Simples Desejo escrita por Nah
Notas iniciais do capítulo
Espero que gostem, boa leitura!
– Um chá, por favor. – peço a Margaret quando me sento à mesa da cozinha.
Com meu ferimento quase cicatrizado, finalmente consegui a permissão de Alexandre para sair da cama. Ele vinha sendo bastante atencioso, gastando grande parte de seu tempo para se certificar de que eu estava bem. “Ele é um bom homem” me vem à cabeça. E se ele realmente estiver me protegendo de algo?
Não.
Arredo o pensamento, certa de que tudo que ele disse sobre o Hugo não passam de mentiras. Ele odeia o Hugo – por um motivo desconhecido para mim, mas que ainda descobrirei –, por isso diz tantas tolices a seu respeito. Apenas isso.
Clement embrenha-se à cozinha e agarra a maçã que Margaret limpava, levando a fruta a boca e ganhando uma bofetada em seu braço.
– No que está pensando? – Margaret chama minha atenção, me distraindo.
– Nada importante. – tomo um gole do meu chá, aproveitando a sensação de seu calor
percorrendo-me por dentro. Sorrio um pouco ao lembrar-me de algo. – Ele sentiu ciúmes.
Margaret vira-se em minha direção, sorrindo. Clement, por sua vez, bufa.
– Alexandre? – aceno positivamente com a cabeça. – Está vendo? Eu disse que ele está fascinado. Deu para perceber desde a primeira vez que o vi olhar para ti.
Outro resmungo.
– Sério?
– Sim. – eu pondero o que ela disse, mas não consigo acreditar. Aposto que seus ciúmes não passaram de uma reação comum de todos os homens, sempre tão territoriais.
– Mas ele não me ama.
– Vocês terão bastante tempo para se amarem.
Clement continua a resmungar, e Margaret lhe lança um pano à cabeça. – Pare com isso homem. Veja Rosie, não é só o senhor Herman que sente ciúmes.
– Ciúmes? – o mordomo faz-se por desentendido, provocando-me um risinho.
Apoio meu queixo em minha mão e penso sobre o que Margaret disse. Tento imaginar o que aconteceria se eu acabasse amando Alexandre, e ao fazer isso, sinto-me como se esse ato fosse traição a Hugo. Descarto o pensamento, tentando me concentrar no presente, por mais não tão agradável que fosse.
– Ansiosa para o casamento? – faço uma careta para Margaret. – Está nervosa. É normal.
Era verdade, eu estava. Faltavam apenas três dias para o juízo final – vulgo casamento – e eu estava começando a crer que não escaparia disso. Todos pareciam estranhamente animados, inclusive Alexandre, que aproveitava cada oportunidade possível para tentar me provocar – e irritar.
Decido dar uma volta pelo casarão. Sigo por um corredor atrás da escada e encontro mais algumas portas. Arrisco a primeira e em seguida estou dentro de um escritório, que acredito ser de Alexandre. O aposento está banhado na escuridão, as grandes cortinas escuras bloqueando o sol, então não consigo ver muito.
Continuo caminho pelo corredor e paro na segunda porta. Antes de abri-la, certifico de que não há ninguém vindo. Não quero ser pega bisbilhotando a casa de Alexandre. Atrás da porta, a maior biblioteca que eu já vira na vida. Livros e mais livros, em altas e grandes estantes, ali parecendo incontáveis para mim.
Fecho a porta atrás de mim. Percorro o recinto, maravilhada com tudo aquilo, sentindo os livros sob a ponta de meus dedos. Encontro Orgulho e Preconceito com facilidade, meu livro favorito em todo o mundo. Mas ao puxa-lo, diversos papeis que estavam presos entre os livros caem em desordem à minha frente. Abaixo-me para recolher, mas um nome em especial chama minha atenção.
O sobrenome Herman está em todos, inclusive em paginas retiradas de um jornal. Sinto-me zonza ao me dar conta do que se trata a noticia: a morte de Frederick Herman. Há cerca de dois anos, ele fora assassinado e deixara seu posto de marquês para o filho mais velho. Alexandre.
O restante dos papeis contem dados e palavras aleatórias. Acredito que Alexandre tenha investigado a morte do pai. Sinto instantaneamente tristeza por ele.
Barulhos lá fora me despertam de meu torpor. Colocando os papeis de volta ao lugar, seguro o livro em meus braços e corro para meu quarto.
*
Próximo ao fim de tarde, estou empoleirada a janela de meu quarto, entretida em minha leitura. Lá fora, o céu ameaça nos banhar com seu derramamento de agua. Noto um movimento, e olhando para além do jardim, contemplo o exato momento em que Alexandre adentra pelo grande portão principal. Mas ele não está sozinho.
Ao seu lado, uma alta e bela mulher. Seu cabelo é de um dourado deslumbrante, e ela não parece ter mais que a idade dele. Ela parece rica e poderosa em seu grande vestido vermelho. Parece... perfeita para ele. Perco o almejo pela leitura, agora interessada em descobrir quem é ela e por que está com ele.
Apanhando uma capa em meu armário, vou em direção ao andar de baixo. Se fosse pega, diria que iria a um passeio, como sempre. Termino o lance de escadas no certeiro instante em que Alexandre leva a loira para dentro de seu escritório. Sinto um rebuliço em meu peito, e decido que não quero mais ficar ali. Aproveito um momento de descuido de um dos guardas e estou fora do casarão.
Tento proteger minha identidade com o capuz sobre minha cabeça e caminho em direção à cidade. Quero tirar o que vi de minha mente, assim como todos os tipos de pensamentos pecaminosos que tenho ao imaginar o porquê de Alexandre leva-la para lá. Quero, mais que tudo, livrar-me do desconforto que sinto ao pensar nisso.
Não era isso que eu queria? Que ele ficasse com outra? Era.
Mas e a mim?
Balanço a cabeça, desnorteada com o rumo dos meus pensamentos. Presto atenção no lugar ao meu redor quando finalmente entro na cidade de fato. Há pessoas indo e vindo, de todos os lados e para todos os lados. Casas, lojas e restaurantes por toda parte. Comerciantes de rua dividem o espaço com as diversas pessoas, desde crianças a idosos.
Uma musica alegre vem de algum lugar, e me pego sorrindo para aquela amistosa cidade. Caminho sem rumo entre as pessoas. Percebo que estou seguindo a musica quando encontro a origem dela. Um grupo de homens a beira da rua toca animadamente alaúde, viola, cervelato e cromorne. Ao lado, outro grupo dança com igual animação, em perfeita sincronia. Estou sorrindo para eles, quando sinto um puxão.
No segundo seguinte estou entre eles, seus movimentos não me deixando fugir. Rendendo-me, entrego-me a dança, girando e saltitando em meus sapatos, seguindo seus movimentos e a musica. Não sei quem me puxou, mas faço par com um homem, que sorri aprazivelmente para mim. É impossível segurar riso. Pareço cheia de genuína felicidade.
Quando a musica termina, saudamo-nos, e algo me passa pela cabeça. Aproximo-me do homem desconhecido.
– Diga-me. – o confronto. – Como faço para chegar a Londres?
– Bem, são boas horas de viagem. Posso recomendar-te alguém que certamente poderá te levar. Mas não de graça.
Sou guiada por entre as ruas estreitas, até uma casa, onde sou apresentada a um homem grande e barbudo, que me olha estranho.
– Precisando de uma viagem para Londres?
– Sim.
– São 10 libras.
Puxa, onde conseguirei dinheiro? Penso em Margaret.
– Dei-me um tempo, para buscar o dinheiro.
– Quando quer partir?
– Esta noite mesmo, se possível.
O homem faz cara feia para mim. – Mas não será. Amanhã bem cedo.
– Tudo bem.
– Mas antes. – ele me para. – Pagamento adiantado.
Estou nervosa. Meu coração ameaça saltar pela boca com o que estrou prestes a fazer. E se for pega? Preciso arriscar. Apenas corro de volta para casa. Lá fora chove forte e em alguns momentos estou ensopada.
Entro pelos fundos, encontrando à cozinha a pessoa que queria ver.
– Margaret. – sussurro meu chamado. Ela se assusta e aproxima-se de mim.
– O que houve?
– Preciso de dinheiro. 10 libras. – estou ofegante, afobada, e ela cada vez mais assustada e confusa.
– Para que?
– Depois te explico. Por favor, Margaret.
Ela pondera por algum tempo, mas cede, desaparecendo de minha visão. Retorna nem um minuto mais tarde, escondendo moedas em minhas mãos molhadas.
– Você está gelada. Ficará doente nessa chuva. Quero uma explicação.
– Depois. – deixo um beijo em sua bochecha, e volto a correr para longe.
Quando estou prestes a atravessar o portão principal, ouço sua voz.
– Onde você pensa que vai? – quero ignorar, apenas ir, mas seu tom autoritário me causa arrepios.
Viro-me lentamente, encontrando Alexandre parado em meio à chuva. Não digo nada enquanto o observo se aproximar de mim.
– Eu disse para não fugir.
– Não estava fugindo. – não agora.
Ele ri, com ironia. – Não sou idiota, Rosie.
Continuo o encarando, não querendo dizer nada. Ele me encara de volta, a chuva dançando a nossa volta, nos mantendo frios e molhados. Observo uma gota de chuva escorrer de seu cabelo pela lateral de seu rosto bonito, seguindo caminho pela sua barba e perdendo-se em seu queixo.
– É dela que você gosta?
– O que? Quem?
– A loira. – sussurro, envergonhada por estar perguntando isso. Minha boca e as
estupidezes que não consigo impedir que saiam dela.
Alexandre sorri.
– Lydia? Não. É apenas uma amiga. – bufo, desacreditada. – Com ciúmes, senhorita Meyer?
Arregalo os olhos com o que escuto, confusa de repente. – Do que me chamou?
– Meyer. Não sabe seu sobrenome?
Nego com a cabeça, sem conseguir organizar minhas emoções, sentindo tudo ao mesmo tempo, embrulho no estomago, medo, tristeza. – Como você sabe?
Alexandre parece mortificado, como se houvesse dito algo que não devia.
– Agora não é hora para isso.
– Diga-me. – peço em sussurro. Ele apenas nega com a cabeça, enquanto se aproxima mais de mim.
Seu rosto tão perto do meu, tenho a leve impressão de que irá me beijar e estou nervosa novamente. Mas ao invés disso, agarra-me as duas mãos, forçando-as a abrir. As moedas caem de minhas mãos, ricocheteando no chão molhado.
– Sei o que estava fazendo. Meus homens viram. – ele parece zangado outra vez, realmente muito zangado – Eu te avisei, Rosie.
Pegando meu braço com rapidez, Alexandre arrasta-me com brutalidade para dentro da casa. Tropeço incansáveis vezes em meus sapatos, até ser jogada para dentro de meu quarto.
– Ficará aí até nosso casamento, para que não me cause mais dor de cabeça e problemas.
E sai, trancando a porta em seguida. Estou perplexa com isso, e não sei da onde tiro forças para bater a porta e gritar para que me tirasse dali.
Argh, eu odeio esse homem!
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