Lá E De Volta Outra Vez escrita por Pacheca


Capítulo 8
Dias Cinzentos


Notas iniciais do capítulo

Aproveitei que ontem não consegui postar e escrevi mais esse :) Aproveitem :3



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Rosalya me passou seu número naquele dia, oficializando sua nova amizade. E eu estava bem feliz de não ser mais só eu e Nathaniel. E de ter uma amiga mulher agora. Bom, além de Iris também.

Quando o dia de aula estava encerrado, eu deixei meu material no armário e fui atrás de Lysandre. Ele estava no jardim, como eu imaginei. Peguei a folha dentro da mochila e, um pouco ansiosa, fui falar com ele.

— Oi, Anna, eu posso ajudar?

— Quase isso. Eu fiquei meio embasbacada com sua facilidade em escrever o poema e tentei imitar em parte o feito. Não foi inveja, eu juro, é só que...Enfim, eu demorei cinco minutos marcados nisso. E já que eu li o poema, nada mais justo do que você ler meu texto também. – Estendi a folha, sem jeito. Sinceramente, por que eu não podia só parar de enrolar e falar o que eu queria de primeira?

— Oh, tudo bem. – Ele pegou a folha e, em silêncio, correu os olhos heterocromáticos pelo texto. E eu fiquei esperando uma opinião, ansiosa. Não sei bem porque eu quis que ele lesse, mas não questionei. – Encarava a vastidão do céu estrelado esperando enxergar em todo aquele azul pontilhado a insignificância que imaginava ser, e no entanto acabou se percebendo tão imensa quanto a noite.

— É, esse trecho é um pouco clichê, mas...

— É bonito. Muito.

— Bom, é. Obrigada. Fico feliz que tenha gostado.

— Ficou muito bom.

— Ótimo. Hum, obrigada. Eu tenho que ir. – Ele estendeu a folha, mas eu rejeitei, sem graça. – Pode ficar. Tchau.

Quase corri para me afastar de Lysandre e da vergonha que eu acabara de passar. Bem, ele gostou, então não sei bem se foi mesmo tão vergonhoso, mas ainda assim corri.

— Parece que está fugindo da polícia, garota. – Castiel riu, soltando a revista que lia. O que aquele menino tanto lia? Roadie Crew?

— Não, eu só...nada. – Dei de ombros, sem saber se encerrava o assunto ali ou se tentava continuar. – Eu...

— Você não precisa se forçar a manter um relacionamento amigável comigo. – Ele falou, pegando os fones.

— Você fala como se eu é quem não quisesse e não você que fica me tratando feito cachorro.

— Não te trato feito cachorro.

— Eu tenho biscoitinhos pra cachorro no meu armário em casa porque ALGUÉM me fez pagar por eles.

— Eu estava brincando. – Ele tentou se defender, ao que eu rebati.

— Meu dinheiro não era de mentira, não.

— Sem graça, quer seu dinheiro de volta? Não preciso...

— Eu também não, só estou te provando que você não me trata bem.

— Ok, entendi. Esquece.

— Você me deixa muito confusa. Tudo bem, eu continuo a tentar fazer essa missão impossível de tornar Castiel um rapaz adorável e que goste de mim.

— Não gaste tempo à toa.

— Agora é por honra, pode deixar. – Revirei os olhos e fui atrás de Nathaniel, no grêmio. Abri a porta num empurrão, assustando o representante.

— O que foi?

— Castiel é um bosta. Ele me trata mal e depois fica se fazendo de vítima.

— Você fala com ele?

— Garoto, escreve ai, eu ainda ponho ele pra ser meu amigo. E um amigo agradável. – Resmunguei, colocando as mãos na cintura. Nathaniel concordou, rindo.

— Boa sorte, mas é melhor começar a praticar magia negra.

— Ele me deixa nos nervos. Irritante. Eu nunca falo com ele e quando falo, fico irritada. – Respirei fundo, vendo Nathaniel guardar o livro que lia e pegar a mochila. – Quer ir lá para casa?

— Hoje?

— É. Não quero ficar lá sem fazer nada o dia todo, esperando o dia passar. Por favor.

— Seus pais estão em casa?

— Não sei se minha mãe vai estar, mas meu pai ia resolver alguns detalhes da loja em casa mesmo. Você vem?

— Sim, pode ser. – Ele concordou, me empurrando pelos ombros escola afora. O caminho até minha casa foi animado, relembrando o dia em que ele tentara subir em uma árvore e acabou pendurado pela perna num galho, de cabeça para baixo.

— Hey, pai. Lembra do Nathaniel?

— Sim. Você está crescido, garoto. – Ele tirou os óculos e estudou a figura do menino ao meu lado, sério. – Realmente, cresceu bem.

— Não mudou muito, senhor. – Nathaniel comentou, aparentemente sem graça. Meu pai deu um sorriso.

— Garoto, venha cá. – Ele ficou de pé e abriu os braços. Meu pai era quase um tio para Nathaniel. – Fico feliz em te ver assim. Mais responsável.

— Os puxões de orelha deram certo, Phillipe. Obrigado. Tia Lucia está em casa?

— Não, ela ainda não chegou, deve voltar logo. – Meu pai murmurou, limpando os óculos na camisa.

— Bem, vou subir para o quarto. – Falei, pegando Nathaniel pelo braço. – Se precisar, me chama...

Nathaniel podia ser quase um irmão e ter vivido dentro da minha casa no passado, mas assim que eu pronunciei a palavra quarto, notei que meu pai não ficou satisfeito. Ficou um pouco nervoso, na verdade. Ignorei o ciúme bobo dele e arrastei o amigo comigo escada acima.

— Prepare-se para entrar no melhor quarto do planeta. – Empurrei a porta e deixei ele entrar primeiro. Ele olhou a parede, impressionado. – Não é incrível?

— Sua mãe fez isso? – Ele perguntou, segurando a cortina azul da janela. – Só faltava escrever seu nome pelas paredes.

— Não é? Ficou incrível. E eu só precisei arrumar as roupas no armário. Ela colocou tudo nos lugares.

— Ainda tem a gaveta?

— A última delas. – Comentei, pegando a calça de moletom azul e uma camiseta preta. – Espera ai, eu vou trocar de roupa.

— Ok. Vai lá. – Entrei no banheiro e me vesti, bem mais confortável que os jeans. Quando voltei para o quarto, Nathaniel estava com uma foto em mãos. E eu sabia exatamente qual. A de nós três.

— Hoje pela manhã eu acordei e olhei para essa. – Apontei por cima de seu ombro. – E eu fiquei me sentindo tristonha, até me distrair com a briga de casal da Rosalya.

— Eu sei. Em alguns dias eu acordo e eu tento entender se não é mentira. Dói em mim também.

— É. Bom, deixa isso ai. Sem depressão hoje. – Tomei a foto e a deixei sobre a cômoda. Ele sorriu e se sentou na minha cama, tentando tirar de si o peso que a foto deixara nele.

Apesar do pequeno momento de depressão, a tarde correu bem. Minha mãe chegou pouco depois de nós, com um bolo da padaria para lancharmos. Ela ficou tão feliz em ver Nathaniel que ele se sentia em casa de novo depois de quinze minutos.

— Tinha tanto tempo que eu não te via, fico feliz em te ver tão bem. – Minha mãe segurou a mão de Nathaniel e sorriu. – Outro dia eu estava revendo umas fotos, de vocês pequenos. Fiquei com saudades.

— Senti falta de vocês também. Fico feliz que estejam aqui. – Ele olhou o relógio do celular e, pedindo licença, ficou de pé. – Preciso ir, tenho que voltar pra escola. Te vejo amanhã?

— É, claro. – Concordei e o levei até a porta, depois de buscar a mochila lá em cima. Ele se despediu e foi embora.

Subi para o quarto, calada. Peguei a foto que ele tinha pegado e a estudei, com um sorriso fraco. Minha mãe bateu na porta e entrou, séria.

— Continua tristonha. Quer conversar? – Ela perguntou, preocupada. Minha mãe sempre sabia tudo de mim, mesmo o que eu não contava. E eu contava tudo para ela.

— Não tem sobre o que conversar. Não é algo que eu consiga me desfazer por simplesmente botar para fora. – Suspirei e deixei a fotografia de lado. Ela suspirou. Fui me sentar ao seu lado na cama. – É só um vazio imenso, uma tristeza sem fim e uma dorzinha chata.

— Ah, meu bem. Se eu pudesse te livrar disso tudo, era o que eu faria. E me livraria junto. O que importa é que ainda temos uma a outra. E ao seu pai. – Sorri, segurando sua mão.

— Ele te amava muito. A todos nós. – Comentei, suspirando. – Bom, a vida continua, não é? Hoje foi só um dia triste. Amanhã vai estar tudo bem.

Ela concordou, sorrindo. E eu sorri de volta, abraçando-a. Ela chorava, soluçando ocasionalmente. Eu nem deixei minhas próprias lágrimas caírem, dando aquele abraço de apoio.

Os dias passaram e meu humor melhorou. Infelizmente, quando eu achei que estava extremamente feliz, o dia teve que começar mal. A primeira voz que ouvi foi a de Ambre.

— Aproveitou seus dias sem mim? Deve ter sido difícil...

— Podia ficar mais alguns dias sem você. Deixa eu ver, acho que uns três anos devem dar. – Ela fechou a cara e eu sorri. Não ia deixar ela arruinar meu dia. – Posso ajudar?

— Não vai ficar barato, garota. O que é seu está guardado.

— Se puder me enviar com umas balinhas no pacote eu agradeço. Licença, tenho mais o que fazer. – Passei por ela e fui para o pátio, respirar um pouco do ar puro.

No horário de aula, Faraize ia nos ensinar como funcionava um censo. Cada um ia ter que perguntar para sua dupla os dados solicitados na pesquisa. Meu plano era ir com Nathaniel, que eu já sabia basicamente tudo, mas acabei ficando com Castiel.

— Fala, chata. – Ele largou a mochila no chão e se sentou, pegando a caneta para anotar minhas respostas. – Quem começa?

— Eu pergunto antes. – Respondi, pegando a caneta na sua mão. – Obrigada. Começando...Nome completo, idade, data de nascimento...

Castiel me encarava fixamente enquanto eu ia anotando as respostas nos espaços em branco da folha impressa. Tudo muito normal, até a parte das perguntas domiciliares. Perguntei quantos moravam com ele e ele disse que morava sozinho.

— Sozinho? Seus pais não moram com você?

— É o que sozinho significa. – Ele resmungou, ajeitando o cabelo. – Sou emancipado.

— Eles trabalham fora?

— Viajando, os dois. Piloto e comissária de bordo. Agora, quer acabar logo? Precisa me responder também.

— É, desculpa. – Comentei, acabando de escrever as últimas respostas e devolvi a caneta, esperando ele começar o questionário. Era igual ao meu, então eu nem esperava ele perguntar, para adiantar.

— Calma ai, eu parei em família. – Olhei em qual das perguntas ele tinha parado e notei que ele tinha uma letra até bem desenhadinha, apesar de meio inclinada. – Irmãos ou filha única?

— Única. – Ele continuou anotando, encerrando a sessão de perguntas e respostas. Ele tomou a iniciativa de ir entregar as folhas, voltando a se sentar e colocando os fones.

Fiquei olhando o cabelo avermelhado dele, esperando ele notar que estava sendo um babaca, mas ele já estava no seu mundo, trancado lá. Peguei meu caderno e passei a escrever trechos aleatórios. Nunca achei que ia me sentir sozinha ao lado de um menino que eu nem conversava direito. Eu só meio que esperava já estar derrubando a barreira do “estranhos” e estar entrando no “quase amigos”.

— Hey, garota. – Rosalya veio se sentar ao meu lado na hora do almoço, puxando uma das cadeiras vazias. Nathaniel tinha que organizar uma papelada nova, então não ia almoçar. Ou seja, eu estava ali largada. – Sozinha?

— É, Nathaniel está ocupado. – Comentei, cutucando uma batatinha com o garfo. O dia parecia tão...triste.

— Ei, não é o fim do mundo. Eu fico com você. – Ela murmurou, começando a comer sua salada. Sorri de leve, um pouco melhor. – Hum, aproveitando a deixa, você e Nathaniel são bem próximos, sim?

— É, a gente se conhece faz um tempo. Tipo, algum tempo, muito.

— Vocês se conheceram fora da escola, então? Porque você é novata, eu achei que, sei lá...só rolou uma química muito forte.

— Não. – Ri, sem surpresa nenhuma. Até minha mãe cismava que eu e Nathaniel éramos um casal escondido. – A gente era muito próximo quando criança, eu morava aqui. Ai eu me mudei, passei alguns anos fora, voltei agora. Por isso essa proximidade.

— Então são amigos de infância? – Ela perguntou, ao que eu simplesmente confirmei com a cabeça. – Bom, quanto tempo ficou fora da cidade?

— Três anos, por ai. – A conversa fluiu daí e minha tristeza repentina foi embora tão rápido quanto ela chegou. Fomos juntas para a próxima aula, falando de quão felizes ela e Leigh estavam.

Os horários iam passando tranquilamente, e eu ia dividindo minha atenção entre as falas do professor e as frases que eu escrevia no caderno. Minha cabeça começou a doer. Respirei fundo e tentei ignorar a sensação pontiaguda acima dos meus olhos.

— Anna. – O professor me chamou depois de alguns minutos e eu só consegui olhar para ele em resposta. – Tudo bem, querida? Está um pouco pálida.

— Estou, é só dor de cabeça. – Comentei, respirando fundo. Realmente, eu estava começando a sentir um calor descontrolado, suava muito.

— Deveria ir até a enfermaria, só por precaução. Nathaniel, poderia...

— Claro. Vem. – Ele ficou de pé e me pegou pelo braço, com medo de que eu caísse. E sábia decisão. Minhas pernas pareciam gelatina. – O que foi?

— Deve ser a pressão. – Comentei, sentindo o enjoo que subia pelo meu peito.

— Ainda tem as quedas repentinas? – Concordei, enquanto ele me sentou numa cadeira e chamou a enfermeira.

— Não estou tão mal.

— É, o bronzeado de defunto está super na moda, concordo. – Ri, sentindo as fincadas na cabeça. – Ai.

— Posso ajudar? Opa, você parece mal. O que foi? – A enfermeira, mulher baixinha e de sorriso simpático, pegou um aparelho para medir minha pressão.

9/5. Aquilo era a pressão arterial de alguém que morreu século passado, se monitorado na atualidade. Ela checou minha temperatura também, abaixo do normal.

— Vamos fazer assim. Você vai na cantina e vai comer algo bem salgado, depois vai correr ao redor da quadra e voltar para sua sala. Podem ir. É só a pressão mesmo.

— Ok, obrigada. – Murmurei, deixando Nathaniel sustentar mais de metade do meu peso. Ele me levou até a cantina e me comprou um daqueles salgadinhos sabor ataque do coração. Comi o pacote quase todo e fui dar a tal volta.

— É correndo. – Ele riu, me puxando com ele. Eu estava com tanto sono que achei que ia cair e ficar por lá mesmo, dormindo. Seria um sonho, se Nathaniel deixasse. – Anda, lesma.

Grunhi, acompanhando seu ritmo. Podia não ser confortável e ter feito minha cabeça doer mais ainda, mas pelo menos aquela bambeira passou e eu consegui me sustentar.

— Bom, vamos voltar para a aula. Rápido. – Falei, pensando no quanto eu já tinha feito Nathaniel perder da aula.

— Relaxa. – Ele falou, dando um sorriso e levantando meu rosto para poder me avaliar. – Melhor?

— Uhum. Para de querer matar aula, vamos. – Ele riu, me acompanhando de volta para a sala. Assim que atravessei a porta da sala de novo, vi Melody nos olhando. Verdade que demoramos um pouco, mas senti que era mais ciúmes que preocupação. Ignorei e fui pro meu lugar.


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Notas finais do capítulo

Até mais :)



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