Capítulo 10

Gale Hawthorn

                O relógio que ficava ao lado da cama no quarto de hóspedes onde eu estava marcava que eram quase 4 horas da manhã. E eu não havia pregado o olho nem por um minuto. Depois que eu e Katniss chegamos em casa, há quase duas horas, vim direto para o quarto onde minhas coisas haviam sido colocadas e nem a vi mais.

                Eu sabia, pelo menos eu devia saber, que todos aqueles beijos trocados no início da madrugada não passavam de teatro para passar ciúmes em Peeta. Mas uma parte de mim ainda acreditava que poderiam ser reais.

                Quando a pessoa nasce para ser trouxa, o destino faz seu trabalho muito bem.

                Depois de ficar mais uns 20 minutos olhando para o teto com a mente vazia, ouvi o barulho da porta sendo aberta e Katniss entrar no cômodo.

                - Perdi o sono – ela disse em voz baixa – Se importa se eu ficar aqui com você?

                Me sentei encostado na cabeceira da cama e neguei, fazendo Katniss se aproximar e sentar ao meu lado. A morena, depois de se acomodar e cobrir suas pernas com o edredom no qual eu estava enrolado, se virou para mim e ficou me olhando como se eu fosse uma paisagem interessante.

                - O que foi? – perguntei, a olhando pelo canto do olho – Tem alguma coisa no meu rosto?

                - Não...

                - Então o que é?

                - Eu só queria te agradecer – ela disse tão baixo que quase não pude ouvir.

                - E por que você deveria me agradecer?

                - Por ter ficado comigo hoje, por ter me ajudado a passar ciúmes no Peeta.

                Estaquei no lugar em que estava e pude sentir meus olhos cheios d’água. Mas dessa vez, de raiva.

                - Como é? – a assustei ao falar em tom alto – Tudo aquilo foi para te ajudar a passar ciúmes no Peeta? Jura que você fez isso?

                - Eu achei que você saberia, babe.

                - NÃO! – gritei e vi a garota pular de seu lugar, parando ao lado da cama – NÃO ME CHAMA ASSIM!

                - O que foi? – a cara de pau ainda teve coragem de perguntar.

                - PARA DE SER DISSIMULADA, GAROTA – gritei enquanto levantava da cama e ia em direção à minha mochila, jogando as roupas que tinha tirado de lá de dentro – NÃO É POSSÍVEL. NEM EU CONSIGO ACREDITAR NO QUE OUVI.

                - Gale, para com isso – Katniss se aproximou, mas dei um passo para trás, me afastando dela – Onde você vai a essa hora?

                - Não te interessa – falei de modo cortante, olhando em seus olhos – Tudo o que eu queria, pelo menos uma vez, era que você parasse de prestar atenção só em você e olhasse ao seu redor. PARA DE SER IDIOTA, GAROTA!

                - EU NÃO SEI DO QUE VOCÊ ESTÁ FALANDO – agora quem gritou foi ela – Pode fazer sentido nisso tudo?

                Parei de juntar minhas coisas e coloquei a mochila no chão, me aproximando de Katniss. Vi que ela estava com medo de mim, mas nem com toda a raiva que eu estivesse, nunca encostaria um dedo nela para machucá-la.

                Pude ouvir sua respiração pesada, enquanto me aproximava da garota de cabelos pretos. Parei em sua frente, olhando em seus olhos.

                A frase seguinte pareceu tirar anos de pesos em minhas costas, o que não seria mentira.

                - Eu amo você, Katniss Everdeen. Sempre amei. É por isso que, agora, quando disse que nossos beijos foram somente para fazer ciúmes no seu ex, eu perdi a cabeça – Katniss me olhava de um modo assustado – Eu. Te. Amo.

                Katniss se sentou na beirada da cama olhando para o chão. Pude ver que ela estava tentando pensar no que fazer a seguir. Poupei seu trabalho de pensar demais, peguei minha mochila e saí pela porta do quarto.

                Ouvi os passos da garota me seguindo enquanto eu me encaminhava para a saída.

                - Gale, não – ela pediu – Não vai embora assim, está de madrugada, é perigoso – nessa hora ela conseguiu chegar até mim e segurou meu cotovelo, me impedindo de andar sem que a arrastasse junto.

                - Eu não vou ficar aqui, Katniss – apesar de um pouco da raiva ter passado, a mágoa ainda continuava ali, firme e forte.

                - Eu não vou te deixar ir embora sem a gente conversar direito e você me explicar o que acabou de me falar – ela disse olhando em meus olhos, logo dando um sorriso – É brincadeira não é? Você me ama como sua melhor amiga, estou certa?

                - Droga, Katniss! – bufei e me soltei de sua mão, voltando a andar – QUANDO EU PENSO QUE VOCÊ VAI DAR UMA DENTRO, VOCÊ VEM FALANDO ESSAS MERDAS.

                - Gale, por favor, você não pode me amar – Katniss disse com os olhos cheios de lágrimas – Nós somos melhores amigos, por favor, babe – ela parecia implorar enquanto chorava.

                - Pode deixar, Katniss – olhei para trás, ainda andando na calçada – Você não vai mais precisar se preocupar se eu amo você ou não.

                - Gale, volta aqui – ela pediu, mas ainda estava no mesmo lugar, agora já chorando forte.

                - A propósito, não precisa se preocupar mais comigo. Eu não vou mais te incomodar.

                Dei as costas à minha melhor amiga enquanto ia em direção à casa que minha mãe morava. De volta à casa que eu havia saído há menos de 24 horas.

                Enquanto andava pela rua deserta pensava no que falaria para minha mãe. Eu sabia que ela ficaria feliz, já que o que ela tanto queria tinha acabado de acontecer.

                Eu e Katniss nos afastaríamos. Para o meu próprio bem.