45% escrita por SobPoesia


Capítulo 34
Sexo




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Comemos calmamente até um horário ótimo para irmos até a rodoviária. Ainda faltava uma viagem não tão longa até a cidade praiana, até o nosso destino final.

Estava animada para ir até lá e passar o dia junto com o meu melhor amigo, mesmo que fosse seu último dia. Não conseguia conter as minhas pernas ou o ar rarefeito em meus pulmões.

Chegamos a rodoviária e seguimos para o local de espera do nosso ônibus. Lá havia um banco surrado, com um forro surrado, pernas surradas, que fazia um barulho surrado, o que me fez achá-lo perfeito. Sentei-me em seu meio, não conseguiria ficar em pé por muito mais tempo. Evans se sentou a minha esquerda e 45% a minha direita.

Haviam várias pequenas coisas na nossa vida cotidiana que nunca me incomodaram, mesmo que fossem estranhas. Em parte, eram tão normais que se tornavam insignificantes e eu nem ao menos era capaz de notá-las. Mas, agora, como todas as coisas rotineiras iriam acabar, todas elas mereciam um olhar diferente, mereciam ser observadas e, muitas delas, questionadas, porque, no final do dia, elas começaram a me incomodar muito.

Essa nossa formação, nossos corpos alinhados sempre daquela maneira, era uma dessas pequenas coisas que me davam muito nos nervos.

Olhei para eles. Estavam juntos e não se mantinham como um casal para me colocar em seu centro. Meus pés batiam no chão freneticamente. Em quantas mais coisas eu os impedi de serem um casal, pois tinha de me intrometer? Queria ir para um canto e pensar naquilo calmamente, os deixaria sozinhos para que pudessem ter um tempo para si, terem a sua felicidade sem a minha presença.

O loiro segurou a minha mão, notando minha inquietude.

—O que está acontecendo?

—Porque vocês nunca estão juntos? – me apoiei sobre meus joelhos.

—Como assim? – ele juntou as sobrancelhas.

—Se vocês estão realmente juntos, porque sempre acabam me colocando no meio de tudo?

—Nós não estamos juntos. – Bruni interviu.

—Violet, nós passamos por coisas difíceis e o sexo ajuda. Essa frustração de ter perdido pessoas, de estar constantemente com medo da morte... Toda essa história acaba com qualquer pessoa. Isso aqui é alguma forma estranha de lidar com isso. E se não fosse com ela, seria com outra garota. Você tem seus cigarros e nós transamos quando você saí do quarto. – o tom de voz de Evans me fez tremer.

Ele estava sério, como quando meu pai me disse que ia largar a minha mãe.

—Violet, eu nunca me entregaria sentimentalmente a outra pessoa que não fosse você. Essa bagunça nunca foi sobre sentimentos. – 45% tomou minha outra mão.

Porque tinham de repetir meu nome várias vezes? Ok, a pré-adolescente aqui já entendeu que sexo nem sempre tem a ver com amor.

—Não falem comigo como se eu tivesse cinco anos, eu entendo isso. Eu só... Não consigo entender isso. – suspirei.

—O que? Entregar apenas seu corpo para uma pessoa? – ela continuou, em um tom materno que me fazia ter vontade de vomitar.

—Para mim, isso é tudo um grande erro. – assenti.

—Então... Você realmente gostava da Abby? – o loiro se aproximou mais.

—Vocês não sabem o quanto.

O assunto acabou ali. Não nos valia de mais nada ficar falando sobre uma ferida claramente aberta, mesmo que já fosse um assunto resolvido.

Toda aquela história de Abby ainda me doía muito, mas não havia mais nada sobre o que conversar.

Já falar sobre essa relação... Não era algo que eu realmente quisesse fazer. Entendia toda aquela bagunça de descarregamento emocional, mesmo que não concordasse com ela. Sabia que ajudava e não seria eu a pessoa para apontar culpados e julgar.

Bufei e recostei a minha cabeça na parede. Recebi uma mensagem e peguei o telefone, li palavras desesperadas vindas de nossa enfermeira, mas fiquei olhando pra a tela acesa e meu papel de parede.

Minha mente estava em mil lugares diferentes, pensando em todas as coisas horríveis que poderia pensar, doendo um pouco nos cantos, talvez muito.

—Você vai ligar para ela? – Bruni se recostou ao meu lado, cruzando os braços.

—Odeio ser a pessoa que vai te contar isso, mas... No século 21, as pessoas não realizam mais chamadas telefônicas. Na maioria dos casos a gente usa uma coisa mágica chamada mensagem de texto, ou até mesmo, aplicativos de conversa... Tem um muito famoso chamado WhatsApp. – sorri.

—Não! Não... Eu acho que o que ela quis dizer na verdade foi algo do tipo: - ele limpou sua garganta, então imitou a voz aguda de 45% - “Você vai falar com outra garota na minha frente?”.

Bruni fechou seu cenho com as sobrancelhas apertadas juntas:

—Vocês dois estão errados. Não foi isso que eu quis dizer.

—Sim, foi exatamente isso que você quis dizer. – eu e o loiro dissemos em uníssono, a observando.

Então, ela virou o rosto e sorrimos.

—Sem essas brincadeiras de quinta série. Eu não vou falar com ela. – suspirei.

—Por quê? – Bruni continuou.

—Porque ainda não é a hora. – a olhei fundo nos olhos.

Ela sabia o que eu queria dizer com isso e era ruim que soubesse. 45% era uma garota incrível, uma garota que tinha tomado meu coração em suas mãos tão rapidamente quanto iria embora da minha vida, mas isso não era tudo.

Existe uma vasta diferença entre todas as paixões e amores de sua vida e a pessoa certa. Disso eu tinha todas as certezas que se pode ter. A forma como não queria que Diana entrasse na bagunça que era a minha vida dentro do hospital só provava para mim, para Bruni e para o meu inconsciente que tinha achado a garota certa.

Se ela era a certa, porque a meter nessa confusão?

Diana poderia esperar alguns meses, alguns poucos meses para que isso tudo acabasse. E se não pudesse... Então nunca foi para ser.

Enquanto isso, eu tinha outra garota para tomar conta. Com seus olhos esquisitos, mordendo seu lábio de nervosismo, sobrancelhas juntas e dobrinhas na testa, 45% precisava disso, de mim, de cuidados, de ter alguém para segurar a sua mão quando Evans fosse, para limpar as suas lágrimas, para a guiar no escuro da cegueira e não ir embora quando o câncer começasse a falar por ela. E se algum dia eu fui feita para um trabalho, esse era ele.

Então, nosso ônibus chegou. Esperamos algumas pessoas entrarem nele para procurarmos bancos na parte da frente. Nos esprememos todos juntos em uma poltrona feita para duas pessoas e depois de minutos a viagem começou. Cada um com sua playlist e seu urso de pelúcia entrou em seu mundo e esperou que a viagem acabasse logo.


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