A Redenção do Tordo escrita por IsabelaThorntonDarcyMellark


Capítulo 63
Inversão de papéis




Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/696420/chapter/63

 

Por Peeta

Um forte grito me desperta. Abro os olhos desorientado e não sei onde estou. Levo alguns segundos para me dar conta de que devo ter adormecido na poltrona do estúdio, quando me recostei após terminar meu último quadro.

Esfrego uma toalha nos meus dedos sujos de tinta.

Outro protesto é emitido, alto e cheio de medo. Um pesadelo.

Abro a porta e saio correndo. Sustento meu corpo sonolento no batente da porta, quando um novo lamento apavorado se escuta, e aperto mais forte a maçaneta.

Entro no quarto e percebo que Katniss respira com dificuldade, quando me acerco da cama. Apoio a mão em seu braço para reconfortá-la.

— Não vai acontecer nada de ruim, Katniss — sussurro. — Está tudo bem.

Ela abre os olhos, seus belos olhos prateados, que suplicam por um pouco de paz nesse tormento.

Eu me deito ao seu lado imediatamente, trazendo-a para se recostar em meu peito, mas Katniss não se deita, apenas me encara.

— Eu deveria ter imaginado que isso iria acontecer — confessa ela. — Todos que amo aparecem em meus pesadelos. Por que não a nossa filha?

Sei que os sonhos ruins em que ela perde a Willow estão piorando seu medo de adormecer. A adrenalina apenas proporciona uma reação em cadeia, que termina com a bebê mantendo-se agitada durante toda a noite.

— Katniss, os exames médicos continuam dizendo que você e a bebê estão perfeitamente bem! — lembro a ela.

Ela se afasta de mim e balança a cabeça.

— Sei disso, mas a voz desconfiada do meu subconsciente não parece se importar com o que os exames médicos informam.

Katniss solta um suspiro triste e faz menção de dizer algo, mas se detém.

Quero suavizar sua expressão e fazê-la sorrir. Quero apertar sua mão. Quero fazer mil coisas, mas apenas fico em silêncio, com meus olhos encorajando-a a continuar.

— E não é só isso — retruca ela, balançando a cabeça. — Quando a bebê nascer, eu não sei o que vou fazer.

Eu lhe ofereço um abraço tranquilizador, o qual depois percebo que se destina a nós dois.

— Você vai explicar a ela sobre seus pesadelos. Willow vai ouvir e entender — tento confortá-la. — E eu também vou explicar e aprender com vocês. Foi assim com Finn, Elliot e Maysilee. Eles sabem sobre os jogos e a rebelião, e amam e admiram seus pais.

Katniss nada diz e apenas me deixa abraçá-la. Com a mão no seu ventre, sinto a agitação da bebê.

Após um tempo, Katniss levanta a cabeça e pergunta:

— E se eu assustá-la com meus gritos de pavor?

Eu delicadamente seguro seus ombros para ver seu rosto.

— As crianças são tão incríveis, Katniss. — Engulo em seco, torcendo para estar dizendo a coisa certa. — Willow logo vai aprender como acalmar você.

— Não gostaria que ela se sentisse com essa responsabilidade. — Katniss deixa transparecer a angústia de suas palavras também em seu olhar e tenho quase certeza de que errei feio na minha intenção de tranquilizá-la. — Não quero que essa criança sofra por ser minha filha.

— Isso não vai acontecer, justamente porque você é a mãe dela. — Solto um sorriso involuntário, porque realmente acredito nisso. — Não podemos poupá-la de todo e qualquer sofrimento. Ela vai sofrer, inevitavelmente, mas por fatos que não podemos evitar. Jamais por ser sua filha.

— E ela vai ter você, Peeta.

Os olhos de Katniss brilham com uma luz diferente, um lampejo de esperança.

— Você cuidará da nossa menina do modo como cuidou de mim tantas vezes? — pergunto baixinho.

Ela confirma com a cabeça com veemência. Eu inspiro calmamente.

— Então, nossa filha não terá o que temer.

Katniss fica imóvel por um curto instante, então, num movimento suave, eu puxo-a para mim e ela enterra o rosto em meu pescoço.

— Você está melhor agora?

— Eu vou ficar — murmura ela. — Ainda estou com medo de fechar os olhos e ver todo aquele horror de novo, mas vou ficar bem.

— E ficarei aqui com você — falo com a voz embargada.

— Nos seus braços, eu me sinto como costumava me sentir todas as manhãs da minha infância, com meu pai. — Ela afrouxa um pouco o aperto e se move para ficar de frente para mim novamente. — Fico feliz por saber que nossa filha vai se sentir como eu.

Por coincidência ou não, nossa filha se aquieta em sua barriga.

E, finalmente, tenho mais certeza de que vamos viver um dia de cada vez, dando suporte um ao outro, e a Willow será uma parte importante em nossa rede de apoio mútuo.

— Agora descanse — aconselho. — Amanhã será um dia bastante movimentado.

¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸

E põe movimentado nisso! Logo cedo, recebi várias equipes para prepararem a nós e a nossa casa para alguns clipes de divulgação da entrevista, que acontecerá amanhã no hotel do Distrito 12.

Cenografia, filmagem, roteiristas, figurino e, como não poderia faltar, a equipe de preparação.

Fiz milhares de recomendações a Flavius, Venia e Octavia sobre os cuidados com Katniss, para que esteja bem alimentada, hidratada e com o mínimo possível de desconforto.

Fui tão insistente a respeito que, de tempos em tempos, Fulvia vinha até o estúdio, onde estou me arrumando, com uma lista de providências tomadas para o bem-estar dela. No entanto, só fiquei realmente tranquilo quando veio a mim a notícia de que a Sra. Everdeen havia retornado do hospital e ficaria com Katniss durante a preparação.

Nesse instante, estou pronto, vestido com uma camisa azul, um terno cinza escuro e calças no mesmo tom. O visual poderia parecer formal, mas os primeiros botões da camisa estão abertos, o que dá um ar casual. Quando chego ao primeiro piso, já está instalada em nossa sala toda a parafernália para a captura de nossas imagens em fotos e vídeos.

As cores da minha roupa contrastam de modo agradável com os tons do painel de fundo, instalado na sala de estar.

Haymitch faz uma aparição para checar se está tudo certo e junta-se a Gale para se servir do farto bufê disposto na mesa de jantar, oferecido para todos os que estão trabalhando.

Apesar de não fazer parte oficialmente da equipe de produção, Effie está envolvida, dando dicas e ordens, inclusive aos filhos, que também vieram assistir às filmagens. Elliot está diante da mãe com os braços estendidos, enquanto Effie empilha alguns montes de fios sobre eles, indicando onde devem ser colocados.

— Mãe, você costumava ser chata e mandona. Agora você é o contrário — afirma candidamente Elliot, após ouvir mais um dos mandos e desmandos de Effie, porém sua expressão irônica denuncia sua vontade de irritar a mãe, em vez de adulá-la. Apenas Effie não percebe.

— Ah! Que bom, meu filho! — comemora Effie, certamente pensando que é um elogio.

— Diz pra mamãe o que ela é agora... exatamente? — Maysilee o instiga.

— Exatamente o contrário de chata e mandona... É mandona e chata.

Effie fica boquiaberta, com a indignação dos acusados injustamente.

— Ora, você me respeite, Elliot! Está vendo, Peeta, o que espera por vo... — A exasperação de Effie é interrompida pela movimentação no alto da escada.

Katniss surge, em um vestido amarelo-claro, quase branco, que destaca sua pele. Um tecido diáfano desce abaixo do busto bem marcado e cobre com leveza sua barriga volumosa. Seus cabelos trançados formam uma espécie de aro ao redor de sua cabeça, tornando-a semelhante a um anjo. É uma visão inebriante.

Ela está serena, observando tudo ao redor sem se deter em nada em particular, apenas cumprimentando as pessoas, que aumentaram de número desde que subimos para a preparação.

Nenhum dos presentes — eu inclusive — consegue apartar o olhar de admiração na direção dela.

Katniss se posiciona ao meu lado e entrelaçamos nossos dedos.

— Você está bem? Está com fome? Com sede? — disparo a fazer perguntas e, quando Katniss sorri para indicar que está tudo sob controle, eu não me aguento: — Você está absolutamente linda.

Ela une nossas testas por alguns segundos. Suspiros da parte superior da escada me fazem olhar para cima. Octavia e Venia estão à beira das lágrimas, abanando uma à outra.

Haymitch revira os olhos, enquanto mastiga um pedaço de torta.

Cressida, que afasta a câmera de seu rosto após conseguir captar algumas imagens desse nosso momento, aproxima-se para nos explicar que faremos algumas fotos e uma chamada ao vivo num programa de TV. Felizmente, não responderemos a perguntas nessa tomada de vídeo. Será apenas o anúncio da entrevista de amanhã.

— Vocês só precisam cumprimentar os apresentadores e o público e, depois, convidar a todos para assistirem ao programa do Caesar dessa semana. Porém, antes, será a sessão de fotos que farão parte de alguns clipes para as propagandas.

— O que exatamente vocês precisam que eu faça? — pergunta Katniss, dirigindo-se à marcação que fizeram para nós dois perto do painel.

— Pode se virar um pouco, para mostrar melhor sua silhueta? — solicita Cressida.

— Tudo bem. — Katniss se posiciona ao meu lado.

— Isso mesmo. Olhem um para o outro. Ótimo! — Cressida elogia. — Agora, diretamente para a câmera. Sorriam!

Nesse momento, preciso estreitar os olhos diante dos focos de luz. Independentemente da direção para a qual me vire, a iluminação incomoda.

Com Katniss, não é diferente, e ela fica ainda mais desconfortável, sendo quase impossível que sorria espontaneamente.

Gale chega ao lado de Cressida. No mesmo instante, Haymitch se aproxima também. Eles devem ter a intenção de ajudar, pois conhecem bem a dificuldade de Katniss diante das câmeras.

— Catnip, faça de conta que está na floresta — graceja Gale.

— Isso mesmo, lindinha! Finja que o Gale é um esquilo e que você precisa acertá-lo com uma flecha.

Ela aperta os lábios, tentando permanecer séria. No entanto, a sugestão deles é ridícula demais.

Assim, é inevitável. Todos começamos a rir e Cressida consegue que a maioria dos cliques seja feita com toda a naturalidade.

Essa é uma das coisas boas em relação a essa entrevista ser aqui na cidade. Ter por perto nossa gente, como diz Plutarch.

Tudo está fluindo bem e Cressida pretende fazer chamadas fora do roteiro com Katniss e comigo, em partes neutras de nossa casa.

— Se vocês dois estiverem dispostos, farei mais algumas fotos — diz Cressida, olhando bem para Katniss. — Ou preferem fazer uma pausa?

— Podemos continuar — concorda ela. — Estou bem.

Katniss parece menos sem jeito, enquanto posa sozinha para outras fotos e vídeos, após a equipe de preparação retocar sua maquiagem.

No entanto, Plutarch surge com outros planos em mente, comunicando que precisa da equipe de filmagem em outro local:

— Decidi que a entrada dos dois ao vivo será da fachada da casa. Aquela pintura colorida e o canteiro de prímulas são o fundo perfeito, muito melhores que esse painel. Então, Pollux e Cressida, preciso de imagens de diversos ângulos para definir o melhor deles.

Após a interrupção, a equipe de filmagem atende às ordens de Plutarch e somos encaminhados a um assento na mesa onde ele se debruça sobre um roteiro.

Fulvia traz frutas e um suco para Katniss.

— A equipe de cenografia aproveitou que a filmagem não será nos atuais estúdios do programa e preparou um cenário idêntico ao das antigas entrevistas de vocês. Vai remeter a todos ao início de tudo.

Meneio a cabeça sem muito entusiasmo, imaginando que é óbvio que reproduzir o velho cenário trará algumas memórias tristes. 

Logo depois, um dos integrantes da equipe traz para a mesa uma tela portátil, na qual exibe os clipes editados com as fotos e vídeos que acabamos de protagonizar para a aprovação de Plutarch.

Em seguida, ele se detém algum tempo conosco, explicando como será a nossa entrada no palco amanhã. Plutarch se empolga ao ser informado por Cressida dos números da audiência após o anúncio da nossa participação ao vivo na programação de hoje, que será mesclada com esses e outros vídeos de alguns momentos marcantes da nossa trajetória.

— Perfeito. Realmente perfeito! — exclama Plutarch, com satisfação. — Cressida, vamos lançar a primeira rodada dos quadros agora. Peeta e Katniss, vocês estão maravilhosos!

— É muito emocionante de assistir, pra falar a verdade — diz Cressida. — Mesmo para quem está produzindo o material, é bastante impactante vê-la grávida, Katniss.

— Eu já disse a ela que é como estar diante da personificação da esperança — revelo e Katniss enrubesce.

— Essa frase é como um slogan — vibra Plutarch. — Como sempre afirmei sobre o que vocês fazem aqui no Distrito 12, tudo vem direto do coração.

Pollux mostra a ele imagens da área externa e Plutarch elege a melhor perspectiva para a filmagem.

É chegada a hora da chamada ao vivo. Será durante um programa de auditório, comandado por um apresentador metido a engraçado, que não costumo acompanhar, justamente por suas piadas impróprias e insensíveis, fazendo questão de deixar seus convidados constrangidos. No entanto, o programa faz sucesso e tem um público cativo, inclusive no Distrito 12.

Felizmente, não seremos entrevistados por ele.

Vamos até a parte frontal de nossa casa e somos direcionados a um ponto onde ficam visíveis as prímulas em flor sob nossas janelas.


Vários moradores das redondezas acompanham a transmissão atrás das câmeras e, quando se escuta o pedido de silêncio, o ponto de luz vermelho se acende.

Isso indica que estamos prestes a entrar no ar. Katniss segura minha mão e a canção que nos anuncia começa. Ela aperta meus dedos. Abro um sorriso e, com um braço, atraio Katniss para mais junto de mim, pousando uma das minhas mãos em sua cintura e a outra, sobre seu ventre.

Entre olhares cúmplices e sorrisos desenhados, seu corpo estremece entre minhas mãos, depois de mostrarem na tela algumas imagens dos nossos Jogos e de nós dois, como os eternos amantes desafortunados.

Os últimos acordes da música soam em um volume cada vez mais baixo e, ao sinal de Plutarch, as palavras de Katniss fluem ao fim.

— Boa tarde aos apresentadores, boa tarde ao público e a todos de Panem!

Ela olha pra mim e essa é a minha deixa:

— Vocês presenciaram alguns dos momentos que marcaram nossa trajetória e não poderia ser diferente agora, com relação à gravidez da Katniss.

Katniss me abraça de lado e se apoia em meu peito, deslizando a outra mão em sua barriga evidente. A câmera se move para focalizar o movimento dela e, depois, volta a se focar em nossos rostos.

— Por isso, convidamos vocês para a entrevista que faremos amanhã, no programa do Caesar Flickerman — convoca Katniss.

— Nós vamos revelar alguns detalhes desse momento transformador em nossas vidas e também se é um menino ou uma menina — anuncio.

— E o nome que já escolhemos! — frisa Katniss, antes que eu me esqueça desse importante pormenor, para a frustração de Plutarch, pois ele ainda nutria esperanças de fazer uma enquete a respeito.

— Isso mesmo! Até amanhã! — despeço-me sorridente, enquanto Katniss acena.

As palmas de entusiasmo provenientes do auditório do programa se escutam pelo mesmo monitor em que estávamos aparecendo.

Eu não perco essa entrevista por nada! — O rosto do apresentador surge na tela, piscando os olhos brilhantes, como se para evitar as lágrimas de emoção. — Raciocinem comigo... Dois vitoriosos, que já passaram por diversos experimentos, inclusive científicos. — Suas últimas frases deixam a todos em expectativa e a atenção geral já está presa no que ele ainda tem a dizer. Então, sua face vai se deformando numa careta de pavor, com trejeitos exagerados que culminam com a seguinte conclusão: — Por isso, quero saber tudo sobre essa gravidez! Afinal, o que nos garante que essa criança não é uma bestante?

Meu mundo paralisa de repente.

Bestante? A menção é à minha filha!

Bastaria a pronúncia dessa última palavra para me abalar. No entanto, além da referência absurda, a hostilidade na voz do cretino faz minha vista escurecer.

Tudo ao meu redor perde um pouco a nitidez, mas a voz odiosa ainda reverbera:

Vocês não concordam, pessoal? Eles tiveram tempo de sobra pra criar um ser indestrutível em laboratório. Por mais que seja um bebê fofinho, não vai deixar de ser um bestante — ele repete essa ideia horrenda, imitando garras com as mãos. 

Katniss abre a boca em choque, sem nenhuma cor em seu rosto. Seus olhos se enchem de lágrimas e sinto-a cambalear ligeiramente. Tento ampará-la, porém tudo à minha volta fica cada vez mais distorcido.

Como alguém pode estabelecer alguma relação entre a minha menina e um bestante?

— Isso foi cruel! — pontua Cressida, depois de pressionar o botão do controle remoto para desconectar a transmissão.

— Espere! Nós não temos direito de resposta? — As palavras passam com dificuldade por minha garganta, apesar da vontade de berrar.

Eu insistiria, porém as pontadas do veneno das teleguiadas em minha cabeça começam a me desorientar. Pressiono os dedos em minhas têmporas doloridas. Fico sem ar.

No entanto, sei que não estou tendo uma crise como as outras. É apenas uma reação à brutalidade das palavras supostamente divertidas daquele apresentador.

Afinal, estou consciente demais de que Katniss precisa ser protegida, e não atacada.

De qualquer forma, não consigo mais distinguir com precisão os sons à minha volta. Tenho a impressão de ouvir alguém pedir uma cadeira para Katniss. Capturo as frases de aprovação de Plutarch pelo sucesso de nosso desempenho ao vivo e um burburinho de vozes indignadas com a péssima piada proveniente daquele pseudoartista.

Ainda sem saber que não sou uma ameaça para Katniss, Haymitch sabiamente me segura pelos ombros para me levar para dentro de casa.

Resisto um pouco à pressão que Haymitch faz para me deslocar dali.

— Katniss — chamo e estendo-lhe minha mão, para me certificar de que ela está bem.

Mesmo com a minha visão ofuscada, percebo que a Sra. Everdeen e Gale auxiliam Katniss para que ela se sente. As molas da cadeira rangem quando ela tenta se levantar para alcançar a minha mão, mas ambos insistem para que Katniss não se erga. Apenas posso acompanhá-la com o olhar, enquanto Haymitch me carrega para longe.

A voz de Plutarch sobe alguns tons para sobressair em meio ao falatório, que continua cada vez mais alto. Ele parabeniza a equipe e tenta amenizar o ocorrido, classificando como um simples disparate sem importância.

Haymitch me guia até a entrada da casa para me afastar de tudo o que está acontecendo aqui fora.

Ele atravessa a porta comigo e nem sequer a fecha atrás de si. Tento escapar dele.

— Preciso ficar ao lado de Katniss.

— Você sabe o motivo de eu trazê-lo aqui, garoto. — Ele sopra pelo lábio inferior alguns fios de cabelo caídos em seus olhos.

— Agradeço a preocupação, mas estou lúcido, Haymitch.

— Não sei se isso é bom ou ruim.

Minhas pupilas devem estar escuras e dilatadas. Por isso, ele continua impedindo minha passagem. Dou meia volta e seguro com força a borda de uma cadeira. A respiração ainda é difícil e pesada.

— Isso não pode ficar assim! — vocifera Haymitch. — Mas Plutarch já está colocando panos quentes sobre essa atitude irresponsável.

Eu me esforço para manter a calma e imagino que Katniss esteja como eu, ou mesmo pior. Sei o quanto isso custa a ela. Katniss é emocional demais e qualquer sacrifício para mascarar seus sentimentos não é uma coisa boa, especialmente em seu estado.

Effie chega em seguida, com um copo d'água para mim.

— Veja como está a Katniss, Effie, por favor — solicito.

— Era o que eu ia fazer, meu querido. — Ela ergue o outro copo que está segurando, sorrindo comedidamente, e sai, cerrando a porta e abafando o som externo.

Na verdade, quem precisa de um copo d'água para se acalmar é Haymitch, que anda de um lado a outro, extravasando sua cólera e esbravejando sobre exigir de Plutarch um pedido de retratação imediato.

Eu me sento no sofá, cabisbaixo, com os cotovelos sobre os joelhos e o rosto escondido em minhas mãos.

Não me movo por uns bons minutos até ouvir o estalo da maçaneta e o som exterior invadindo o ambiente.

Ergo a cabeça para constatar que Katniss cruza o umbral da entrada. Eu me levanto imeditamente e minhas pernas bambeiam. Então, quando a porta é novamente fechada, ela se vira pra mim e o mundo silencia.

Solto o fôlego represado e meus ombros despencam ao ver sua expressão alarmada e entristecida. Ela se apoia na parede e leva a mão livre à sua barriga.

— Katniss! — Corro até ela e a envolvo com meus braços, sustentando seu peso, quando ela deita a cabeça em meu ombro. — Você sempre falava nessa crueldade, nessa impiedade, e eu minimizava. Hoje eu senti duramente o golpe... O que estamos fazendo com essa criança? Por que eu não lhe dei ouvidos?

Seu corpo todo treme enquanto pronuncio as palavras. Ela segura meu rosto e busca fixar seu olhar no meu de modo aflito.

— Não diga isso, Peeta — murmura ela.

— Você tinha razão — reconheço, com as palavras saindo da minha boca com dificuldade. — Tinha razão o tempo todo.

— Não, por favor, não quero que você agora pense que eu estava certa em evitar filhos por isso — implora Katniss. — Nós temos é que mostrar que ele ou quem quer que compartilhe dessa opinião estão errados.

Quero concordar com ela e certificá-la de que é isso o que vamos fazer, mas mal consigo manter a cabeça erguida para olhar em seus olhos.

Em vez disso, choro, porém não pelo desgosto ou pela humilhação da situação ocorrida, mas porque o momento mais incrível de toda a minha vida — o nascimento da minha filha — agora me amedronta e me faz ter dúvidas.

Katniss coloca as mãos nas minhas bochechas e enxuga minhas lágrimas com as pontas dos polegares. Pressionando a testa na minha, ela sussurra:

— Eu entendo e respeito a sua angústia e suas lágrimas, mas sempre vou priorizar sua calma e o seu sorriso. Nós vamos corrigir isso.


— Não dá pra ficar calmo ou sorrir agora. — Minha voz é baixa, em contraposição aos meus punhos, que se fecham. Estreito minhas pálpebras, expulsando as lágrimas restantes dos meus olhos. — Agora que sei que você está bem, eu vou lá fora. Preciso fazer alguma coisa e...

Eu silencio quando Katniss segura meus pulsos, antes que eu me desvencilhe dela para ir até Plutarch.

— Não, Peeta. Você vai ficar comigo — Ela descansa meus punhos ainda cerrados em seu peito e sinto seus batimentos acelerados. 

Ela não é indiferente. Está apenas refreando sua impetuosidade e a minha, por um motivo maior. Nossa menina.

Essa fúria que estamos sentindo é muito útil para inflamar um povo numa revolução, porém, quando o assunto é a nossa filha, o melhor jeito de transmitir indignação é deixando a raiva de lado e procurando formas mais eficientes de comunicação. 

Katniss ergue meu queixo e pede licença a todos, levando-me pela mão até as escadas.

— Isso mesmo, docinho. Ajuda o garoto a se acalmar, que vou tentar me tranquilizar por aqui — comenta Haymitch, entretanto logo volta a reclamar: — Não tem cabimento que alguém fale algo assim sobre uma criança!

Nós nos entreolhamos com pesar e, por fim, Katniss me conduz até o meu estúdio. Chegando lá, ela não acende as luzes de imediato e permanecemos na penumbra da transição da luz do dia para a sombra do anoitecer.

É um grande contraste em comparação ao excesso de iluminação a que estivemos expostos anteriormente, tornando o ambiente muito mais acolhedor.

— Como está se sentindo? — questiona ela.

— Estou bem, posso garantir. Eu é que deveria perguntar como você está e se precisa de algo.

Eu a guio até a poltrona, onde ela se senta, e me agacho à sua frente. Acaricio sua face antes que ela me responda.

— Todos cuidaram muito bem de mim — afirma Katniss. — Agora estou aqui para cuidar de você. O que gostaria de fazer?

— Ir lá embaixo e cancelar tudo. Essa entrevista, qualquer pronunciamento para a imprensa, tudo!

Um sorriso nostálgico puxa seus lábios para cima e chego a cogitar que ela concorda comigo. Ledo engano.

— Conheço uma pessoa, que me ensina e demonstra todos os dias que um único gesto ou uma palavra pode fazer alguém simplesmente mudar de ideia. Ou pode fazer mais. Pode mudar uma vida — admite. — Não vou permitir que uma pergunta absurda, feita por alguém que sequer nos conhece, impeça você de mostrar em rede nacional todo o seu amor por nossa filha, tudo o que ela realmente é.

— Essa entrevista agora vai ser um suplício, Katniss. — Ergo meu corpo, virando-me em direção à porta. 

Não demora muito, seus dedos tateiam meus ombros e giram meu tronco para novamente estar de frente para ela.

— Vamos enxergar como uma chance, não como um suplício. Será uma oportunidade de provar que a Willow é apenas uma criança, muito amada, que nos faz tirar forças de onde nem sabemos que temos, e de deixar claro que enfrentaremos tudo... Tudo por ela.

— Eu enfrento tudo mesmo por ela, por você. Mas continuar com todo esse circo de horrores seria mesmo bom pra nossa filha?

— Em nossa condição de pessoas públicas, existe o que nós realmente vivenciamos e existe o que é divulgado. Então, essa é mesmo a oportunidade de contar algumas coisas, a partir da nossa perspectiva.

Assim, Katniss põe em prática a teoria que ela confidenciou que eu lhe ensinei. Nesse breve discurso, ela me convence de que é mesmo melhor para a Willow que eu não me cale.

— Isso é até engraçado, Katniss... Ontem, era eu quem estava dizendo palavras de incentivo pra você.

— Preparado pra descer e anunciar que os planos estão de pé?

— Eu preciso de alguns minutos ainda. A dor de cabeça não se foi completamente.

Katniss não comenta nada. Simplesmente, vai até minha estante.

— Vou acender o abajur — avisa, sem outras explicações, e eu protejo os olhos, já acostumados com a pouca claridade.

Depois, ela separa alguns pincéis e uma paleta de tintas e os deposita na pequena mesa ao lado do meu cavalete.

— Você quer que eu pinte?

— Sim. Quero que desenhe.

Eu me sinto mais animado no mesmo instante. Lanço ao chão os lençois que cobrem meu cavalete e estendo a mão para pegar o rolo de tecido para minha nova arte, porém Katniss segura meu braço para me deter. Eu a encaro, sem entender, fazendo contato visual.

— Não. Quero que desenhe em mim — propõe. — Eu serei sua tela.

Continuo olhando-a nos olhos, enquanto ela descalça suas sapatilhas e vira-se de costas, num pedido implícito para ajudá-la a se despir do vestido. Assim que o retira, ela guarda a peça delicada numa prateleira, distante de qualquer tinta. Em seguida, retorna até onde estou.

Eu também tiro meu terno e o jogo sobre uma cadeira. Arregaço as mangas da camisa e alcanço o pincel e as tintas. Minha cabeça pende para o lado enquanto observo minha tela: sua pele oliva.

— Quero que comece aqui — pede, indicando sua barriga. — Faça um desenho pensando na Willow, na nossa filha, que você sabe que não é uma b...

Beijo o canto de sua boca, impedindo que ela repita a terrível palavra, e suas mãos invadem meus cabelos, prolongando essa aceitação latente de que nenhum de nós jamais reproduza tal perversidade em relação à nossa menina.

Quando nos separamos, mergulho um dos pincéis numa das colorações e Katniss confirma sem palavras, apenas balançando a cabeça afirmativamente.

A ponta do pincel sujo de tinta toca seu baixo ventre primeiro. Ela estremece ligeiramente. Meu traçado inicial é preciso, cuidadoso.

Katniss fecha os olhos, enquanto desenho um pequeno broto despontando de uma semente envolta em uma gota d'água e terra.

Ela se esforça para não olhar pra baixo, enquanto a obra ainda está inacabada. Em razão da minha preocupação em não deixá-la por muito tempo de pé, seria apenas isso. Então, eu afasto o pincel, dando alguns passos para trás.

— Você pensa que já terminou? Não mesmo! — Katniss abre os braços, esperando que as cores avancem por eles também.

Então, meu universo explode. Como num crescendo de uma sinfonia, agora meus traços são ligeiros e mais coloridos.

Das tintas irrompe uma bela árvore, cujos galhos e copa sobem pelo seu colo, arruinando a roupa íntima que ainda cobre seus seios.

As cerdas fazem cócegas em seu pescoço, braços, mãos e, por fim, nas suas costas, em forma de folhas, flores, ninhos, pássaros e raios de sol. 

Como minha filha é para mim: cor, vida, calor e abrigo, numa profusão de tonalidades. As gotas multicores escorrem pelas pernas e pés de Katniss, mesclando-se no chão.

— Pronto — sussurro e a levo até a janela. Puxo um pouco a cortina, pois o vidro atrás dela é o que mais se parece com um espelho aqui no meu estúdio.

Ela admira seu reflexo, ficando na ponta dos pés para melhorar seu ângulo de visão.

— É maravilhoso! — Katniss se observa por um bom tempo. Eu me sento numa grande almofada no chão para admirá-la. Por fim, ela se vira para mim. — Obrigada.

— Eu que devo agradecer. Gostou?

— Amei! — Katniss se põe de pé à minha frente. — Mas o que amei mesmo foi ver a transformação no seu semblante... Seu rosto estava todo franzido de preocupação. Agora está como sempre. Tão forte e bonito, tão firme e, ao mesmo tempo, tão tranquilo. O único problema é que ainda está muito limpinho — completa ela, com um sorriso travesso.

— Presumo que não por muito tempo.

Assim, eu me ajoelho e, com a testa, toco sua barriga e a tinta na pele dela cria uma imagem espelhada na minha face. Em seguida, fecho os olhos e digo:

— Obrigado por tudo, meu amor. E obrigado por tanto, filha. Acho que nunca vou saber como retribuir a vocês duas.

— Você já sabe, Peeta.

Katniss acaricia meus cabelos e aperto minha bochecha contra o seu corpo, enlaçando seu quadril.

Mais uma vez, a tinta se transfere para o meu rosto, criando impressões disformes, salpicando minhas roupas.

Então, ela se afasta e pega alguns potes de tinta. Em seguida, cuidadosamente se senta à minha frente.

Katniss abre os botões da minha camisa, deixando-a de lado, e suja as pontas dos dedos nas colorações para arriscar um desenho em meu peito. Eu também abandono os pincéis e iniciamos essa dança policromática, pele com pele.

A atmosfera não está mais carregada. Está leve como o toque de seus dedos em meu rosto.


Beijo seu pescoço e prossigo no percurso até seu queixo com pinceladas suaves, agora dos meus lábios, até encontrar os dela. Uma das mãos dela escorrega pelas minhas costas e a outra acaricia minha nuca.

Quando nos damos conta, estamos deitados sobre os lençóis anteriormente atirados ao solo, lambuzando tudo com os matizes misturados em nossos corpos.

— Imagina quando a Willow estiver aqui com a gente nessa bagunça — digo contra sua boca.

— Ela já está bagunçando aqui dentro.

Espalmo minhas mãos sobre sua barriga e constato o que ela acabou de confidenciar.

A lâmpada do corredor começa a piscar e a luz se firma, entrando no estúdio como um feixe luminoso pelas frestas da porta.

Num impulso, cubro Katniss rapidamente com meu terno e sua pele repleta de desenhos logo tinge a peça de roupa vinda da Capital.

Apenas depois do estrago feito, ela se dá conta e abafa uma risada. Nossos últimos instantes também estão mantendo o bom-humor dela em alta.

Algumas passadas cautelosas e incertas fazem ranger o piso de madeira e logo se escutam as batidas na madeira, características de Haymitch. E é a figura dele que surge na porta agora entreaberta.

— Vim checar se estão bem e, vendo vocês assim nesse estado... — Ele sacode o indicador em nossa direção. — Sinceramente, não sei qual a resposta.

— Estamos bem — Eu o tranquilizo.

— Há um monte de gente lá embaixo esperando notícias de vocês. Pessoas de todas as partes do Distrito viram o que foi ao ar e vieram dar apoio. Delly, Thom, Greasy Sae, Blaine, Violet, Timothy — enumera ele. — E outras tantas vieram prestar solidariedade. Estão protestando com a equipe de TV, exigindo de Plutarch uma retratação do apresentador, mas ele está tentando fazer parecer que foi tudo combinado e que vocês não se ofenderam.

— Embora não seja verdade, é a melhor solução. Diga a eles que não gostaríamos de dar audiência para esse tipo de coisa — pede Katniss.

— Eu gostaria de ver aquele desgraçado pedir desculpas, mas é melhor mesmo deixá-lo recolhido em sua insignificância — concorda ele.

— A nossa resposta será dada amanhã na entrevista — garanto.

— Eu não esperaria menos de vocês — afirma Haymitch, apoiando a mão na maçaneta, já em sinal de despedida. — Sem mais fotos ou filmagens por hoje, pelo visto? 

— Nem pensar! — retruca Katniss.

— É uma pena, porque essa cena aqui merecia um registro para a posteridade.

Depois que Haymitch nos deixa a sós, eu e Katniss saímos do estúdio cautelosamemte, pé ante pé, para não fazer alarde no caminho até nosso quarto.

Já em nosso banheiro, Katniss está sob a água da ducha, enquanto eu me olho no espelho. Passo o dedo pela pintura em meu torso e sorrio.

A área do chuveiro já está cheia de vapor quando entro. Ajudo Katniss a limpar as costas ainda impregnadas com tinta, que só sai com algum esforço.

A água quente cai sobre nós e os pigmentos escorrem pelo meu corpo até o piso, espalhando-se para todos os lugares.

Willow já colore toda parte.

Esse pensamento me faz parar subitamente de lavar as escápulas de Katniss para colar meu corpo ao dela e acariciar seu ventre de modo delicado, justamente o oposto dos movimentos firmes que estava fazendo para livrar sua pele dos vestígios da pintura.

— O que foi? — questiona, notando a mudança repentina na forma de tocá-la.

— Preciso me desculpar com vocês, por ter duvidado de que formar nossa família foi uma das decisões mais acertadas da minha vida.

— Estou notando uma inversão de papéis aqui... Só que estou em clara desvantagem. Foram anos e anos ouvindo seus argumentos. E eu tenho apenas mais alguns meses para fazer desaparecer suas dúvidas.

— Hoje algumas coisas saíram do roteiro mesmo, mas pode ficar tranquila. Você não precisa de anos ou de meses. Bastou um fim de tarde, algumas sábias palavras suas e um pouco de tinta.

Novamente em silêncio, consinto que, da mesma maneira efêmera com que minhas incertezas surgiram, elas fugazmente desvaneceram.

No entanto, eu gostaria que minhas preocupações tivessem também desaparecido pelo ralo como as cores das tintas, contudo elas ainda estão aqui, manchando minha consciência.

¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸

Desperto num sobressalto, mas torno a fechar os olhos imediatamente. Ainda há muito zumbido dentro da minha cabeça. Algo como aquele ruído insuportavelmente agudo que é produzido quando um microfone ligado fica muito próximo dos alto-falantes. Meu cérebro parece latejar.

No entanto, são as imagens rondando minha mente que me deixam paralisado de terror.

Aquele apresentador detestável comandava uma horda de pessoas encapuzadas, empunhando tochas acesas, as quais carregavam Katniss e Willow para longe, chamando-as aos gritos de bestantes. E levavam junto o meu coração e minha paz...

Foi apenas um pesadelo, porém a sensação ruim de impotência, raiva e medo somente me abandona quando ouço o som suave da voz de Katniss:

— Peeta... Estou aqui. Eu e a Willow estamos bem aqui.

Ela sabe exatamente o que aconteceu, pois é a única pessoa que consegue entender minhas noites ruins e a causa delas.

— Meus pesadelos continuam sendo sobre perder você, mas o de hoje foi também sobre perder a Willow — desabafo.

Viro o rosto para o outro lado, mas não a tempo de esconder os olhos úmidos. Prendo a respiração por um momento e depois a solto em um longo suspiro, numa tentativa de me manter sob controle.

Katniss agarra minha mão e a mantém apertada contra sua bochecha.

Ela nada diz, enquanto sustenta minha mão, suavemente acariciando sua face em minha palma. Uma serenidade toma conta de mim. Uma tranquilidade imensa me invade, quando ela me encaixa entre seus braços, sua respiração leve infiltrando através dos meus cabelos.

Eu a envolvo com meus braços também, acolhendo esse novo sentimento de sossego, e ficamos assim colados, até eu bocejar.

Katniss inclina a cabeça para me observar.

— Hoje quem teve os piores pesadelos foi você. É a minha vez de fazê-lo voltar a dormir.

Ela me ajuda a me aconchegar no travesseiro e, não demora muito, adormeço, ouvindo seu cantarolar contínuo e agradável e sentindo o movimento delicado de seus dedos em minha testa. 

¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸¸.•*'¨'*•.¸

Eu sou acordado mais tarde por Katniss me sacudindo afetuosamente. Olho para seu rosto já sem resquícios de sono e ela sorri para mim.

Eu aceno e sento-me, esticando os braços.

— O café da manhã está pronto — avisa ela.

— Os papéis estão mesmo invertidos.

— Engano seu. Refleti melhor a respeito e concluí que está tudo como deve ser. Você é meu apoio, quando eu preciso... E eu sempre preciso. E, de vez em quando — Katniss estica os sons das palavras nessa última frase —, eu sou o seu apoio, nas raras situações em que você precisa.

— Eu sempre preciso. Eu preciso de você.

— Essa fala é minha! — Katniss brinca.

— Viu como estamos seguindo o roteiro errado?

— Espere até ver o café da manhã que preparei pra você e me diga se há algum furo nesse roteiro.

— Essa vai ser a maior reviravolta de todas nesse enredo! — Finjo espanto. — Café da manhã? Pra mim? Preparado por você?

— Eu devia ficar brava com essa insinuação de que não cozinho bem, mas é bom poder surpreender você... Às vezes.

— Só pra registrar — digo antes que ela se vá. — Você sempre me surpreende.

— Vem logo. Você tem que estar bem alimentado para a entrevista daqui a pouco. 

Ergo uma sobrancelha para ela, um tanto desanimado.

— Nós precisamos fazer isso. Por nossa filha. 

Finalmente, absorvo todo esse vigor que ela emana desde sempre, quando o intuito é preservar nossa pequena. 

— Você tem razão. Está na hora de nossa bebê ser corretamente apresentada aos nossos amigos do Distrito 12... E a toda Panem!

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Oi, pessoal!

Juro que tentei incluir a entrevista nesse capítulo, mas essa que vos escreve não conseguiu abreviar as emoções desses papéis invertidos (nem tão invertidos assim)!

Até o próximo, que espero que seja em breve, mas não posso garantir...

Beijos,

Isabela



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Redenção do Tordo" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.