A Prayer For The Heartless escrita por Izzy Aguecheek


Capítulo 5
Luke


Notas iniciais do capítulo

Sim, eu demorei um bocadinho, porque viajei e usar o computador pra postar aqui onde eu tô ficou meio complicado. Mas aí está: o Luke tentando ser uma pessoa boa, como sempre, e o Sebastian respondendo sendo uma bruxa dos infernos, como sempre. Vejo vocês lá embaixo!



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/646986/chapter/5

What’s so good about picking up the pieces?

What if I don’t even want to?

O que é tão bom a respeito de juntar os pedaços?

E se eu nem quiser?

Pierce The Veil – Caraphernelia

Foi só quando a raiva diminuiu um pouco e Sebastian conseguiu pensar com clareza que ele se deu conta de que não tinha exatamente como voltar para casa, mesmo que a casa se encaixasse na definição de lar. Isso o deixou com raiva de novo, mas dessa vez ela era direcionada a seu pai.

Como todo adolescente rico e (não exatamente) mimado, Sebastian tinha um carro, e um bem caro, por sinal. Mas, como todo pai controlador (e, na opinião de Sebastian, tirano e canalha), Valentim vivia confiscando as chaves do veículo do filho e trancando-as na gaveta do escritório.

Às vezes, era só porque Valentim estava de mau humor; nesses dias, ele mandava rispidamente que Sebastian lhe entregasse as chaves, fuzilando-o com o olhar. Quando Sebastian fazia alguma coisa errada para merecer a punição, ele não precisava dizer nada; apenas estendia a mão e aguardava.

Na segunda-feira, havia sido o segundo caso. Sebastian tivera permissão para ir e voltar da escola em seu Porsche, simplesmente porque Valentim estivera ocupado demais partindo seu lábio ao meio para se preocupar com pequenos detalhes; assim que o garoto chegara em casa, porém, fora obrigado a entregar as chaves.

Sebastian se perguntou se poderia andar até a estação de metrô mais próxima e concluiu que não faria diferença. Suspirando, se sentou no gramado dos Fray, abraçando os joelhos junto ao peito. Não queria ter que encarar o olhar de "eu te disse" de Valentim quando voltasse derrotado para casa.

Ele estava começando a planejar uma ligação para Meliorn ou Seelie quando a porta atrás dele foi aberta. Sebastian se virou, esperando que fosse Simon indo embora, e se deparou com Luke, parecendo estranhamente deslocado ali, com um copo térmico na mão e aqueles óculos de bibliotecário. O garoto revirou os olhos e tornou a olhar para frente; só percebeu que Luke não estava só de passagem quando este se sentou na grama ao seu lado.

– Jocelyn mencionou o que houve - começou Luke, em tom apaziguador. Sebastian bufou com desdém.

– Vocês gostam de brincar de telefone sem fio, né? "Clary me contou o que aconteceu", "Jocelyn mencionou o que houve" - Ele sacudiu a cabeça. - Vocês são patéticos, sabia disso?

Luke não parecia irritado; talvez um pouco triste.

– Talvez sejamos. Mas há coisas piores, Sebastian.

– Vai contra minha política pessoal debater questões filosóficas antes de pelo menos uma dúzia de drinques - Ainda sem olhar para o lado, Sebastian estendeu a mão, como se exigisse algo. - Você tem um drinque aí?

– Se você considerar café como um drinque…

Sebastian torceu o nariz, em uma imitação quase perfeita de Valentim.

– Nada de psicanálise para mim, então.

Luke suspirou. Com o canto do olho, Sebastian pôde vê-lo sacudir a cabeça.

– Eu não ia tentar te psicanalisar, Sebastian.

– Tá, claro.

– Nem todo mundo é seu inimigo, sabe.

Em resposta, Sebastian deu a gargalhada mais sem vida que já se lembrava de ter produzido, o que era impressionante, considerando que ele dificilmente ria com alguma vivacidade.

Teimosamente, Luke continuou, embora houvesse alguma alteração em seu tom:

– Eu só queria perguntar como estão as coisas. Jogar conversa fora, e tudo isso.

Ele não era tão inabalável quanto Jocelyn; Sebastian notou isso é decidiu descobrir quanto era preciso para perturbá-lo.

– Por favor, pare de tentar parecer jovem. Está ridículo - Ele arrancou um tufo de grama do chão, aparentemente desinteressado. - Achei que você fosse ficar do lado da Jocelyn. Já que você é o cachorrinho dela e tudo mais.

Mesmo sem olhar para ele, Sebastian percebeu que o comentário tivera algum efeito sobre Luke; desenvolvera quase um sexto sentido para isso. Entretanto, o homem insistiu em permanecer tentando soar casual:

– Na verdade, Jocelyn não me disse exatamente o que houve entre vocês, só mencionou que houve algo. Então, imagino que não seja uma situação na qual eu precise tomar um partido.

– Ou talvez não fosse da sua conta - sugeriu Sebastian. - Que nem a minha vida, aliás.

– Não vamos falar sobre a sua vida, então - Luke deu de ombros. - Sobre o que você quer falar?

Sebastian revirou os olhos. Ele deveria apreciar o interesse de Luke, mas aquilo só o deixava irritado, o que era estranho. Geralmente, era mais difícil se irritar com Luke do que com os outros.

– Por que você quer falar comigo, de qualquer forma? - retrucou. Ele pretendera falar de forma desdenhosa, mas sua voz soou ansiosa a seus próprios ouvidos, talvez porque ele quisesse mesmo saber a resposta.

Ao contrário do que Sebastian esperava, Luke não vacilou antes de responder:

– Porque ninguém fala com você de verdade - Diante da expressão perplexa que Sebastian não conseguiu esconder a tempo, ele acrescentou: - Eu nunca te fiz nada, nem você a mim. Não temos nenhum motivo real para não conversar.

Se Luke esperava que aquele comentário o tranquilizasse, errou feio. Sebastian olhou para ele como se ele tivesse acabado de sugerir que os dois se jogassem na frente de um caminhão em alta velocidade.

– Tirando o fato de que eu nunca fui exatamente aberto com você - disse, recuperando a pose. - E que eu te chamo de cachorro o tempo todo, claro, mas acho que você já se acostumou com a verdade.

Luke suspirou.

– Você não está ajudando.

A situação inteira era ridícula, pensou Sebastian, desde o nome na caixa de correio à frente deles e a grama irritando suas pernas até o homem sentado ao seu lado e sua baboseira. Uma parte dele queria realmente conversar, mas isso era ridículo também; o resto (que ele considerava como a parte sã) sufocou essa ideia.

Depois de alguns minutos de silêncio, Luke disse:

– Eu conheço seus pais desde que éramos adolescentes, sabe. Seu pai costumava ser meu melhor amigo.

– Antes de você roubar a mulher que ele amava?

Os lábios de Luke se crisparam quase imperceptivelmente.

– Ele "roubou" - Dava para sentir as aspas na voz dele. - a mulher que eu amava antes.

– Ah, meu Deus - murmurou Sebastian. - Drama amoroso de gente velha. Que ótimo assunto, realmente.

– Nós não éramos velhos - lembrou Luke, sem se alterar. - Na verdade, seus pais se casaram bem jovens.

– E se separaram bem jovens, também - rebateu Sebastian, dando de ombros. - Então, não importa.

– O amor é importante enquanto dura, mesmo que acabe depois.

Ridículo, ridículo, ridículo. Dessa vez, havia emoção no riso de Sebastian; ele curvou o corpo, dobrando-se de tanto rir.

– Cara, você não pode responder a tudo que eu falo com filosofia barata - disse, quando conseguiu recuperar o fôlego, secando as lágrimas de riso.

– Melhor filosofia barata do que arrogância fingida - observou Luke. A não ser pela anotação mental de que agora conseguira aborrecê-lo e de ter ficado sério de repente, Sebastian não deu sinal de ter ouvido o comentário.

– E não tem nada a ver com essa merda de amor, sabe - prosseguiu. - Ele não a amava.

Assim que as palavras deixaram sua boca, ele soube que era mentira. Valentim amara Jocelyn um dia, mesmo que tivesse sido de maneira completamente errada. Luke o fitou, curioso, da maneira que Sebastian mais detestava: como se estivesse analisando-o.

– Ele batia nela - disse Sebastian, à guisa de resposta para o olhar interrogativo do outro. Sua voz e seu semblante estavam completamente vazios. - Não sei se ela te contou. Mas eu me lembro disso.

Luke parecia completamente surpreso. Com uma satisfação cruel, Sebastian imaginou que Jocelyn estaria no divã do psicanalista naquela noite.

– Ele… - Luke pigarreou, limpando a garganta antes de continuar. - Ele certamente não fazia isso na sua frente.

– Valentim nunca se preocupou em me proteger - respondeu Sebastian, de forma quase ausente.

A memória de Sebastian costumava ser seletiva com aquilo que deixava vir à tona diariamente, mas, quando ele pensava em determinados acontecimentos desagradáveis, eles afloravam com clareza absurda. Ele se lembrou de estar parado na porta da sala, assistindo, enquanto Valentim erguia o punho, segurando Jocelyn pelo braço. Ela vociferava, ameaçando-o, mandando - pedindo– que Sebastian fosse embora. Ele nunca ia embora, mas também não se metia.

Sebastian não se lembrava de ver Jocelyn cedendo. Ele não sabia que não herdara sua combatividade do pai.

– Foi por isso que ela fugiu antes de pedir o divórcio - concluiu Sebastian. Por isso e porque tinha um filho anormal. Fora o que Valentim lhe dissera.

– Eu sinto muito que você tenha tido que passar por isso.

Havia uma delicadeza na voz de Luke que fez Sebastian desejar poder, ao menos uma vez, agir como uma pessoa normal e aceitar que alguém o confortasse. Mas ele não conseguia.

– Tanto faz - disse, desconsiderando as palavras com um aceno de mão. Você não precisa - e não merece - da pena de ninguém, Valentim o havia ensinado. - Não era eu que apanhava.

– Não?

O olhar de Sebastian praticamente faiscou.

– Como eu disse: não é da sua conta.

– Acho que não. Desculpe - disse Luke, após uma pausa.

– Você é a única pessoa do mundo inteiro que se desculpa por levar uma cortada - Sebastian se levantou, indicando que a conversa acabara. - Acho que vou pegar o metrô.

– Eu posso te dar uma carona, se você quiser.

Sebastian o encarou, pensativo. Imaginou a expressão de Valentim se o visse chegando em casa no carro de Luke e quase sorriu.

– Você é um cara legal, no fim das contas - disse. Ele concluiu que podia fazer essa concessão, considerando que Luke fizera por ele algo que ninguém mais pensara em fazer: ouvi-lo. - Mas acho que vou recusar.

Luke deu de ombros, levantou e estendeu a mão.

– Se precisar, estamos sempre aqui - disse. - Apareça.

Ele realmente era um cara legal, mas, depois do que acontecera na cozinha, Sebastian duvidava que fosse bem-vindo na casa dos Fray/Garroway. Ele abriu o um sorriso seco, retornando à atitude sarcástica de sempre.

– Obrigado - disse, dando as costas ao outro sem apertar-lhe a mão. - Mas eu não preciso de alguém para juntar os meus pedacinhos ou algo do tipo.

Valentim não estava em casa quando Sebastian chegou. O garoto se arrastou até o quarto e se deixou cair de cara na cama, inexplicavelmente cansado. Ele preferia quando tinha certeza de que ninguém queria nada com ele. Era bem mais simples daquele jeito. Ele estava acostumado a ficar sozinho; não sabia que havia outra opção.

O dia seguinte era quarta-feira, e Sebastian tinha um trabalho de literatura para entregar. Como não tinha feito o trabalho e não estava a fim de aturar as fofocas à mesa dos Fairfolk, pensou em ir até a lanchonete em frente ao colégio para almoçar e continuar lá até o término da aula de literatura, que era a primeira depois do almoço. Porém, sabia que Theresa Gray o deduraria para o diretor, que, por sua vez, o deduraria para seu pai, que o deduraria para o cinto; então, cumpriu apenas a primeira metade do plano e levou zero com louvor no trabalho.

Esse zero e a ira que Valentim sentiria ao vê-lo em seu boletim foram os únicos motivos que levaram a Sebastian a comparecer a todas as aulas da quinta-feira. Na sexta-feira, porém, ele decidiu que não estava nem aí e subornou o vigia da escola para que o deixasse sair e matar os dois últimos tempos.

Não havia muito o que fazer, porém; ele correria o risco de encontrar algum conhecido de seu pai se fosse a algum lugar muito frequentado. Sebastian se esgueirou para o beco atrás da escola, que sabia ser frequentado apenas por skatistas que havia largado a escola e drogados que provavelmente largariam a escola antes do fim do ano. Às vezes, ele pensava que devia ser legal ser um deles. Exceto pela parte da morte dolorosa por câncer de pulmão ou overdose aos vinte e sete anos; Sebastian pretendia morrer de uma forma um pouco mais memorável.

Alguém lhe ofereceu um cigarro. Ele conhecia o garoto de vista, das tantas vezes que se escondera ali, e aceitou. Tentava não fazer disso um hábito - a última coisa de que precisava era ter que esconder um vício em drogas de Valentim -, mas, naquele momento, sentia que uma distração poderia ser útil.

Sebastian se sentou no chão duro, apoiando as costas em uma das paredes pichadas, e pegou o celular. Havia duas mensagens não lidas, ambas do mesmo número; ele não o havia salvado, mas sabia a quem pertencia. A primeira era do dia anterior, e dizia:

Sexta-feira à noite? Ele vai estar trabalhando.

A segunda fora enviada naquela manhã:

Meliorn vai sair com os amigos, também. O que vc acha?

Sebastian sorriu para si mesmo. Talvez aquilo fosse o que ele estava procurando: uma distração de verdade, com alguém com quem ele sabia exatamente em que pé estavam. Ele digitou a resposta:

Acho uma ótima ideia.

Após pensar um pouco, acrescentou, só para não perder o hábito dos joguinhos mentais:

Senti sua falta.

Era mentira, e o destinatário sabia, pois a resposta chegou logo em seguida:

Aposto que sim.

Sebastian sabia que a troca de mensagens acabava ali. Afinal, jogos mentais eram sua especialidade.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Opiniões? Alguém sabe de quem são as mensagens? De novo, peço que, por favor, apontem qualquer erro que eu possa ter cometido, já que eu não tenho um beta nem nada assim. Sem previsão pro próximo, mas vou tentar ser mais rápida. Até!



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "A Prayer For The Heartless" morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.