Quando Yuki chegou, a redação da “Splash” estava praticamente vazia, então aproveitou para ler o jornal. Foi quando um artigo no caderno juvenil lhe chamou a atenção.

“Carreira de Shindou Shuichi parada depois de ser brutalmente atacado.”

Num instante ele já estava diante da casa de Shuichi. A porta já estava aberta e a sala parecia mais o cenário de um arrastão. Os desenhos, pinceis e tubos de tinta estavam jogados pelo chão, enquanto garrafas de varias bebidas diferentes agrupavam-se na mesa, pelas estantes e bancadas de toda a casa. No quarto, um homem beijava Shuichi, ambos nus.

Pasmo, Yuki se aproximou, sem crer nos próprios olhos. O homem que beijava Shuichi logo notou sua presença e, envergonhado, saiu de cima se Shuichi, pegou suas roupas e saiu, sem nem se importar em vestir algo mais que a cueca.

Shuichi o encarou por um minuto, em silencio, até que se levantou da cama e vestiu um short.

-não interrompa. Estava muito bom... – disse, com seu ar insolente, saindo do quarto.

-o que aconteceu com seu rosto?- perguntou Yuki, vendo as marcas de hematomas não so pelo rosto de Shuichi, mas por toda a extensão de seu corpo. O garoto, porem nem ligava. Foi para a sala e se sentou em no banco alto, que estava encostado bem antes ficava o quadro do menino e o mar.

-graças a isso, agora tenho tempo livre- disse, pegando uma garrafa de vodka e bebendo um gole direto do gargalo.

-no final das contas...  Você nem ao menos sabe cumprir uma promessa. - disse Yuki, serio. Viera ver se Shuichi estava bem, com medo que ele estivesse todo engessado ou coberto de bandagens, mas pelo visto ele estava bem. Bem até demais.

-isso é verdade.- ele disse, como se estivesse comentando sobre o clima.- você sabia disso desde o principio, não é?

-o que é que você quer?

-você está sobrando aqui. Suma!- sugeriu Shuichi, bebendo ainda mais e apoiando as mãos no banco, como uma criançinha.

-por que você faz isso?- Yuki ignorou o que Shuichi havia dito. Não entendia mesmo por que aquele garoto insistia em destruir sua própria vida. – por que você não cumpriu nossa promessa?

-promesa?- desdenhou – as promessas são feitas para serem rompidas.

-não- discordou Yuki, sério.- são feitas para serem cumpridas. Protegendo-a, nossa relação perduraria. Você jogou tudo fora. Você é um imbecil.

-somente os idiotas acreditam em promessas- disse Shuichi, colocando a garrafa na mesa, sem se levantar.- eu decidi que jamais acreditaria... em promessas.

-do que você esta falando?

Shuichi suspirou, desanimado.

-Ryuuichi não cumpriu a promessa que fez para mim. Mesmo tendo me prometido tanto... que me acompanharia.- ele disse, como se falasse mais para si mesmo que para Yuki.- ele não cumpriu com a sua palavra.

-Ryuuichi? Você está se referindo ao menino do quadro?- lembrou-se Yuki. Sim, Hiroshi havia dito algo sobre o menino do quadro ser o tal amigo de infância de Shuichi.

-quem disse isso a você?

- Hiroshi. Quando nos vimos aqui, pela primeira vez.

-na escola, os outros meninos implicavam com Hiro e comigo – confessou Shuichi.- Ryuuichi era maior, nos defendia. Eu tinha muito carinho por ele.

Shuichi foi contando tudo aos poucos, da maneira que doesse menos. Claro que, para isso, precisava lembrar de tudo, o que era muito ruim, então começou pelas lembranças boas. Lembrava bem de como era o sorriso de Ryuuichi, e de como ele nunca se cansava de ficar ao seu lado, vendo-o desenhar. E ele sempre ameaçava bater em quem quer que fosse implicar com Shuichi por viver sempre desenhando.

-Ryuuichi era forte e meigo. Ele era muito legal. Eu o admirava. Sempre elogiava meus desenhos. Eu desenhava por que gostava de vê-lo sorrir.

Shuichi lembrava bem de ter feito vários desenhos quando era criança, so para receber os elogios de Ryuuichi. Quando este foi internado, cada visita de Shuichi era um novo desenho, cada qual mais colorido que o anterior.

Fechava os olhos e podia ver o desenho de uma baleia emergindo da água que havia dado a Ryuuichi quando haviam feito aquela promessa.

-toma, isso é para você. Para que você melhore logo.- Shuichi havia dito, logo que chegou ao hospital. Ryuuichi recebeu o desenho com um sorriso.- você gosta de baleias, não é?

-você desenha bem- ele dissera, recebendo o desenho.-alguma vez você já viu o mar?

-não, nunca. E você?- perguntara Shuichi, sentando-se ao lado da cama do amigo.

-não. Quando estiver melhor, vamos juntos! É a nossa promessa!

-serio? É uma promessa?- dissera, levantando-se e agarrando-se à manga da camisa de Ryuuichi.

-sim, eu prometo.- afirmara o garoto, com um sorriso.

Shuichi acreditara na promessa. Acreditara que Ryuuichi logo ficaria bem e, juntos, eles iriam ver o mar. E ficara esperando o dia em que ela se tornaria realidade.

-logo, uma semana depois... Ryuuichi morreu- disse Shuichi, os olhos úmidos.- não cumpriu sua promessa. Foi quando me dei conta, pela primeira vez, que eu o amava. Mas, se amar significa tanta tristeza assim... sofrer tanto desse jeito... então eu não preciso amar. Promessas... não acreditarei mais nelas.

Yuki escutou seu desabafo em silencio. Entretanto, quando as primeiras lagrimas começaram a escorrer pelo rosto do garoto, o loiro fez a única coisa que estava ao seu alcance. Aproximou-se delicadamente do garoto e o abraçou, permitindo que ele chorasse em seu ombro. Sabia que era pouco, mas esperava que isso o ajudasse de alguma forma, mostrando-lhe que havia alguém com quem ele poderia contar. So não imaginava que não conseguiria se conter por muito tempo –logo suas lagrimas misturavam-se às de Shuichi.

“Quando duas pessoas choram juntas pela primeira vez, sabem o quanto se gostam”, Emile Deschamps.