Estio_[DEGUSTAÇÃO] escrita por Senhorita VI


Capítulo 4
Capítulo 5


Notas iniciais do capítulo

Boa leitura!



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CAPÍTULO V

O caminho estava escuro, mas o luar permitia-lhe ver toda a estrada. A cada trecho, havia uma casa de um vizinho conhecido, e ela já percorrera tanto estes caminhos, que não sentia medo algum em andar por ali, mesmo na penumbra.

O trote do cavalo foi escutado ao longe. Lá no fundo do peito ela pressentiu que era ele, mas, novamente, pediu a Deus que a livrasse de mais esta vulnerabilidade. Obviamente, Ele não atendeu.

— Triana! – Renato havia descido do cavalo e agora caminhava rapidamente em sua direção. – Por favor, deixe-me acompanhá-la.

Ele já estava a um metro dela e o perfume que exalava era de uma fragrância amadeirada. Triana olhou ao redor. Temia que alguém os visse juntos na noite.

— Não creio que esta seja uma boa idéia.

Ele sorriu, encantadoramente.

— Por favor Triana. Ninguém irá nos ver em meio a esta escuridão e eu posso jurar que não ofereço qualquer perigo à você.

Não foi exatamente isto que ela viu no olhar e sorriso maliciosos de Renato. Ele poderia sim, ser bastante perigoso para os nervos dela. Este pensamento causou um leve sorriso em Triana, embevecendo Renato e tornando-o ainda mais cobiçoso de tê-la por algum tempo.

— Algo me diz que me arrependerei disto, mas vamos lá.

E caminharam juntos bosque adentro. Não foram muito longe da beira da estrada, apenas o suficiente para sair das vistas dos mais curiosos. Encontraram alguns troncos recém cortados e ali se sentaram um pouco. Ela estava ansiosa e receava que Renato conseguisse escutar as batidas aceleradas do seu coração.

Permaneceram calados por alguns segundos.

Ele a examinava minuciosamente. Os cabelos negros e brilhantes, o peito, que subia e descia, por causa da respiração acelerada; a pele aveludada, sob a luz da lua... Tudo lhe era encantador. Por outro lado, ao sentir o olhar observador de Renato, Triana entendeu que ele a recriminava sua postura, sua roupa e tudo mais. Ela rogava a Deus que a escuridão encobrisse seus defeitos. Ou, ao menos, a maioria destes.

— Renato, se tudo que quer é me olhar, poderia fazer isso sem me expor, não acha?

— Desculpe Triana, mas agora que finalmente consegui um pouco da sua atenção, fico assim, feito um rapazote, sem saber o que fazer.

— Bem, se não iremos conversar... – e então, ela fez menção de levantar-se, mas ele a deteve, segurando-a pela mão. O nervosismo agora se espalhava por todo o corpo, como ondas elétricas.

— Por favor, não destrua este momento. – A voz aveludada e a maneira gentil com que pedia, convenceu a jovem a senta-se novamente. – Triana, - ele a olhava com ternura, e fazia com que ela sentisse o estômago revirar. – não entendo muito bem o que está acontecendo comigo, mas... Mas eu nunca me senti assim, como me sinto com você. Mulher alguma, nunca me causou a sensação que você me causa.

Ela até abriu a boca para protestar, para dizer que isto não era possível, que ele, por favor, parasse de fazer aquilo com ela. Mas Renato a impediu.

— Não, por favor, não diga nada agora. Deixe-me terminar. – ele apertou as mãos trêmulas de Triana e deslizou o polegar com delicadeza, acariciando-as. – Sei que sou um estranho para você, mas..., é como se nos conhecêssemos há anos! Sinto ânsia de estar ao seu lado, de falar com você e... Me perdoe, por ser tão explícito assim...

— Por favor, Renato, não faça isso... – Era óbvio que ele estava se divertindo com ela. Por que um homem como ele, com tantas opções de moças para galantear, estaria ali, dizendo aquelas coisas?

— Triana, eu estou apaixonado por você. Completamente apaixonado.

A revelação foi de encontro ao peito de Triana como uma bola de fogo, arrancando-lhe o fôlego e o equilíbrio. As palavras ressoavam em sua cabeça, mas pareciam não fazer muito sentido. Aquela brincadeira estava indo longe demais!

— Renato, por Deus! – ela tentou se desvencilhar, mas ele segurava suas mãos com firmeza – Você está sendo cruel!

— Cruel, Triana?! Que tipo de crueldade pode haver no amor?

O impulso nervoso de gargalhar veio forte, mas ela o conteve. Amor?! Como assim amor? Será que estava bêbado novamente?

Ela respirou fundo, fechou os olhos por um momento e tentou, com todas as suas forças, recobrar um pouco de serenidade. Ele só podia estar brincando. Deus! Que ele não esteja brincando, por favor!

— Renato, eu nunca .... Eu jamais me apaixonei e nunca tive ninguém apaixonado por mim. Não sou do tipo de que tem sonhos de amor. Na verdade, nunca me permiti ter este tipo de vislumbre. – já havia passado do estágio de nervosismo há muito, e agora beirava a histeria - Olhe para mim! Eu não sou bonita e nem elegante. O que um homem fino, bonito e rico como você pode querer com alguém como eu?

Ele ergueu as sobrancelhas, parecia surpreso com o que acabara de ouvir, mas então, com uma das mãos acariciou o rosto jovem de Triana. O perfume suave de lavanda encheu os pulmões da menina e por onde a mão de Renato passava, deixava um rastro de fogo.

— Minha doce criança... Tudo o que tenho, tudo o que sou, coloco aos seus pés neste momento. Para mim, você é a mulher mais encantadora deste mundo.

— Como poderei crer? – Ela virou o rosto, afastando a carícia tentadora – Você não me conhece. Não sabe nada de minha vida e não faz idéia do tamanho da consciência que tenho da minha insignificância! Como pode ter certeza que me ama, se nem mesmo me conhece?

O sorriso veio fácil ao rosto masculino. Ela acabara de dar o bilhete de entrada que ele queria. Ela acabara de dizer sim, e ele estava pronto para fazê-la crer.

— Eu já conheci e me apaixonei por muitas mulheres Triana. Um homem sabe reconhecer o vinho puro e de boa safra, depois que está acostumado a provar vinhos e bebidas de todas as partes. Eu reconheci que você era a mulher que eu esperava, no primeiro momento em que te vi. Você me pergunta como eu tenho certeza? Deixe-me mostrar e você também terá esta certeza.

Renato deslizou a mão até a nuca de Triana e, com muita suavidade, puxou-a para si. Seus lábios se tocaram como dois imãs. Triana nunca havia sido beijada e seu peito explodiu frente aos lábios macios e doces de Renato. Era o seu primeiro beijo e, sem dúvida, o melhor beijo do mundo. Suave e mágico. Todo o seu corpo vibrou e os joelhos transformaram-se em líquido – moles e fluidos.

O momento não durou mais que alguns segundos, mas para ela, tornara-se uma eternidade. Mesmo depois de separados, ela ainda podia sentir o seu sabor e a mão forte a sobrepujá-la.

 Ele a encarou por algum tempo, mantendo a mão em sua nuca e o polegar a acariciar a delicada pele do pescoço.

— Acredita agora nos meus sentimentos?

Triana não poderia assegurar nem mesmo se ainda estava na Terra, muito menos se acreditava em algo ou não.

— Você me deixa tonta, Renato.

O riso saiu fácil, como um suspiro, e ele tornou a beijá-la, desta vez com mais delicadeza, dando-lhe uma série de pequenos beijos nos lábios, até que ela mesmo tomou a iniciativa e passou um dos braços pelo seu pescoço.

Triana não soube dizer quanto tempo havia passado desde o momento em que adentrara ao bosque, até a hora em que conseguiu convencer Renato que era melhor seguir sozinha o caminho até em casa. Talvez uma hora ou duas. Mas quando chegou, encontrou Jesus irritado, e sua mãe, com o semblante coberto de preocupação, estava agarrada ao terço.

— O que houve menina? Quer deixar-nos inquietos?!

A voz de trovão de Jesus ecoou pela sala. Então, ela viu Breno surgir de trás de seu pai, com os olhos arregalados.

— Triana, onde você estava?

Do outro lado da sala estava Otelo, recostado à arcada da porta. Ele fez um gesto discreto, lembrando-a do silêncio que havia prometido manter, a respeito de seu recado para Domitila.

— Eu... Desculpem. Eu não sei o que aconteceu. – seu cérebro funcionava tão rápido quanto uma locomotiva. Precisa criar uma história consistente e confiante. - Fui à cidade, e quando voltava para casa, senti uma tontura muito forte. – sentia a mentira estampada em seu rosto, mas precisa acreditar na própria calúnia para ser convincente. - Procurei sentar-me em uma árvore, um pouco adentro do bosque e, quando dei por mim, estava deitada no chão. Devo ter adormecido ou mesmo desmaiado, não sei.

Não conseguiu encarar Breno. Não conseguiria mentir olhando-o de frente. Ele atravessou a sala e abraçou a irmã, tanto por alívio de vê-la viva, quanto para protegê-la de uma possível agressão de Jesus. Para Breno, era óbvio que ela estava aterrorizada, pois seus olhos estavam destacados e a pele mais pálida do que o normal.

O abraço do irmão destruiu-a por dentro, mas era preciso escolher: ou isso, ou ver a desgraça instalar-se de vez em sua casa.

— Como ninguém a viu? – Jesus deu um passo à frente, ficando a pouco menos que um metro dos irmãos. – Andamos por todo este caminho e não vimos nada!

O temor subiu por suas pernas e atingiu-a em cheio no peito. O olhar ríspido e gélido de Jesus a atravessava como uma lâmina. Ela sabia que a qualquer momento sentiria a mão pesada e áspera do pai em seu rosto.

— Ela está muito nervosa meu pai. – Interrompeu Breno, vendo que Triana começava a chorar e a tremer. - Sabe lá se não está doente. Não acha melhor chamarmos o médico?

Ela entregou-se ao desespero e deixou que o pranto chegasse. Agora Breno também apanharia com ela, como já acontecera inúmeras vezes.

Jesus chegou a erguer a mão ao vê-la chorar. Poucas coisas o irritavam tanto quanto o choro de Triana, fazendo-se sempre de vítima. Mas, antes que pudesse dar vazão à raiva, sentiu os olhares inquisidores a sua volta e viu o quanto a menina se encolhera nos braços do gêmeo. Respirou fundo e enfiou os polegares no cós das calças, como costumava fazer quando reconhecia que perdera um jogo.

— Leve-a para cima. Mantenha esta menina em seu quarto o máximo possível. Não quero vê-la circulando por alguns dias. – até que sua raiva passasse, ele pensou. Ela fizera com que perdesse a hora do jantar e com que fizesse papel de tolo perante seus vizinhos.

Os dois passaram por Jesus, mas antes que subissem o primeiro degrau da escada, o pai os chamou. – Espero que o médico a dê por doente. Caso contrário, teremos uma conversa eu e você, mocinha.

Mal Jesus virou as costas, Isabel subiu as escadas em disparada, atrás do casal de gêmeos. Estivera o tempo todo em oração, pedindo que Deus tomasse conta da sua menina. Não saberia dizer se estava mais apavorada com os perigos da noite e da estrada, ou com as atrocidades que escutara Jesus dizer que faria com sua filha, quando esta chegasse.

Por estas coisas, as quais ninguém sabe explicar, quando o médico chegou, Triana ardia em febre. O medo era grande, e a consciência lhe doía de tal forma, que lhe causavam espasmos e tremores. Breno estivera o tempo todo ao seu lado, segurando-lhe a mão e alisando-lhe os cabelos. Isabel trocava as compressas de água, enquanto o médico prosseguia com o exame. Por fim, diagnosticou-a como febre temporal, algo como uma virose sem motivo aparente. Este diagnóstico abrandou um pouco a ira de Jesus, mas não a sua vontade de descontar em Triana toda a raiva que trazia em seu âmago.

A noite fora intensa. Isabel e Breno não descansaram, enquanto Triana delirava de febre. Mas, por fim, o dia amanheceu limpo, apesar das baixas temperaturas, e a febre de Triana cedera no meio da madrugada. Agora, ela dormia tal qual um anjo. Breno também adormecera ao seu lado, mas no meio da manhã já estava de pé, providenciando o desjejum de sua irmã.

Quando abriu os olhos e viu que o sol estava bem no alto, Triana se deu conta de que já era o meio do dia e o cheiro de assado invadia suas narinas. As impressões de Renato também ainda estavam lá, bem marcadas. Ela sonhara com ele durante toda a noite e, em pensamento, pediu à Deus que, com a febre, não tivesse delatado o real motivo de seu atraso.

Ainda estava assustada e sobressaltou-se quando Breno entrou no quarto, com uma bandeja nas mãos. Ele sorriu ao vê-la desperta.

— Bom dia, Nana. Como se sente?

— Estou melhor. – E todo o ressentimento de ter mentido para seu irmão voltou com força total, ao encarar aqueles olhos tão puros e calmos. Tentando afastar este pensamento, sentou-se na cama e fez um rápido e prático coque no cabelo. Precisava saber o que havia acontecido, enquanto ardera em febre - O que aconteceu durante a noite, Breno?

— O que aconteceu durante a tarde, Triana? – ele devolveu a pergunta enquanto sentava-se ao lado da cama e servia-lhe a bandeja com um belo pedaço de pernil e legumes.

Ela espantou-se com o tom inquisidor que ele lhe aplicava. Agora estava certa de que, ao menos a Breno, nunca enganara. Mesmo assim, insistiu.

— Exatamente aquilo que contei. Por quê?

— Porque não acreditei em uma só palavra. – ele levantou da cadeira e sentou na cama, de frente para ela. – Eu te conheço como ninguém, e sei quando mente. – um suspiro, e o olhar que lançou para a irmã a fez corar - Então, vai me contar tudo?

Ela também suspirou conformada e certa de que levaria uma merecida bronca. Resignou-se em pensar que era melhor uma bronca dele, que uma surra de seu pai. Garfou um pedaço de batata e engoliu-a sem muita vontade.

— Não posso te contar tudo, e não insista – avisou. - Mas posso contar meia verdade, está bem assim? - Ele meneou a cabeça, resistente a aceitar o que ela lhe oferecia. – Breno, Otelo está planejando alguma coisa com Domitila.


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