Elementar escrita por LunaLótus
Notas iniciais do capítulo
"Ser um pouco normal. Será que isso é pedir demais?"
– Renato! Renato! Acorde! – chama Thaís, balançando o corpo sonolento do namorado.
– Hmmm... O que foi...?
– Água! Um sonho! É uma garota! Dezesseis anos, no máximo. E ela está... está...
Mas Thaís não consegue lembrar. Renato se senta abruptamente na cama, totalmente desperto.
– Você sonhou com a convocada da Água?
– Sim! Só não sei dizer se foi real ou apenas minha imaginação.
– Não, não, não... – Renato balança a cabeça, tentando clareá-la. Para, olhando para o travesseiro onde Thaís esteve deitada, o rosto agora muito sério. – Foi real.
– Como pode ter tanta certeza? – indaga Thaís.
– Por isso.
Ele aponta para o travesseiro. Ela quase não consegue enxergar. Ali, delicadamente colocada, está uma pequena escama de peixe, quase invisível no pano branco em que se encontra. Thaís olha para Renato, mas estende a mão, pega a escama, receosa, e a coloca na palma.
– Impossível... – sussurra ela. – Impossível.
Renato está calado, olhando para a pequena escama.
– É de verdade? Quero dizer, é realmente de um peixe? – pergunta ele.
– Acho... Acho que não. Parece ser como o meu colar, feito do elemento Ar. É engraçado. A escama dá impressão de estar molhada, mas a minha mão está perfeitamente seca.
– Deixe-me ver.
Thaís estende a escama para seu namorado, e ele a pega cuidadosamente, alisando-a contra a própria pele.
– É verdade – Ele sorri, mas parece confuso. – Parece que vai se dissolver na minha mão.
– De onde você acha que é? Tipo, em que país a Água deve estar?
– Onde você a viu?
– Parecia... O mar. Era o oceano, definitivamente.
– Bem, isso não ajuda muito. – Renato vira a escama na palma da sua mão, distraído. – Poderíamos ter...
Ele se interrompe, olhando mais atentamente para o pequeno objeto. Aproxima-o do seu rosto para saber se não está imaginando coisas. Não pode acreditar. Estava fácil demais. Será?
– Olhe isso aqui, Thai. Há uma pequena letra aqui. Pode ser uma pista, mas...
– Onde?! – Thaís está agitada.
– Aqui, olhe. É bem pequeno. Tem o símbolo da Água, mas aqui embaixo do desenho... Uma letra, ou melhor, duas. Uma sigla: IT.
– O que isso quer dizer? – sussurra a jovem em estado de choque.
– Não sei. Mas temos que ter cuidado. Pode ser uma armadilha.
– Ah, qual é, Renato! Duvido muito que seja! O governo não tem tanta mentalidade assim para armar um plano como esse. Se eles tivessem certeza que sou o Ar, eles já teriam me matado, e não tentado fazer com que eu saísse procurando a outra.
– Você tem razão – diz ele. – Temos que tentar descobrir o que significa isso.
– Talvez sejam as iniciais do nome dela.
– Ou uma mensagem subliminar, como um código secreto. Podem representar números ou letras anteriores a essas. O que teríamos então?
– Os números 9 e 20. O que isso iria querer dizer? E se fossem letras... Seriam H e U. Não faz sentido!
– Eu sei que não, mas vamos tentar pensar e encontrar pistas. Talvez quando... Quando você partir, entenda isso direito.
Thaís se levanta da cama e vai até a pequena cômoda ao lado da porta do banheiro. Tira um pequeno caderno vermelho da gaveta, procura uma caneta e volta para o lado de Renato.
– Talvez se colocássemos tudo isso num papel nos ajudaria a pensar.
Ela escreve:
Água:
Mar, oceano – litoral
“IT” – o que seria?
9 e 20
H e U
E o nome dela?
– Pronto – diz ela. – Mas ainda não consigo encontrar a resposta.
– Você precisa ter cuidado. E se alguém pegar esse caderno?
– Não irá ler nada demais. Olhe, um truque que aprendi com meu pai.
Thaís aproxima o caderno dos lábios, fecha os olhos e mentaliza uma frase. Inspira lentamente, abre os olhos, e assopra suavemente a folha. Renato prende a própria respiração, curioso. As palavras se soltam da página como se tivessem vida, embaralhando-se. Devagar, uma a uma, elas formam um redemoinho até parecerem um borram e vão sendo consumidas pelo papel, surgindo novas, apresentando um pensamento:
“O Amor não é o que nossa mente apresenta e tenta definir ou identificar, mas sim o que o nosso coração reclama como seu.”
– Lindo. Genial. Eu te amo – diz Renato, e a beija na testa.
Ele se levanta e vai ao banheiro. Thaís suspira e decide sair da cama. Não adianta adiar o inadiável. Ela tem treinamento. Renato vai gostar que ela se mostre disposta e faça também alguma coisa na casa, pra variar. Talvez se ela preparasse o café da manhã. Planeja até ir dar uma volta pela praça, ver as pessoas, conversar, sair um pouco desse mundo caótico e ameaçado em que vive. Ser um pouco normal. Será que isso é pedir demais? Toma coragem e ergue o tronco desajeitadamente, ainda sonolenta. Caminha se apoiando nas paredes e sai do quarto.
Thaís está sentada no sofá, o pensamento em lugares muito distantes. Parece que faz séculos que seus pais saíram de casa, mas não. São apenas três dias. Quanta saudade...! Como estaria Thaíssa agora? E seu pai? Estaria se alimentando bem? E sua mãe estaria se distraindo de alguma forma? Ela deseja que sim. Deseja que nada da vida deles mude por causa dela, apesar de a vida dela ter mudado completamente por causa do passado deles.
A jovem balança a cabeça para espantar essas ideias. O café da manhã já está pronto, não há muito mais para se fazer. Ela levanta e vai até o banheiro do térreo, lava o rosto e se encara no espelho.
– Sem dúvida houve progressos hoje. Talvez passear seja uma boa recompensa.
Thaís sai do banheiro. Renato já a espera à mesa, servindo aos dois. Ela se senta e eles comem em silêncio. Depois de um longo momento, ela decide falar:
– Renato, estou pensando que depois do treinamento talvez possamos passear por aí. Preciso ver outras pessoas ou irei enlouquecer. Preciso saber que a vida é normal em algum lugar.
– Eu ia falar com você, amor. Preciso ver meus pais. Há três dias que não tenho contato com eles.
– Desculpe por estar tomando tanto o seu tempo – Ela baixa os olhos.
– Não. Eu amo estar aqui com você, mas são meus pais. Você os conhece.
O casal sorri um para o outro e ela murmura:
– Conheço, felizmente. Acho que vai ser bom para você ir passear um pouco.
– Mas e você? Não quer vir comigo?
– Não posso. Seu pai trabalha numa fábrica, lembra? Alguém perigoso pode estar em sua casa. É melhor não arriscar. Mas mande um beijo por mim a eles.
– E o que você vai fazer aqui sozinha?
– Acho que vou andar pela praça. – Ela dá de ombros.
– Isso pode ser perigoso.
Thaís suspira e dá uma garfada em seu prato.
– E o que não será perigoso pra mim agora, Renato? Não adianta fugir dessa realidade: só estarei realmente segura quando esta guerra acabar. Enquanto isso, acho que você vai ter que se acostumar a ter uma namorada com risco de morrer. – Sorri.
– Mas tenho o direito de me preocupar com você, não tenho?
– Tem todo o direito, meu amor. Não só o direito, como o dever também.
Renato ri e levanta, beijando-a na testa. Ele retira os pratos da mesa e os leva para a cozinha. Thaís sai da mesa e vai para a sala esperar seu namorado. Depois de alguns breves minutos, o jovem retorna e pergunta:
– E agora?
– Treino. E depois, folga. Fechado?
– Fechado. Vou pegar as armas.
Ele desaparece por uma porta onde estão guardadas as armas letais. Minutos depois, o casal sai da casa e caminha até a clareira em que antes tinham treinado. Renato coloca todas as armas no chão e se vira para Thaís.
– Qual arma hoje? – pergunta ele.
– Que tal o bumerangue?
O jovem se abaixa e recolhe a ferramenta, analisando-a.
– Ótimo. Não há muito segredo com essa. Na verdade, aqui você vai precisar mais do domínio do Ar. Mas podemos treinar a sua força de arremesso. Não se esqueça que ele sempre volta pra você, então veja se consegue agarrá-lo. Se não conseguir, saia do caminho, ok?
– Ok. É só isso?
– Sem você ter domínio completo do Ar, é só isso.
– Então não seria melhor que eu dominasse o Ar antes?
– Tecnicamente. Mas para um kit de sobrevivência, acho que suas prioridades estão nas armas. E então? Vamos começar?
Thaís assente, nervosa, e pega o bumerangue. Acha-o leve, como o ar, mas não se surpreende já que ela própria é a representante do elemento. Ela olha para Renato e pergunta:
– Não há mais nenhuma recomendação? Ontem você falou muito das shurikens.
– Exatamente. Essas armas possuem um funcionamento muito parecido. Mas logo que você treinar suas habilidades com o Ar, poderá usá-las melhor.
– E quando vou começar a treinar com o Elemento?
– Acho que não vou poder te ajudar nisso. Não muito, quero dizer. O treinamento real você receberá na base.
Ela balança a cabeça, pensativa.
– Como você sabe tanto sobre isso, Renato? Como sabe tanto sobre a base?
– A maior parte é intuição. E seus pais me falaram um pouco sobre esse mundo antes de partirem.
– Ah.
– Muito bem. O seu alvo é o mesmo que o de ontem. Dessa vez, tente acertá-lo pro trás. Assim. – Ele pega o bumerangue e o atira no ar, alguns centímetros mais distantes do tronco. A arma volta e atinge a árvore por trás. – É um elemento surpresa contra seus inimigos. É fácil. Tente.
Thaís faz o primeiro lançamento. Não é perfeito e ela erra o alvo por pouquíssima coisa. Sente raiva. Imagina que aquele tronco é um andróide que quer matar sua família, seu namorado e todos os que ela ama. Tenta lançar de novo, mas sua força excessiva destrói outra árvore que está perto do alvo.
– Calma, amor. Controle sua força. Respire fundo e tente.
Renato se afasta de novo. Ela respira fundo e olha para a árvore. Estende o braço, passando em frente aos olhos, do modo que tenha a visão somente da parte superior do tronco. Em um movimento amplo, Thaís lança o bumerangue. A arma descreve um arco perfeito perto do alvo e então, na volta, o atinge em cheio.
– Isso! – ela vibra. – Isso!
– Muito bem – Renato bate palmas, encorajando-a. – Exatamente assim. Continue tentando e logo todos os seus lançamentos serão tão perfeitos como esse.
– Existe uma técnica? – pergunta ela.
– Na verdade, existe, mas eu quis que você descobrisse o seu corpo e sua habilidade sozinha. Não demorou muito, está vendo?
– Renato! – Thaís ralha com seu namorado. – Não podia ter me avisado antes?!
– Iria estragar o plano! De qualquer forma, você já descobriu. O segredo é manter o braço firme e no seu campo de visão. Quando for lançar, descreva um amplo arco. Somente isso.
– Mas você podia ter me avisado antes! Ok. Vamos tentar de novo, dessa vez com minha mente ciente do que deve fazer.
– Certo. Vamos lá.
Thaís treina por mais três horas. Depois de um curto espaço de tempo, seus lançamentos estão perfeitos e certeiros. O casal está cansado e decide ir para casa, tomar um banho e relaxar um pouco antes de sair. Refazem todo o percurso de volta, rindo um com o outro sobre os aprendizados daquela manhã.
Eles entram na casa e Thaís é a primeira a ir para a ducha. Renato vai para a cozinha e prepara o almoço, enquanto isso. Meia hora depois, os jovens estão sentados à mesa, comendo e rindo.
– Como foi meu progresso hoje, professor? – pergunta ela.
– Foi ótimo. Você aprende muito rápido, minha pupila. – Ele sorri. – E então? Enquanto treinava, em que você pensava?
Thaís fica calada durante um tempo. Durante o treinamento, esquecera-se que Renato estava ao seu lado, e que ele sabe interpretar todas as suas emoções, o que é algo bem difícil, já que ela é uma ótima atriz. Ainda assim, sabe que se não contar a ele o que pensa, provavelmente ele ficará chateado.
– Em tudo, como sempre. Tenho raiva dessa guerra. Tenho raiva desses nerds psicopatas que querem dominar o mundo com andróides. Sinceramente, o líder deles deve ser bem maluquinho. – Ela dá de ombros.
Renato ri com gosto. Ela olha para ele e suspira.
– Você é tão melhor que eu, Renato. Não sei por que eles me escolheram. Sempre me pergunto isso.
– E eu sempre te respondo: você é mais corajosa e habilidosa.
– Quanto à habilidade, nós estamos empatados.
– Pode até ser. – Ele sorri ternamente. – Mas eu não posso manipular o Ar. E nessa guerra, é isso que conta, não é?
– Por quê? Por que precisam ser manipuladores de Elementos? Por que não podem ser pessoas comuns?
Ele balança a cabeça e dá uma garfada no prato.
– Não sei. Talvez combater tecnologia com tecnologia fosse o mais certo. A História não nos traz nada de concreto em relação à escolha da base pelos Elementares.
– E o que a História nos traz?
– Lembra-se da Primeira e Segunda Guerra Mundiais? Quantos milhares de mortos existiram, quando foi usado tecnologia contra tecnologia. Talvez eles pensem assim.
– Pode ser, mas e quanto a colonização da América? Milhares de índios forma dizimados. Os incas, astecas e maias... Civilizações pré-colombianas inteiras destruídas e, agora, esquecidas. Tudo isso porque esses povos não tinham tecnologia para se defender.
– Não podemos julgar os atos do passado. Não temos como mudá-lo. O que a base faz agora é juntar as duas coisas, tecnologia e... primitividade, acho que posso chamar assim.
– É claro. Afinal, os Elementares usam armas também, como eu. – Ela faz uma pausa, pensativa. – Você já parou para pensar que, se eu que sou o Ar uso armas ditas perigosas, qual calibre será as armas do Fogo? Devem ser bombas interplanetárias!
Renato sorri com a possibilidade.
– Provavelmente o Elementar Fogo poderia usar a bomba interplanetária, mas acho que não vá. Duvido muito que ela vá querer destruir o nosso planeta.
– É, nisso você tem razão. Mas que é uma pena, ah, isso é!
O casal ri e, depois de alguns minutos, retiram-se da mesa. Renato sobe as escadas para se arrumar e retorna vinte minutos depois. Os jovens dão as mãos e saem da casa. Thaís respira fundo. Parece que faz anos que está presa, mas é claro que isso é loucura. Afinal, ela nunca esteve confinada de verdade.
– Ah! É tão bom estar aqui fora!
Renato sorri e os dois se encaram. Estranhamente, Thaís não quer se separar dele, sente uma coisa diferente, quase como se algo a avisasse que seus dias com seu namorado estão próximos do fim. Ela balança a cabeça e expulsa esses pensamentos. Hoje não, diz a si mesma. Ele a abraça e beija a sua testa, despedindo-se.
– Até daqui algumas horas – diz ele.
– Vou morrer de saudades.
– Não vou demorar.
– Fique o tempo que precisar. Mas volte, ok? Eu amo você, Renato.
– Vou voltar, eu sempre volto. – Ele sorri. – E eu te amo ainda mais.
Eles se abraçam novamente e se separam. Renato dá as costas a Thaís e segue seu caminho. Ela o observa se afastar e depois de alguns minutos já não consegue vê-lo mais. Vira-se para tomar o caminho oposto, e quase dá o primeiro passo, ainda sorrindo, quando levanta o rosto e para abruptamente, assustada. Ele não pode estar ali.
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Hey, pessoas lindas do meu coração! O que acharam deste capítulo?! Bom, peço desculpas pela demora em postar, e também pelo capítulo grande! (Aproveito também para pedir desculpas aos meus leitores de Sob o Olhar das Estrelas!).
Enfim, resolvi organizar isto aqui: todo sábado, decidi, haverá capítulo novo de Elementar! E toda sexta ou domingo, de Sob o Olhar das Estrelas. Vou tentar postar um novo amanhã lá, ok?
Agora, os agradecimentos, porque sim! À Isaps11, Gabriel Lucena, Marys e Spy Kid, fica o meu enorme carinho, gratidão e beijo! Vocês são muito divos e lindos! Beijoos e até o próximo!