Her Slave escrita por nymphL


Capítulo 5
V - Um hollow entre nós


Notas iniciais do capítulo

Olá, pessoas!

90 anos depois, cá estou eu para atualizar Her Slave. Dessa vez, já venho com os capítulos 5, 6 e 7 e finalizo a história.

Agradeço a todos os reviews que tive até agora e agradeço também aos favoritos e acompanhamentos que a história recebeu.

Aliás, esse cap tem uma cena mais caliente, mas como não é totalmente descritivo, a classificação continua +16. Caso alguém se ofenda ou ache melhor ser +18, me avise ok?

Boa leitura

ps: eu não consigo colocar o banner, sabe-se lá porque, quando der eu volto aqui e coloco, ok?



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“K-KEN... HUMMMM.”

A voz foi abafada pelos lábios quentes do Capitão sobre os dela. Kensei beijava impetuosamente, como tudo que fazia na vida. Em estado de deleite, a vice-capitã mal teve tempo para processar o que estava acontecendo quando, finamente, se afastaram. O intervalo foi apenas para uma breve tomada de ar, pois tão logo Mashiro inalou, seus lábios foram arrebatados mais uma vez.

A última coisa da qual se lembrava, ou que acordara com as meninas da Associação, é que deveria seduzi-lo — não ser seduzida; precisava ter isso em mente. Passara as últimas horas na companhia de Matsumoto para aprender alguns truques que, segundo ela, seriam infalíveis.

A verdade é que sequer tivera a chance de usá-los. Desde que se reunira na companhia de Kensei, mal pudera abrir a boca — exceto, é claro, para beijá-lo. Assim que entrara no escritório de seu Capitão — ou dela, já que vivia mais no espaço dele do que no seu próprio, compartilhado com Shuuhei —, fora surpreendida pela voracidade com a qual ele a tomara em seus braços.

Seus dedos se encontravam entrelaçados nos fios prateados. É bem verdade que, assim como Shinji, reclamara muito do novo estilo de Kensei tão logo ele resolvera mudar o corte de cabelo, mas admitia que gostava muito dele — se fosse ser sincera consigo mesma, admitiria que embora sempre procurasse motivos para reclamar de Kensei, praticamente não encontrava muitas razões, e, quando as encontrava, considerava-as charmosas. Até mesmo sua costumeira falta de paciência era um charme aos olhos de Mashiro.

Não à toa, arrumava todo e qualquer motivo para provocá-lo.

Kensei era um esquentadinho.

Es-quen-ta-di-nho!

Um gemido insatisfeito deixou seus lábios tão logo ele interrompeu o beijo. Estava pronta para reclamar — chamá-lo de Kensei malvado! era batata! —, mas não foi necessário. Com os braços fortes ao redor de sua cintura, Kensei apenas a colocou sobre a mesa; as pernas de Mashiro automaticamente se abriram para acomodá-lo, enlaçando-se ao redor de seus quadris. Com uma risadinha satisfeita — que, obviamente, fez com que uma sobrancelha se arqueasse na face de seu Capitão —, ela o puxou para outro beijo, que foi emendado noutro beijo.

E mais outro.

E mais outro.  

E mais outro. 

Quando finalmente se separaram, Mashiro se sentia completamente drenada. Ele descansou a cabeça contra o ombro dela, respirando profundamente. Seu nariz roçou contra o lenço alaranjado que ela usava ao redor do pescoço, mas Kensei queria lhe inalar o cheiro diretamente.

Não.

Precisava.

Era mais do que um desejo, era uma necessidade.

As interações com Mashiro costumavam ser intensas — quer estivessem brigando ou se beijando; não eram o tipo de par que faziam algo pela metade. Com Kensei e Mashiro ou era tudo ou era nada. Sua relação física não poderia ser diferente. Mas, ultimamente, o raro controle, que sempre lhe escapava por entre os dedos, parecia ainda mais escorregadio.

O Capitão da Nona Divisão não teve tempo de analisar a situação. Algo no fundo de sua mente — bem, mas bem lá no fundo, quase como um murmúrio; talvez sua consciência — dizia para ser cuidadoso, para não deixar o controle lhe escapar completamente. Porque, ele sabia, tal controle tinha que vir de alguém, e, certamente, ele não viria da papagaia brega. Num rompante de desejo — que ele mal conseguiu reconhecer como vindo de dentro de si —, removeu o lenço alaranjado — rasgou-o — e percorreu a extensão de pele cremosa com a ponta de seu nariz.

“Ken—”

A reclamação ficou presa em sua garganta quando o nariz dele foi substituído pela ponta quente de sua língua. Apenas cheirá-la não era suficiente. Kensei sabia que precisava prová-la. Saboreá-la. E, Kami, seu gosto era superior ao dos biscoitos de com raspa de limão que ela lhe presenteara dias atrás. Fechou os olhos ao sentir a ponta dos dedos dela em seu peitoral; eles deslizaram pela abertura de seu shihakushou até o nó presente em sua faixa branca, desatando-o.

Um arrepio perpassou sua espinha ao ajudá-la a remover seu kosode preto e o shitagi branco. As mãos pequenas, desprovidas das costumeiras luvas, percorreram a extensão de sua tatuagem. Kensei sentiu seu abdome se comprimir diante do toque hesitante. Logo, os lábios carnudos se juntaram aos dedos numa exploração tímida da pele exposta.  

Ofegou.

Com as mãos trêmulas, o Capitão alcançou o nó no kosode dela, mas não o desfez. Queria observá-la, queria assistir a expressão de prazer em seus olhos amendoados quando a despisse. Com a mão direita, alcançou seu queixo e a afastou de si. Mashiro tinha os lábios entre abertos e a ponta rosada de sua língua percorreu o lábio inferior antes de roçar contra a ponta dos dedos dele.

Um som gutural brotou em peito e ganhou vida em sua própria boca segundos antes de esmagar seus lábios contra os dela num beijo avassalador. Os dedos de Mashiro se curvaram em seu peito; as unhas se fincaram em sua pele. Um silvo de prazer foi absorvido por ela ao entrelaçar as pernas ao redor do quadril dele com mais força, fazendo com que a proeminente ereção raspasse contra seu centro.   

O mais delicioso som que Kensei pensara ouvir em toda a sua vida deixou os lábios dela. Num ato sôfrego, começou a despi-la. Percorreu, com os lábios, cada milímetro de pele que seus dedos desnudaram, em beijos e leves mordiscadas. Mashiro jogou a cabeça para trás; o gesto fez com que seus pequenos seios preenchessem as mãos do Capitão.

Não foi surpresa perceber que Mashiro não usava nenhuma roupa íntima — perdera as contas de quantas vezes mais do que tivera uma prévia do que se escondia por debaixo de seu shikakushou; não estava desapontado — mas foi surpreendido quando a voz rouca lhe alcançou os ouvidos.

“K-Kensei...”

Estava prestes a beijá-la novamente quando ela colocou os dedos sobre seus lábios, impedindo qualquer movimento de sua parte.

“S-Seus olhos...”

Kensei olhou para ela, encontrando em seus orbes amendoados o reflexo dele próprio. Estava desgrenhado, obviamente. Cabelo desarrumado, parcialmente desnudo; respirava com sofreguidão. Mas o que despontava em sua aparência eram seus olhos: ao invés da natural coloração amendoada — idêntica à dela — um tom de ouro derretido tomava conta de sua íris. A costumeira esclera esbranquiçada apresentava uma ramificação enegrecida.

Aqueles olhos não eram seus.

Eram de seu hollow.

Kensei se afastou abruptamente, tentando colocar alguns centímetros entre eles. No entanto, as pernas de Mashiro ainda enlaçadas em torno de seu quadril impediram que ele fosse muito longe.

“Fique.”

Com as costas de uma mão, ela percorreu seu rosto numa leve carícia. Com a outra, tentou puxá-lo pela nuca para mais um beijo, que ele prontamente negou.

“Eu não quero te machucar.” Sua voz saiu num sussurro aflito. Roçou os lábios sobre a testa dela numa leve carícia.

Eu não vou deixá-lo te machucar.

Pressionou os dedos sobre as panturrilhas delas, forçando-a a deixá-lo ir. Quando Mashiro desenlaçou as pernas, Kensei colocou tanta distância quanto podia entre ambos. Pegou seu haori do chão e apertou o tecido entre seus dedos com brutalidade; suas pálpebras estavam fechadas enquanto tentava controlar o desejo avassalador que corria em suas veias.

O desejo de seu hollow.

Ainda que não pudesse tê-la visto, ouviu quando ela saltou da mesa e deu dois passos em direção a si.

“Mashiro! Fique aonde está!”

Também não pode ver, mas tinha certeza de que ela fez biquinho diante de seu comando — que foi prontamente desobedecido ao dar mais dois passos em direção a ele.

“Eu tô falando sério, Mashiro!” Cerrou os punhos com força; o tecido de seu haori estava a ponto de rasgar diante da ferocidade com a qual o segurava. Ao menos, considerou, Mashiro decidiu obedecê-lo.

“Kensei malvado!”

Virou-se com tudo para ela, pronto para explicar — gritar — os motivos pelos quais não era uma boa ideia provocá-lo naquela situação — porque era menos sábio ainda tentar se aproximar ou tocá-lo da forma como ela pretendia tocá-lo —, mas, neste exato momento, a porta de seu escritório foi aberta de supetão.

“Muguruma Taichou, o SouTaichou foi informado de que o primeiro relatório da oficial Kuchiki Rukia chegou e—

As figuras de seu tenente, juntamente com o seu terceiro em comando, surgiram pelas as portas de shouji entreabertas. Atrás de si, Mashiro ofegou. Kensei se ajustou para que seu corpo largo se interpusesse entre ela e seus subordinados antes de atirar seu haori para que ela pudesse se cobrir.

O terceiro em comando olhou para baixo imediatamente. Shuuhei, por outro lado, continuava a encará-lo com uma expressão extremamente estúpida no rosto — toda cor parecia ter saído de sua face, para ser substituída por uma tonalidade muito avermelhada. A sua frase continuava sem fim, mas ninguém, naquele momento, parecia interessado em saber o resto.

Exceto, é claro, pela marmota sem senso de moda.

“O que tem o relatório da Kuchiki-san, Hisagi-kun?” A voz de Mashiro soou atrás de si, naquele tom extremamente irritante e forçado, o que fez com que os três homens no escritório olhassem imediatamente para ela. O haori estava pressionado contra sua pele, mas ela não o havia vestido. Seus olhos amendoados brilharam com curiosidade e interesse. Sangue escapou pelo nariz de Shuuhei. “Hã, Hisagi-kun...” Ela sacudiu as mãos com certo desespero, fazendo com que o tecido escorregasse sobre sua pele e revelasse o contorno de seus seios. O nariz de Shuuhei agora parecia um chafariz. “Você tá bem? Ken-sei! Ele não parece nada bem!”   

Kensei estreitou os olhos. Uma veia saltou em sua testa. Não sabia quem deveria estrangular primeiro: se Shuuhei e seu terceiro em comando por ousarem olhar para Mashiro, ou a marmota por continuar despida como se não houvesse outras pessoas no cômodo — e sem se incomodar nem um pouco com isso.

“Deem o fora daqui!”   

###

Com a partida do Capitão Muguruma para o Décimo Terceiro Esquadrão, Mashiro se viu caminhando em direção ao Rukongai para comprar seus amados bolinhos de arroz doce. Kensei havia dispensado sua presença — e dessa vez não houve encenação e choradeira que o fizesse ceder — alegando que preferia checar o relatório recém-chegado com o Capitão Ukitake ele próprio.

Sozinho.

Mas...

Mas ela queria taaaaaanto saber o que dizia o relatório da Kuchiki-san! Se a reação de Hisagi fosse algum indicativo, deveria ter algo muito, mas muito, mas muito mesmo importante nele. Afinal, narizes não sangravam sem motivo algum, certo?  

Kensei malvado!  

Mashiro sentiu seu estômago roncar. Sempre que estava entediada sentia fome — o que acontecia, admitia, com certa frequência. Com um assovio alegre, correu em direção a um restaurante que vendia os melhores bolinhos de arroz, doces ou salgados, de toda a Soul Society. Lambeu os lábios em expectativa, quando avistou pelo canto de seus olhos uma movimentação estranha.

Até pensou em desaparecer, mas antes que sequer pudesse pensar em usar um shunpo, viu-se cercada por três participantes da Associação Feminina de Shinigami. Soi Fong colocou uma mão sobre sua boca, impedindo-a de gritar e a arrastou para dentro de uma sala reservada no restaurante. Hinamori pedia, desesperada, para que a Capitã não a machucasse e Matsumoto tinha um sorriso do tamanho do mundo estampado na cara. Lá dentro, Nanao a esperava na companhia de Isane.

A tenente do Quarto Esquadrão acabava de colocar em sua boca um bolinho de arroz. Mashiro salivou diante da cena. Até esticou o braço para pegar um, mas Matsumoto segurou seu pulso antes que pudesse alcançar a bandeja de comida.

“E aí? Deu certo?”

“Deu certo o quê?” devolveu, ainda esticando os dedos para pegar algum dos bolinhos. Dessa vez, Soi Fong bateu em sua mão, fazendo com que Mashiro a sacudisse freneticamente. “Ai! Doeu!” Olhou para a mão vermelha se perguntando com o que a Capitã da Segunda Divisão havia lhe acertado, antes de reclamar, fazendo beicinho, “Eu só quero um ohagi!

“Não antes de ouvirmos o seu relatório,” Soi Fong atalhou, já impaciente. Não conseguia entender a razão pela qual precisavam da co-tenente da Nona Divisão quando seu método era muito mais prático e infalível: capturar o Capitão Muguruma, despi-lo e tirar algumas fotos. Pronto.

Simples e prático.

“Então depois tá liberado?” Seus olhos castanhos brilharam diante da possibilidade de encher seu estômago com todos aqueles bolinhos de arroz doce. Sua boca ainda estava cheia d’água quando assumiu a posição de seiza sobre o zabuton próximo ao da vice-capitã da Oitava Divisão.

“Tá, tá, tá! Deixa ela comer!” Matsumoto atalhou, já sem paciência. “Só conta logo o que houve!”

Colocou um dedo no canto esquerdo do lábio e o mordiscou levemente, assumindo sua melhor expressão de marmota louca, como Kensei-sama gostava de chamá-la. “Contar o quê?”

Nanao bateu com uma mão na testa e sacudiu a cabeça em negação. Soi Fong revirou os olhos. Por mais que ambas tivessem ideias completamente divergentes acerca do que deveria ser feito para conseguirem as fotos do Capitão Muguruma, as duas podiam concordar que estavam, muito, mas muito, ferradas.

Mashiro continuaria se fazendo de louca até não poder mais — até que seu tempo se esgotasse e elas tivessem que fechar a Associação para pagar tudo que deviam ao tenente Iba.

E tudo, tudo, tudo, por culpa de Matsumoto e suas apostas sem noção.

A tenente loira semicerrou os olhos, uma expressão felina em seu rosto. Se Kuna Mashiro achava que alguém ali era burra, estava muito, mas muito enganada.

“Como você conseguiu esse chupão enorme no seu pescoço.”

Os olhos amendoados de Mashiro se arregalaram diante da menção de uma marca em sua pele. Num gesto desesperado, começou a tocar sua nuca, seu queixo, seu colo, e então a dedilhar sua garganta, como se pudesse sentir as marcas, ao invés de vê-las.

“Onde? Cadê? Cadê?”

“Nossa, foi caliente o negócio mesmo hein, pra ficar com essa marca gigantesca.” Matsumoto continuou, tentando se manter séria. Ou o máximo que poderia. Se a tenente não estivesse tão desesperada tentando ver o inexistente, perceberia que tudo não passava de uma grande pegadinha. “Me impressiona que ninguém tenha comentado antes!”

Mashiro atirou a cabeça para trás e soltou um grunhido que foi identificado como Kensei idiota!

“Rá! Sabia!” Matsumoto gritou em deleite! Conseguira pegar a amiga com as calças arriadas, como diriam no Mundo Real. Era assim que diziam no Mundo Real? Tinha que perguntar para Orihime da próxima vez que a visitasse.

Soi Fong estalou os dedos, pronta para ação. A tenente da Nona Divisão engoliu em seco. Ops. Olhou para os lados, procurando uma saída, apenas para não encontrar nenhuma. Ao menos Nemu não estava presente, pensou com certo alívio.

“Então você andou cedendo ao inimigo sem ter conseguido as fotos, Kuna Fukutaichou?”

Eeeeerrrr...

“N-não.” Abriu a boca e a fechou algumas vezes. O que dizer? O que dizer? O que dizer? “É claro que não!”

“Já disse que odeio mentirosos?” Soi Fong sacou sua Zanpakutou. Hinamori encarou a cena de boca aberta. Nanao removeu os ósculos e massageou as têmporas. Quanta dor de cabeça! Isane nunca se sentiu tão feliz por estar por perto momentos antes de a tragédia acontecer. A co-tenente Kuna certamente precisaria de cuidados médicos posteriormente. “E pessoas que quebram suas promessas?”

Mashiro sacudiu a cabeça, arrastando-se para longe das garotas. Mas não havia muito para onde correr. Suas costas se chocaram contra a parede do restaurante. Olhou para todas elas: nenhuma parecia disposta a ajudá-la. Com exceção de Hinamori, é claro, mas Matsumoto a segurava no lugar, um sorriso vitorioso em sua boca.

Naquele momento, quando a responsável pela Onmitsukidou pressionou a lâmina da Zanpakutou contra sua garganta, Mashiro só conseguia pensar numa coisa: ia morrer virgem.

Virgem e com fome.

###

“Seu chá vai esfriar, Muguruma Taichou,” Ukitake comentou, levando o copo à boca. Com um sorriso de canto, o Capitão da Décima Terceira Divisão assistiu ao amigo de longa data observar o horizonte com uma expressão pensativa.

É verdade que Muguruma Kensei era um homem facilmente distraído, mas hoje, especialmente, Ukitake achou que seu nível de distração estava maior do que o comum. Tão logo ouvira o relatório — pontuando e analisando a situação de forma precisa — e a conversa caminhara para assuntos informais, a atenção de Kensei evaporou por completo. Ukitake pensou que ele se levantaria bruscamente a qualquer momento e daria por encerrada a reunião. No entanto, algo parecia prendê-lo ao zabuton.  

Bom, Ukitake pensou com um leve sorriso, ao menos tinha Hisagi-san como companhia. Isso o levou a se questionar sobre a ausência de sua co-tenente. Tinha a opinião — acreditava ser compartilhada por toda a Seireitei — de que Kuna Mashiro e ele eram inseparáveis — tratasse-se de assuntos Oficiais ou não, a co-tenente sempre estava ao seu lado. Ukitake sorriu. A ideia de um Capitão ter mais de um tenente não era inédita, mas tampouco era comum.

E Kensei ainda tinha coragem de dizer que a detestava...

“A Kuna Fukutaichou está bem, certo?”

A mera menção do nome dela fez com que Kensei se voltasse para ele abruptamente, com um semicerrar de olhos que quase fez com que Ukitake perdesse o sorriso calmo. Quase. Tratou de reforçá-lo em seu rosto. Não lhe passou despercebido que, ao mesmo tempo em que o Capitão o observava, seu tenente abaixava a cabeça e se ocupava com seu chá — inclusive tentara alcançar o copo alheio, que repousava entre eles.

“Por que não estaria?” Kensei devolveu com um tom de voz mal-humorado.

Não que bem-humorado fosse um dos tipos de humor que se aplicassem ao Capitão do Nono Esquadrão com frequência... Mas, Ukitake pensou que já o havia visto menos irritadiço. Perguntava-se se a sua co-tenente teria passado dos limites dessa vez, porém, não acreditava que esse fosse o caso. Até onde sabia, Kuna Mashiro sequer conhecia o significado do vocábulo limite.

“Nada... Nada...” Levantou as mãos num gesto de pacificação, antes de mover o braço numa tentativa abafar a tosse com o lado interior de seu cotovelo.  “Só esperei que ela fosse acompanhá-lo...” Fez outra pausa. Talvez precisasse, de fato, conversar com a Capitã Unohana sobre seu tratamento. “Estou apenas surpreso pela ausência, tendo sido ela quem conduziu a primeira parte da investigação no Mundo Real...” Ukitake deixou o resto da sentença no ar, tocando o queixo de forma pensativa.

A verdade é que o relatório de Rukia reportava exatamente os mesmos pontos que o da co-tenente Kuna. Por mais que Kensei sempre a chamasse de marmota burra — para não mencionar a fama de preguiçosa que Mashiro cuidadosamente cultivara ao longo dos séculos; só perdia para, talvez, a tenente Matsumoto e seu amigo Kyoraku — Ukitake sabia que nenhum Capitão manteria um tenente ao seu lado sem que este fosse capacitado, a menos que...

...tivesse outros motivos.

Shunsui aventara tal possibilidade, mas Ukitake parecera meio cético a princípio, ainda mais por se tratar de uma constatação feita na ocasião da Festa de Aniversário do Capitão Muguruma, em que seu amigo já estava mais bêbado que todos os convidados juntos.

Entretanto, seu nível de alcoolização nunca fora motivo para constatações errôneas, sobretudo as concernentes à natureza romântica. Após tantos anos de amizade, Ukitake aprendera a confiar no que Kyoraku falava, por mais absurdo que pudesse soar logo de cara. Mas parte de si queria deixar para lá a promessa que fizera a seu amigo — quanto mais velho Kyouraku ficava, mais fofoqueiro e intrometido se tornava — mas, precisava admitir, também estava curioso.

Ainda assim... Kensei era um homem justo. Gostava de acreditar de que todos os Capitães, em maior ou menor medida, obedeciam a um senso de justiça ímpar na Soul Society. Ainda que o Capitão da Nona Divisão pudesse nutrir sentimentos por sua vice-capitã, sabia que ele não a manteria numa posição de poder e destaque sem que ela o merecesse. Acreditar em tamanho disparate era descreditar todo o trabalho que Kensei e Mashiro vinham fazendo, juntos, para reestabelecer a moral dentro de seu esquadrão.     

Foi quando o Capitão Muguruma se levantou e apanhou sua Zanpakutou, prendendo-a ao obi em sua cintura, que Ukitake soltou:

“Espero que me perdoe pela intromissão, Muguruma Taichou,” começou, olhando-o por sobre a borda do copo de chá. No passado, líquidos quentes costumavam ajudá-lo com as crises de tosse. Temia que atualmente sequer fizessem efeito. “Mas tomei a liberdade de conversar com o SouTaichou e solicitei a transferência da Kuna Fukutaichou para a minha Divisão. O cargo está vago há várias décadas e acreditamos que ela seria uma excel—

“Não,” Kensei o cortou com uma simples, porém, ríspida negativa. Sem lhe dar mais tempo para acrescentar o que quer que fosse, deu-lhe as costas. “Vamos, Shuuhei.”

Um leve sorriso ganhou vida nos lábios de Ukitake.

Kyoraku estava certo.

Como sempre.

“Mande minhas saudações à Kuna Fukutaichou.”

Ainda parado no final do corredor Kensei apertou o cabo de Tachikaze entre seus dedos. Poderia jurar ter ouvido o Capitão da Décima Terceira Divisão soltar um “cuide bem dela, sim?”.

Tsc. Como se precisasse de um homem senil como Ukitake para lhe lembrar de suas obrigações.     

###

Muito podia ser dito sobre Muguruma Kensei, sobretudo sobre seus defeitos: era cabeça quente, talvez por isso — não, justamente por esse motivo —, acabava metendo os pés pelas mãos mais do que deveria. E praticamente todos os seus outros defeitos decorriam desse primeiro. Mas ninguém poderia dizer que era estúpido.

Sabia muito bem o que o aparentemente bondoso e frágil Capitão da Décima Terceira Divisão estava fazendo. Ou tentando fazer. Não era a primeira vez que alguém insinuava desejar separá-lo de Mashiro — Lisa já o fizera anteriormente. Todos os Vizards, com exceção de Hachi, já o fizeram anteriormente. No início, logo quando se refugiaram no Mundo Real e precisaram treinar para controlar seus Hollows, essa era uma das maneiras mais efetivas de fazê-lo se transformar.

Se no passado a mera insinuação era suficiente para arrancar uma intensa reação de Kensei, hoje descobrira que, na verdade, a separação talvez fosse o melhor caminho para os dois.

E apesar de ter negado o pedido — sem sua autorização, Mashiro não poderia partir; Ukitake sabia disso —, Mashiro era livre para deixar o Nono Esquadrão — para deixá-lo — caso assim o desejasse. Nunca a impediria de partir — nunca a impedira. É bem verdade que seus dias seriam, no mínimo, diferentes, para não dizer entediantes. Após mais de um século convivendo com a papagaia sem senso de moda, era óbvio que a rotina de brigas e gritos era algo com o qual Kensei estava acostumado e sentiria falta. Mas não algo que não pudesse viver sem.

O que não poderia conviver era com a culpa de ser responsável por machucá-la. Responsável por deixá-la a mercê de seu hollow.

Por outro lado, sabia que não passava de um blefe. Caso Rukia fosse bem-sucedida em sua missão no Mundo Real, seria promovida ao cargo de tentente. Na opinião de muitos na Seireitei, tal promoção chegava com vários anos de atraso.

Não.

Ukitake Juushirou não desejava separá-los. Só queria saber sua reação. Provavelmente para provar algo para alguém. Havia sempre alguém querendo provar algo sobre sua relação com Mashiro para os outros.

Que saco.

Pressionou os lábios numa linha firme ao se aproximar de sua Divisão. Pela primeira vez em vários dias desejou que houvesse absoluto silêncio — sem a necessidade de qualquer subterfúgio para obtê-lo. Ficou impressionado ao ter seu desejo atendido — muito embora tal quietude se devesse mais ao horário tardio do que qualquer vontade de seu subconsciente.

Percorreu os corredores vazios sem pressa. Até pensou em passar no quarto de Mashiro, mas se recusou a concluir o pensamento do que poderia ou esperava encontrar. Após aquela manhã, pensava que talvez o melhor a ser feito fosse despachá-la para o Mundo Real — e o faria, se a situação assim o demandasse.

Além do mais, já era muito tarde. A papagaia louca provavelmente estaria dormindo e a última coisa que precisava era acordá-la. Já tivera mais do que a dose necessária de Mashiro por um dia — embora, ele soubesse, esse era um ponto do qual seu hollow discordava veementemente. Para o monstro dentro de si, muitas doses de Mashiro nunca seriam o suficiente, não até que estivesse completamente embriagado.

Manteve-se firme em seu caminho e tão logo abriu a porta de seu quarto, tratou de remover seu haori e correr os dedos pelos fios prateados. Sentia os princípios de uma forte dor de cabeça. Sabia que o correto a se fazer era procurar um analgésico. Mashiro trouxera várias caixas do Mundo Real que abastecera com suplementos medicinais retirados do Quarto Esquadrão — queria acreditar que com a autorização das responsáveis Capitã Unohana e sua tenente, Kotetsu Isane, mas o furto não estava abaixo de Mashiro —, ainda que, na maioria dos casos, comparecer à Quarta Divisão fosse mais fácil e prudente. Havia uma caixinha daquela para cada um dos Vizards que retornaram para a Soul Society: Rose, Shinji e, é claro, ele. Havia uma para Hisagi também, e para cada membro da Nona Divisão. No fim, acabou procurando por uma garrafa de saquê.

Uma delas fora presente do Capitão Shunsui. Estava prestes a abri-la quando a avistou completamente estirada sobre a mesa de centro. Ao seu redor havia um modesto jantar para dois — ou, especificamente, para um. Conhecendo a papagaia louca, sabia que ela provavelmente não fizera muito esforço para esperá-lo e comera tudo muito antes de seu horário previsto de chegada. 

Kensei até sentiu o começo de um aperto no peito diante da cena. Mashiro adormecera esperando por ele — para jantarem juntos. E ele, irremediavelmente, estava atrasado. O sentimento, no entanto, logo foi desfeito. A papagaia louca era uma péssima cozinheira — quando tiveram que partir para o Mundo Real, sempre que era seu dia de cozinhar, ou Mashiro o atormentava até que ele tomasse o avental de suas mãos enraivecido e fizesse comida para todo mundo, ou o arrastasse até um restaurante para comprar bolinhos de arroz —, era melhor, portanto, ter ficado sem ingerir aquilo. Só alguém com o estômago como o dela para aguentar digerir aquela coisa e sobreviver.

Aproximou-se em silêncio ainda que soubesse que tal cuidado era desnecessário. A menos que alguém gritasse em sua orelha, Mashiro não acordaria. A ideia era tentadora, mas não faria nada para desfazer o tão confortável e maravilhoso silêncio.

Fechou os próprios olhos e inalou com calma.

Aquele momento merecia ser capturado — na ausência de uma câmera, Kensei tentou registrá-lo em sua memória, pois tão certo quanto o fato de que Shunsui e Matsumoto estavam armando para ele, aquele instante jamais se repetiria.

...e tão rapidamente ele foi corrompido.

Logo estava a papagaia louca murmurando alguma coisa em seu sono enquanto enfiava a mão em suas vestes. Kensei arqueou uma sobrancelha com ligeira irritação ao se recordar daquela manhã. Sentia vontade de chutar-lhe o traseiro para fora do quarto, mas apenas se inclinou para ouvir o que ela dizia.

Suspirava.  

“Kensei idiota!”

Respirou com força, controlando a vontade de sacudi-la até o próximo século. Até dormindo aquela maluca conseguia irritá-lo.

Estava prestes a deixá-la exatamente onde estava e que se dane caso tivesse torcicolo no dia seguinte, quando a ouviu resmungar outra coisa que o fez congelar.  

“Eu também gosto muito de você.”


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Notas finais do capítulo

Bem... Nesse cap eu tentei explorar um lado diferente do Kensei, então como esse cap é mais focado nele, ele é mais sério também (embora tenha a parte de comédia da Mashiro com as meninas da Associação, hehe sempre né). Ah, esqueci de mencionar nas notas iniciais, mas meus sinceros agradecimetos pra Roberta, por ter me ajudado com a descrição do Ukitake ♥

Tentei com esse cap jogar uma luz sobre os sentimentos do nosso amado Capitão Tsundere. Apesar dos momentos comédia e etc, acho que dá pra extrair um pouco de profundidade desses dois. Nesse cap, fiz isso com o Kensei... Em breve, farei isso com a Mashiro tbm hehe

Beijinhos,
Nymph_L



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