Cold Blood escrita por Miss America


Capítulo 3
Capítulo 2 — Welcome To Real Life


Notas iniciais do capítulo

(Bem-vindo à vida real)

Oi amores, tudo bem? Voltei com o segundo capítulo e confesso que ele foi bem chatinho de escrever. Apesar de não ter tanta emoção quanto o prólogo e o capítulo anterior, esse é essencial para a história já que aqui vocês notam como as garotas mudaram depois de um ano. Enfim, espero que gostem e não se esqueçam de ler as notas finais, coloquei um aviso nelas :)

Músicas do capítulo:
The Black Keys - Lonely boy
Liza Anne - Room
Remmi - Star Spangled


Capítulo betado pela Cam, do Kat Fanfics.



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/636435/chapter/3

 

Capítulo 2

WELCOME TO REAL LIFE

 

Um ano depois

 

Os fios desgrenhados de Samanta Langdon balançavam com o vento. Apesar de não sentir mais seus dedos dos pés devido ao frio que estava fazendo milagrosamente naquela manhã australiana, ela se recusava a levantar-se da cama e abandonar seus cobertores macios para ter que fechar as portas da enorme varanda do quarto. As cortinas brancas pareciam dançar de um lado para o outro na janela, fazendo com que uma claridade absurda entrasse no cômodo e iluminasse o suficiente para que ela bufasse indignada e proclamasse alguns palavrões, antes de virar-se para o lado oposto da cama.

Sua preguiça era consequente das férias de verão estarem nos seus dias finais e isso significava que ela teria que voltar para a Nova Zelândia antes do tempo que gostaria. As férias haviam sido mais do que perfeitas, ficando na casa de sua mãe com vista para umas das mais belas praias do país, Sam aproveitou-as como se fossem seus últimos dias de paz e ela tinha consciência de que realmente eram. Desde a brincadeira que aparentava ser inofensiva entre as melhores amigas e a festa de início de ano promovida pelos veteranos, ainda nas ilhas neozelandesas, Sam nunca mais conseguiu colocar a cabeça no travesseiro e dormir tranquilamente sem se lembrar dos gritos de pânico, dos olhares assustados ou das expressões culpadas, quando as três amigas se reuniram na casa de seu pai para assistirem o jornal diário daquele dia que reportava sobre a notícia do desaparecimento de Alexia Grimes para todos os países da Oceania.

Duas semanas se passaram desde o incidente e a garota ainda permanecia desaparecida, o jornal continuava reportando que o principal suspeito era Ethan Williams, o novato que já tinha passagens pela polícia e que, coincidentemente, também fora o último a sair da festa. Três semanas, e como forma de se livrar da angústia que ela e provavelmente todos as suas outras amigas estavam sentindo, Sam usou a desculpa de que iria voltar para seu país natal e morar com sua mãe, em uma tentativa inútil de esquecer o sumiço da amiga. Em um piscar de olhos, um ano se foi e as demais estações passaram mais rápido do que deveriam, retornando ao maldito verão que estava ali, para trazer aquelas malditas lembranças que persistiam em assombra-la toda vez que Samanta se atrevia a fechar os olhos e esquecê-las.

De todas as coisas que podia acontecer na vida da morena depois do sumiço da Grimes, ela nunca imaginou que seria obrigada a voltar para Santa Kennedy, onde todos os seus pesadelos tornavam-se reais. Como não havia chance de escapar da viagem, a única solução que ela encontrou fora aproveitar os seus últimos dias na Austrália e a noite passada havia sido um desastre. Sam havia ficado bêbada em uma festa e perdeu a conta de quantos caras havia ficado. Como se não bastasse, uma ressaca de jogar qualquer um no chão estava atacando-a naquele exato momento e, se dependesse de sua vontade, ela teria continuado dormindo pelo resto da vida em sua cama extremamente confortável, mas sua mãe estava tão nervosa com sua viagem e com o trabalho que nem percebera que as ligações feitas no andar de baixo tinham acordado toda a vizinhança, incluindo Sam, que queria apenas que sua dor de cabeça parasse.

— Você ainda não se levantou? — Elizabeth Harris perguntou depois de Sam ouvir seus passos chegarem ao segundo andar, vendo-a aparecer na soleira da porta de seu quarto com o telefone fixo nas mãos e uma expressão cansada no rosto.

— Eu não quero levantar e não quero voltar para aquela cidade. — A garota olhou para os olhos azuis da mãe que eram iguais aos seus e fez questão de enfatizar bem os "nãos" enquanto falava, rolando para o outro lado da cama e escorregando novamente para dentro o edredom.

— Posso saber o motivo?

Sam não respondeu de imediato. Na verdade, nem ela mesma sabia o motivo de não querer voltar para a Nova Zelândia. O professor Malcolm era um amor de pessoa e, com certeza, ela estava sentindo saudade de ficar sentada no topo da escada às quatro da manhã, vendo seu pai franzir as sobrancelhas para as respostas estúpidas que seus alunos colocavam nas provas, nas quais ela adorava ler e dar boas risadas escondida enquanto seu pai fazia um intervalo entre uma correção e outra.

— O motivo é o de sempre — murmurou ela depois do que parecera uma eternidade, com a voz abafada por conta das inúmeras camadas de pano que estavam sobre sua cabeça. — Eu não quero voltar para uma cidade onde todos me conhecem, sabem sobre minha história e apontem o dedo na minha cara como se eu fosse uma assassina.

Elizabeth também demorou um pouco para responder e Sam tirou o edredom de cima da sua cabeça devido à demora, saindo de seu esconderijo e arquejando pela claridade repentina que invadiu suas pupilas.

— Não fique assim, eu gostaria que você ficasse e também sei que está sendo difícil, mas foi o que Malcolm concordou. Você passaria um ano comigo desde que voltasse para Santa Kennedy antes do início das aulas.

Sam revirou os olhos, impaciente.

— Seu pai e suas amigas devem estar morrendo de saudade e eu tenho certeza de que tanto ele quanto elas sabem o quanto voltar nessa questão que tanto te amedronta pode ser doloroso — disse Elizabeth e por fim beijou o topo da cabeça da filha, levantando-se e sorrindo ao mesmo tempo em que se afastava. — Infelizmente você não pode ficar aqui em casa pelo resto do ano... Meu trabalho dificulta isso, você sabe.

Mesmo ainda contrariada e com uma dor de cabeça do inferno, Sam assentiu. Foram inúmeras as vezes que ela e a mãe precisaram mudar de cidade por conta do trabalho de Elizabeth e uma vez as duas até tinham ido morar nos Estados Unidos, quinze mil quilômetros longe de casa. Sam sabia que ser comissária de bordo era uma profissão onde sua mãe não conseguia nem respirar direito, muito menos ficar em casa cuidando de uma adolescente de dezesseis anos que precisava de álcool para esquecer seus problemas.

— Suas malas estão na sala, tome um banho e vista uma roupa decente.

— Vou ficar duas horas sentada em um avião, meu pijama não é decente?

— Não se atrase para tomar café da manhã ou irá perder o avião. — Elizabeth ignorou a pergunta da filha e piscou para ela antes de descer as escadas e sumir de vista.

Sam pegou o travesseiro que antes estava deitado e o socou no rosto, resmungando mais alguns minutos antes de chutar as cobertas e levantar-se preguiçosamente. Ainda suspirando e com raiva das circunstâncias, ela encaixou os pés nas pantufas de pandas que estavam ao lado do tapete felpudo e caminhou em direção ao espelho elegantemente emoldurado na parede. Encarou seu reflexo e seus olhos imediatamente subiram para as fotos que estavam pregadas nele com adesivos já gastos pelos inúmeros meses que permanecerem ali, Sam era uma aspirante de fotografia e as fotos que tinha fixadas deixavam claro sua paixão. Paisagens australianas faziam parte da maioria e se destacavam entre as demais com sua família e com as pouquíssimas que ainda restavam de suas melhores amigas em frente à casa de praia que seus pais haviam alugado em Queenstown, no verão passado.

Uma pontada de dor atingiu seu coração por ter que largar tudo aquilo para trás e antes que uma lágrima solitária escorresse pela sua bochecha ela limpou-a brutalmente com o dorso dos dedos e foi até sua cômoda, procurando por um remédio contra ressaca na primeira gaveta. Quando o achou, não perdeu tempo e o engoliu seco, respirando fundo antes de trancar-se no banheiro.

 * 

No país vizinho, os familiares dos Gilbert-Bianchi estavam reunidos na imensa mesa de jantar do andar debaixo para um almoço de família.

Catherine estava chateada. Como se não bastasse a insuportável dor de cabeça que estava sentindo, ela ainda teria que descer e cumprimentar sua família inteira que decidira de última hora vir, sendo obrigada a ouvir os comentários desagradáveis sobre o clima improvável, seguidos de sorrisinhos que ela poderia jurar que eram falsos.

— Você não vai descer? — Sua mãe de repente apareceu na porta de seu quarto, estava usando um elegante vestido verde-escuro. Ela havia exagerado um pouco na maquiagem.

— Sim, estou só acabando de me arrumar — respondeu Catherine forçando um sorriso de confiança que pareceu ser o suficiente para que a mulher concordasse e descesse as escadas de volta, acreditando que a filha estava realmente animada para reencontrar seus parentes.

Catherine esperou os degraus pararem de fazer barulho para finalmente poder voltar ao devaneio que seus pensamentos se encontravam. Ainda estava com uma toalha presa aos cabelos e seu corpo ainda acomodava-se dentro do roupão de seda que colocou assim que saiu do banho quando se assustou ao escutar um talher cair no andar debaixo. O susto fez com que ela despertasse e passasse as mãos pelo rosto, se obrigando a voltar para o mundo real.

Olhou no calendário ao lado da cama, vendo o primeiro dia de fevereiro sendo tampado por um minúsculo bilhete alaranjado que ela havia colado há muito tempo atrás e que hoje perdera a importância. Catherine respirou fundo e, antes de colocar-se diante do armário, dobrou cuidadosamente sua roupa de cama e deixou-a em cima do seu antigo baú de madeira aos pés da cama.

A garota conferiu as horas no celular, andou até o guarda-roupas e o abriu, deixando um suspiro escapar ao notar que o vestido azul no primeiro cabide era justo o que ela comprara com Alexia em uma promoção relâmpago em uma das únicas lojas do shopping que vendia roupas caras. Milhares de pensamentos invadiram a mente de Catherine e, apesar dela ser a quem mais sentira falta de Lexi, resolveu ignorar tudo que havia uma ligação com o caso e socou o maldito vestido em um dos cantos mais fundos do guarda-roupa, pegando o primeiro que vira na frente.

Catherine ainda não estava pronta para enfrentar os fantasmas do passado e nem tinha ideia de quando iria estar. Tudo o que ela mais queria naquele momento era seguir com sua vida normalmente e isso incluía esquecer Alexia Grimes. Entretanto, até mesmo depois do caso ser esquecido pelos jornalistas, ela sabia que aquilo era impossível.

Os moradores de Santa Kennedy não conseguiam falar de outra coisa a não ser sobre o desaparecimento da garota e Catherine estava cansada de sentir falta da amiga. Ela precisava logo se livrar dela e da parcela de culpa que vinha como um fardo.

A loira olhou sua aparência no espelho que havia pregado atrás de uma das portas do armário e calçou um par de sandálias baixas, desejando que estivesse apresentável o suficiente para os parentes não olhassem de modo estranho as suas olheiras de noites mal dormidas.

Vestida com um vestidinho azul elegante e um pequeno colar de pérolas, ela era dona de uma beleza angelical, muito diferente de Samanta, com os cabelos castanhos quase ruivos, os olhos azuis e as bochechas grandes, ou de Erin com a expressão forte no rosto e as sobrancelhas grossas. Era loira e seus olhos pequenos tinham um azul claro, quase cinza. Seu rosto era delicado feito uma flor, como tudo nela. 

Quando a loira largou as lembranças para trás, desceu as escadas e cumprimentou todos os tios, primos e amigos da família que nem sequer lembrava, o almoço foi servido. Neta de italianos por parte de pai, ela sabia que almoços eram raros na família Gilbert-Bianchi caso não houvesse uma celebração especial. 

Mary Anne, sua irmã, estava sorrindo como uma boba a todos que perguntavam sobre o seu novo relacionamento. Catherine tinha achado um lugar na mesa ao seu lado.

— Ryan acabou de se formar em medicina e foi na mesma faculdade do papai. — a mais velha disse, porém a mais nova não prestou atenção. Ela estava encarando o novo namorado da irmã no outro lado da mesa e ele a encarava de volta com a mesma expressão. Ele era o marinheiro que tinha tentado levá-la para o quarto, um ano atrás, no dia em que Lexi desapareceu.

— Catherine? — A sua mãe ao seu lado sussurrou seu nome e tocou-a levemente no ombro enquanto dava um sorriso nervoso. Catherine assustou-se e olhou para ela com os olhos arregalados. — Você está encarando o novo namorado de Mary.

Catherine sorriu de volta, sem graça:

— Claro, desculpe. — ela sentiu as bochechas corarem.

— Era naquela cidade que o papai insiste em morar com aquela vadiazinha que ele chama de esposa. Digo, qual é mesmo o nome dela? Ninguém se importa. — Mary debochou com um sorriso no rosto e se virou para Catherine, pegando-a desprevenida. — Você passou o verão com ele naquele subúrbio, não foi?

— Sim, em Invercargill. O verão de lá é ótimo... não é tão quente como aqui, mas também não faz muito frio. — ela demorou um pouco para organizar os pensamentos e responder. Invercargill não tinha nada de subúrbio, Mary só dizia aquilo para enraivecer a irmã, pois a cidade era linda e seu pai estava morando lá com a nova esposa.

Catherine suspirou, ficava difícil pensar em alguma coisa quando o cara que tinha a assediado estava do outro lado da mesa fingindo não conhecê-la. Ela encarou um ponto fixo da parede amarela que de repente tornou-se interessante, tendo certeza de que Ryan lembrava-se dela. O mesmo cara que disse em seu ouvido que nunca tinha visto uma garota tão linda como ela, estava ali, puxando a barra do vestido de Mary para cima e apertando a pele exposta de sua coxa por debaixo da mesa, querendo causá-la ciúmes.

A casa dos Gilbert uma mansão e apesar dos inúmeros quadros de artistas famosos emoldurando todos os cômods, Catherine continuou encarando o nada enquanto Ryan ia subindo a mão e apertando mais forte a perna da namorada. 

Ignorando a situação, ela permaneceu assim até que ouviu batidas na janela. Mary dizia o quanto ela estava feliz e Catherine olhou para os lados antes de virar-se na direção do barulho e encontrar seu melhor amiga acenando para ela através do vidro, pronta para arremessar mais uma pedra.

— Acho que vou para o meu quarto, estou passando mal. — Catherine murmurou e levantou-se da cadeira, agradecendo mentalmente pela amiga aparecer bem na hora.

— Não vai nem acabar de comer? — Sua mãe perguntou preocupada, atraindo sua atenção.

— Não estou me sentindo bem. — justificou ela e quando Andrea iria insistir para que ficasse, Ryan aproveitou a oportunidade para provocá-la:

— Ela está mesmo muito pálida — comentou.

Catherine teve nojo de ouvir aquelas palavras. Ela não o agradeceu, apenas olhou-o sem expressão e levantou-se da cadeira. Apontando discretamente para as escadas, torceu para que sua amiga conseguisse vê-la indicando que ela deveria subir pelo telhado da garagem até seu quarto.

— Só porque eu fiz ginástica durante nove anos, não significa que eu consigo escalar o Everest, ouviu? Na próxima vez, deixe a porcaria dessa janela aberta! — Catherine mal pisou no cômodo e Megan reclamou enquanto terminava de passar os braços e pisava em segurança no quarto da loira.

As duas haviam virado melhores amigas no final do ano passado. Megan era da vizinhança, mas elas viraram melhores amigas apenas depois que fizeram um trabalho em dupla.

Catherine ainda não havia acostumado com o jeito da garota. Ela mudava de personalidade de uma hora para a outra e por mais que Catherine fizesse um esforço, não conseguia acompanhar as mudanças constantes.

— Você podia ter usado a porta da frente.

— Tanto faz. Eu acabei de salvar você de um almoço de família tedioso e você nem me agradeceu — Megan disse e sentou-se com as pernas cruzadas na cama da loira. — Você vai querer sair? Podemos pular a janela, não é tão difícil assim.

— Não sei se quero mais. — Catherine respondeu sendo sincera e sorriu cúmplice, sem olhá-la nos olhos. Depois da situação que havia acontecido minutos atrás, ela perdera a vontade de fazer alguma coisa durante o resto do dia e só queria voltar a dormir e sonhar com Justin Timberlake pedindo sua mão em casamento.

— Você é a pessoa mais chata do mundo. — Megan murmurou e arrumou a franja mal cortada na testa. Sua nova fase era gótica e ela estava usando apenas roupas pretas. Os olhos castanhos carregavam traços pesados de lápis-preto e eles diminuíam de tamanho quando ela sorria. — Hoje é o aniversário de morte dela.

Catherine encarou a amiga, confusa.

— Quem?

— Quem mais? Alexia, claro! — Megan exclamou, esticando-se e apontando na direção do calendário em cima da penteadeira cor-de-rosa. — Primeiro de fevereiro, faz um ano.

— Então é aniversário de desaparecimento, não de morte. — Catherine murmurou depois de um pequeno silêncio. Não gostava de falar a palavra aniversário nesse contexto, aniversários lembravam-na coisas felizes e definitivamente o sumiço de Lexi não era uma delas.

— Sinceramente? Eu acho que ela está morta — Megan disse e Catherine olhou-a assustada. Ela sabia que sinceridade era uma de suas características mais marcantes, mas não esperava que a amiga fosse tão indelicada com o assunto.

A morena revirou os olhos e deu de ombros, deitando-se em sua cama.

— Meu pai foi em uma reunião do conselho e os pais de Lexi apareceram por lá, estavam viajando ou sei lá o que eles estavam fazendo em Wellington. Aqueles babacas querem fazer um memorial para ela, sabe... disseram que se tudo der certo isso trará boas energias e irá eternizá-la enquanto ela não dá as caras.

Catherine sentou-se ao lado da amiga, não respondeu nada e ficou pensativa. Talvez o memorial fosse realmente uma boa ideia, um lugar onde as pessoas poderiam olhar para a sua foto e fazer suas orações positivas.

O que Catherine mais queria naquele momento era começar uma nova vida e esquecer tudo o que ela havia passado para trás, desde as noites de choro até as madrugadas que passou acordada pesquisando pistas de onde a amiga estaria. Novo ano, vida nova. Foi o que ela desejou quando chegou o ano novo e os fogos de artifício brilharam sobre o céu negro de Santa Kennedy na virada do ano.

Depois de ficar calada por alguns momentos, Catherine enrolou uma mecha loira na ponta dos dedos e virou-se para a amiga. A morena estava com os olhos fechados e Catherine pensou mais um pouco antes de pegar o travesseiro e acertá-la na cabeça:

— Sabe de uma coisa? Eu ainda não conferi a nova coleção da Guicci. O shopping ainda está de pé? 

*

Qualquer um que entrasse no Kai's Brothers pela primeira vez ficaria maravilhado pela decoração rústica do ambiente.

Os gêmeos donos do estabelecimento eram descendentes de alemães e por causa disso eles haviam herdado todo o bom gosto europeu.

As paredes e o piso de madeira, os móveis de antiquário, as bandeiras de várias nacionalidades penduradas nas paredes, o mural cheio de fotos com os clientes, os pôsteres vintage e até os piscas-piscas coloridos espalhados estrategicamente pelo bar com pouca iluminação faziam com que o estabelecimento tivesse um charme natural e se tornasse o principal ponto de encontro dos adolescentes de Santa Kennedy, trazendo uma clientela um tanto considerável.

Naquele dia, o lugar estava tão cheio de clientes que, ao entrar pelas portas duplas, Erin McCarthy teve que se espremer na parede para não ser pisoteada ou arrastada pela multidão.

— O que está acontecendo? Estamos vendendo café de graça ou a Madonna resolveu provar nossos cupcakes? — A morena perguntou ao seu colega de trabalho e também melhor amigo enquanto se aproximava do caixa e passava por debaixo do balcão de madeira maciça. O Kai's era uma espécie de restaurante híbrido, de manhã funcionava como cafeteria e de noite, como bar.

— Nenhuma das alternativas e, aliás, Katy Perry iria trazer muito mais gente do que a Madonna. — Peter respondeu, tentando arrumar da melhor maneira a camisa vermelha que todos os garçons eram obrigados a usar e que fazia parte do uniforme masculino, apesar dos rapazes ficarem a maior parte do dia reclamando sobre o quanto a gola da peça de roupa os pinicava.

Erin deu de ombros, entrando no banheiro feminino dos funcionários. Saiu minutos depois, com um coque improvisado e um lápis preso aos cabelos para que eles não se soltassem enquanto atendia os clientes.

O uniforme feminino era pouco diferente, as garotas também usavam uma blusa vermelha, porém ao invés de calças pretas e sem graça, elas tinham que usar uma saia amarela listrada de preto. Erin achava uma péssima combinação de cores, mas aquelas eram as cores da bandeira alemã e o que ela menos queria era levar um sermão dos chefes em alemão por ser contra o uso do uniforme.

— Está faltando dois dias para começarem as aulas, as pessoas deveriam ficar tristes ou entrar em depressão, não virem aqui para encher a cara. — resmungou ela enquanto tentava se equilibrar nos patins que, tanto para as garotas quanto para os rapazes, eram de uso obrigatório. Os sapatos ficavam perfeitos em seus pés, mas segundo o que ela mesma dizia, eles não passavam de objetos criados para a destruição humana, já que ninguém conseguia andar naquilo sem esborrachar-se no chão em um piso tão escorregadio.

Peter apontou com a cabeça para as mesas centrais e Erin virou-se de uma vez. Assim que viu os novos clientes que o estabelecimento acabava de ganhar, ela arregalou os olhos e notou um homem loiro encarando-a.

— O que a polícia faz aqui? — perguntou ela, vendo repórteres e policiais mais jovens rodearem o tal homem que ela não fazia a mínima ideia de quem era. O delegado da cidade, Rico Martínez, estava ao lado do homem engravatado. Julgando pela cor avermelhada que seu rosto ia ganhando, ele parecia estar nervoso com todo o alvoroço que faziam ao seu redor.

— Eles apareceram e nem sequer pediram um café. — Frank, um dos gêmeos que era donos do estabelecimento, apareceu saindo da cozinha carregando inúmeras caixas, acompanhado pelo irmão. — Acho melhor você atendê-los antes que nos cause problemas.

— Por que logo eu? — Erin perguntou e, como não houve resposta, revirou os olhos. — Obrigada, meninos. O cavalheirismo de vocês é de se orgulhar — resmungou, pegando as notas enquanto atravessava o ambiente, reclamando mentalmente por ter que usar aqueles malditos patins que só sabiam fazê-la cair enquanto levava bandejas e anotava pedidos.

— Senhorita McCarthy? — Ouviu o delegado chamá-la. Assim que se aproximou da mesa, ela não deixou de notar que o homem engravatado, sentado ao lado do delegado, tinha um distintivo dourado reluzindo sobre a mesa com o brasão da polícia.

Erin sentiu um calafrio percorrer o corpo e sorriu cúmplice para os dois homens, tentando não parecer nervosa. Desde que houvera o ocorrido e os policiais bateram na porta da sua casa às três da manhã depois do imenso interrogatório que o delegado fizera a ela na noite do acidente, ela ficou traumatizada e nunca mais quis ver um policial na sua frente.

— Delegado Martínez — ela fez uma reverência desajeitada, exagerando na simpatia. — Gostaria de fazer um pedido?

— Na verdade...

— Na verdade, eu gostaria de trocar algumas palavras com a senhorita — o detetive interrompeu e o delegado bufou, impaciente por ser interrompido pela décima vez naquele dia. A cidade era dele e aquele forasteiro engravatado já estava o deixando sem paciência, Erin notou que seu rosto estava novamente ganhando uma coloração vermelha e se segurou para não fazer piada sobre como o rosto dele parecia um balão cheio de ar pronto para explodir.

— Eu vou deixá-los sozinhos. — o delegado avisou e se retirou da mesa, acenando com a cabeça para os dois enquanto caminhava na direção do bar.

Peter e Frank encaravam a mesa indiscretamente, os dois apoiados no balcão, cochichando coisas no ouvido um do outro. Mark, o outro gêmeo, estava até gravando com o celular o que acontecia. Os três quase pularam de susto quando viram que Rico estava indo em suas direções. Peter trombou com Frank enquanto procurava a caneta para anotar o pedido do delegado e Mark deixou o celular cair.

Erin revirou os olhos para eles, querendo socar a si própria. 

— Por favor, me faça companhia — o detetive pediu, fazendo com que Erin se voltasse para ela. Ela continuou no mesmo lugar, deixando claro que preferia ficar em pé. — Sou o detetive substituto responsável pelo caso Alexia Grimes, você pode me chamar de Matherson, sei que a vítima tinha muitos amigos, inclusive a senhorita.

Erin engoliu a seco.

— Não já prenderam o assassino, sequestrador ou quem quer que seja? Eu já disse tudo o que aconteceu no meu depoimento ano passado na delegacia, assim como minhas... amigas. — ela disse, sentindo-se desconfortável ao tocar naquele assunto.

O detetive levantou as sobrancelhas e limpou a garganta antes de prosseguir.

— Ethan Williams foi sentenciado como inocente, Erin. Isso significa que você, Catherine Gilbert e Samanta Langdon terão que dar um novo depoimento, um ano pode ter feito vocês se lembrarem de outros detalhes importantes.

— Eu já disse tudo o que sei! Não é necessário outro depoimento, creio que isso também sirva para os outros — ela reafirmou irritada, cruzando os braços. — Aliás, por que diabos um detetive está me procurando? Não era outro cara que estava tomando conta do caso? Se você fosse qualificado o suficiente, poderia muito bem descobrir as coisas sozinho, sem precisar de mais um depoimento de uma noite que eu e nem ninguém desta cidade está a fim de lembrar.

Erin estava quase indo embora quando o detetive puxou-a pelo pulso.

— Estou procurando por você porque, pelo que olhei em sua ficha, tem uma parte de seu depoimento que não bate com os dos outros presentes na festa — Matherson disse afrouxando o aperto e Erin olhou os dedos do homem em volta de seu pulso. Ela stava prestes a responder que aquilo não tinha a convencido quando ele continuou:

— A perícia encontrou o corpo de uma garota nos arredores da cidade e eu estou extremamente curioso sobre o que suas amigas e principalmente você estavam fazendo naquela noite.

 


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

E então? Gostaram? O que acharam dos novos personagens? Qual das meninas é a preferida de vocês? Alguns segredos delas começaram a aparecer nesse capítulo: Sam é alcoólatra, Catherine tem vários rolos mal-resolvidos com a irmã e Erin morre de medo da polícia por causa do que aconteceu na festa. Não se esqueçam de deixarem suas opiniões nos comentários.

Agora sem enrolação, tenho na verdade dois avisos. O primeiro é o seguinte: eu vou postar com menos frequência por causa da escola, estou indo muito mal e quero me dedicar 100% aos estudos. Não vou abandoná-los, só não irei postar toda semana igual estava fazendo até agora, peço que tenham paciência e não desistam de Cold Blood. Ok, agora o segundo aviso: leitores fantasmas, estou observando vocês. A fanfic tem quase cento e quarenta acessos e apenas três comentários... poxa, gente, é tão difícil deixar um "gostei" no capítulo? Sei que a história ainda está no início, mas os comentários me incentivam e fazem com que eu poste mais rápido. SIM ANNA, HENRIQUE E LUANA, SEI QUE VOCÊS ESTÃO LENDO ISSO AGORA E ISSO SERVE PARA VOCÊS TAMBÉM!

http://ask.fm/sterollarke
https://twitter.com/sterollarke.

Beijos e até breve!