Policiais, assistentes sociais ou qualquer um que estiver lendo:

Se achar essa carta, é porque já parti há algum tempo. Mas não se preocupe, eu não parti dessa vida, e sim de Twinbrook. Não estou fugindo de ninguém, apenas estou em busca de uma nova vida, de um recomeço.

Meu nome é Annika Hanover Huttenloche Sanders, e eu sou filha de Helia Hanover. Sim, a cantora famosa (e agora empresária) que vive em Starlight Shores. Ela começou a namorar meu pai, Marlon Sanders, com 16 anos. Do jeito que eles viviam, parecia um conto de fadas. Aos 18 anos, ela ficou grávida de mim e de minha irmã, Britney. Foi uma gravidez inesperada, pois ela estava em início de carreira e os pais não aceitaram que sua filha perfeita tivesse cometido um erro como aquele antes de estar casada. Mas Marlon a apoiou, assumiu a paternidade ao lado dela e com isso os pais de Helia se comoveram.

Britney e eu crescemos juntas até os 5 anos. A vida era ótima, nós duas sempre muito unidas apesar de nossas diferenças, e nossos pais nos davam todo o carinho do mundo. A partir daí, muita coisa mudou...

Helia recebeu uma oportunidade que mudaria sua vida e faria sua carreira de cantora decolar: Uma turnê na Europa que duraria um ano, a faria ganhar muito dinheiro e aumentar sua fama pelo mundo. Ela ficou louca para ir, pois sempre foi seu sonho. Porém, dessa vez, Marlon não a apoiou. Ele disse que uma mulher casada e mãe de duas meninas que estavam em fase de crescimento teria muita irresponsabilidade em deixá-las por um ano. E, de certo modo, ele estava certo. Nós duas já estávamos na escola, e ele trabalhava em uma fábrica de calçados. Sempre dizia como seu patrão era rígido, e o demitiria sem pensar duas vezes se ele ousasse lhe pedir aquilo. Mas Helia não quis nem saber. Aquela era uma oportunidade única, e, se a recusasse, poderia não ter essa sorte novamente. E então foi para a turnê.

Foi um longo ano sem ela, os dias pareciam passar mais devagar e não tínhamos nenhuma notícia dela. Nem um cartão postal, nem uma foto, nem um bilhete, nada; Parecia que havia nos esquecido, que a vida na Europa era tão boa a ponto de nem ligar para a própria família que a esperava ansiosamente. E então, ela voltou. Linda, radiante, agindo como se nos amasse e fosse a melhor mãe do mundo, se esquecendo de que ficara um ano sem mandar notícias. Marlon não ficava muito em casa, chamava a vovó Lydia para cuidar da gente enquanto estava fora. Eu me perguntava o que ele tanto fazia na rua. E então, quando Helia voltou, eu descobri: Ele estava contatando advogados e preparando os papéis do divórcio. Foi uma longa discussão até que ela aceitou assinar, e depois disse que iria se mudar. Britney era muito apegada á ela, então concordou em ir junto. Mas a ideia de deixar meu pai sozinho, o homem que cuidou de mim durante um ano, para ir morar com a mulher que esqueceu minha existência no mesmo período era insuportável. Então, Britney e Helia partiram para Starlight Shores, enquanto continuei morando com Marlon em Twinbrook.

Hoje, 11 anos depois do ocorrido, recebi uma notícia terrível na escola: Marlon havia sofrido um acidente na fábrica e ficara preso em uma das máquinas, não conseguindo sobreviver. Comecei a chorar, levando alguns minutos para acreditar que aquilo era real, enquanto os funcionários da escola tentavam me consolar. Fui correndo para casa na mesma hora, não aguentei mais ver todo mundo me encarando e murmurando "pobrezinha". Não havia nada que eu pudesse fazer para mudar o que aconteceu, então me preparei para o que estava por vir. Provavelmente eu ficaria sob a guarda do serviço social até eles decidirem o que fazer comigo.

Enquanto arrumava minhas malas, notei algo que me chamou muita atenção no sótão logo em cima do quarto de Marlon: Uma grande caixa cheia de cartas empilhadas, cartões postais de Paris, Milão, Veneza, Londres, Praga e alguns ursinhos de pelúcia e bonecas cheias de poeira. Foi aí que percebi: Helia havia mandado tudo aquilo para nós, mas Marlon se recusou a mostrar. Por quê?

A resposta não importa. A única coisa que importa é que eu estava enganada sobre minha mãe. Ela havia se mostrado toda atenciosa, carinhosa no período da turnê, nunca esquecendo de sua família, enquanto o vilão de verdade era Marlon, que havia escondido aquelas coisas de mim e de Britney, me fazendo pensar que Helia se achava boa demais para se lembrar da família. Então decidi: Tenho que encontrá-la.

Juntei todo o dinheiro que encontrei em casa e decidi tomar meu rumo. Não era muita coisa, mas foi suficiente para pegar um ônibus para Starlight Shores. Agora, estou indo para lá procurar minha mãe e minha irmã. Não é o fim de uma história, é apenas o começo de outra. Me desejem sorte!

Annika H.