Atendimento #213: Se eu fosse você

Conselhos não são coisas boas, se fosse eles seriam vendidos e não dados. Bom, essa afirmativa até que faz algum sentido na vida dos clientes de grandes empresas, afinal de contas, quando você esperaria receber uma ligação de um atendente querendo que você mande seu produto para uma inspeção gratuita?

— Isso mesmo senhora, estou pedindo para a senhora encaminhar seu produto para autorizada. — Kauã já estava perdendo a paciência, que naquele dia estava no talo, para a cliente que se negava a remeter a câmera digital para autorizada.

— Olha eu estava aqui fazendo a minha salada com azeite e você me interrompe para dizer que eu tenho de mandar meu produto para autorizada sem razão nenhuma? — A cliente era daquele tipo que odeia ser interrompida na hora da salada. — Olha eu vou fazer assim eu vou desligar está bem? Faça o favor e me deixa em paz.

— Eu sei que é complicado alguém atrapalhar esse momento sublime senhora. — Kauã gesticulava com a mão enquanto se recordava da vez que foi interrompido na sala aquário por uma garota do setor de procom. Virou-se para Luly e rapidamente virou o rosto envergonhado da garota que sorria em sua direção como um gato. — Mas se eu fosse você eu faria o que estou dizendo, afinal é um benefício que estamos lhe dando, por que não aceitar?

— Porque eu não quero ué, se eu tivesse interesse em mandar eu mesma ja havia ligado para vocês para reclamar. — Irredutivel a cliente começava a perder a estribeiras. — Além do mais eu sei que algum interesse vocês têm, do contrário eu não teria recebido sua ligação.

Na vida nada é de graça; a ligação, o tempo do funcionário usado para convencer a cliente, a postagem do produto para a assistência, o papel higiênico que Ezequiel usava no banheiro naquele instante, a descarga que ele usou, o alcool que ele esqueceu de passar na mão… Tudo resulta em um custo que têm de ser empregado para gerar mais dinheiro ou para evitar uma grande perda, e a cliente sabia disso.

— Vamos ser bem francos aqui querido, se você me falar o que vocês ganham com a minha câmera, talvez eu a mande para vocês. — A cliente falava com um barulho de rangido ao fundo. As mentes poluídas poderiam pensar que ela estava fazendo coisas complicadas, mas na realidade estava apenas cortando alface para fazer realmente uma salada de azeite. — E ai? Vamos abrir o jogo?

— Só um momento senhora. — Kauã reparou que o supervisor se aproximava e ergueu o braço. — Tô com uma cliente que não quer de jeito nenhum mandar o produto para autorizada, já disse que é benefícios, já até ofereci fotos de presente como você fez com o Júlio. — Kauã sacou um alcool em gel da bolsa e colocou nas mãos do encarregado. — Seja menos porco.

— Tá? — Ezequiel não entendeu por que o subordinado banhou suas mão com o alcool. — E o que a cliente tá falando?.

— Ela quer saber a real razão para mandar o produto, do contrário ela não vai fazer nada.

— Entendi, passa ela aqui. — Ezequiel ajustou o timbre da voz. Tirou do mute. — Olá senhora! Eu sou Ezequiel, acredito que a senhora esteja muito feliz e contente com a sua câmera digital correto? Bom eu gostaria de informar que a senhora ganhou uma revisão totalmente de graça devido a sua fidelidade com nossa empresa.

— Tá e qual é a história verdadeira?

Laurence parou naquele momento de atender para colocar uma pausa. Reparou no sorriso forçado de Ezequiel e passou a anotar algumas coisas em seu caderninho.

— Senhora a história verdadeira é essa! — Ele soava alegre como as pessoas da propaganda politica do partido com cunho comunista. — Estamos ligadno para informar desse beneficio.

— Beneficio é o cacete, nem injeção na testa hoje é de graça. Se eu fosse você eu falaria antes que eu coloque na mídia que vocês estão pedindo para que o povo envie as câmeras.

— Existe um defeito oculto no aparelho que precisamos verificar se está acontecendo no dispositivo da senhora. — Kauã anunciou já sem saco para continuar fingindo.

— Espero que não seja as fotos que vieram nela no começo.

Ezequiel engoliu em seco percebendo que a cliente sabia do que se tratava.

— Não por que eu tentei reiniciar a câmera umas trocentas vezes e não sumia, ai eu apaguei e resolveu. Espera vocês não estão fazendo um recall por isso né?

Enfurecido, Ezequiel foi até a sua mesa enviar um E-mail para o responsável na fábrica, como estava online a resposta foi rápida.

“Sabemos que se mandarmos o cliente reiniciar o problema vai persistir, mas e se mandarmos ele apagar as fotos? Isso por acaso resolveria?” Perguntou nosso herói.

Quando a resposta veio ele quase jogou o computador no chão.

“Sim, mas continuem mandando os produtos para a autorizada.”