher completou a frase enquanto tentava se aproximar cada vez mais.-Esse é o problema meu caro, porque não os dois lados se beneficiarem?

—Porque  em um jogo com dois adversários,jamais terá dois vencedores.-Cebola respondeu rispidamente a aquela pergunta,se afastando totalmente da mulher ao seu lado.

— Típico pensamento de um perdedor…

— Típico pensamento de uma iludida…

—É porque não fazer desta ilusão uma realidade?-Anne alcançou uma maleta preta para o garoto.

—O que é isso?-Cebola observou o objeto em suas mãos um tanto apreenssivo.

—Abra e verá.-A mulher o encarava com expectativas em seus olhos.

Assim que destravou a maleta,Cebola se deparou com uma espécie de contrato ao lado de uma caneta.Naquele contrato havia inúmeras cláusulas que falavam sobre os benefícios que a cobaia teria se caso assinasse.

—Você pode ter livre acesso pelo laboratório,ter os funcionários a sua disposição e principalmente….ter informações sobre a sua família.

—Porque eu não consigo acreditar nisso?-Cebola encarou a mulher com um olhar desconfiado.

—Deveria acreditar…

—Eu sei que eu não seria tão fácil assim ter essa “liberdade” aqui dentro.

—Não é fácil mesmo,mas você precisa conquista-la…

—Consquista-la como?

—É só trabalhar para a nossa organização e receberá todos esses benefícios e outros que merecer mais tarde.

—O que eu vou precisar fazer nesse “trabalho”?-Cebola perguntou seriamente enquanto encarava a folha de papel a sua frente.

—Isso o Doutor vai decidir.

—Eu não posso aceitar…

—Pense bem nessa proposta, você já deve saber que a sua família está nas nossas mãos,assim como a sua amiga Magali...se assinar pode aumentar consideravelmente as chances de libertá-los,a escolha é sua.

—E como eu vou ter certeza de que realmente vão cumprir com a sua palavra se caso eu assinar?

—Vamos mantê-lo informado.

—Vocês podem muito bem mentir pra mim.

—Então o que você quer?-Anne bufou impaciente com tanta desconfiança (geralmente conseguia a confiança de suas cobaias muito rápido,mas no caso de Cebola era um excessão).

—Eu quero saber o que está realmente acontecendo com a minha família e se estão bem, já em relação a Magali...A única coisa que eu não quero é que a machuquem.

—Você não está com muito crédito para fazer esse tipo de exigência queridinho...Mas vou te dar uma colher de chá,se assinar o contrato eu posso te ajudar.

Cebola voltou a analisar o contrato,deslizando o olhar atento sobre cada linha ou palavra e juntando a coragem que precisava para tomar a sua decisão.

—Eu vou assinar.

—Eu sabia que iria fazer a escolha certa.-Anne respondeu com um sorriso no rosto e um olhar cheio de expectativas.-A caneta já está ao seu alcance...é só fazer as honras.

Cebola hesitou em assinar no primeiro instante,mas logo depois preencheu o respectivo espaço para o seu nome rapidamente,por fim entregando o documento a mulher a sua frente.

—Seja bem vindo a organização.Em breve será informado das suas funções e cargos aqui no laboratório.

Cebola apenas concordou positivamente com a cabeça e observou Anne ir embora do local.Ele obviamente sentia um grande sentimento de culpa lhe invadir no momento em que assinou aquele contrato, porém também estava feliz por ter dado o primeiro passo para o seu plano de fuga.

Minutos antes...do outro lado do laboratório.

—VAMOS SAIAM DA MINHA FRENTE!!-Dr.Jeremy passava entre o aglomerado de funcionários á procura da sua cobaia.-AONDE ELA ESTÁ?!

—Esta bem ali senhor.-Um dos guardas apontou para a mulher estirada no chão e cercada por outros funcionários.

—Do-doutor... nós podemos explicar.-A funcionária mascarada que havia ordenado que Magali fosse colocada dentro daquela enorme estrutura anteriormente,agora se encontrava trêmula e com a voz falha por ter cometido um erro em sua função.-Não fazíamos ideia de que ela não havia ingerido o adesivo com o sonífero, não estávamos esperando que ela acordasse no meio do procedimento.

—Não sabiam?!ISSO É JUSTIFICATIVA PARA UM ERRO TÃO GRAVE COMO ESSE?!-O doutor serrou os punhos e esbravejou,deixando um clima de tensão do local.-É SÓ ISSO QUE ME DIZEM?!!

—Desculpe senhor,isso não vai se repetir de novo.-a mulher abaixou a cabeça visivelmente arrependida.

Dr.Jeremy por fim se abaixou para analisar o corpo de Magali,a mesma estava pálida e com os lábios levemente roxos...era visível que ela havia se afogado com a substância,seu corpo trêmulo e repleto de hematomas havia denunciado as agressões que sofrerá antes de entrar no procedimento.

—O que são esses ferimentos?!-O doutor perguntou desconfiado para a sua funcionária.

—Nòs tínhamos que puni-la por mal comportamento senhor,ela não quis participar do procedimento padrão e infelizmente tivemos que dar uma pequena lição nela.

—Certo…-O homem respondeu friamente e totalmente indiferente a gravidade da situação.-Desde que ela permaneça viva até o final do experimento...podem puni-la quando for necessário.

—Sim senhor.

—Outra coisa...quem foi o responsável por dar o adesivo a ela?

Todos permaneceram em silêncio,se entreolhando assustados e curiosos... até que  Anne surgiu no meio da multidão,dando um passo à frente.

—A princípio essa função foi dada a outra cobaia do experimento alfa, Cebola...Mas houveram mudanças de última hora e um dos guardas ficaram responsáveis por essa função,creio que ele tenha sido responsável por esse erro Doutor.

—E você por acaso sabe quem ele é?

—Sim.Tenho todos as informações a respeito dele...se quiser posso passá-las.

—Quero sim,mande esses os dados pra mim o quanto antes e eu verei o que vou fazer a respeito disso... enquanto isso o restante dos funcionários irá ficar encarregado de levar a nossa outra cobaia até a sala de exames, lá irão tratá-la até que esteja apta para novos procedimentos.

—Sim senhor.-Todos assentiram positivamente e carregaram Magali(ainda inconsciente) até o determinado local.

—Já posso recrutar a segunda cobaia para fazer parte da organização?-Anne perguntou ao doutor antes que o mesmo se retirasse do local.

—Sim...o mais rápido que puder,temos que mantê-lo aqui de alguma forma... Use todos os artifícios que estiverem a sua disposição, precisamos manipulá-lo antes que ele comece a pensar em fugir.

—Como quiser senhor,farei o que estiver ao meu alcance.-A funcionária saiu apressadamente do local,passando pelos corredores repletos de outras cobaias (a maioria delas dopadas).

A mesma já conseguia ver o rosto de Cebola em uma daquelas cobaias,prontas para seguir ordens e serem usadas nos inúmeros experimentos da organização.Os gritos dos pacientes eram como música aos ouvidos de Anne que continuava os seu trajeto até o escritório,onde pegaria a maleta com o contrato.

Depois de ter pegado a documentação necessária para a suposta parceria,Anne se dirigiu até o quarto de Cebola encontrando com os funcionários que haviam  levado-o para o aposento.

—Ele já acordou?-A mulher depositou a maleta encima de um criado mudo enquanto observava a cobaia estirado em sua cama.

—Ainda não...Mas pra apagar ele foi difícil.-Um dos guardas resmungou cruzando os braços.

—Eu imagino…-Anne revirou os olhos.-Já aplicaram a substância?

—sim,como a senhora pediu.

—ótimo...E já encontraram a família dele?

—Sim,os guardas já estavam no avião junto com eles e conseguiram levá-los até o laboratório nos EUA... só estão esperando as suas ordens para continuar o procedimento.

—Podem continuar...quero que implantem os chips neles também.

—Mas e a irmã mais nova dele?Ela é só uma criança.

—Não importa!Ela também vai ser submetida aos experimentos igual aos pais dela.-Anne respondeu enquanto rangia os dentes.-Mais alguma pergunta?

—Não senhora.-Todos os guardas abaixaram a cabeça.

—Agora já podem ir embora, estão dispensados.-Todos os guardas saíram prontamente do local, enquanto Anne acompanhava com os olhos cada movimento de seus subordinados.

Após todos terem se retirado do local,Anne se sentou na cama em que Cebola estava e pousou a cabeça do mesmo em seu colo...acariciando seus cabelos e lhe encarando como um lobo encara uma presa.

—Em breve você vai ser meu…-A mesma cantarolava com um sorriso maldoso em seus lábios,a sensação de ter uma nova cobaia em suas mãos era como ganhar um presente...tal sensação foi a mesma que sentiu mais tarde quando viu Cebola assinar o contrato, porém mal sabia Anne que a cobaia não pensava só em fugir como tinha um plano perfeito pra isso.