Pétalas de uma semideusa escrita por Paper Wings


Capítulo 5
Cap. 4: O Acampamento Júpiter


Notas iniciais do capítulo

Geente, voltei! Não deu para postar ontem, mas aqui estou agora. /
Primeiro de tudo, obrigada pelos comentários. ~me deixa extremamente feliz~ E um obrigada especial à Phaella, que recomendou a fic. Sério, cada palavra fazia meu sorriso crescer mais e mais. Juro que estava mais feliz que o treinador Hedge quando deixam ele dar umas pancadas em monstros desafortunados. E quando comparou minha escrita ao do Tio Rick, então? Já estava morrendo. Amei demais.
Segundo, espero que gostem do capítulo. Boa leitura.



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Ok, eis minha opinião sobre viajar pelas Sombras, sobre a qual alerto todos que são inteligentes, vivendo em sã consciência: de preferência, passo, e, se obrigarem, fujo para as montanhas. Eu nunca mais queria dar uma de ser sobrenatural que fica zanzando por aí, ao som de murmúrios depressivos e gente chorando sobre causas perdidas. Um fato? Se você não vomita suas tripas ou não fica simplesmente com um considerável tempo de mau-humor, apenas remoendo algumas pequenas partes compreensíveis durante o trajeto, você pode entrar em um colapso devido a esse simpático passeio. Foi o que descobri quando estávamos no meio do caminho, quase no tal Acampamento Júpiter.

De início, senti uma pressão gradativa sobre todo o meu corpo, como se tentassem me comprimir até eu virar um puro nada, desaparecendo do universo, porém, pensei ''Imagina, às vezes sou tão neurótica... Eu estou viajando pelas Sombras, quais são as chances disso acontecer?'' Bom, altas pelo que descobri depois. É claro, se minha vida já havia se transformado em uma novela mexicana, por que não desmaiar também, certo? Para entrar no clima, somente isso.

Processando mais tarde, considerei minha negligência sobre o assunto, pois, na realidade, eu deveria parar de imaginar minha neurose como um problema, e sim, como uma qualidade. Admitir isso era um pouco difícil, já que, certa vez, em um ''importante'' questionário da escola, escrevi que meu superpoder era minha habilidade de ser uma ''cagona''. Digamos que meus pais não ficaram satisfeitos com meu ilustre vocabulário e fiquei um mês escutando que ter pensamentos vacilantes — palavras de minha mãe, Amalia — não era exatamente bom, por exemplo, ao tentar arranjar um emprego. Era uma selva cheia de neandertais, cada um por si, viva e trabalhe quem puder, ou seja, pegue seu taco de baseball e não hesite em mandar seu concorrente para fora da órbita terrestre. Ah, melhores pais do ano, certo? Tome ela como uma mulher desempregada e com os nervos à flor da pele...

Lembro, então, de reclamar que justamente por ter ''pensamentos vacilantes'', não experimentei drogas no muro atrás do colégio, não falei para uma patricinha que ela estava usando um par de sapatos diferentes em cada pé... Acredite, virou moda na escola em alguns dias e a amiga dela, a qual tentou alertá-la, teve de pedir transferência porque sua vida havia se tornado um inferno na terra.

Eu realmente estava considerando escrever um livro de autoajuda: ''Problemas de neuroses? Abrace-as ao invés de suprimi-las". Talvez fizesse sucesso. Quem sabe?

Bom, após a sensação de estar sendo desfeita aos poucos, como quando assopramos a capa de um livro empoeirado e o pó desaparece pelo ar, exceto que, no caso, eu estava desaparecendo pelas sombras, uma extrema tontura surgiu e passou a martelar minha cabeça e eu nem entendia mais para aonde íamos, somente continuava a acompanhar o passo do garoto, tentando ser mais forte do que aparentava. A esse ponto, os sussurros decadentes pareciam rir de mim, caçoando da minha incapacidade de agir de acordo com meu real parentesco.

Nico não notou meu estado, e infelizmente percebi que minha voz não estava saindo de maneira alguma para ver se havia a mínima chance de pararmos um pouco para descansar. Eu abria a boca e fazia uma força extrema para qualquer som sair, mas o resultado era murmúrios de desconhecidos por cima de mim, portanto, nada legal. Assim, sem qualquer outra opção, obriguei meu corpo a seguir em frente, tentando acreditar que estávamos quase lá, que logo tudo iria parar e aquele misto de euforia, medo e desespero iriam embora e as coisas melhorariam instantaneamente.

Finalmente, quando minhas pálpebras queriam fechar pelo esforço de me manter em pé, surgimos em um ambiente bem iluminado, com uma relva verde que se misturava a um tom quase dourado, e uma brisa quente e bem densa. Dei uma volta cambaleante no mesmo lugar, ainda tonta, e enxerguei um rio, com a água brilhante, seguindo pela correnteza até uma curva, onde não pude mais ver ser destino pelo desnível do solo. Vislumbrei, enfim, ao revirar os olhos, quase desfalecendo, um navio estacionado no... Ar?

A próxima coisa que senti foi uma série de leves batidas na minha bochecha e uma voz um pouco desesperada. Pisquei lentamente sem ver direito, pois os raios do Sol tentavam me cegar e estavam conseguindo ao que parecia. Eu estava caída no chão de pedra e Nico e seus cabelos negros vire e mexe faziam sombras em mim, cobrindo a estrela fulgurante.

— Lorelai! — Sua voz saiu em um guincho. — Consegue me ouvir?

Grunhi, incomodada com a mochila em minhas costas. Eu deveria ter sido premiada em alguma agência de macumba para ter a capacidade de ganhar tanta porcaria, porque não era possível. Da primeira vez que caminhara pelas Sombras, apenas vomitei. Vomitar era normal, até aceitável, não é? Já desmaiar era outra história, exalava fraqueza.

Eu sentia, acima de tudo, raiva de mim, beirando a decepção. Tinha feito um juramento de tentar meu melhor para ajudar os semideuses contra a Mãe Terra da pesada, porém, eu só via uma nova-iorquina que não sabia o que fazer com a vida. Literalmente uma pessoa bem perdida.

— Por quê? — Indaguei em um resmungo. — Por que isso aconteceria?

di Angelo parecia fazer a mesma pergunta a si mesmo, ao me ajudar a levantar. Ele mantinha um semblante extremamente sério, como se meu desmaio fosse sua culpa de alguma forma e ele estivesse repassando tudo que imaginou antes de nos jogar dentro das Sombras, à procura de seu erro.

— E-eu não sei. — O jovem gaguejou, confuso. — Talvez a distância tenha sido muito para suportar.

— Por acaso estamos no Texas? Viajamos metade do país? — Dei um leve riso anasalado. — Eu nem sei onde era o outro acampamento, então, fica difícil fazer suposições...

O garoto continuava me apoiando, caso meu corpo decidisse beijar o chão novamente. Era até fofo, vê-lo todo preocupado, pois a tal criança perdida, a qual tinha um importante papel havia acabado de ter um colapso, porém eu não poderia deixar de pensar que havia a possibilidade dele não ter culpa alguma naquilo.

— O Acampamento Meio-Sangue é em Nova Iorque. — Revelou. — Estamos em Oakland Hills, Califórnia.

Suspirei. Claro que tínhamos atravessado o país inteiro. Isso fez eu me sentir um pouco melhor, já que eu era novata no assunto, e não era a minha obrigação ainda conseguir viajar uma distância tão grande pelas Sombras. Para isso eu teria que comer duas ceias de Ação de Graças para ficar, no mínimo, satisfeita durante o trajeto, pois normalmente eu era uma pessoa bem esfomeada, e foi aí que lembrei de um pequeno detalhe: comida.

Eu me odiaria eternamente se ele culpasse a si mesmo quando, na realidade, eu era a responsável. É claro, só poderia ser... Associada aos quilômetros e quilômetros de um emocionante passeio, recheado de murmúrios, ao pouco que havia comido, estava bem evidente a causa do meu desmaio.

— Ahn... — Iniciei meio envergonhada. — Falta de energia é um fator plausível?

Lentamente, Nico tirou os olhos dos próprios sapatos, ligando os pontos. Era um olhar meio assassino, igual a pais zangados, que fez eu imaginar o garoto soltando-me de cara no chão e dizendo ''Se vira, idiota''. Eu até mereceria isso, porém, se eu pudesse impedir uma segunda estatelada naquele piso de pedra, eu ficaria muito, mas muito, agradecida.

— Você não comeu?

Seria muito mais fácil se ele não utilizasse aquela voz rouca e comedida, repreendendo-me obscuramente por minhas escolhas, de maneira quase adulta.

— Ah, eu comi aquela maçã ao sair do Acampamento, lembra? — Balbuciei. — Quero dizer, metade daquela maçã...

Ele tinha uma expressão raivosa, misturada a um pânico do que poderia ter acontecido de pior, e isso estava deixando-me ligeiramente assustada. E se eu virasse mesmo um mero nada no universo?

— Ontem à noite! — Queria questionar mais. — Você comeu ontem à noite?

Cerrei os dentes em uma careta, prevendo sua reação.

— Eu comi metade de uma maçã também... — Dei um sorriso amarelo. — Resultado? Uma maçã inteira.

di Angelo continuava sério demais.

— Obrigado. — Falou, sarcástico. — Fico muito aliviado que saiba matemática...

Não deu tempo para continuar com meu sorriso, porque o adolescente mudou drasticamente sua expressão e tom de voz. Uma veia saltou em sua testa e seus olhos ficaram mais uma vez com um tom sombrio, quase negro, e travou o maxilar como se estivesse preso em uma dolorosa e difícil lembrança.

— Não é tão ruim... — Tentei amenizar a culpa sobre mim para deixá-lo menos nervoso. — Veja só, se...

— Não é tão ruim? — Ele repetiu, agressivo. — Não é tão ruim? Justamente por você comer somente uma maçã em um período tão grande de tempo, seu corpo corria o risco de se perder pelo caminho! Transformando-se em apenas vestígios da pessoa que uma vez existiu. Tem ideia disso? Lorelai, você viraria Sombras de quem realmente era!

Então, a sensação de estar sendo desfeita era real. Eu poderia ter morrido de um jeito terrivelmente memorável: ''E a criança perdida, a caminho do Acampamento Júpiter, faleceu nas Sombras por comer abaixo do adequado'', e tudo teria sido minha culpa. Ou não? Afinal, eu não sabia informações algumas sobre como trafegar naquele estranho lugar, não havia um guia de normas e condutas a mão.. Como eu poderia ter consciência do que aconteceria comigo se eu comesse uma maçã? Mesmo a escuridão e os sussurros sofridos já dizendo bastante coisa, referente aos perigos, não havia como eu ser a única responsável. E eu não seria...

— Abaixe o tom de sua voz, Nico di Angelo! — Tentei colocar um aborrecimento extremo em minha voz, mesmo ainda sentindo fraqueza. — Você simplesmente me empurrou do ninho e ordenou ''Voe ou morra tentando'', ou seja, você tem tanta culpa no cartório quanto eu, portanto, trate de me tratar com mais respeito, Príncipe dos Mortos, pois você não me alertou sobre o que eu deveria ou não deveria fazer para permanecer viva!

Eu fiquei surpresa por conseguir falar de tal forma, porque não era um hábito gritar algumas verdades para pessoas alheias. Sempre tentei ficar na minha, culpe as neuroses se quiser... Era tão incomum que quase abracei o garoto e pedi desculpas, porém, mantive o queixo debilmente erguido e uma expressão de certeza absoluta sobre minha opinião, sem qualquer arrependimento aparente. O que era totalmente o oposto dentro da minha cabeça, mas Nico não precisava saber disso.

O menino franziu a testa, levantando levemente as sobrancelhas, surpreso. Aí, eu pensei ''É agora, ele vai me largar para cair no chão mesmo'', só que isso não aconteceu. Ao contrário do esperado, ele respirou fundo, acalmando-se. Eu deveria gritar com meus pais também... Ou talvez não, pensando bem.

— Tem razão, Lorelai, eu deveria ter dado mais detalhes sobre a viagem. — Anunciou, deixando-me um pouco arrependida pela minha desagradável chamada. — Foi mal... Aqui está uma aula rápida: sempre esteja bem abastecida de energia; pense no lugar que deseja ir e sinta o poder de Hades fluindo por dentro de suas veias; não tente parar durante o trajeto, mas se for necessário, faça.

Molhei os lábios, pensativa.

— Você é um terrível professor...

— Olha, não temos tempo, ok? — di Angelo estreitou os olhos, passando a sussurrar. — No Acampamento Júpiter, sou conhecido como Embaixador de Plutão e eu tenho a confiança dos romanos, porém, talvez eu tenha mentido para Percy sobre quem eu realmente era... — Pausou pela minha cara de dúvida. — Não se preocupe, eles vão explicar melhor. Enfim, eu preciso partir para encontrar as Portas da Morte e você deverá seguir sozinha até Nova Roma.

— Ahn, pergunta número um... — Murmurei, olhando para todos os lados. — Por que estamos falando baixo?

— Eu não sei se Términus pode nos escutar daqui.

— Ah, sim, Términus... — Debochei. — Claro que eu sei quem é, um amigo de longa data.

Nico suspirou.

— Términus é o deus protetor das fronteiras... Ah, e não questione sua aparência. — Continuou. — Ele protege a Linha Pomeriana, que é o limite da cidade, a Nova Roma.

Achei graça de como o garoto já tentou cobrir todas as minhas possíveis indagações. Isso fora uma demonstração sutil de como eu não parava quieta se não entendesse algo.

— Boa tentativa... — Sorri. — Aonde eu estava? Ah, sim, pergunta número dois... Por que tem um navio no céu?

— É o Argo II, criado pelos semideuses, filhos de Hefesto. É o transporte de vocês.

— Hm... Cativante.

— Acabaram suas perguntas?

Sorri, já nem lembrando de nossa discussão anterior e, aparentemente, ele muito menos. Na verdade, di Angelo estava preocupado mesmo em falar tudo em um curto período de tempo. Este, que eu desperdiçava.

— Você andará até lá... — Apontou discretamente uma série de construções a uns dez metros à frente. — É a Nova Roma. Chegando na Linha Pomeriana, Términus aparecerá... Terá, então, que se apresentar e muito provavelmente ele ainda não deixará você entrar na cidade... Para isso, diga que deseja falar com os pretores Reyna Ramirez e Percy Jackson. A eles, poderá contar sua história e ambos permitirão que entre em Nova Roma.

Absorvi cada uma de suas palavras atentamente, imaginado as diversas hipóteses de tudo dar errado, mas estavam contando comigo... Precisava dar certo.

— Pretores?

— Compõe o magistrado do Acampamento Júpiter.

Engoli em seco.

— Beleza, e se pedirem para eu demonstrar meus dotes de meio-sangue, que detalhe: ainda não manifestei?

Nico permaneceu em silêncio, o que não era um bom sinal, porém, após alguns segundos, seu rosto acendeu, como se uma lâmpada brilhasse acima de sua cabeça.

— Diga que já manifestou seu parentesco vindo de Hades... Se fosse qualquer outro semideus, não aguentaria uma viagem sem pausas para descanso. Quanto a Zeus e Poseidon, é só uma questão de tempo. — Explicou. — Lorelai, você é bem capaz de andar pelas Sombras, precisa apenas acreditar em si... E comer mais.

— Tipo... — Arqueei a sobrancelha. — Pozinho mágico do Peter Pan? Acredite que você pode voar e você voará?

O jovem não entendeu o que eu disse de pozinho mágico, mas compreendeu a pequena analogia sobre voar.

— Ahn, sim. Infelizmente, terá que aprender a controlar os poderes de Hades sozinha, porém, Hazel Levesque pode ajudá-la com algumas coisas. Ela é filha de Plutão, a identidade romana de Hades, e ela não costuma viajar pelas sombras e invocar mortos-vivos... Creio que ela consiga dar algumas dicas para você, mesmo que não exatamente as que você necessita.

— Quer que eu aprenda a invocar mortos-vivos sozinha?

— Por agora, sim. — di Angelo assentiu. — Planejo tentar contatá-los em alguns dias para dar informações sobre as Portas da Morte, se eu conseguir encontrá-las, e ajudarei você...

Um arrepio fez os pelos em minha nuca eriçarem. Sempre que Nico falava sobre as Portas, eu lembrava da minha profecia e como eu seria a culpada por alguma coisa relacionada à Sabedoria. Ter culpa sobre algo nunca possuía um significado positivo.

Ok, então, chegando na linha do pomar, eu...

— Linha Pomeriana.

— Essa mesmo. — Revirei os olhos pela correção. — Eu digo que o Embaixador de Plutão me trouxe aqui?

— Sim. Se ficar perto dos sete semideuses da profecia, estará segura. Lembre-se apenas disso quando os romanos se aproximarem de você.

Acenei, entendendo. Não era difícil. Desde que eu conseguisse falar com os pretores e entrar em Nova Roma, estaria bem.

— Beleza. — Respirei fundo, tentando me convencer de que tudo daria certo. — É simples.

— Ah. — Ele pareceu lembrar de algum detalhe. — Peça néctar para conseguir renovar suas forças.

Estranhei, mas concordei silenciosamente. Assim, parei de me apoiar no garoto de maneira lenta, o qual manteve os braços próximos de mim, caso minhas pernas não me sustentassem de início. Testei meu peso em cada uma delas e vi que estava bem. Ajeitei, portanto, as alças da mochila em minhas costas e tirei do saco de papelão um pedaço de pão, que enfiei na boca, recebendo aprovação de Nico.

— Vai que eu tenha que escapar pelas Sombras de romanos furiosos. — Sorri pela sua cara de ''O que eu faço com você?''. — Certo, professor?

O adolescente deu um riso anasalado e, logo, bufou, achando um pouco de graça. Uma mínima graça, já que ele ainda tentava manter a pose de durão.

Conferi se minha adaga permanecia segura, presa à bainha, e tentei tirar um amassado da camiseta, alisando o tecido. Por fim, encarei meu destino a uns metros à frente, preparando-me para entrar em Nova Roma.

— Me deseje sorte, Príncipe dos Mortos. — Dei um sorriso zombeteiro. — Vejo você por aí.

Fitei-o mais uma vez e deixei-o para trás, em direção à cidade romana. A cada passo que eu ficava mais próxima, eu repassava as informações em minha cabeça, já tentando supor como o tal deus das fronteiras era. De acordo com di Angelo, eu não deveria questionar sua aparência. Sendo que eu estava na história, era meio impossível eu não questionar, após falarem para eu fazer exatamente o oposto. Não dá para negar a própria natureza...

De repente, ao estar a um ou dois metros de Nova Roma, com um estrondo totalmente desnecessário, uma estátua e sua carranca enfurecida saltaram na minha frente, barrando o caminho. Instintivamente, dei um passo para trás, já sentindo o ímpeto desejo de questionar a aparência do provável deus.

Graecus! — Ele rosnou. — Não é bem-vinda em Nova Roma! Renda-se e dê meia-volta, graecus!

Uma coisa era certa: ele era bem receptivo. A estátua era um tanto estranha, com um busto humano, todo esculpido em mármore, e apoiado por sobre um pedestal. Ela não tinha braços, mas mesmo assim era estranhamente ameaçadora e cômica ao mesmo tempo.

— Ahn... — Engoli em seco. — Oi, você deve ser Términus. — Tentei dar um sorriso convincente. — Ouvi muito a seu respeito, sabia?

— Protelações! — A estátua pareceu me amaldiçoar. — Renda-se ou dê meia-volta, graecus, antes que...

— Isso é bem legal, Términus. — Cortei-o de modo quase educado. — Só que é um pouco rude de sua parte nem permitir que eu me apresente...

— Eu sei exatamente quem é você, graecus! Filha de... — Ele franziu o nariz, como se tentasse farejar meu cheiro olimpiano e não conseguisse. — Filha de...

Expressei ''Vá em frente, demore o tempo que precisar'', e isso deixou o deus das fronteiras mais aborrecido ainda, parecia até que sua tonalidade branca como cera estava ficando levemente rosada de raiva. Não estava sendo tão difícil assim... Era divertido conversar com a estátua, até aquele momento, pelo menos.

— Ora, graecus petulante! Quem é você?

Quase ri por ele se dar por vencido de jeito teatral, inflando suas narinas de pedra, se é que isso era possível.

— Ah, Términus... — Entortei a cabeça levemente. — Estou um pouquinho decepcionada. — Fiz um bico meio arrogante, o qual, na verdade, desgostei. — Eu sou a criança perdida, é claro... Meu nome é Lorelai Tate, a criança perdida, filha do trovão, do mar e da morte. A filha dos Três Grandes.

Surpreendentemente, minha voz saiu forte e, pela primeira vez, eu quase me sentia tudo aquilo que minha apresentação anunciara. Era uma sensação estranha e a fraqueza nem parecia mais tão presente, mesmo consciente de que ela estava guardada, apenas esperando o momento certo para se manifestar, provavelmente quando eu precisasse de forças, pois, eu ainda carregava a maldição das macumbas, estava apostando nisso.

— Desejo falar com Reyna Ramirez e Percy Jackson, pretores de Nova Roma. — Estreitei os olhos, sentindo-me nada mais, nada menos, que poderosa. — Agora.

Términus estava sem palavras, confuso se deveria acreditar em mim ou não, porém, conseguiu infelizmente retomar a confiança e a ligeira prepotência. Foi aí que minha pose praticamente fraquejou, porque eu premeditava o que ele diria a seguir e eu não estava preparada para aquilo.

— Se é mesmo quem diz, graecus, faria uma pequena demonstração, sim?

Travei o maxilar, séria. Não poderia desmoronar, não ali, não naquele momento, e a estátua percebeu minha hesitação diante de seu singelo pedido e já mostrava, portanto, ter ganhado a pequena disputa entre nós.

Eu fechei minhas mãos em punhos e os nós dos meus dedos começaram a ficar brancos. Estava nervosa por não saber o que fazer... Eu precisava manifestar os três poderes, a não ser que eu quisesse, além de fazer um papel de palhaça, acabar com todo o plano de Quíron. Uma gota de suor gélida escorreu por minha têmpora e eu tentava qualquer coisa para mostrar minha herança olimpiana e não desapontar os semideuses gregos que contavam comigo.

— Por que tamanho esforço, graecus?

O deus das fronteiras tinha um sorriso cínico em seu rosto de mármore e isso encurralou-me, praticamente destruída. Arquejei pelo esforço e evitei que a ideia de dar as costas e fugir pudesse concretizar-se. Eu tinha um dever a cumprir, havia feito uma droga de juramento silencioso e, se eu realmente era a criança perdida, eu precisava fazer os outros acreditarem. Eu precisava acreditar.

Respirei fundo, lembrando das duras palavras de minha profecia, do sonho com Gaia e como eu era necessária para ganharmos a eminente guerra. No dia anterior, eu era apenas uma fútil — não tanto — nova-iorquina a caminho da loja de tacos, naquele momento, entretanto, eu estava me tornando quem eu realmente deveria ser. Pensei em como minha apresentação a Términus estivera beirando à atuação e à crença total. Não havia como eu ingressar em uma batalha sem saber de fato quem eu era...

Ali, assim, descobri finalmente. Não tinha como negar: eu era, sim, a criança perdida; eu era, sim, filha de três deuses gregos; eu era, sim, a garota da profecia.

Como em um passe de mágica, senti uma injeção de adrenalina e meu coração palpitou rapidamente. Meu corpo tremeu um pouco e a estátua notou a súbita mudança do ambiente como um todo.

Naquela parte do Acampamento, e somente nesta, tudo começou a escurecer rapidamente e eu não precisava olhar para cima para ver que nuvens densas e cinzentas sobrepunham ao Sol, com relâmpagos perigosos, escondendo os vestígios de luminosidade; a água do rio a minha esquerda, começara a borbulhar e, com um estampido de doer os ouvidos, um jato de água lançou-se como um gêiser, moldando-se em um gigantesca tromba d'água; por fim, o piso de pedra passou a rachar, formando crateras semelhantes às do beco, e delas, criaturas mortas-vivas saíam, armadas com escudos e espadas.

Era incrível, mesmo eu respirando fundo, tentando manter as coisas em seu devido lugar, não precisava fazer esforços muito grandes. Naturalmente, eu percebia o poder percorrendo minhas veias e não havia confusão sobre o que fazer, eu somente fazia como se fosse algo de rotina: ''Ah, sim, hora de chover, provocar um tsunami e invocar alguns guerreiros zumbis. Que tédio''.

Términus estava boquiaberto e vários semideuses romanos, armados, correram até aonde estávamos, surpresos pelo repentino agito nas fronteiras. Eles fizeram uma formação de exército, perto da tal Linha Pomeriana e pareciam aguardar ordens.

— Eu exijo falar com os pretores Reyna Ramirez e Percy Jackson. — Repeti à estátua. — Agora!

— Ahn... — O deus não sabia o que fazer. — Graecus, você...

Deixe-a, Términus. — Uma jovem surgiu da multidão, mantendo-se mais à frente da legião. — Sou Reyna Ramirez, pretora de Nova Roma e filha de Belona. Quem é você, graecus?

Analisei a postura de líder da adolescente. Ela trajava uma toga roxa e uma armadura dourada, e dois cães postavam-se ao seu lado, protetores. Ambos tinham olhos de rubi, porém, um era prata e o outro, dourado.

Não questionei se ela era mesmo a pretora, pois parecia que estava dizendo a verdade, mas não era apenas ela quem eu procurava.

— Aonde está o outro pretor? — Indaguei, ainda mantendo o espetáculo atrás de mim. — Aonde está Percy Jackson?

De uma das pontas, um garoto de cabelos negros e olhos verde-mar adiantou-se, porém, não sozinho. Uma loira com uma expressão desconfiada e levemente surpresa acompanhou-o também. Talvez fossem namorados?

— Meu nome é Lorelai Tate, filha dos Três Grandes, e carrego o peso de uma profecia. — Revelei. — Venho do Acampamento Meio-Sangue, e serei uma peça importante na guerra contra Gaia.

A expressão de todos era de choque, assim como Términus. Apenas Reyna tinha um quê a mais, encarando seus cães, como se eles pudessem analisar a veracidade de minhas palavras. Ela estreitou os olhos e fitou-me.

— Lorelai Tate, vejo que diz a verdade. — A pretora travou o maxilar. — Permito que se junte a nós, porém, não colocará os pés sobre Nova Roma. — Ela praticamente cuspiu a condição. — Permitirei que descanse no Fórum, assim como os outros semideuses gregos, nada mais que isso.

Assim como a garota, estreitei os olhos, tentando exalar força e coragem, no entanto, eu não fazia a mínima ideia do que estava fazendo, mas desde que estivesse dando certo, eu continuaria daquela forma.

— Estou de acordo com o decidido. — Acenei com a cabeça. — Agradeço.

Com um suspiro, o céu voltou a clarear, a água retornou ao seu devido lugar e os soldados mortos-vivos seguiram até as crateras, desaparecendo junto com elas. Nem parecia que o ambiente tinha sofrido minha demonstração nada amigável, exceto pelo piso meio rachado.

Caminhei os dois metros que sobravam até o limite da cidade e novamente Términus barrou-me, pigarreando.

— Tenho regras estritas quanto a armas sobre a Linha Pomeriana.

Travei o maxilar, arqueando a sobrancelha, já esgotada pela petulância do deus das fronteiras.

— Eu permiti sua passagem, Términus. — Reyna falou. — Deixe-a que passe.

Dei um sorriso de lado, expressando "E então?'' e a estátua parecia novamente estar tentando mudar de cor. Sem manter contato visual, enfim, deixou que eu seguisse caminho.

Tudo era bem bonito, a não ser as caras dos semideuses, os quais não estavam satisfeitos por eu ter conseguido permissão para entrar. Até eu não tinha me reconhecido quando mantinha os poderes à mostra e sentia a obrigação de amenizar o ódio e medo dos semideuses.

— Peço desculpas. — Respirei fundo, dando um sorriso suave. — Não era a minha intenção criar esse clima... Tumultuado.

— Tumultuado? — Um garoto com um rosto de elfo continuava boquiaberto. — Aquilo foi mais do que tumultuado, foi foda, mas extremamente medonho.

Uma menina, então, deu uma cotovelada no semideus e sussurrou algo em seu ouvido.

— Bom, enfim... Eu peço sinceras desculpas. — Encarei a multidão armada. — Eu não queria criar esse clima foda e extremamente medonho.

— Lorelai Tate... — Percy Jackson deu um passo à frente. — ... mesmo, imagino, já estando há um bom tempo dentro do acampamento, seja bem-vinda ao Acampamento Júpiter.


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Notas finais do capítulo

People, o que acharam? Olha, confesso que talvez, para alguns, a Lori estava meio chata, já outros pode tê-la achado mais badass. Assim, espero que, apesar de tudo, vocês tenha gostado.
Comentem e até o próximo capítulo.
Xxxxxx



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