Guertena escrita por KyonLau


Capítulo 11
Noivos Aflitos


Notas iniciais do capítulo

Hello, my people :v
Não vou prender vocês aqui nas notas iniciais, só vou pedir um favor: se encontrarem um erro, qualquer erro, me falem nos comentários, ok? Ok o3o
E, sim, não é do meu feitio colocar dois fleshbacks tão próximos um do outro, mas esse foi meio inevitável ;w; Espero que me perdoem ♥
Aproveitem a leitura~

Soundtrack: "Puppet"
https://www.youtube.com/watch?v=GJqFunWjfOE



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Os sinos de bronze, enormes, balançavam para lá e para cá com energia, tocando sua música retumbante do alto de sua torre de pedra. Alegria. Aquela era uma ocasião feliz.

As pessoas se aglomeravam na escadaria batendo palmas, soltando lágrimas de emoção, conversando alto enquanto chamavam os nomes dos dois que agora saíam pela enorme e pesada porta que dava para o interior sacro, os braços dados, os sorrisos feitos. A moça segurava com firmeza o braço do companheiro ao lado, radiante, os cabelos loiros arrumados em um coque preso por um véu. 

— E então, senhora, está ansiosa para a sua Lua de Mel? — o noivo a puxou mais para perto, o peito apertado de tanta felicidade.

A moça respondeu com um beijo terno nos lábios do novo marido. Seu sorriso, no entanto, se desmanchou um pouco ao ver a figura que os observava. Alta, vestida num sobretudo preto, recostado à árvore mais próxima, de braços cruzados. Silencioso e impassível. O homem de sorte notou aquilo e seguiu o olhar de sua mulher.

Franziu o cenho.

— Não é aquele o cavalheiro que lhe mandou aqueles dois quadros como presente de casamento, Ilka? Que errou o seu nome no bilhete de congratulações...

Ilka desviou rapidamente o olhar. Não havia mais ligações entre os dois para que ela precisasse se preocupar com ele. Vendera aquela maldita pousada. Vendera o lar dos dois. Agora, só lhe restava esquecer...

— É ele. Por algum motivo, ele me chama daquele jeito, mas não sei o motivo — contou — Diz que combino mais com esse nome.

 — Sujeito estranho — comentou, dando um ponto final naquele assunto.

Ilka também espantou as preocupações de sua cabeça. Aquele era um dia feliz.

Ela deveria se sentir abençoada.

A pesada porta fechou-se atrás de Iza e Ib, encerrando-as naquele mundo cinzento. A mais nova sentia ainda o couro antigo da capa do diário que apanhara contra a mão. Esquecera-se de devolver à prateleira onde o encontrara antes de avançar. Ib foi na frente enquanto Iza demorava-se um pouco, guardando o diário na mochila. Não queria deixá-lo lá, de qualquer jeito. Morria de curiosidade, a bem da verdade, para ver se conseguia ler algo mais sobre a vida do pintor.

— O que você acha que é isso?

A pergunta da mais velha, parada mais a frente, fez Iza voltar a realidade. Erguendo os olhos e recolocando a mochila nas costas, ela foi até onde a outra se encontrava, olhando para a parede.

Iza arregalou os olhos ao ver. Era o boneco palito! O que vivia seguindo Galli!

Sentindo uma onda de esperança, a garota inclinou-se para a parede.

— Você! — exclamou — Você sabe onde o Galli está? O garotinho pequeno que estava comigo, lembra...?

O boneco pareceu afirmar com a cabeça, causando em Iza uma nova onda de inquietação e alegria. Ele ergueu o bracinho direito e, como se estivesse rabiscando em uma janela embaçada, começou a escrever lentamente, de forma que as letras ficassem no sentido certo para que Iza pudesse ler, uma única sentença: “Estamos brincando de pique-esconde”. Iza quase se impacientou ali, mas achou melhor manter a calma com aquela coisa. Arreganhou o seu melhor sorriso persuasivo que conseguiu.

— Mas então me conte onde ele está — pediu com a voz doce — Você quer ganhar o jogo, certo? Só me fale onde ele está e ele irá perder.

O boneco palito não fez nenhum gesto dessa vez. Tornou a escrever, logo abaixo da sua primeira frase.

Siga as regras do jogo, Iza.”

Aquilo fez a garota se afastar da parede como se ela estivesse prestes a explodir.

— Para onde você acha que devemos ir agora? — perguntou Ib como se nada tivesse acontecido.

Iza se endireitou e olhou para frente. Além de sua visão, tudo eram portas e bifurcações, como um verdadeiro labirinto. Aquela área era definitivamente diferente de todas as outras em que estivera. Se eram grandes ou pequenas, ao menos havia apenas um caminho com, no máximo, uma ou duas bifurcações.

Em tinta branca havia mais uma provocação na parede.

Vocês gostam de labirintos? — Ib leu e, em seguida, virou a cara como se não fosse nada — Vamos, então.

Iza engoliu em seco.

Ib, vendo que a outra não se moveria, deu os primeiros passos, sem sequer pestanejar. Um pouco surpreendida pela falta de medo, e provavelmente de noção, dela, Iza foi andando logo atrás.

As duas permaneceram em silêncio, como sempre, enquanto andavam. Na maior parte das vezes, Ib passava direto pelas portas que apareciam ocasionalmente, outras estavam trancadas e por isso, impossíveis de se verificar o conteúdo que guardavam, mas em alguns momentos parava para espiar o que havia dentro e, então, fechava novamente, balançando a cabeça em negativa.

A mais jovem continuava na esteira da outra, quase desligada do que acontecia. Contudo, ao ver uma figura familiar, parou de supetão e, como Ib só fazia continuar, parou-a também, puxando-a pelo pulso com um certo grau de força que fez a mais velha se desequilibrar.

— Qual o problema? — perguntou, franzindo as sobrancelhas para a companheira.

O problema estava parado, imóvel, à apenas alguns passos na frente. O corpo rígido, pintado de preto como se fosse ébano se erguia encostado na parede, coberto pelo mesmo vestido de péssimo gosto que Iza vira antes, apenas que dessa vez era de uma cor amarela vibrante, como a gema de um ovo e sapatos de salto da mesma cor. Não possuía cabeça.

As duas permaneceram imóveis, encarando o manequim sem sequer respirarem. Pela experiência de Iza, ele saltaria a qualquer momento de sua posição e passaria a persegui-las incessantemente. E não havia como poder contar com a sorte que tivera em seu primeiro encontro.

Felizmente, por algum motivo, o manequim permaneceu parado. De qualquer forma, preferindo evitar surpresas desagradáveis, Iza deu meia volta e tomou outro caminho, sempre puxando Ib consigo, que parecia se deixar levar sem resistência alguma, quase como se não lhe importasse para onde ia.

— Isso é realmente um labirinto — comentou Iza depois do terceiro beco sem saída que encontraram.

Rangia os dentes, mas começava a pensar se realmente algum dia conseguiria sair dali. Todos os corredores e portas lhe pareciam iguais, cinzentos, sem graça alguma.

— Existe um truque para resolver labirintos — comentou Ib baixinho, quase que para si mesma — Abrace o lado direito da parede e você chegará ao final eventualmente.

— Sério? — perguntou Iza, estranhando — Como sabe disso?

Ib demorou um pouco antes de responder.

— Não sei ao certo — disse vagamente — Acho que eu vi isso em algum lugar, quando era criança...

Mais uma vez, elas se puseram novamente a andar. Passaram por mais quadros, mas felizmente, nenhum se mexeu ou fez qualquer ruído. Pelo contrário, estava tudo tão anormalmente silencioso que Iza já conseguia prever que algo de errado estava prestes a acontecer. Olhou para Ib, que caminhava à sua frente, para ver se ela demonstrava algum sinal de ter tido os mesmos pressentimentos que ela, contudo, era difícil saber, uma vez que ela mantinha-se virada para a frente e não abria a boca para nada.

Não foi surpresa, então, ela acabar ouvindo uma fungada profunda de quem acabava de chorar violentamente, seguida por uma risadinha de deboche.

Ib parou e, estendendo um braço para a companheira mais jovem, parou Iza também. A menina ergueu os olhos a tempo de ver algo peculiar. Do lado direito da porta cinzenta adiante, uma noiva de longo véu e vestido branco, segurando um magnífico buquê de flores, chorava copiosamente, enquadrada dentro de sua moldura retangular. Do outro lado, um jovem noivo suspirava, infeliz. Em frente aos dois, duas enormes mãos que não podiam se alcançar brotavam do chão. Elas agitavam os dedos finos, esticando-os inutilmente. Bem na soleira da porta, rindo-se da cena, uma boneca de cabelos desgrenhados, olhos vermelhos e pele azul apreciava o espetáculo.

— Nossas alianças, senhoritas! — choramingou o noivo, inclinando-se para as recém-chegadas — por favor, ajude-nos! Ou jamais poderei unir minha alma à de minha amada!

— Se pegar nossas alianças de volta, permitiremos que passem pela porta! — barganhou a noiva, transtornada — Vocês precisam avançar, não é? Nós não nos importamos com esse jogo bobo, então, por favor...!

Iza ergueu uma sobrancelha para Ib, descrente. Aprendera a não confiar no que os quadros daquele lugar falavam. Ib, por sua vez, deu um passo a frente, a mão estendida, quase se permitindo tocar a dos noivos. Parecia estar em outro planeta.

— E onde estão suas alianças? — perguntou a mais velha sem olhar para os quadros.

— Foi aquele homem cruel, senhorita! — contou a noiva — Arrancou as alianças de nossas mãos e entregou para aquela boneca nojenta — disse, apontando para a tal diabinha.

— Exatamente! Ele disse que era para relembrar, ou algo assim... Francamente, eu não entendi nada...

Enquanto Iza prestava atenção no que os quadros diziam, sem entender nem a metade do que ouvia, Ib foi até onde a boneca azul repousava e, ajoelhando-se no chão à sua frente, pegou-a ainda rindo e, segurando-a com firmeza ao nível de seus olhos, começou a balançar a pequena com violência para um lado e para o outro. Iza ficou observando, até que o processo medieval terminou no momento em que um barulho metálico ecoou.

Ib praticamente jogou a boneca para o outro lado e, apanhando aquilo que deixara cair próximo aos seus joelhos, ergueu-se. Em cada mão, uma argola do tamanho de uma pulseira de prata brilhava, reluzente.

Os noivos começaram a aplaudir animadamente o destino da boneca enquanto Ib ia em cada mão e depositava as joias em seus dedos anelares.

— Muito obrigada, senhoritas — agradeceu a noiva, seguida rapidamente pelas palavras vitoriosas do noivo.

— Sim! Muito bem feito! — batia palmas — Bem, como prometido, vocês podem passar.

Um tilintar de fechadura indicou às duas que a porta estava aberta e esperando para ser utilizada. Iza foi até a maçaneta, porém, no momento em que tocou o metal gelado, a noiva as chamou mais uma vez.

— Nós as deixamos passar, senhoritas, mas tenham cuidado — seu tom de alerta era sério e baixo, como se estivesse prestes a infringir uma lei federal — O Esquecido aguarda mais a frente, e ele fará de tudo para conseguir o que deseja.

— Como separar um casal feliz, por exemplo — ajuntou o noivo.

A noiva concordou com a cabeça.

Iza estranhou. Era um alerta esquisito, mas supôs que certamente não podia ser pior do que a Dama de Vermelho ou a Morte do Indivíduo. Girou a maçaneta e, com uma pequena palavra de agradecimento e assegurando-os de que iria tomar cuidado, ela avançou, puxando Ib consigo depressa.

Mil cabeças de manequins agora ladeavam o corredor pelo qual passavam. Brancas, calvas e redondas, erguendo-se do chão. Era preciso tomar cuidado para não esbarrar em nenhuma com os pés, pois sua disposição inconveniente tornava o corredor estreito demais para duas pessoas andarem confortavelmente lado a lado.

Assim, Iza caminhava na frente dessa vez e por isso teve a oportunidade de perceber vez ou outra um olhar zombeteiro lançado em sua direção para logo em seguida desaparecer. Levou algum tempo até que ela percebesse que não se tratava das cabeças, mas da mesma boneca azul de antes. Tentava ignorá-la, afinal, não havia feito nada de errado com ela, até aquele momento. Claro, tomara um grande susto quando a viu escalando suas costas, mas depois vira outras tantas coisas assustadoras que ela simplesmente foi se apagando de sua mente...

— Você precisa parar de subestimar as coisas.

A voz de Ib ressoou pelas paredes e fez com que Iza se sobressaltasse.

— O que quer dizer com isso? — ela encarou a outra, ligeiramente emburrada.

— “Comparado às outras coisas que vi por aqui, o que está por vir não pode ser tão ruim” — Ib falou em seu costumeiro tom monótono — “Vai dar tudo certo, eu já passei por outras coisas piores”... Falo desse tipo de pensamento bobo que vai acabar te matando.

Iza sentiu as bochechas esquentarem.

— E como sabe que eu pensei isso? — perguntou rangendo os dentes.

Ela abriu outra porta sem nenhuma delicadeza, fazendo-a ricochetear na parede e entrou sem nenhuma cerimônia na sala seguinte, ainda encarando Ib, que entrou logo atrás, aborrecida.

— Eu estou te dando um conselho de bom grado — tornou a outra — Faria bem se você ouvisse.

— Concordo plenamente, Ib.

A voz repentina se fez ouvir, assustando as duas. A porta se fechou com força atrás delas e, antes mesmo que tivessem a oportunidade de olhar diretamente para a nova figura que se avolumava adiante, Iza sentiu, da mesma forma que viu, braços finos e negros, como se fossem sombras, saltarem das paredes e agarrarem seus braços, puxando-as contra a parede gelada e obrigando-as a sentarem-se, apertando com tanta força seus corpos que não seria surpresa se acabassem amassando as duas.

Elas ficaram presas lado a lado, lutando inutilmente contra as mãos que as algemavam impiedosamente, cada vez mais até perderem a possibilidade de movimentarem-se livremente. Iza sentia o coração bater enquanto mais mãos a forçavam a olhar diretamente para frente. Podia ver Ib pelo canto do olho ofegante devido à luta.

Uma risadinha maníaca se fez ouvir, anunciando a presença ameaçadora para as duas.

O homem alto e magrelo que antes falara agora se mantinha acocorado em frente às suas novas prisioneiras. Seus cabelos retorcidos caiam por seus olhos azuis, que perfuravam os de Iza e iam dela para Ib rapidamente, como se não soubesse ainda direito para quem olhar. Sem brilho. Seus lábios finos se retorciam em um sorriso arreganhado, como uma fenda escura e de profundeza infinita.

— Essas duas têm andado de forma muito irresponsável para lá e para cá, não concorda, amiguinha? — ele virou-se para a boneca de olhos vermelhos que segurava com cuidado e, empurrando com um dedo a parte de trás de seu pescoço de pano, fez com que ela balançasse a cabeça, concordando com ele — Mas tudo bem. Fico feliz que tenham conseguido chegar. É isso o que importa...

— Quem é você? — perguntou Iza impertinente, atraindo novamente a atenção do homem.

Ele era diferente de qualquer outra obra que ela já vira e não fazia sentido pensar que se tratava de mais uma pessoa presa naquela Galeria.

Enquanto o observava, seu sorriso morreu. Ele virou-se para Ib e, com um movimento brusco da mão livre, agarrou-a pelo maxilar com tal força que a obrigou a inclinar a cabeça para a frente.

— Essa a Ib sabe responder, não é? — sua voz tornou-se repentinamente ameaçadora, arranhando os ouvidos de Iza.

— Eu não sei de nada... — respondeu a outra com a voz abafada.

O homem inclinou a cabeça para o lado, como uma criança curiosa. Sem aviso, ele empurrou a cabeça da mulher de volta para trás, provocando um baque surdo que fez a menina ao lado estremecer.

— Vamos, uma segunda chance! — anunciou brincalhão e ruidoso — Tente de novo!

Os olhos de Ib entravam e saíram de foco.

— Você é do... Retrato Esquecido...

Foi impedida de continuar a falar pela mão do homem, que agora apertava seu pescoço com firmeza. Iza soltou um berro, pedindo para que ele se afastasse da outra, mas foi sumariamente ignorada. Os olhos profundos do agressor estavam fixados no rosto de Ib e não se moveriam por nada no mundo.

— E o que mais...? — encorajou ele quase num sussurro.

Os olhos de Ib foram se arregalando pela falta de ar. Ela tentava puxar com força mais oxigênio para os pulmões suplicantes, mas só conseguia tossir e engasgar-se com o esforço. Iza fechou os olhos, apavorada.

— Vou te ajudar, então — tornou o homem num sibilar gelado — Uma vez, eu fui seu amigo... E então, você me deixou para trás. Fui esquecido... Bem, quase. Como pode ver, meus amigos de verdade continuaram comigo — e acenou com a cabeça para a boneca ao lado — Mas mesmo tendo sido esquecido, eu nunca esqueci.

Quando parecia que Ib finalmente iria se asfixiar, ele soltou a mão, deixando-a engasgar-se para recuperar o fôlego. Um olhar de desprezo perpassou suas feições, mas logo desapareceu, dando lugar a um sorrisinho meio bobo que ele dirigiu à Iza, que abrira uma frestinha de um dos olhos, receosa.

— É um prazer conhecê-la, Iza — disse brandamente — Eu me chamo Garry.


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Notas finais do capítulo

Prontenho. Juro que esse flashback foi importante, tá galera? Se não, eu não teria colocado, mas mesmo assim, tenho TOC com essas paradas, queria ter seguido o padrão... ;w;
Enfim, me contem o que acharam do capítulo, ok?
Até a próxima :3
P.S.: Não me crucifiquem por conta do Garry, ok? Pl0x