A Redenção do Tordo escrita por IsabelaThorntonDarcyMellark


Capítulo 6
06. Decidindo voltar




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Por Peeta

Ainda não estou certo sobre qual rumo tomar em minha vida. O que Annie me falou há dois dias sobre voltar ao Distrito 12 era uma ideia que eu já havia afastado, mas que recomeçou a tomar forma em meus planos para o futuro.

A verdade é que não me contento em saber que Katniss foi absolvida e voltou para o nosso Distrito de origem ao lado de Haymitch. Por algum motivo, que ainda não sei definir qual é, quero e preciso estar próximo a ela.

A manhã de hoje foi especialmente encorajadora para me convencer no sentido de que devo retornar ao Distrito onde nasci. A Dra. Ceres conseguiu permissão para que eu utilizasse as dependências da cozinha do hospital para preparar um café da manhã especial, com a presença confirmada de Annie, Johanna, Max e — para minha surpresa quando me deram a notícia —, Effie Trinket.

Cheguei timidamente ao refeitório e fui muito bem recebido pelos funcionários. Apesar disso, ainda me sentia como um intruso e acho que nem todos estavam à vontade com a minha presença também, pois surpreendi alguns deles me observando curiosos. Essa é uma das dificuldades de ser uma figura conhecida. Todos sabem — ou acham que sabem — qual é a minha história e pensam que têm motivos para me adorar, odiar ou sentir pena de mim. Tudo depende do ponto de vista de cada um.

No entanto, as pessoas foram gentis o suficiente para preparar para mim uma bancada com os ingredientes e utensílios que precisaria para aprontar tudo.

Visto-me com o avental e a touca que me ofereceram e, apesar do desconforto inicial, basta começar o processo para fazer os pães que a minha inquietação se dissipa.

Enquanto sovo e enrolo a massa, desligo-me um pouco da realidade à minha volta, encoberta pela névoa das lembranças que me remetem ao Distrito 12.

Sou capaz de ouvir as risadas dos meus irmãos, as broncas da minha mãe e, especialmente, a voz mansa do meu pai, transmitindo pacientemente todos os seus ensinamentos para que os pães ficassem perfeito. Os tipos de ingredientes, o tempo de sova e de fermentação da massa, a umidade necessária ao local onde a massa crescerá, a temperatura do forno e, principalmente, o carinho de quem prepara o alimento. Este último item, para meu pai, era o grande segredo da receita e sou testemunha de que ele estava certo.

Enquanto a massa do pão descansa, aproveito para fazer alguns biscoitos, já que tenho tempo e materiais disponíveis. Ao colocar tudo no forno, o maravilhoso cheiro dos assados invade minhas narinas e a vontade de reviver algumas daquelas recordações me toma de assalto.

O que antes era uma dúvida passa, então, a ser uma decisão: voltar ao Distrito 12 e reabrir a padaria. Com sorte, reaproximar-me de Katniss e — quem sabe? — formar uma família e, mais tarde, ser eu a transmitir aos meus filhos o que meu pai me ensinou.

Meus pensamentos voam longe até que volto a ter os pés no chão. Estou sonhando alto demais. Com a minha mente atormentada, se eu me reaproximar de Katniss como um amigo, já será um grande passo.

Em momentos calmos assim, eu me permito imaginar que ainda a amo. No entanto, logo volto a lutar contra esse pensamento, pois não sei se é mesmo amor o que me impulsiona a querer estar perto de Katniss. De qualquer modo, acho que só terei essa certeza estando frente a frente com ela.

Retornando à realidade, quando tudo está pronto, distribuo alguns biscoitos para a equipe da cozinha, agradecendo a acolhida, e levo as iguarias para os meus convidados.

Avisto Effie de longe. Ela usa roupas um pouco mais discretas, apesar de ainda serem bem extravagantes, se comparadas às das outras pessoas à mesa, mas o fato de estar sem peruca é o que mais me impressiona em seu novo visual. Os cabelos lisos e claros emolduram seu rosto melhor do que qualquer daqueles adereços de gosto duvidoso.

Deposito a bandeja sobre a mesa e lhe dou um forte abraço.

— Peeta, meu vitorioso favorito! — Effie exclama ao me ver.

— É sério isso? Achei que o seu preferido fosse o Haymitch! — Johanna a provoca.

— Querida Johanna, não sei do que você está falando — disfarça Effie.

— Então, só você não sabe, Effie! — Johanna retruca, enquanto Effie continua a fazer ar de desentendida, ajeitando uma peruca imaginária. O acessório se foi, porém as manias ficaram.

Achei que uma mudança assim nunca aconteceria, pois, na última vez em que a vi, quando Effie escoltou Katniss até a reunião que os tributos tiveram com Coin, ainda usava uma peruca dourada chamativa.

— Gostei da sua nova aparência, Effie — comento, buscando observar se seu olhar continua vago, como reparei estar naquele dia, quando soube por alto que ela esteve presa durante a rebelião.

— Estou me adaptando aos novos tempos. Faz parte do meu tratamento pós-prisão — diz ela efusivamente.

— Que ótimo! Agora quero saber que novidade é essa entre você e Haymitch! — Também a instigo.

— Peeta, onde estão os seus bons modos? — repreende–me ela, cantarolando em seu sotaque da Capital. Effie definitivamente está melhor.

Cumprimento os demais, que estão aguardando que eu me sente para começarem a comer.

— O que estão esperando? Vamos aproveitar enquanto está tudo quentinho — convido todos a se servirem. — Tomara que não tenha perdido a prática. Estou até nervoso para saber a opinião de vocês, já que nunca provaram nada do que fiz. Aliás, só o bolo do casamento da Annie e do Finnick.

— Ai, aquele bolo! Estava lindo e delicioso. Finnick adorou também — elogia Annie, suspirando com tristeza e saudade.

— É verdade, o bolo estava ótimo. Foi difícil conseguir um pedaço, mas tenho meus meios. — Johanna faz uma expressão maliciosa.

— Essa é a minha garota! — Max aperta sua mão e ela dá uma risada, que felizmente contagia a todos.

Pelo visto, o improvável aconteceu e esses dois estão se entendendo. Johanna parte alguns pedaços de pão e põe na boca de Max.

— Isso está muito bom, Peeta! Vou falar pra minha irmã não dar alta a você tão cedo. Pelo menos, não antes de o pessoal da cozinha aprender suas receitas. — Max me cutuca com o cotovelo.

— Falando em alta, já sabe o que vai fazer quando for liberado daqui do hospital? — Effie me pergunta.

— Estou praticamente decidido a voltar ao Distrito 12 — respondo e Annie bate palmas de alegria. — Preparar esses pães e biscoitos me fez ter vontade de reabrir a padaria.

— Só por esse motivo? Sua decisão não tem nadinha a ver com a Katniss? — Todos os olhares se voltam para mim de uma só vez após o questionamento de Effie.

— Estaria mentindo se dissesse que não, mas não é apenas por ela. Na verdade, quando penso no assunto, às vezes, Katniss é o motivo de eu não querer ir pra lá.

— Peeta, você tem que parar com essa postura de coitadinho... O amante desafortunado rejeitado! — Johanna pronuncia as últimas palavras fazendo uma voz debochada. — Assim você não vai se recuperar nunca, nem conquistar a garota.

— Não fale assim com ele, Johanna! — Effie me defende e Johanna revira os olhos.

— Está tudo bem, Effie. Mereço esse puxão de orelha, pois, se deixar, fico mesmo dramatizando tudo — digo com sinceridade.

Johanna não esperava por essa minha reação.

— Ah, foi mal, Peeta. Você deve ter uma boa razão para ter receio de voltar para o Distrito 12. Tenho certeza de que não é apenas drama... — Ela tenta consertar o que disse.

— Tenho medo de estar agindo com o mesmo impulso de quando fui enviado ao Esquadrão 451. Não sei exatamente o que me movia naquela época. Era tudo muito desconexo na minha mente. — Tento recordar. — Queria estar perto de Katniss num instante, logo depois sentia um ódio incontrolável dela. Não quero que isso aconteça, se por acaso retornar ao Distrito 12.

— Peço desculpas, mas não pude deixar de ouvir a conversa de vocês. — A Dra. Ceres surge por trás de mim. — Não se esqueça, Peeta, de que você ainda estava em processo inicial de recuperação naquela época. A sua participação no Esquadrão 451 não foi uma decisão médica, pois nenhum profissional de saúde liberaria você no estado em que se encontrava. Aquela foi uma decisão política de Alma Coin. Quando você tiver alta agora, sua condição será diferente.

— Finalmente, a voz da razão para convencer esse menino de que ele deve voltar para casa! — Annie se anima ao falar.

Pego um guardanapo e ofereço um pedaço de pão à Dra. Ceres.

— Ok! Vocês é que vão me ajudar a decidir, então. Basta responder a uma única pergunta minha. — Todos me olham atentos. — Tenho futuro como padeiro no Distrito 12?

— Siiiiim! — A resposta chega rapidamente e em uníssono.

— Pronto! Decidido! Já posso fazer minhas malas, Dra. Ceres? — questiono, fazendo graça.

— Antes de mais nada, tenho um pedido a fazer. — A voz grossa de Max se sobrepõe às nossas risadas. — Que o Peeta só tenha alta depois de fazer um bolo pra gente!

— Tenho uma proposta melhor. Prometo fazer um bolo, quando eu tiver alta — sugiro.

— Agora sim! Todo mundo fica satisfeito! — Max comemora.

— Você veio aqui falar alguma coisa, não foi, Dra. Ceres? — Annie observa.

— A conversa está animada, acabei me envolvendo e esqueci de falar — admite a médica. — Vim saber se uma pessoa que acabou de chegar para falar com o Peeta pode vir participar do papo com vocês.

— E quem é essa pessoa? — Effie formula a pergunta que todos queriam fazer.

— Gale Hawthorne — responde a Dra. Ceres e todos ficam em silêncio, aguardando como vou reagir.

Eu estava distraído demais e não havia me preparado para ser assolado por sentimentos contraditórios tão depressa.

Ciúme. Gratidão. Raiva. Respeito. Desprezo. Admiração. Mais ciúme. Um ciúme mortal de Gale com Katniss.

— Peeta, respire fundo — aconselha a Dra. Ceres, com uma entonação firme, porém preocupada. — Você conseguiu se controlar outras vezes.

As imagens falsas que brilham como espasmos em minha mente se digladiam com o que é real. Eu me esforço, mas é em vão.

Cubro minhas têmporas com as mãos. Sinto a dor causada pelo veneno das teleguiadas se instalar violentamente em minha cabeça. Os tremores dos meus membros são a prova de que já comecei a travar aquela luta interna para manter minha lucidez e não me permitir ser dominado por alucinações aterradoras. Uma batalha inglória.

Olho para Max e, numa súplica silenciosa, faço-o entender o que quero que ele realize. Apesar da minha visão turva, consigo distinguir sua figura se colocando de pé e injetando em meu braço o líquido que me faz desmaiar em segundos.

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Quando desperto, estou deitado no leito do meu quarto, ainda sob o efeito do forte tranquilizante. Tento focalizar as pessoas que estão no cômodo enquanto acordo. Procuro me estabilizar ao me erguer, porém minha cabeça pende para trás. Volto a fechar os olhos e escuto as vozes de Annie e Johanna.

— Não importa quanto o tempo passe, mesmo que a gente tente seguir em frente, as assombrações do passado reaparecem... Queria ser forte como você, Joh — fala Annie, baixinho.

— Não é que não me ressinta por tudo o que aconteceu. Apenas disfarço muito bem — confessa Johanna, sem qualquer resquício do tom brincalhão de sempre em sua voz. — Já era difícil conviver com as lembranças dos Jogos e com o que Snow fez com as pessoas que eu amava. Ficou pior ainda, depois do que vivemos quando fomos capturados pela Capital.

— Oh, sinto muito. — Annie chora, passando seus braços em volta de Johanna.

Elas ainda não notaram que acordei.

— Estamos empatados, hein, Joh? — Consigo erguer um pouco meu corpo, apoiando-me nos cotovelos. — Estivemos em duas arenas, perdemos nossas famílias, fomos capturados pela Capital...

— Longe de mim querer fazer disso uma competição, mas você ainda está à frente nas desgraças, bonitinho. Ficaremos empatados apenas se você se entender com a desmiolada, pois já estou enrolada com o Max.

Não posso evitar uma risada, mas rir não é uma boa ideia, pois aguça a dor de cabeça que ainda estou sentindo. Isso me faz lembrar de Gale.

— E o Gale? Vocês falaram com ele antes de ele ir embora?

— Gale não foi embora. Está esperando todo esse tempo para falar com você! — Annie me informa.

— Deve ser importante, Peeta. Você não vai mesmo ouvi-lo? — Johanna pergunta. — O problema é que ele se recusa a falar com você nesse quarto, deitado num leito de hospital. Gale quer conversar com você de igual para igual.


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Notas finais do capítulo

Olá, pessoal!

O Gale está cheio de assuntos para falar com o Peeta, aí tive que deixar para o próximo capítulo.

E… Falta pouco para o Peeta ter alta!
Aguenta firme aí no Distrito 12, Kat! ;)

Grata por acompanharem e muito feliz com os comentários carinhosos e votos.
Beijos!
Isabela



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