Piel de Lava escrita por Emma Grimes


Capítulo 12
Piratini




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A vigem fora demasiada cansativa, por mais ajuda que eu tivesse para cuidar de minha pequena Perpétua, já não aguentava mais os solavancos da estrada e nem ela. Quando finalmente colocamos os pés em solo brasileiro me senti aliviada, até Bento dizer que tínhamos mais caminho a percorrer. 

— Chegamos. - disse o cocheiro 

 

A nossa casa lembrava a dos meus pais. Grandes escadas que davam para porta, uma varanda enorme, muitas janelas e videiras que subiam pelas paredes. 

— Nossa nova casa, meu amor. - disse Bento e depois colocou um beijo na minha testa. 

Antônia, Ana Joaquina e Maria estavam a nossa espera. 

— Onde está minha mais nova sobrinha? - disse Ana logo depois de nos cumprimentar. Bento entregou a menina para a irmã. 

 

***  

Logo depois de chegarmos, Bento se juntou com alguns amigos e saíram, eu sabia que ele já estava envolvido com política, mas não era função minha dizer o que ele deveria fazer, mas a de esperar e rezar para que ele voltasse bem para casa. "Minha casa é onde tu estás, minha prenda" eu podia ouvir perfeitamente a voz de Bento me dizendo isso, mas ouve um tempo que essa voz ficou fraca e eu quase não podia ouvi-lá mais. Graças a Deus, Ana Joaquina estava sempre ao meu lado para me dar forças.  

O novo quarto com uma cama grande de dossel, um espelho enorme e uma janela com varanda, era maior e diferente do quarto da outra casa, era bem mais espaçoso e aconchegante. Perpétua finalmente dormiu, e eu fiquei a espera de Bento, olhando pela janela esperando ele chegar, uma garoa fina veio chegando molhando meu rosto, fechei os olhos sentindo as gotas fazendo minha pele arrepiar. 

— Prenda minha. - disse Bento com a sua voz rouca abraçando minha cintura. 

Voltastes meu amor? - me virei encarando seus olhos. 

Siempre! — ele sorriu e me beijou. 

Quando ele me abraçava eu não precisava de mais nada, foi por Bento quem eu sempre esperei e sempre iria esperar toda vez que ele saísse, não consigo me imaginar com outro, não existe outro, apenas ele. 

— O que tu fez comigo mulher? - ele sussurrou em meu ouvido. _ Quando estou longe de tu é como se eu estivesse em profunda tristeza, tu estas sempre em meu pensamento. - ele tinha a mão firme em meu quadril, eu ri. 

— É que tu me amas cada vez mais e mais. 

— E ainda duvidas disso, uruguaiana?  

— Não. 

30 de junho, 1817

— É um menino Sinhá! - disse a negra, segurando meu guri. 

— Me dê. 

Ela o enrolou em cueiros e colocou o menino em meus braços. 

— Como chora alto. - eu disse. 

— Pulmões fortes, Sinhá. Quer que eu chame vosso marido? - ela jogou um lençol limpo sob mim. 

— Acho que não precisa. - apontei para a porta e Bento já estava lá, com o mesmo olhar assustado de quando Perpétua nasceu. 

— Meu amor.- ele beijou minha testa. 

— É um menino. 

— Menino? - ele sorriu. 

Entreguei o menino em seus braços, ele se levantou olhando o pequeno rostinho. 

— Zefina disse que ele tem pulmões fortes. - sorri 

Ele continuou calado olhando o menino, estava orgulhoso e emocionado. 

— Caetana precisa descansar, e o menino também, precisa se alimentar melhor e se banhar. - disse Zefina. 

— Deixe. - sussurrei para ela. 

— Joaquim Gonçalves da Silva Neto. Se chamará Joaquim, assim como o avó. - seus olhos estavam marejados quando olhou para mim. 

 

22 de janeiro, 1822 

— Precisa comer Sinhá, senão quando for a hora de seu filho nascer, não terás forças. - disse Zefina. 

— Mas eu não tenho vontade. 

— Discutindo com Zefina novamente, Caetana? - disse Bento. 

— Ela não quer comer, e não sai do quarto porque não tem forças. 

— Eu cuido dela, obrigado Zefina. 

Zefina deixou o quarto, logo em seguida Bento apagou as velas e abriu as janelas. Me ajudou a me sentar colocando almofadas nas minhas costas. 

— Olhe para você naquele espelho uruguaiana. - ele se sentou ao meu lado na cama e apontou para o nosso reflexo no espelho. _ Não está bem, está pálida, tem que comer e beber algo, ouviu o que Zefina disse. 

—  Tudo o que eu como me faz mal, até falta de ar eu sinto, nunca me senti assim antes.  

— Faça um esforço, por mim, pelos guris e por esse que vai nascer. - ele sorriu e beijou minha testa.  

 

Acho que o fato de Ana Joaquina ter perdido o primeiro filho e o último parto de Maria ter sido difícil me afetaram de uma forma que eu não esperava. Desde o quarto mês vim me sentindo cada vez pior, mas fracas, com enjoos mais fortes, falta de ar e insônia. Me lembro de ouvir Zefina falando com Bento que tinha medo de que algo acontecesse comigo no parto, e aconteceu, foi o meu pior parto. 

 

— Força dona Caetana! 

— Eu não... cons... 

As ondas lancinantes de dor me faziam perder o ar. Acho que perdi a consciência mais de uma vez. 

— Pelo amor de Deus dona Caetana, aguenta! - Zefina gritou, tinha sangue em suas mãos  

— Não deixa meu filho morrer... Zefina! 

— Não vou!

Me lembro de ver a cruz que ficava na parede do quarto e pedi a Madre de Dios que me levasse, mas deixasse meu filho.  

— Dona Caetana, olhe para mim, aguenta! 

Perdi a consciência novamente, e quando acordei tudo estava em completo silêncio, o quarto estava vazio e eu estava exausta. Levou algum tempo até eu me lembrar de tudo, senti as lágrimas descerem com o pensamento de que eu teria perdido meu filho. 

— Ela acordou! - gritou Zefina. 

Bento entrou no quarto, me abraçou apertado e chorou. 

— Meu amor, pensei que não iria mais acordar, pensei que tinhas me deixado. - ele segurava meu rosto. 

— Meu filho morreu? - as lágrimas cobriam meu rosto. 

— Não, não! - ele limpou as lágrimas. _ Está bem, é um guri lindo, forte feito a mãe. 

Senti um alívio, leve, e voltei a chorar, agora de alegria e me agarrei a Bento. 

— Quero vê-lo. 

Zefina trouxe o menino e colocou nos braços de Bento, que me entregou. 

— Que guri lindo. - ele tinha os olhos verde iguais aos meus. 

— Se parece contigo. - Bento deitou sua cabeça em meu ombro. 

— Deu um nome a ele? - perguntei. 

— Não, esperei você para fazer isso. - ele me beijou a têmpora. 

— Vamos chamá-lo de Caetano.  

 

 

 

 

 

 


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