Espera(nça) escrita por Lalye


Capítulo 6
Mas precisamos refletir


Notas iniciais do capítulo

Tenho a impressão que tem mais gente lendo do que comentando e isso tá me deixando deprê. T_T Preciso de um termômetro, galera. Leiam com carinho esse capítulo de uma Sakura bem confusa ♥



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Ser filha da “sabedoria” de Clow é maravilhoso, mas não é de todo fácil. É claro que meu pai sempre tornou as coisas muito fáceis para mim e isso é bom. Sempre encontrar carinho, apoio, palavras sábias, confiança e um abrigo emocional do tamanho do nosso planeta. Mas eu preciso confessar que também é terrível para mim, as vezes, não ter passado por aquela fase em que se tem a certeza absoluta de que os pais estão sempre errados sobre tudo. Meu pai sempre está tão certo que eu nunca tive a chance de fazer besteira por conta própria e me sentir revolucionária, pois em tudo o que eu escolho, mesmo que diferindo do que ele acredita, ele sempre está definitivamente certo e me dá, ainda por cima, toda a liberdade para acreditar que nem eu estou realmente errada.

Você conhece a história dos meus pais porque eu já te contei. O amor deles é lindo e eterno, e ele rega o meu núcleo familiar todos os dias, pois continua vivo mesmo com a morte da minha mãe. Eu fui criada pelo amor dos meus pais embora orfã de mãe, porque meu pai nunca deixou transparecer a falta desse amor, ele está em tudo aqui na minha casa - nos gestos do meu pai ao cuidar de mim e do meu irmão, nas histórias que ele conta sobre a vida deles, em toda a presença da minha mãe que está aqui em porta-retratos, pinturas e em todas as coisas que ela gostava de fazer. Talvez por ele ser a reencarnação do Clow e ter uma visão e sabedoria muito diferente sobre as coisas, ou por enxergar em mim e no meu irmão a vida da mamãe, é como se ela não tivesse realmente partido e ele não se sentisse realmente sozinho. E tudo isso molda a visão que ele tem sobre amor e a visão sobre o nosso relacionamento e o que ele se tornou.

Meu pai acredita no amor que sinto por você, apesar de todas as coisas que eu fiz (as que eu já te contei e as que irei contar). Ele vê em nós coisas que eu não consigo enxergar e posso compreender isso pois o amor dele é infinito e inalterável enquanto o nosso, querido, é humano. Como eu disse na primeira parte dessa carta, para além do tempo e o espaço o que muda em nós são os sentimentos - e talvez, só talvez, os nossos não fossem sublimes tanto quanto eu sonhei, ou pelo menos suas novas formas não sejam, para sustentar todas as mudanças que ocorreram em nós, explicitadas a todo momento por nossas lacunas e as tantas vezes em que pudemos estar juntos e não estivemos.

Um dos motivos, portanto, por eu estar terminando com você, para além da história que já te contei, são as mudanças pelas quais passamos - em tantos âmbitos - que eu temo que não sustentem mais o nosso amor e, quem dirá, o nosso relacionamento. E sim, eu sei que pareço pessimista demais por dizer que nosso amor possuir fraquezas, ainda mais para quem se dispõe a fazer esse monólogo todo para justificar um término que a pessoa mais sábia do mundo acha um desperdício.

Mas, acredite, não se trata realmente de pessimismo, acredite.

Eu sou o resultado de um amor que foi além da morte mas isso não significa que hoje eu possa vivê-lo em todas as minhas relações. Meu pai crê que o sentimento que tenho por você tem potencial para que eu crie uma nova forma de amor baseado nesse em que eu fui criada. Ele acredita que meu amor tem o poder da minha mágica, e que por meio dessas duas coisas nós podemos transformar nossas vidas - nossos futuros - em algo grandioso, em um amor poderoso à nossa maneira. É lindo, eu sei. Eu pareço uma desacreditada por simplesmente não tentar, só jogar a toalha e ir fazer outra coisa da minha vida sem nem tentar ir até a China ou te pedir para vir ao Japão para esclarecer tudo - não atendendo as suas ligações e não abrindo seus e-mails, mensagens e te bloqueando sem ouvir o que você tem para me dizer. Parece covardia, não?

Por outro lado, em todos esses anos em que você esteve longe, até o momento em que eu comecei a enviar este tratado sobre nosso término, você não ofereceu resistência às lacunas e à distância. Você questionava sobre meu dia, questionava sobre minha rotina, mas nunca perguntou como eu me sentia acerca de muitas coisas e isso foi algo que eu só percebi recentemente. Você me deu um gigantesco espaço para que eu contasse o que eu quisesse, apenas, e eu fiz o mesmo com você, inconscientemente. Eu me pergunto até onde isso está certo, até onde estamos nos mantendo fiéis a nós mesmos ou apenas ao nosso antigo e, até certo ponto, infantil amor. Mas isso tudo, é claro, não justifica o fato de agora eu estar terminando com você de maneira abrupta e sem te dar nenhuma chance de resposta.

Bem, querido, talvez, dessas três coisas (pessimismo, descrédito e medo), a que mais me impulsiona a terminar com você seja a terceira. Se as nossas mudanças criaram lacunas, e elas tornaram nossos sentimentos diferentes daqueles que nos fizeram começar essa história, e hoje eu não espero mais a resposta delas, é porque eu tenho um medo absurdo do que elas representam, e da mudança dos sentimentos de você para mim, porque eu tenho o domínio sobre aquelas de mim para você, que seriam completamente ambíguas não fosse o medo. O pessimismo e o descrédito vem dessa dúvida que eu não quero ter respondida, são filhas da carta que eu não quero receber, da espera pela qual eu não quero passar e da esperança que eu não quero ter, pois os meus sentimentos são bambos e geram dúvidas entre o que ainda resta de nós em um eu e você.

E antes que eu me torne mais confusa do que já estou, porque foi mais fácil justificar para o meu pai, ouvir as razões dele, pensar, matutar, refletir e estruturar mentalmente uma carta do que realmente escrevê-la para você e eu já sinto uma batata na minha garganta. Isso está se tornando uma tarefa muito mais difícil do que eu pensei quando comecei, e creio que escrever tenha sido a única maneira porque eu duvido que conseguiria falar tudo isso para você sem ter um ataque de nervos ou qualquer outra coisa, porque já estou tremendo só de precisar fazer isso e...


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