Deixe-me Gritar escrita por Mrs Days


Capítulo 2
Capítulo 1


Notas iniciais do capítulo

Capítulo betado por Lu SweetLu do Perfect Design



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Acordei com uma movimentação súbita ao meu lado seguida por um arfar. Meus olhos se abriram automaticamente e me pus sentada, esperando que minha visão se adaptasse a escuridão que envolvia o meu quarto. Não tive que esperar muito por conta da fraca luz do luar que atravessava a janela e iluminava o rosto pálido de Julian.

Meu coração pesou de preocupação ao ver seu peito nu descendo e subindo em uma respiração pesada acompanhado pelo suor que prendia seu cabelo escuro em sua testa. Assim que vi a cor voltando as suas bochechas, esforcei-me para ser cautelosa com o toque em seu ombro apenas para não assustá-lo.

Seus olhos azuis me encararam.

— Julian, o que houve? — questionei com um fio de voz.

Ele respirou fundo mais algumas vezes, antes de balançar a cabeça e passar os dedos por seus cabelos, soltando-os de sua pele. Pressionei os lábios juntos sabendo que ele iria preferir me poupar de seus pensamentos sombrios do que me assombrar compartilhando-os comigo.

— Um pesadelo, Andie. Não se preocupe — ele suspirou pesado e deu um pequeno sorriso culpado ao ver que eu estava parcialmente assustada. — Desculpe ter te acordado.

Passei os dedos pelos nós de meu cabelo, frustrada.

— Eu que deveria me desculpar por não ter te acordado. Quer conversar?

Seu sorriso se tornou genuíno enquanto virava seu corpo esguio totalmente para mim, esticando sua mão para poder afastar alguns fios de meu cabelo do meu rosto. Não desviamos os olhos um do outro e aos poucos senti meu coração se aquietando.

— Não precisa se sentir culpada. Não pode me proteger de tudo — ele arregalou de leve os olhos e veio na minha direção, deitando seu rosto na curva do meu pescoço. Comecei a acariciar seu cabelo ainda molhando dando o sinal que ele precisava para se aconchegar em mim. — Nem se você quisesse. O super protetor sou eu.

Eu ri.

— Eu sei que não posso te proteger de tudo, mas isso não me impede de tentar — afastei-me o suficiente para que ele erguesse o rosto na minha direção. Encarei-o altiva. — E isso inclui saber o que está passando pela sua cabeça para te dar pesadelos — coloquei meu dedo na pequena elevação entre seus olhos que surgiu ao franzir o cenho. — Fale comigo — pedi.

Ele suspirou, parecendo cansado.

— Prometo que amanhã eu conto — ele disse e ergueu um dedo ao ver que eu iria rebater. — Amanhã, Andrômeda — fiz uma careta ao escutar o meu nome todo e o sorriso retornou aos seus lábios. Ele se aproximou, pondo uma mão em minha bochecha e acariciou com carinho. — Agora eu preciso de você — sussurrou.

Só o seu pedido me fez fechar os olhos e Julian tomou aquilo como um sinal afirmativo. Ele terminou a distância entre seus lábios e minha pele, beijando meu pescoço com uma lentidão sufocante. Segurei seus cabelos, instigando-o a continuar. Ele subiu por minha mandíbula e mordeu com leveza antes de alcançar os meus lábios.

Eu literalmente pulei em seu colo, passando as mãos por seus ombros, subindo por seu pescoço até alcançar os cabelos em sua nuca, parando ali. Suas mãos desceram para a minha cintura e sua língua tocou a minha, fazendo todos os meus pelos se arrepiarem e minha pele esquentar. Pressionei o meu peito contra o dele, satisfeita que seu coração estivesse em um ritmo semelhante ao meu e gemi quando ele mordeu e puxou meu lábio inferior.

— Julian.

Ele fixou os olhos nos meus e eu hesitei por um momento. Era um brilho estanho, como se ele estivesse com medo e quisesse fugir. Quase parei os meus movimentos e ele deve ter pressentido isso, pois segurou em meus pulsos empurrando-me delicadamente até deitar na cama. Colocou os joelhos na cama, inclinando seu corpo na minha direção com um meio sorriso de modo que deixasse alguns de seus fios de cabelo roçando em meu rosto.

— Preciso de você — ele repetiu.

Seus olhos azuis pareciam ainda mais brilhando na penumbra e esse era um dos motivos para eu continuar apaixonada por ele depois de quase quatro anos juntos. Só que a razão número um sempre foi o modo como ele me compreendia mesmo sem saber o que estava me atormentando. Já que eu era constantemente atormentada, ele se esforçava para me dar apoio.

Eu conseguia me sentir normal ao seu lado.

— Eu também preciso — Sussurrei de volta.

Ele fechou os olhos e pressionou o restante do corpo contra o meu.

— Não sabe o quanto te amo.

Sorri de leve.

— Você pode me mostrar enquanto faz amor comigo.

Ele soltou um riso baixo e rouco antes de abaixar totalmente o seu rosto, beijando-me com ardor. Meu corpo era submisso de seu toque, assim como o meu coração. Porém minha mente periodicamente retomava a lembrança do olhar perdido dele e isso me deixava preocupada.

*************************

Acordei relativamente cedo sem o auxílio do despertador e fui cuidadosa ao me espreguiçar. Deitei-me de lado para poder admirar Julian enquanto dormia. A luz do sol destacava o tom marfim de sua pele contrastando seus cabelos negros, o lençol escondia apenas uma parte de sua cintura e se enrolava na metade de sua coxa. Impedi-me de tocar seu rosto, levantando e vestindo minha camisola que estava jogada do outro lado do quarto.

Tínhamos ficado tão exaustos na noite passada que a simples ideia de vestir uma roupa parecia absurda. Sentia meus músculos ainda doloridos, porém isso me fez sorrir ainda mais. Dei mais um olhar na direção dele antes de sair do quarto para fazer o café da manhã.

Retive a vontade de ligar o som e preferi ficar refém de meus pensamentos que logo foram direcionados para a garotinha loira que tínhamos visto no dia anterior. Por mais que o apartamento de Julian fosse praticamente minha segunda casa, era um pouco assustador com todo aquele silêncio.

Liguei a frigideira e quebrei dois ovos, escutando-os estalando. Peguei algumas torradas e as pus na mesa ao lado do suco, só que, por mais que esses movimentos fossem exatos, minha mente estava como uma fita arranhada repetindo o quanto aquela garota parecia feliz. Fechei os olhos, inclinando-me contra a mesa e lamentando novamente por aquela estranha habilidade que eu possuía.

Antes que um lamento saísse de meus lábios, senti os braços de Julian me envolvendo e seus lábios sendo pressionados contra meu pescoço. Toda a minha apreensão foi jogada para o fundo de minha mente, dando lugar ao alívio de tê-lo comigo. Virei-me e coloquei meus braços ao redor de seu pescoço, dando um leve beijo em seus lábios.

— Acordou cedo — ele disse, abraçando-me pela cintura. — Senti sua falta na cama.

Eu ri com seu comentário sugestivo.

— Tinha que vir fazer algo para comer. Sei que você acorda querendo matar um boi — respondi e meu sorriso se diluiu quando nossos olhos se encararam. — Quer me contar sobre ontem?

Ele deu um meio sorriso.

— Nós fizemos amor, não se recorda? — ergueu uma sobrancelha.

Trombei um ombro no dele.

— Estou falando sobre antes disso. O pesadelo.

Julian abaixou os olhos, todo o bom humor se tornando uma sombra. Ele ficou em silêncio por alguns segundos antes de finalmente me fitar novamente.

— Eu sonhei... — ele hesitou, parecendo procurar as palavras certas. Fiquei tensa com o que viria a seguir. — Que você queimava o meu café da manhã. E veja, eu estava certo.

Dei um salto ao me recordar dos ovos na frigideira, contudo não tive sorte em resgatá-los. Fiz uma careta com a sujeira que tinha feito e joguei o resíduo no lixo, colocando a panela na pia.

— Você quer mesmo ir para a festa de Cassidy hoje? — Julian me perguntou. Encolhi os ombros com o som da cadeira se arrastando. — Desculpe, péssimo hábito. Mas se você quiser podemos ficar em casa para aproveitar o restante do fim de semana de outra maneira.

Virei-me para ele e joguei o pano de prato em seu rosto.

— Parece que você só pensa em sexo, Julian.

Ele jogou o pano de volta, passando os dedos por seus cabelos escuros.

— Eu penso em você, o que, consequentemente, me faz pensar em sexo — ele cruzou os braços e ficou sério — Pode me responder?

Ergui uma sobrancelha.

— Você sabe muito bem que se não formos Cassidy vai enfiar as unhas em nossos olhos — sequei as mãos e me recostei na bancada da pia. — Só me prometa que não vamos ficar até tarde. Cassidy fica um pesadelo depois das três da manhã.
Julian erguer uma mão e pôs a outra em seu peito.

— Promessa de escoteiro.


*******************

Cassidy ficou um pesadelo às duas e meia da manhã. Estávamos no centro de Carson City em uma boate que todos juravam ser a melhor da capital e, pela fila que tínhamos enfrentado para entrar, esperava que eles estivessem razoavelmente certos. E até que estavam. O atendimento era bom e não era tão lotado como as outras que tínhamos visto anteriormente. A única coisa que não combinava com o ambiente era o choro copioso de Cassidy.

— Eu não acredito que Travis está aqui — ela reclamou pela quinta vez antes de virar o incontável enésimo copo de tequila. — E com aquela vagabunda da Daphne. Faz nem três meses que terminamos, Andie.

Acariciei seu ombro.

— Vai ficar tudo bem, Cassidy — prometi mesmo sem ter total certeza de minhas palavras. Só queria que Julian voltasse logo do banheiro. Cass balançou sua cabeleira loira e abaixou os olhos verdes de volta para a sua bebida. — Travis sempre foi um canalha.

— Eu sei, mas ele era o meu canalha.

Bufei sem saber o que mais dizer naquela situação. Sabia que Julian iria colocar juízo na cabeça dela ou iríamos ir para outra boate. De qualquer jeito, meus pés estavam me matando por conta daquela maldita sandália de salto alto. Por mais que o som da boate estivesse estupidamente alto ao ponto de eu ter que me inclinar na direção de Cass para escutar sua voz em um sussurro, foi impossível não perceber quando ela voltou a chorar. Ela pôs as mãos em seu rosto e seus ombros tremeram.

— Cassidy...

Não consegui de completar a frase antes de ela sair correndo em direção a saída. Meus olhos se arregalaram e tentei ao máximo não perdê-la de vista enquanto tirava o dinheiro da bolsa e dava ao barman. Ajeitei minha sandália e tentei passar pela multidão mantendo os olhos em seus cabelos, porém era praticamente impossível se contasse o fato da luz precária e quantidade de pessoas em meu caminho.

Quando vi que definitivamente a tinha perdido de vista, resolvi ir em direção ao banheiro masculino procurar Julian. Cassidy não estava em condição para sair sozinha, tanto fisicamente quanto emocionalmente. Parei na porta do banheiro, meu corpo em estado de urgência segurou o primeiro cara que saiu pela camisa e o vi me encarando com descrença e confusão.

— Pode me ajudar? Não sei se meu namorado ainda está lá dentro — pedi, falando o mais alto possível. Ele assentiu, mostrando que estava entendendo. — Pode ver para mim? Ele é dessa altura — ergui meu braço. — Olhos azuis, cabelos escuros e está usando uma camisa preta.

Ele ergueu um dedo em um pedido silencioso que eu esperasse e entrou no banheiro. Cruzei os braços e bati um dos pés, esperando meu ajudante retornar. Ele demorou apenas dois minutos, todavia pareceu uma eternidade. Tudo para ele apenas me olhar e balançar a cabeça em negativa. Agradeci com um sorriso e voltei para a multidão. Talvez Julian tenha ido até o bar nos procurar e o barman tenha dito que nos viu indo embora.

Parei em um ponto mais deserto e fiquei na ponta do pé, querendo enxergar o bar. Passei os olhos por cada pessoa que estava ali até encontrar Julian. Só que ao invés de um suspiro aliviado, o que saiu de meus lábios foi um grito contido quando o cheiro podre tomou conta do meu nariz. Todo o barulho ao meu redor se resumiu a um zunido baixo no fundo de minha mente acompanhando meu desesperado coração.

Não podia ser.

Julian estava inclinado, falando com o barman que apontou para a saída. Meu namorado assentiu e foi na direção apontada. Eu deveria ter ido atrás dele, só que meu corpo se desconectou de minha mente. Meus olhos se encheram de água e as lágrimas desceram silenciosas. Minha boca tremia e eu sabia que se a abrisse, o grito se tornaria alto e agonizante. O mundo só voltou a aparentar normalidade quando ele sumiu pela saída e todas aquelas sensações desapareceram simultaneamente.

Passei as mãos pelos cabelos e me pus a ir atrás dele. Eu tinha que fazer algo que sempre evitei. Desafiar a morte. Porque eu sabia que meus instintos estavam me alertando que a vez de Julian havia chegado.


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