O Curioso Caso de Daniel Boone escrita por Lola Cricket, Heitor Lobo


Capítulo 16
Photograph — Parte Dois


Notas iniciais do capítulo

Olá, meus amores! Tudo bem com vocês?
Exatamente uma semana depois, aqui estamos com mais um capítulo ;) Desta vez o capítulo foi escrito por mim e é a continuação do anterior (como vocês devem bem saber). Ele não possui MUITAS informações, mas é tão amorzinho que eu adoro ele de montão.

Um agradecimento especial a Anne Bridge (Natasha) e a Sinclair pelos comentários amorzinhos! Dedicamos esse capítulo a vocês duas ♥


Enfim, eu não sei mais o que falar... Então, tenham todos uma boa leitura e desconsiderem qualquer erro bobinho de gramática!



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"Nós mantemos este amor numa fotografia, nós fizemos estas memórias para nós mesmos onde nossos olhos nunca fecham, nossos corações nunca estiveram partidos e o tempo está congelado para sempre"

— Ed Sheeran, “Photograph”

 

Washington, D.C.

12 de Agosto de 2015

248 dias antes da facada que pode ou não ter me matado

Dou o primeiro passo para dentro da van quando um bando de criançinhas com cabelos loiros e braços histéricos me empurram para longe de sua passagem e voltam a gritar desesperadamente, como se estivessem em um filme de terror.

Malditos sejam!

Raven emite uma risadinha baixa e puxa o meu braço em sua direção, para logo em seguida o meu corpo se chocar contra o assento duro daquele transporte. Evito dizer uns palavrões e lhe dar uns tabefes na cara por sempre estar me empurrando ou roubando minhas coisas.

— Você pode parar com essa mania de ficar me puxando como se eu fosse um boneco? — Imploro com o cenho franzido e ela volta a rir. — Qual o seu problema, Raven?

— Nada demais — deu de ombros e apertou minhas bochechas com suas mãos frias. — Agora seja um amigo bonzinho e compartilhe seu fone comigo. Eu esqueci o meu em cima da cama.

— Problema seu — respondo prontamente e sinto um puxão na minha camiseta. — Tudo bem, tudo bem, Raven! Vamos ser bons amigos e ouvir uma música juntos como um casal apaixonado faria.

 Raven revira os olhos e conecta o fone no plugue do celular e começo a procurar uma música para aquele dia, no entanto, nesse processo eu noto Kian se sentando atrás de nós. Ao mesmo tempo em que a garota sentada do meu lado lança olhares inquisitivos para o fundo do transporte.

— Algum problema lá atrás? — Pergunto no exato segundo em que aperto o play e Photograph começa a ressoar em nossos ouvidos.

— Eu só... — Ela encara-me com duvida — Nada demais. Não tem importância.

— Se você diz, então tudo bem.

Depois desse momento mais estranho do que quando eu vi minha avó dançando de calcinha na sala, ficamos em total silêncio. Raven parece presa em seus próprios pensamentos e pouco atenta a música que estava tocando. Se eu colocasse um forró — Shawn iria adorar isso —, ela nem perceberia. Nem mesmo se uma bomba caísse do seu lado e o mundo todo morresse.

Ela estava pouco ligando para o mundo ao seu redor.

Merda, só porque eu queria contar o que ouve antes do começo das aulas.

— Ei, Daniel — sinto uma cutucada na minha cintura e evito soltar um berro — Podemos conversar?

Conto mentalmente até cinco e viro-me para trás, sendo privilegiado — ironia, gente — com a bela facete de Kian. Seus cabelos foram cortados recentemente e agora eu consigo ver o seu rosto, já que antes parecia que eu estava falando com a Sia.

— Você já abriu a boca mesmo... — apesar de minhas palavras, o garoto não parece nem um pouco abalado — Qual a desgraça da vez?

Kian estreita os olhos, como se tivesse conhecimento de todos os boatos que rondavam aquela escola — e eu não desconfiava desse fato. Apesar de exibir uma personalidade estranha e atos ainda mais estranhos, Kian tinha o olhar de uma águia e a sabedoria de uma raposa.

— Estão rolando uns boatos, pequenos, por enquanto — sinto meu estômago se contrair com o que está para vir — que você recebeu um apelido.

Merda. Será que o Danico pegou?

— Só falta estarem me chamando de bosta, o que não seria novidade — Kian revira os olhos e inclina o corpo em minha direção.

Agora vem a bomba, senhoras e senhores!

— Daniel Safadão — enrugo os lábios com desgosto ao sentir aquelas palavras em minha boca — E o motivo? Com certeza é o melhor — ele bate na própria perna e gargalhada — Porque você, supostamente, entrou em contato com o instrumento ativo do Shawn, acredita? Nunca ouvi uma merda tão grande em minha vida.

Kian continua a gargalhar e suas bochechas até adquirem um tom rosado, os olhos ficam úmidos e aquela cena passa a chamar a atenção de alguns outros alunos. Raven faz uma careta e retira o único fone que usa, como se reprovando a atitude exagerada de Kian ou apenas decidida a saber do que se tratava aquele burburinho.

— Meu Deus — a loira cobre a boca e emite o famoso grito da pantera. O que, claro, faz ainda mais pessoas se voltarem para nós.

As crianças de antes até terminam com a sessão de socos e voltam-se com seus olhos pequenos para mim. A garota loira com tranças empurra o menino sentado ao seu lado que resmunga em resposta ao ser arremessado no chão.

— Muita calma, pimpolha — Kian abre com um sorriso, como se estivesse gostando daquela cena.

— O que é instrumento ativo? — A desconhecida pergunta, como se aquilo realmente fosse uma pergunta normal. Aquela pergunta que a gente faz para os pais em um jantar importante. Aquela pergunta que os pais nunca sabem como responder.

Aquilo que te fez, filha. Aquilo que entra em buracos. Aquilo que os homens têm. O pepino. O objeto funcional. O pintinho da sua vida e nossa.

— É um instrumento que as pessoas tocam — Kian responde com um olhar perturbado quando Raven ri extremamente alto. Duplo sentido, claro. — Nada que mude sua vida perfeita.

A loirinha concorda com um ar desconfiado e senta-se novamente em seu lugar, voltando a conversar com seus amigos. Mais um dia normal nos EUA, mais um dia sem mortes e mais um dia com perguntas estranhas.

— Eu vou arrancar a sua cabeça, Fields! — Gritou e a loira desatou a rir novamente — Ela é sempre assim?

Concordo com um aceno.

— Desde que nasceu.

Quando penso em voltar para o meu mundo de músicas e acabar com a socialização diária que ia além do que eu esperava, a motorista da van lança um olhar incriminador para mim e aperta o botão para fechar a porta automática do automóvel, logo em seguida ligando o mesmo.

— O que está acontecendo, afinal? — Suas sobrancelhas escuras arqueiam-se enquanto Raven e Kian discutem sobre suas bobeiras. Um dia esses dois... — Daniel? O que acha de me contar essa história?

Encolho-me no assento, como se o banco pudesse me sugar e eu conseguiria evitar aquela situação terrível. Mas como Kian é — quase — um salvador, ele enfia a mão no rosto de Raven e a empurra de volta para seu banco e acena amistoso para a motorista.

— O Daniel aqui está envolvido em uma situação romântica com o Shawn! — Ele exclama alto demais e minhas bochechas esquentam no mesmo segundo. A motorista abre um sorriso malicioso em minha direção e puxa o freio de mão.

— Nada a ver! — Arquejo em um grito quase feminino e Raven chuta a minha perna, como se alertasse para eu tomar cuidado — Não ocorreu nada entre nós dois.

— Sim, sei — Kian me cutuca com o dedo indicador e balança os ombros — E eu sou o Papai Noel. Legal, né?

— Você é ridículo para ser Papai Noel, Kian — Raven se mete novamente e desvia-se de outro empurrão do moreno — Deveria ser um anão.

— Então quer dizer que você me pegaria? — as sobrancelhas loiras se estreitam — Porque você parece à branca de neve, mas a versão de farmácia.

Os dois voltam a se cutucar e fazer cócegas um no outro. Reviro os olhos. A maioria dos relacionamentos começava assim, com um ódio recíproco e depois um amor em comum. Kian não parecia ser um cara de uma mulher apenas, mas se fosse de ser, provavelmente seria respeitoso com ela.

Ou não.

Não sei de mais nada, na verdade.

— Mas o que realmente aconteceu? — A motorista volta a perguntar, olhando para nós pelo retrovisor.

Respiro derrotado e resumo em menores detalhes o que aconteceu naquele dia. Raven emite alguns sonoros murmúrios de surpresa e Kian bate na perna coberta por uma calça jeans escura constantemente. Oculto algumas coisas que sei que irei contar depois para Raven particularmente e sem todos aqueles ouvidos voltados para mim como se eu fosse o Obama.

— E a história do Daniel Safadão — lanço um olhar mortal para Kian — É a mais pura mentira criada por bocas grandes. Mas, eu sei que Shawn Hans adora ferrar com a minha vida e não seria novidade ele fazer isso.

Raven assente, imitando o movimento da motorista que agora mantém toda a atenção no trânsito um pouco caótico da cidade. Kian, no entanto, ainda está quieto em seu canto e mordendo a unha do dedão.

— EU SABIA QUE ELE NÃO ERA HÉTERO! — grita extremamente alto e aponta para mim, caindo na gargalhada de novo.

Mando-o para aquele lugar, — tanto mentalmente como verbalmente — e penso em retornar para o meu mundo musical pela segunda vez naquele dia, mas uma pergunta parecia martelar em minha cabeça a cada retumbada da música.

Bufo com raiva e jogo o fone para longe de mim.

—Por que você diz isso, Kian?

O moreno deu de ombros e cruzou os braços, amassando um pouco a camiseta do uniforme que usava.

— Não é de hoje que o Shawn se mostra bipolar quando assunto são relacionamentos — ele diz normalmente, os olhos encarando os meus — Isso não é novidade para mim e não deveria ser para você também.

Suspiro sem ter tido a resposta que esperava e viro-me para frente, voltando à atenção para Raven que estava remexendo nas pulseiras do braço e tentando desfazer o nó entre elas. Enquanto a loira se desfaz em xingamentos e gemidos de irritação, penso na bipolaridade de Shawn e a forma como Kian a mencionou sem problema algum.

Talvez fosse mais normal que eu já tivesse imaginado.

— Sei no que você está pensando — Raven arqueja e coloca uma mecha loira atrás da orelha — Eu estive pensando também.

— Não sei de mais nada, Fields.

— Nem eu, Boone — ela confessa tristemente e volta à atenção para as pulseiras.

E eu para o meu celular com os fones agora sendo totalmente de meu domínio. Enquanto espero a van parar até a minha casa eu volto a pensar em Shawn Hans e sua bipolaridade fora do comum.

[...]

Jogo minha mochila em um canto do sofá e caminho até a cozinha onde o delicioso — só que não — almoço me esperava. Observo o corpo de minha mãe se movendo com graciosidade no pequeno espaço. Seus cabelos castanhos com algumas mechas estão presos em um rabo de cavalo e ela usa um avental de flores, parecendo muito contente com o seu dia e o resultado de mais uma guerra sua na cozinha.

— Oi, meu menino — ela deposita um pequeno beijo em meus cabelos quando me vê parado na porta — Como foi o seu dia?

— Bom — respondo o que sempre digo. Ellis concorda em um aceno e entrega-me o prato vazio — E o seu?

— Muito bom — responde alegremente e enche os copos de suco de laranja — Consegui fazer tudo o que queria e o seu irmão não me implorou mais para comprar aquela coleção de carrinhos.

— Ele está doido por eles — concordo sem interesse e sento-me em frente à mesa.

Ellis termina de preparar o seu almoço e arruma o meu prato como faz todos os dias. O silêncio na mesa depois que cheguei à adolescência ainda é perturbador. O barulho dos talheres batendo contra o prato e o barulho de nossas mastigações são algo difícil de enfrentar quando volto da escola e tenho que me sentar ali, como se tudo fosse lindo e perfeito.

— E a escola? — ela pergunta o de sempre enquanto seus olhos de gavião encaram os meus.

— Normal.

— E os amigos?

— Os melhores que eu poderia ter.

Minha mãe sorri amistosa e solta um suspiro, como se estivesse exausta de eu sempre responder suas perguntas do mesmo jeito.

— Não tem nada que queira me contar?

Engulo a seco e encaro o meu prato com arroz, alface e carne branca. Tem tanta coisa que eu gostaria de te contar, mãe. Eu queria poder te dizer que não tenho sido eu mesmo desde o ano passado. Que eu não tenho sido o filho perfeito — e talvez eu nunca seja. Eu queria te dizer que gosto de um garoto, e isso é errado. Porque, afinal, olhe para nós.

Olhe para dentro de você, mãe. Você jamais aceitaria.

Você jamais aceitaria as minhas escolhas.

— Não.

Ellis abaixa a cabeça e murmura um "tudo bem" e voltamos para o nosso almoço. Aquele almoço em completo silêncio que mostrava o quanto deixamos de ter uma relação familiar normal.

[...]

Depois de um almoço de semi-mudos, eu volto para o meu quarto e ligo o computador e torço por consegui terminar de ver o episódio de iZombie, já que alguém sempre conseguia me interromper. Enquanto espero o episódio carregar um pouco, percebo que o celular vibrava em meu bolso.

O nome de Peter brilhava na tela e suas mensagens chegavam rápido demais.

"Você não vai acreditar!"

“Daniel!”

“Pelo amor das batatas, me responda!”

“Alouuuu, ser humano de bosta!”

"O que aconteceu, CARAMBA?"

"De uma olhada no grupo da sala. Você vai adorar HAHAHAHA"

"Tá"

Abro o grupo da sala — 1ª SÉRIE B — que passou agora a se chamar "SHAWNIEL, MELHOR SHIPPER" e como ícone está àquela maldita foto que foi tirada no intervalo.

Abelhas, abelhinhas, vou matar vocês todinhas com minha faquinha.

Bufo com raiva e troco o ícone rapidamente, mudando o nome do grupo com agilidade e logo digito para todos:

"Parem com isso! Vou dar uma voadora na cara de todos vocês!"

Alguns desconhecidos — que eu não salvei o número — dão risada e logo o nome como o ícone voltam com tudo. Emito um muxoxo de desgosto e jogo o celular na cama, sabendo que seria impossível ganhar uma discussão com pessoas que tinham o cérebro do tamanho de uma ervilha.

E nessa pequena ervilha tudo envolvia apenas shippers e séries.

Jogo meu corpo na cama — ao lado do meu celular — e volto a encarar a foto do ícone. Como eu suspeitara a minha cara era de um bobão apaixonado e o sorriso de Shawn era escandalosamente bonito. Eu nunca o vira sorrir daquele jeito e fiquei feliz por saber que — talvez — eu fora o motivo dele.

Praguejo baixinho enquanto faço um ato que achei que jamais faria: salvo a imagem e a deixo lá em minha galeria, encarando todas as noites como um completo bobão apaixonado.

Porque era exatamente isso que eu era.

Foram aqueles olhos verdes com uma luminosidade diferente da comum que me fisgaram desde o começo. Foi aquele seu jeito de mexer no cabelo quando está nervoso que me chamou a atenção. Foi a sua risada descontraída que me fez perceber que você — talvez — significasse para mim bem mais do que eu achava. E, talvez, bem lá no fundo, eu tenha negado isso por tempo demais.

Eu sei tanta coisa de você, mas não sei o que sou para você.

Eu sei que você brinca com o coração das pessoas, que comete erros e que tenta se mostrar inabalável quando o assunto é sentimentos. Mas eu também queria saber; existe algo realmente bom dentro de você? Existe algo que realmente valha a pena? Exista algo que possa lhe fazer a pessoa certa para mim?

Claro que não. Porque eu também consigo ser errado para você.

Essa foto é uma prova disso. Seu machismo elevado é tão estressante que me pergunto como posso aguentá-lo. Como posso sentir além de afeto por você? Você pisoteou o meu coração tantas vezes e depois voltou com seu sorriso mesquinho e fingiu que os cacos que eu segurava entre meus dedos eram brinquedos.

Fingiu que aqueles cacos não poderiam te machucar. Fingiu que o meu coração quebrado era apenas mais um para a sua longa coleção. Fingiu que estávamos bem, mas na verdade estávamos desabando.

Desabando nesse abismo que é o amor.

Desabando em lágrimas.

Desabando em tristeza.

Desabando em meu próprio choro.

Eu choro por tantos motivos. Choro por cada palavra não dita, por cada abraço em final de tarde, por cada segredo compartilhado. Por cada momento que irá se apagar da memória. Por cada momento em que você está com seus amigos e não comigo. Por cada momento que fiz algo errado e não soube como consertar. Por cada momento sozinhos, por cada momento juntos. Por cada momento separados.

Por cada momento em que você me fez feliz e eu não fui capaz de perceber — e tampouco você.

E por esse momento. Esse momento gravado nessa fotografia. O meu amor exibido em uma fotografia que você também vai esquecer.


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Notas finais do capítulo

E então? O que acharam ? O que dizer dessa foto que já lacrou na Parte Um e agora está fazendo a cabecinha do nosso menino Boone? E a interação Kian e Raven, o que esses dois tanto se cutucam? Para variar os grupos do Whats fazendo caos KKKKK

Esperamos que vocês tenham gostado, e não deixem de comentar! A gente adora ouvir vocês.



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