Ana continuava a encarar o homem à sua frente sem saber bem como reagir. Se não tivesse visto o ritual nunca iria acreditar nas palavras daquele desconhecido.

  - Cadela?! - Não queria ser mal-educada para alguém que se auto-proclamava um demónio, mas aquele insulto tinha sido um pouco forte para que ela conseguisse ignorar. - O que quer dizer com isso?

  - Quero dizer que… - Começou num tom irónico guardando o maço de notas no bolso do casaco enquanto se aproximava da rapariga. - Enquanto a menina fizer o que eu lhe ordenar não irá sentir a garganta secar de um momento para o outro e essa carinha linda não vai virar um monte de areia como aconteceu aqui ao seu colega.

  Enquanto se explicava passou gentilmente os seus dedos ao longo do maxilar da jovem até ao queixo fazendo com que esta levantasse o rosto e o olhasse nos olhos.

  Um forte arrepio percorre o corpo da rapariga. No brilho invulgarmente lilás daqueles olhos ela pode ver o reflexo da sua morte agonizante em câmara lenta.

  Naquele momento a melhor solução que encontrava para escapar ao seu horripilante destino era aceitar o acordo que o demónio à sua frente lhe propusera. Após engolir em seco com algum esforço Ana aceitou a proposta de Astaroth. Um sorriso triunfante surgiu nos lábios do demónio mesmo já sabendo que a resposta da rapariga seria a seu favor. 

  Satisfeito com o seu novo contrato, Astaroth voltou para dentro do círculo que havia sido usado na sua invocação. Retirou um lenço branco de um dos seus bolsos e limpou os dedos que ante tocaram a face da jovem.

  - Só podes estar a gozar?! – Exclamou Ana ao presenciar tal gesto.

  - Ver-nos-emos em breve, Humana. – Despediu-se o demónio desaparecendo por entre o brilho sinistros dos desenhos marcados no chão deixando para trás o maldito lenço.

    No instante seguinte foi como se o tempo tivesse parado para a rapariga. Ainda não conseguia acreditar no que tinha acabado de fazer. Enquanto se mentalizava sobre o erro que tinha acabado de cometer mais se admirava com o que tinha sido capaz de fazer sendo confrontada com a própria morte.

  Ana apenas voltou a si quando o som de algo a bater contra a vitrina da sua loja chamou a sua atenção. Quando olhou na direcção de onde vinha o som o seu coração disparou. Do outro lado do vidro estava uma rapariga que, até àquele dia costumava ser uma das clientes habituais da loja. Podia ler-se nos lábios da rapariga um pedido desesperado de socorro que, em apenas alguns segundos foi levado pelo vento como um sussurro.

  Aquela cena fê-la lembrar de uma outra rapariga que se soubesse sobre o que havia acabado de fazer, sem dúvidas de que a iria matar com ou sem a protecção de um demónio.

***

  Horas depois já tinha pegado em Cátia e estavam agora longe da aldeia onde sempre tinham vivido. Ambas ficaram caladas durante todo o percurso, uma a pensar em como haveria de salvar a amiga e a outra a pensar na família que perdera.

  Como já era tarde, e estavam cansadas da viagem, decidiram parar numa espécie de hotel que tinham encontrado pelo caminho. Assim que entraram viram que o que tinha acontecido na sua terra também tinha passado por ali.

  Cátia olhava em volta ainda incrédula com o que via, enquanto Ana iam entrando em todas a divisões abrindo armários e gavetas procurando por algo que pudesse usar para salvar a vida da sua amiga.

  - Senpai! – Chamou a pequena.

  - Diz?

  - Porque não vais tomar um banho enquanto eu vou dar mais umas voltas neste sítio?

  - Tens razão… Até preciso de relaxar um bocado. – As palavras custavam-lhe a sair. Não sabia que devia ficar assustada ou preocupada, afinal nunca tinha visto a colega assim.

  Assim que Cátia virou costas Ana deu um murro na parece que estava mais próxima de si:

  - Demónio estúpido! Agora que eu preciso de ti não apareces!