Já era fim de tarde quando Hana voltava para o dormitório das Stars com as garotas. Samantha e Elizabeth iam na frente, enquanto Yasmin e a loura preferiam ir mais atrás. Quando as duas chegam ao gramado da frente da casa, o restante do grupo já havia entrado. Foi então que Hana ouve alguém lhe chamar. Imediatamente as duas olham para trás e Yasmin faz uma cara de desgosto ao ver Hiroto acenando para sua colega de quarto.

— Conhece ele? — ela arqueou uma sobrancelha para o ruivo que caminhava devagar em direção as duas.

— Err... Conheço. Ele me ajudou a encontrar minha sala no primeiro dia.

— Sei... Ok, então. Só não demora — olhou torto para ele mais uma vez, e foi em direção a porta da frente.

— Oi — ele para a sua frente, sorrindo.

— Oi — Hana sorri também e prende uma mecha de seu cabelo atrás da orelha.

— O que está fazendo aqui? — o rapaz pergunta, se referindo à casa. Foi então que Hana se deu conta de que ainda estava em frente ao dormitório das Stars. — Ah! Já sei. Você acabou ficando nessa irmandade por causa da falta de vagas nos alojamentos, não é?

—... É! Exatamente isso! — escondeu seu cordão, colocando-o totalmente dentro da blusa.

No fundo ela sabia que mentir daquele jeito era errado, mas simplesmente não tinha coragem de dizer a verdade a ele.

— Pediram para as irmandades aceitarem os calouros por algum tempo, até que eles encontrem um clube no qual se encaixem. Humpf! Lamento que você tenha que ficar logo aqui com essas malucas.

Hana engoliu em seco.

— Elas são legais... Tá, a Samantha me assusta, mas é o jeito dela.

— A Sam é a mais maluca de todas — ele ri consigo, lembrando das provocações da morena. — Ela me odeia — deu de ombros. — Enfim, eu só queria te ver e saber como você está. Se perdendo muito pelos corredores da Raimon?

A canadense riu.

— Sabe que não, mas caso aconteça-

— É só me chamar — ele completa e os dois sorriem. — Tenho que ir agora, antes que sua amiga tente me matar. — Hiroto aponta para a direção atrás da loura, que se vira e percebe que Yasmin ainda estava esperando por ela na porta com uma cara nada amigável para o ruivo. — Nos vemos depois.

Ela acena para o rapaz, enquanto esperava o mesmo se afastar. Depois, caminha até a morena.

— O que ele queria? — questionou sem que Hana sequer pudesse tocar a maçaneta da porta.

— Nada demais. Só saber se eu estava bem.

— Hum, isso tá me parecendo muito suspeito. Não gosto desse cara.

— Também não precisa ficar me vigiando.

— Vai que ele fazia alguma coisa.

— Tipo o quê? — Haruki cruzou os braços.

— Tipo te agarrar ou te sequestrar e te fazer de refém para nos pedir resgate ou... Ou sei lá!

—... Yasmin... na boa, você viaja!

Atsuki deu de ombros.

— Tá, exagerei. Mas seja lá qual for a ligação de vocês dois, é melhor você se afastar dele, Hana. Aquele garoto não é confiável.

♫

Um pouco mais tarde, ainda naquela noite, Hana estudava em sua cama enquanto Yasmin tomava banho. O calmo silêncio foi quebrado quando a loura ouviu um pequeno som vindo da janela, como se alguma coisa estivesse sendo jogada contra a mesma. No começo, achou que fosse coisa da sua cabeça, mas o incômodo barulho continuava, obrigando a Haruki a se levantar e ver o que era.

Chegando a sacada, notou que o barulho era provocado por pequenas pedrinhas que haviam sido jogadas e agora estavam no chão. Inclusive, quase foi atingida por uma, que passou de raspão por seu rosto. E depois dessa, as pedrinhas cessaram. Olhou para baixo e viu Hiroto com um sorriso no rosto.

— Hiroto?! — tentou falar baixo, mas alto o possível para que o ruivo ouvisse. — O que está fazendo aqui?

— Vim te sequestrar. Ta afim?

A jovem ri. Nunca havia recebido um “convite” de sequestro. Imediatamente se lembrou das palavras da amiga mais velha — “Te sequestrar e fazer de refém para nos pedir resgate”. —, mas apenas começou a descer, ignorando o alerta.

♫

Os dois caminharam até o lago que ficava próximo aos alojamentos. Hana notou que no pescoço do ruivo havia um cordão, e nele um pingente de um raio. Lembrou do que estava em seu pescoço, ainda debaixo de sua blusa. Além do cordão, Kiyama também usava um moletom azul com mais um raio bordado na altura do peito. Não era a primeira vez que via o ruivo usando a peça. Ambos eram marcas da Kappa.

— Você parece preocupado... Aconteceu alguma coisa?

— É só que... Nada. Não preciso te encher com meus problemas — ele forçou um sorriso.

— Que nada. Pode me contar.

— É por causa das Stars — disse. — Eu sei que elas são suas amigas e tudo, mas eu já tô cheio dessa obsessão delas, e principalmente da Sam, em derrotar os Kappas. Caramba! Nós vencemos delas tantas vezes que nem dá para contar. Somos os melhores e pronto. E mesmo assim elas querem a todo custo nos vencer e isso me irrita. Essa briga idiota já foi pro lado pessoal há muito tempo. Elas não ligam para a música, só pensam em vencer.

Evitou olhar em seus olhos quando ele terminou. Mesmo que não tivesse deixado transparecer, as palavras atingiram Hana como um soco no estômago.

— E agora ela vem com essa tal de “arma secreta” — Hiroto continuou. — Não sei quem é essa garota, mas tenho pena dela. Ela tá sendo usada pela Samantha pra satisfazer a sua obsessão pela vitória — sentiu vontade de perguntar se Hana sabia quem era a arma secreta, mas não queria demonstrar que estava tão interessado em saber.

Abaixa a cabeça quando ele termina. Estava perplexa, sem saber ao certo em quem acreditar. Sabia que deveria acreditar nas Stars, mas parecia que cada um tinha sua razão. Samantha tinha razão em dizer que o ruivo não era uma pessoa tão boa como Hana imaginava que fosse, e Hiroto tinha razão quanto a fascinação da líder em vencer os Kappas a qualquer custo.

No entanto, decide pensar nisso quando estivesse em seu quarto. Agora, fingiria que as palavras dele não a feriram.

♫

Quando Hana termina de subir pela sacada, percebe que sua colega de quarto ainda está acordada, com uma mistura de raiva e preocupação em seu rosto.

— Onde você estava?

— Eu saí para tomar um ar.

— Sei. E esse ar por acaso é ruivo e tem olhos verdes? — a pergunta fez com que o rosto da loura ficasse vermelho.

— Claro que não.

A japonesa ainda estava desconfiada, porém, cansada demais para discutir com a mais nova.

— Tudo bem, então. Não me importa com quem você saia, com tanto que não seja um Kappa. — Yasmin deu de ombros e as duas foram dormir.

Ou melhor, Hana tentou dormir, mas as palavras de Hiroto não saíam de sua cabeça. Como dois grupos de pessoas podem se odiar tanto? Sentia-se estranhamente dividida. As únicas coisas que sabia sobre os Kappas eram o que as garotas lhe contavam, mas já havia percebido que o ódio podia distorcer as palavras. Sem falar que estava ficando presa em uma teia de mentiras. Por quanto tempo poderia mantê-la?

♫

— Como vocês já sabem — começa Samantha, em uma sala da universidade exclusivamente das Stars, para que ensaiassem. Eles levam as Stars bem a sério aqui. —, no começo do ano acontece uma apresentação dos grupos à capela para toda a universidade, para que os calouros possam escolher seu favorito e conhecer seus participantes. Essa apresentação acontecerá essa semana. E, como vocês também sabem, faz muito tempo que não vencemos dos Kappas, então precisamos nos preparar, ensaiando bastante, para irmos para o mundial.

Hana sente seu estômago embrulhar. Hiroto iria descobrir que ela era uma Star.

— E já sabe que música nós vamos cantar?

Samantha sorri.

— Já.

♫

Depois de quatro dias ensaiando, o dia da apresentação chega e elas estavam prontas. De trás do palco, Hana assiste o número dos rapazes. Entendeu na hora o motivo de eles vencerem tantas vezes e serem os atuais preferidos. As Stars  perderam sua popularidade com o passar do tempo. Eles são... incríveis!

Era a primeira vez que ouvia Hiroto cantar e, naquele momento, não conseguia tirar os olhos do ruivo. Assiste a tudo de boca aberta. Sincronia perfeita, coreografia também e a música certa... Tudo isso eles tinham de sobra. Vê também Fubuki e se sente feliz por vê-lo novamente. Todos usavam o mesmo moletom que ela havia visto. Diferente das Stars, os Kappas quase sempre usavam as mesmas roupas para se apresentar: o moletom do grupo e calça jeans.

O número acaba e elas começam a se preparar para subir ao palco. De frente para ele havia uma faixa que dizia “Bem-vinda classe de 2015”. Pela primeira vez, não era o público que preocupava Haruki, e sim apenas uma pessoa. Hana cantaria a maior parte da música — conforme Samantha queria exibi-la. —, enquanto as outras a acompanhariam no refrão. Usava meia calça preta e um moletom dourado, combinando com o cabelo da mesma cor, que agora estava preso em tranças. O restante usava roupas semelhantes, com pequenas alterações.

— Olá, Raimon — Samantha foi à frente, segurando um microfone. — Antes de começarmos, gostaria de apresentar a vocês nossa mais nova estrela — Hana foi empurrada para o centro do palco e Samantha a puxou pelo braço. —: Hana Haruki! — Depois de gritar seu nome, ela levanta o braço da canadense, fazendo o público gritar.

O lugar encheu-se de aplausos, mesmo que a maioria não fizesse ideia de quem a loura fosse. Procurou desesperadamente por Hiroto na plateia, achando-o segundos depois. Ele estava sentado com os outros garotos da Kappa, bem no meio da multidão de pessoas, totalmente perplexo. Hana desenhou um pequena “desculpa” com os lábios, antes que Samantha a puxasse de volta até sua posição para que o número começasse.

Parece que todo mundo tem um preço

Como conseguem dormir de noite?

Quando a compra vem na frente da verdade

Pare por um minuto e sorria

Todos olhem para a esquerda

Todos olhem para a direita

Conseguem sentir?

Vamos pagar com amor essa noite

Durante toda a apresentação, seus olhos azuis estiveram fixos nos de Hiroto. O ruivo balançava a cabeça negativamente enquanto elas cantavam, completamente decepcionado.

O dinheiro não importa

Não precisamos do seu dinheiro

Só queremos fazer o mundo dançar

Esqueça o preço

O que importa não é o ching-ching, nem o bling bling

Queremos fazer o mundo dançar

Esqueça o preço

Preço. Esqueça o preço

Até o momento em que ele levanta, caminhando pesadamente e esbarrando em várias pessoas rumo à saída, sem nem olhar para trás.

Esta noite

Eu vou te amar esta noite

Me dê tudo esta noite

Pelo que sabemos, podemos não ter um amanhã

Vamos fazer esta noite

Nesse momento, enquanto observa o rapaz ir embora, Hana erra um passo e esbarra em uma das garotas, que cai levando outra, que levou outra até que toda a apresentação estivesse acabada. Samantha parecia que ia ter um ataque a qualquer momento. Os Kappas ganharam de novo.

♫

— Qual é o seu problema? No que estava pensando? Estamos perdidas! — Samantha dava a bronca que Hana já esperava levar. A morena senta em uma poltrona, as mãos cobrindo o rosto. Hana se sente extremamente culpada, é claro, não só por Hiroto, mas também porque sabia como aquilo era importante para a líder. — As Stars são minha vida!

— Desculpa — Hana pediu, realmente arrependida. — Eu me distraí e... — é claro que aquilo não era justificativa, ela sabia disso, mas não havia o que pudesse dizer.

— Com o quê, Hana? — era a primeira vez que a chamava diretamente pelo nome e não por Herança. Isso, por algum motivo, fez Hana se sentir ainda pior. — O que foi tão importante para tirar sua atenção naquele momento?

— Sam — Yasmin entra na sala de repente —, estão te chamando na diretoria.

Samantha se levanta e as duas saem da sala, deixando a loura sozinha.

♫

No dia seguinte, Hana encontra com Hiroto no corredor da universidade. Porém, o mesmo passou por ela como se a loura não estivesse ali. Precisava fazer alguma coisa que a redimisse com as Stars e fizesse Hiroto lhe perdoar.

Minha vida virou de cabeça para baixo nessa última semana. Estou começando a achar que... Talvez as Stars não sejam tudo aquilo que eu pensei que fossem. As garotas, principalmente a Samantha, estão uma fera comigo... E com razão. Me envolvi em um monte de mentiras. Hiroto descobriu que sou uma Star e agora se recusa a falar comigo. Eu sabia que isso iria acontecer mais cedo ou mais tarde, mas não posso deixar que as coisas fiquem assim. Eu vou fazer alguma coisa.

Hana.