Aster

Um alarme me tirou do estado adormecido.

Demorei para perceber que aquele teto que eu encarava não era o do meu quarto e sim o que Harry dormia. Olhei rápido para o lado, mas ele não estava ali.

Passei a mão pelo alarme e encontrei uma carta. Fiz menção de abri-la, mas esperei. Não era capaz de ouvir seu adeus, nem mesmo lê-lo. Não quando as memórias da noite passada inundavam minha mente.

Seu corpo no meu, suas mãos, seus lábios... Como uma madrugada tão perfeita poderia ser seguida por uma manhã tão triste? Até o clima refletia isso.

Mesmo através das cortinas era possível ver o céu nublado e cinzento. Como se ele soubesse que não valia a pena mostrar seu mais brilhante estado para mim, uma alma ofuscada. Como se ele quisesse refletir como eu estava por dentro.

Me obriguei a levantar ainda que minhas pernas estivesses fracas e meu corpo um pouco dolorido. A casa estava silenciosa indicando que minha avó ainda dormia em seu quarto. Coloquei minhas roupas e vasculhei o chão com o olhar, ainda que tentasse convencer a mim mesma que não procurava por algum vestígio dele. Ainda que estivesse claro que era isso mesmo que eu fazia, abrindo as portas do guarda-roupa e revirando gavetas.

Juntei os lençóis, tentando não pensar muito sobre quantas vez o agarrei entre meus dedos na noite passada, e os coloquei na máquina de lavar. No caminho de volta, encontrei um colar caído próximo a porta do quarto, provavelmente havia despencado dos lençóis. Era bem simples: prata e com um pingente que lembrava um aviãozinho de papel.

Respirei fundo. Achar algo dele não havia me deixado tão feliz como eu esperava, mas ainda assim o guardei para pôr em meu próprio pescoço depois do banho.

Depois de deixar o quarto arrumado, fui para o banheiro. Tirar sua marca, seu cheiro de mim fora tão difícil quanto eu imaginei, mas era necessário. Chorei baixinho contra a parede gelada do box. Chorei até que meus olhos apenas ardessem e não conseguissem derrubar mais nenhuma lágrima.

Deitei em minha cama, com uma mão na carta e outra no pingente do colar. Meus dedos roçaram várias vezes o local onde a carta estava colada , mas a coragem de abri-la não apareceu. Eu ainda poderia fingir que Harry havia apenas saído para uma caminhada e voltaria logo. E me tomaria nos braços. E me beijaria. E faria amor comigo novamente.

Porém, no momento em que eu abrisse aquela carta e lesse o seu conteúdo, tudo se tornaria real. Harry estaria do outro lado do país e, então, do outro lado do oceano.

O sono me pegou novamente antes que eu pudesse tornar aquilo real.

Harry

"Eu já te disse que espero que o seu avião caia?" A voz de Alice ainda estava embargada mesmo pelo telefone.

Quando saí da casa da avó da Aster, eu passei na casa de Alice para me despedir. Eu só tinha esquecido que Alice nunca fora e nunca seria uma pessoa matinal, mas ela fez questão de me lembrar ao me dar um tapa na cara quando apareci em sua porta às cinco e meia da manhã.

Naquele momento, ela olhou bem no fundo dos meus olhos e disse:

"Tomara que o seu avião caia, Styles." mas sua voz tinha mais tristeza do que ódio. Eu também sentia por deixá-la para trás junto com Aster. Ela era aquela amiga que poderiam passar mil anos e eu ainda poderia voltar e sentar ao seu lado reclamando sobre a vida enquanto ela me ouviria atenciosamente.

Bem, ela faria isso... antes de hoje. Porque pelo modo com que ela falava agora no telefone, ela nunca mais olharia na minha cara. E se ela olhasse, seria segundos antes de me dar um soco.

Provavelmente Aster já havia contado a ela o que acontecera entre nós na noite passada. Eu apenas não contei porque, apesar de saber que ela contaria, ainda seria uma escolha dela dizer ou não.

"Sim, você já disse isso tantas vezes que eu estou pensando em pegar um ônibus até a Georgia." disse tentando por um bom humor na minha voz e falhando miseravelmente.

"Por precaução, tomara que seu ônibus bata." ela respirou fundo e abaixou a voz. Só de imaginar que ela poderia estar perto de Aster meu coração deu um salto. "Eu juro Harry que se Aster nunca mais voltar a ser a mesma por sua causa, eu vou até o quinto dos infernos para te achar. E, quando eu te achar, eu não vou ter piedade."

Suspirei alto.

"Cuide bem dela."

"Eu já estou fazendo isso, babaca. Cansada de ter que ficar limpando sua bagunça."

"Tenho que ir agora, estão chamando meu voo."

"Faz um favor para mim." ela disse antes que nos despedíssemos. "Manda o seu pai para puta que pariu."

Consegui sorrir um pouco.

"Não precisava pedir, tenho certeza que um dia com ele será o suficiente para isso acontecer."

Aster

Assim que encontrei Alice, eu desabei.

Desabei em seus braços assim como minhas lágrimas desabaram dos meus olhos.

Contei a ela sobre a noite passada e ela me consolou. Xingou e amaldiçoou Harry, mas nada daquilo fez com que eu me sentisse melhor. Nada poderia me fazer sentir melhor se não fosse ele.

A carta ainda estava intacta na gaveta do meu quarto. O colar agora era parte permanente de mim e eu me via brincando com o pingente entre meus dedos com cada vez mais frequência.

A pasta de Rascunhos do meu celular já estava cheia de tantas mensagens inacabadas que deveriam ter ido para o número de Harry.

Foi no fim da tarde que eu decidi caminhar sozinha. Minha avó preparava a casa para receber meu pai e minha madrasta. Nós não havíamos conversado muito durante o dia, ela não havia tocado no assunto "Harry" além do necessário. Agradeci por isso silenciosamente.

Após avisar que sairia para caminhar um pouco, fui em direção à porta.

A campainha tocou no momento em que eu segurei na maçaneta.

Meu coração errou uma batida e meu estômago se levantou. Além de Alice, ninguém viria me visitar e ela sempre me avisava quando planejava vim.

Não pude conter a esperança de crescer minimamente dentro de mim. Também não pude conter que ela murchasse drasticamente ao abrir a porta e encontrar Thomas ali. Com um sorriso no rosto e com um pequeno buquê em mãos.