Três Formas de Amar escrita por Mi Freire


Capítulo 27
Comentários ruins.




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As coisas não estavam nada fáceis em casa em relação ao Lucas, mas pelo menos as férias da faculdade estavam cada vez mais próximas. E sempre que eu precisava contar com alguém eu podia procurar pelo Yuri.

Ele não se importava de ouvir meus problemas, que por sinal eram muitos ultimamente.

− Posso mexer no seu computador? – Perguntei já me levantando da cama enrolada em um lençol.

− Fica à vontade. – Respondeu ele, procurando uma melhor posição na cama para tirar um cochilo.

Assim que liguei o computador do Yuri, entrei direto no Youtube e fui na minha página. Eu nunca ficava desconectada por muito tempo e estava curiosa para ver os comentários do ultimo vídeos que eu postei sobre meus aplicativos favoritos para celular.

Desci a barra de rolagem até me deparar com os comentários e fiquei muito assustada com o que vi.

“Nossa que garotar ridícula, não tem a mínima noção do que está falando.”

“Que patricinha fútil e sem conteúdo. ”

“Credo! Como vocês conseguem assistir isso? ”

“Garota feia e escrota!!!”

“Não fala bobagens, garota fútil! ”

Esses eram alguns dos comentários que eu bati o olho logo de cara. Conforme fui descendo para ver se tinha mais, me surpreendi com a quantidade de vários outros comentários negativos que encontrei.

Isso nunca tinha acontecido antes. Não em grande quantidade. Claro que sempre tinha um ou outro falando mal dos meus vídeos, mas esses eram fáceis de ignorar. Porque eles eram mínimos em meio a tantos outros comentários positivos.

Apesar de tudo não consegui parar de ler cada comentário e percebi que meus leitores estavam brigando com essas pessoas, pedindo para eles não falaram tantos absurdos porque não me conheciam ou pedindo para eles não verem os vídeos se não era algo que eles gostavam de assistir.

Não aguentei ver aquilo por muito tempo e saí da minha página imediatamente. Eu bem que tentei segurar as lágrimas. Mas aquilo já era demais para mim. Eu não podia suportar tantas críticas negativas. Não quando eu fazia tudo com tanto carinho e cuidado.

Comecei então a recolher minhas roupas e me vestir o mais rápido que eu podia.

− Ei – Yuri se virou para mim. Tentei esconder o rosto para ele não ver que eu estava chorando. – Você está indo embora sem se despedir, é isso mesmo?

Não respondi.

Se eu abrisse a boca para dizer qualquer coisa ele perceberia que eu estava despedaçada naquele momento.

− Japonesa, ei, o que foi? – Yuri se sentou quase que imediatamente. Acho que não consegui disfarçar muito bem.

Eu queria sair dali imediatamente para ele não perceber que eu era uma garota boba e frágil.

Eu nunca antes tinha chorado na frente dele!

Mas assim que terminei de colocar minhas roupas e ir em direção a porta ele me puxou pelo braço, me fazendo sentar em seu colo. Quando ele levou a mão até o meu cabelo para tirar da frente do meu rosto molhado, foi quando eu não aguentei mais e desabei de vez.

Enterrando a cabeça em seu pescoço.

− O que aconteceu? – Perguntou ele todo o tempo. – Porque você está chorando, Manuela? Foi algo que eu fiz?

− Não... – Tentei dizer, mas não consegui. Eu só sentia vontade de chorar cada vez mais.

O que aconteceu comigo e com a minha vida?

Porque de uma hora para outra eu tinha a sensação que estavam todos contra mim?

Será que eu também não podia ser feliz como uma pessoa simples e normal como qualquer outra?

Pelo jeito não.

Depois de alguns minutos quando eu enfim consegui me controlar, peguei meu celular e entreguei a ele.

Yuri pegou o aparelho intrigado e passou um tempo tentando entender o que eu estava tentando lhe mostrar.

− Nossa, que absurdo! – Ele me olhou espantado, colocando o celular de lado. – Quem faria uma coisa dessas?

− Eu não sei... – Disse eu em meio as lágrimas. Mas então na minha cabeça veio um sorriso diabólico como se quisesse me passar uma mensagem e esse sorriso era o da Helena.

Sai do colo do Yuri, atravessei seu quarto, depois o corredor e abri a porta do quarto dela com o máximo de forças que pude.

− Sua vagabunda!

Helena estava sentada em sua cama, lendo tranquilamente um livro.

− Que merda é essa? – Ela me olhou assustada. Eu estava verdadeiramente brava. E garanto que nunca na vida me viram assim. – O que você está fazendo aqui no meu quarto? – Ela se levantou com o livro fechado em mãos.

− Foi você, não foi? – Gritei. – Eu sei que foi você, sua desgraçada. – Avancei em sua direção, peguei rudemente o livro de suas mãos e atirei pela janela aberta.

O coitado do livro mergulhou na escuridão.

− Do que você está falando maluca?! – Ela alternava o olhar entre mim e a janela e o livro jogado lá fora.

Se eu tivesse com o meu celular em minhas mãos nesses instantes eu juro que esfregaria no meio da fuça dela.

− Não se faça de desentendida, Helena. Quanto foi que você pagou a eles, hein? Para comentarem tantos absurdos na minha página?! Eu sei que você está com raiva de mim porque acha que o Lucas não transa com você por minha causa...

Nesse momento ela abre a boca, chocada por eu saber dessa história.

Mas como eu poderia não saber?

Lucas me conta tudo!

Pelo menos costumava contar antes da nossa última briga.

− Mas saiba que eu não tenho nada a ver com isso. O problema é seu e dele. Não me envolva nessa merda. Não é justo! Estamos falando da minha carreira! Você que foder a minha carreira é isso mesmo?

Ela inclinou a cabeça por uns instantes, como se ainda tentasse processar a isso tudo. Mas foi uma coisa e rápida e passageira. Logo ela caiu na risada.

− Ah, você está falando dos comentários do seu último vídeo? Eu vi aquilo! – E ela continuou rindo. – Saiba que eu não tenho nada a ver com isso. Mas não posso dizer que eles estejam errados em relação a você. Porque não estão!

Essa filha da puta está me chamando de fútil?

Não posso ter ouvido isso direito.

Mas ela continuava rindo da minha desgraça e isso eu não podia deixar passar.

− Você me paga! – Pulei em cima dela, derrubando-a, por sorte, sobre sua própria cama.

Grudei meus dedos em volta de seu pescoço magro e ela me olhou assustada como se não me reconhecesse.

Eu juro que tentei matá-la de todas as formas possíveis: enforcada, com tapas, chutes, arranhadas, sufocada. Mas nada disso funcionou. Por causa do Yuri que resolveu entrar no meio e me puxar de cima dela.

− Manuela, você ficou doida? – Ele me puxou para dentro do seu quarto e trancou a porta. Me impedindo de sair para acabar com aquela cadela de uma vez por todas.

Yuri me olhava assustado e ao mesmo tempo com desprezo, da mesma forma que o Lucas tinha me olhado há algumas semanas atrás quando eu disse que estava dormindo com o Yuri porque eu queria, porque eu gostava dele.

Isso foi a gota d’ água para mim.

Yuri não precisou dizer ou fazer mais nada. Eu peguei minhas coisas e fui embora dali rapidamente.

Eu sei que posso ser infantil as vezes ou na maior parte do tempo. Eu admito! Tudo bem. Eu sou mesmo infantil pra quem tem quase vinte anos. Mas e daí? Será que nunca ninguém agiu sem pensar de acordo com o calor do momento? Eu, por exemplo, sou assim. Normalmente ajo sem pensar. Sou uma pessoa inconstante. Essa sou eu! Não posso admitir que ninguém me olhe feio ou torto por eu ser quem sou.

Lucas estava em casa quando cheguei, jogando videogame na sala. Mas dane-se ele também. Passei por um ele feito um foguete e me tranquei no meu quarto.

Eu chorei a noite inteira, tanto que pensei que iria secar meu estoque de lágrimas a qualquer momento. Isso se já não tivesse secado. Mas de onde vieram tantas lágrimas?

Também não consegui parar de ler os tais comentários mesmo que fossem como tiros no meu coração. Não demorou muito para eu começar a me convencer de que eles tinham razão. O que eu tinha a oferecer, afinal? Absolutamente nada que pudesse acrescentar na vida de alguém. Pois mesmo que eu não tivesse o canal não mudaria em nada na vida das pessoas.

Mas eu sabia que não podia deixar algo assim afetar tanto a minha vida. Eu nunca seria capaz de agradar todas as pessoas. E então a voz do Lucas vinha na minha cabeça, pedindo, me fazendo jurar, que nunca desistiria dos meus sonhos por nada nesse mundo.

Como não consegui pregar o olho durante toda a madrugada, eu nem fui para a aula na manhã seguinte.

E continuei trancafiada no meu quarto, com medo de sair lá fora e me deparar com coisas ainda piores.

Toc toc

Alguém bateu a porta por volta das quatro e meia da tarde.

Eu bem que tentei ignorar e fingir que não tinha ninguém ali, mas a pessoa foi insistente e mesmo relutante eu fui ver quem era. Já sabia que não podia ser o Lucas já que ele tinha a chaves de casa e nunca a perdeu antes.

Yuri entrou sem eu nem precisar convida-lo e me seguiu até o quarto. Eu não queria vê-lo. Não agora. Não naquela situação. Mas parece que ninguém mais se importa com a minha opinião. Com o que eu quero.

− Trouxe isso para você comer e não me venha dizer não, porque eu faltei hoje no trabalho para estar aqui com você.

− Mas eu não pedi nada! – Digo, emburrada. Tentando a todo custo não olhar na direção dos olhos dele.

Yuri me estendeu um saco com pãezinhos doces.

− Coma, por favor.

Não tinha jeito. Ele nunca sairia dali e nunca desistiria de insistir.

Então resolvi comer, pois estava mesmo faminta. Não comi nada desde a noite passada.

− Você está melhor?

− Não. E nunca vou estar. Pois aqueles comentários jamais poderão ser apagados da minha mente.

− Eu sinto muito. Mas não entendo.

Depois de terminar o segundo pãozinho eu finalmente ergui os olhos na direção dos dele.

− O que você não entende?

− Porque você continua? Porque você escolheu isso para sua vida? Nada disso aconteceria se você não...

− Yuri, para. - Olhei para ele abismada. − Você está querendo me dizer que que tudo isso é culpa minha ou eu não ouvi direito?

Ele virou o rosto por um momento.

− Você deveria excluir o canal. Parar com essas coisas...

− Primeiro, essas coisas são o meu trabalho. O que eu escolhi para mim! E segundo, isso tudo pode ser doloroso demais. Faz parte, eu sei. Mas eu nunca, nunca mesmo desistiria dos meus sonhos. Eu nunca desistiria do canal. Ele é tudo que eu tenho, Yuri. Você não entende?!

− Mesmo que continuem dizendo aquelas coisas horríveis sobre você?

− Sabe, Yuri, é realmente triste que isso esteja acontecendo. Mas o mais triste é que você não esteja me apoiando nesse momento e esteja sugerindo que eu... que eu...

As lágrimas voltaram aos meus olhos.

− Manuela!

Quando levantei meus olhos vi o Lucas vindo na minha direção. Ele sentou ao meu lado e segurou meu rosto bem próximo ao seu.

− Eu vi os comentários. Mas não se preocupe! – Ele me abraçou e foi quando eu vi o Yuri se levantar na outra ponta da cama e ir embora. Eu não o impedi. – Eu já pedi aos seus leitores no Facebook para denunciarem essas pessoas. E se você quiser eu posso excluir comentário por comentário. Mesmo que sejam milhões. E não sei se é possível, mas eu posso tentar também bloquear um por um e impedir que eles voltem a dizer essas coisas horríveis sobre você. Eles não te conhecem, Manu. Eles não sabem o doce de garota que você é.

− Não precisa, Lucas. – Abracei-o de volta, sentindo seu cheirinho suave impregnado em seu pescoço. – Obrigada, por tudo.

Mesmo com tudo que ele tinha acabado de me dizer, provando que faria qualquer coisa por mim, para me proteger das más pessoas; eu não consegui parar de chorar ao pensar que o Yuri era a única pessoa no mundo que não me apoiava.

Nunca antes ninguém tinha sugerido para eu desistir do meu trabalho. Normalmente elas me apoiavam e me davam forças. Mesmo sabendo das dificuldades ninguém tinha me pedindo para excluir o blog ou o canal. E eu estava disposta a lutar e continuar por essas pessoas. Pois elas faziam cada esforço e sacrifício valer a pena.

Mas as palavras do Yuri me perfuravam por dentro.

Eu precisei do seu apoio, da sua compreensão, mas não foi bem isso que eu tive e toda aquela imagem que eu tinha na minha cabeça sobre ele de homem ideal, maduro e sensato desapareceram completamente naquele segundo.


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