O Mestre da Batalha escrita por Psycho Ray


Capítulo 1
Prólogo




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Ray sempre quis ter uma barba respeitável.

Era um pensamento bobo, claro. Um detalhe inerte ao mundo à sua volta, mas que lhe trouxe alegria e satisfação em níveis inimagináveis. Ray também escolheu olhos verdes, outro detalhe que lhe falhara na genética da vida real, mas não falharia nesse mundo.

Detalhes.

Entretanto, a experiência fora muito diferente da criação de um personagem em qualquer outro MMO, ou mesmo outro jogo. Neles, um personagem era apenas um boneco na tela. Aqui, cada detalhe podia ser visto em si mesmo, ser sentido em si mesmo. Tocou os curtos, mas abundantes fios que desenhavam-lhe a face.

Detalhes.

Ray nunca se incomodou em tentar ocultar ou mudar sua essência. Pelo contrário, orgulhava-se de todos os principais aspectos de sua existência, mas duas eram suas lamentações: as limitações de uma vida desprovida de aventuras e os tão inoportunos detalhes. Ray amou-os por toda a vida, mas aprendeu a odiá-los após ouvir Kayaba citar, explicar, argumentar e palestrar infinitamente sobre o impacto de cada detalhe até que a palavra começou a lhe causar náuseas, mesmo sendo o perfeccionista metódico que era. Kayaba simplesmente estava sempre em outro nível, até para Ray.

Secretamente, como um confeiteiro que diz estar enjoado de doces, Ray nunca deixaria de lado sua característica mais admirada. Principalmente após ver os resultados do Projeto Aincrad. Agora ele entedia o porquê. Compreendia cada palavra de Kayaba, muito mais do que quando pensava compreender. A forma como pássaros e outras criaturas aladas voavam, os sons sinfonicamente aleatórios à sua volta, o farfalhar da grama e das árvores, a sombra perfeita de toda e qualquer forma, e o vento. Vento! Era impressionante, inacreditável. Uma maravilha, não, um milagre tecnológico onde quer que olhasse. O efeito maravilhoso da junção de cada recurso digital possível e em versões optimizadas, todas impulsionadas pelo Cloud Computing redesenhado especialmente para Sword Art Online.

O mundo ao redor de Ray era tão real quanto seus sentidos poderiam dizer. Só que... era melhor. Uma realidade na qual lutas e habilidades, heróis e monstros, aventuras e missões verdadeiramente existiam.

Era clichê.

Era clichê, era clássico, era mais do mesmo bom e velho RPG que Ray amou sua vida toda, e não importava se o tema já havia sido tão explorado ao ponto de se tornar repetitivo.

Mas, pela primeira vez, era real.

Ou tão real quanto jamais seria. Os limites da tecnologia haviam sido alcançados — ou talvez fosse o nascimento de novas possibilidades além de sua imaginação. Ray não sabia, Ray não se importava. Todos os detalhes haviam sido arrumados, maldito seja Kayaba!, e mesmo a limitada realidade de sua vida há muito fora esquecida.

Deixou o instinto tomar conta, e esquivou de mais uma investida furiosa do pobre javali. Deveria se concentrar mais em sua luta, sem dúvida, ou talvez devesse ter absorvido toda a nova realidade antes de procurar qualquer luta, mas como poderia? Ele conhecia cada movimento da criatura que agora corria em sua direção, e finalmente testá-los pessoalmente era simplesmente seu dever moral.

Ray também conhecia extremamente bem a habilidade que usaria a seguir. Era a habilidade mais básica de SAO, disponível desde o nível 1. Causava uma quantidade razoável de dano, que aumentava conforme o momentum de cada envolvido. Era um conceito de física que Ray gostava de simplificar para os leigos dizendo:

— O dano aumenta conforme a força da porrada! — era extremamente eficaz.

Conhecendo tão bem a skill, seu plano havia sido preparado há tempos, quase sem Ray perceber, e ele apenas esperava preguiçosamente o momento de agir. Observando o javali, a criatura hostil mais fraca de Aincrad, Ray estudou com tranquilidade o avanço da criatura e investiu contra ela firmemente segurando sua espada atrás de sua cabeça, esperando a habilidade ser reconhecida e ativada. Assim era o sistema — bastava se mover para a posição inicial da habilidade e, em alguns casos como esse, escolher o momento de liberação.

Ray sincronizou a liberação da habilidade com o momento da colisão. Como resultado, o golpe foi certeiro, sem dúvida perfurando o coração e acumulando preciosos bônus por velocidade e precisão. Ray também antecipou o ataque do animal antes do choque, mudando levemente sua trajetória para evitar qualquer dano.

Entretanto, Ray tinha plena consciência de que seu ataque não seria o suficiente para matar o mob, mas sem dúvida o deixaria com uma quantidade mínima de vida, bastando acertá-lo novamente com qualquer coisa. Assim, girando o corpo em pleno ar antes mesmo que o animal terminasse seu primeiro grunhido, Ray lançou sua espada para um golpe final pouco efetivo, mas simplesmente espetacular.

Exp: 24

Col: 30

Loot: Presa de Javali, couro de javali.

As lutas nos níveis iniciais de SAO eram simples para aqueles que conheciam a mecânica de combate. Como o primeiro mob de Aincrad, sua recompensa era mínima: A presa, Ray venderia a NPCs por alguns trocados. O couro seria útil apenas se transformado em outros equipamentos básicos, o que também não valeria a pena em pequenas quantidades. Somando tudo, um javali pagaria um pão ou alguma bebida barata, embora Ray não pudesse ter certeza. A experiência era relevante apenas porque pouca era necessária para alcançar o nível 2.

Ray observou o cenário mais uma vez. Estava ao pé de uma pequena plataforma de obsidiana surrealmente sustentada por uma espiral de mesmo material. Ou pelo menos parecia obsidiana, mas a do mundo real não era tão resistente, Ray se lembrava. Não muito longe, observavam-se outras plataformas idênticas, mas com diferentes estruturas no topo. Avistou uma com grandes e numerosas rochas, outra coberta por muitas árvores, formando uma vegetação bastante densa. Em pelo menos duas, observou baús, e em quase todas haviam javalis em variadas quantidades. Também viu uma casa, na qual provavelmente existiria um NPC que levaria a alguma quest.

Abrigando todas as plataformas próximas, estava uma gigantesca planície verde decorada por flores, pequenas rochas e árvores escassas. Mobs neutros e hostis exploravam a área e ocasionalmente lutavam contra algum herói destemido ou noobs que ousavam lhe incomodar.

Numa dessas lutas, Ray viu um jogador acabar levando a pior contra um javali ao tropeçar em uma pedra. Para um video game, a ideia de um jogador tropeçar em uma pedra enquanto batalha para se provar aventureiro era simplesmente hilária, e os três jovens que acompanhavam o garoto caíram na gargalhada tanto quanto Ray ao ver o espadachim loiro e de porte físico avantajado se transformar em pixels — ou, como Ray, de maneira debochada, gostava de chamar, PDD, Purpurina Digital da Derrota — e desaparecer ao vento.

Voltou sua atenção à escada em espiral diante de si. Estava ansioso para abrir o baú localizado poucos metros acima de sua cabeça. Infelizmente, Ray sabia que já estava atrasado para a faculdade, e que SAO teria de esperar por mais algumas horas. Faltaria sem pensar duas vezes, não fosse a importante prova prestes a ser aplicada. Por sorte, tomara banho antes de logar, então não precisa se preocupar com nenhuma outra coisa que pudesse tomar seu tempo.

Relutante, abriu o menu e procurou o botão para desconectar...

...Mas não encontrou nenhum.

No lugar onde deveria existir um botão, estava apenas o ícone de desconectar decorando um botão sem nenhum texto e absolutamente inerte. Apesar da surpresa, Ray rapidamente creditou o ocorrido a um evento de inauguração. Claro, algo revolucionário quando o lançamento de Sword Art Online, não poderia deixar de realizar uma cerimônia tão importante, chegaria a ser desrespeitoso. Curiosamente, Kayaba nunca mencionou qualquer coisa do tipo, mas ter um evento surpresa não seria uma ideia absurda.

Porém, impedir todos os jogadores de se desconectar pareceu algo totalmente desnecessário para Ray. Decidiu então voltar à Cidade Inicial para aguardar o fim do evento, além de fazer uma anotação mental para xingar Kayaba repetidamente por fazê-lo perder um compromisso tão importante. Mesmo assim, aquilo o deixava inquieto, perturbado. Talvez algo no fundo de sua mente gritasse sobre o gênio responsável por Aincrad, principalmente porque Ray não conseguia entender as ações de Kayaba nesse momento. Ray esperava algum tipo de anúncio antes mesmo da inauguração dos servidores, talvez dias antes, sobre o evento de abertura.

Se ele queria um evento surpresa, pensou Ray, seria melhor avisar todos os jogadores em vez de prendê-los ao jogo. Algo simples, como "Hey, teremos um evento, não deslogue a menos que seu semestre dependa disso!", porra.

De qualquer modo, não precisou andar mais que alguns minutos. Pouco depois de derrotar, não, assassinar outro javali, Ray foi envolvido por uma estranha luz azul que parecia consumi-lo, como se estivesse em chamas.

No momento seguinte, estava no centro da cidade.

Teletransporte forçado. Aposto que não estou sendo promovido.

Agora casas e muros bloqueavam sua visão da gigantesca planície onde estava momentos antes, embora ainda pudesse enxergar, ao longe, o topo de algumas plataformas. Ao seu redor, milhares de pessoas se aglomeravam na praça central e murmúrios inquietos acumulavam-se para gerar um barulho caótico e desesperado, como abelhas em uma colmeia em chamas.

Aah, então Kayaba finalmente nos convidou para sua festinha. Apenas espero que ele não descubra que estou aqui.

Logo, entretanto, todas as vozes foram silenciadas quando uma gigantesca figura envolta em roupas vermelhas se materializou em pleno nada e pairou sobre a multidão. Um Mago Carmesin, como Ray costumava chamar os GMs. Porém, se o tamanho fosse qualquer indicação de poder, o Mago Carmesin em questão só poderia pertencer ao ser com os maiores poderes de moderação de Aincrad. Numa categoria única e exclusiva de God, Kayaba detinha poderes e direitos para fazer absolutamente tudo o que quisesse dentro de Sword Art Online.

Ray nunca escondeu sua curiosidade sobre o título escolhido pelo gênio à sua frente, e neste momento sua curiosidade se transformou em medo, um tipo único de medo em que todas as peças às quais Ray nunca havia dado qualquer atenção começavam a se encaixar. Uma premonição.

Mesmo sem saber exatamente o que aconteceria a seguir, Ray era capaz de sentir cada discurso de Kayaba, cada momento, cada vez que seus olhos brilhavam ao falar de SAO. Tudo agora tomava um novo sentido para Ray.

God. Deus.

As palavras que ouviria a seguir mudariam sua vida para sempre.

E Ray não estava gostando desse clichê.


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Notas finais do capítulo

Yo, espero que tenham gostado do prólogo, e esperem por muito mais de Ray, já que no próximo capítulo SAO deixa de ser um jogo e a coisa fica séria, embora eu deva lembrá-los de que esse jogo é fatal desde o primeiro momento, e quem já morreu, morreu mesmo =/
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