O término

Ela queria começar aquela conversa, mas realmente não sabia como olhava para ele o esperando que tomasse partido de algo. Só que ele parecia ignorar, afogado em seus pensamentos.

:- Parece que não voltamos e estamos ainda naquele hospital. – Ela falou em pé encostada na parede do quarto, seu tom de voz tinha decepção sobretudo.

:- Eu não vejo assim. – Ele por sua vez estava sentado na cama.

:- Não sente a falta dele?

:- Você sente? - Ele encarou ela por fim.

Houve aquele instante em que não conseguiam focar em mais nada além dos olhos um do outro. Procuravam respostas. A pergunta dela foi a chama inicial para o clima se instalar pesado, o pior foi o questionamento dele, o tom acusatório que ele usou.

:- Como?

:- Você sente a falta dele. – Pedro não conseguia evitar evidenciar o seu ciúme.

Júlia não queria acreditar que estava presenciando aquilo, ela sentia que estava num barco onde só ela remava e um relacionamento que não funcionava não daquela forma, e que assim jamais chegariam a lugar nenhum.

:- O seu irmão não dá notícias há quase um ano e quando ele aparece mal te olha e você está com ciúmes de mim? Você é impressionante Pedro.

:- O que você quer que eu pense? Nunca tive tanto contato com o Felipe. – deu os ombros.

:- Mas, isso não te da o direito de me acusar dessa forma grosseira. – ela falou desafiadora. – E quer saber Pedro? Sinto a falta de Felipe sim. Não tivemos a chance de nos falar desde que tudo aconteceu, desde que nós dois voltamos isso porque cada um respeitou a decisão um do outro.

Pedro não disse nada, apesar de que pensava muito no que podia falar. Só que Júlia não deu espaço para ele sequer abrir a boca.

:- Sinto que preciso te falar o que estou carregando há algum tempo aqui dentro, que está me consumindo e me fazendo se transformando em muito mal. – Ela tinha os olhos fechados agora e abriu para encará-lo – Eu estou decepcionada, Pedro, com tudo.

:- Do que está falando exatamente?

:- Eu me sinto tão abandonada por você quando decidiu continuar a sua história com a Taís, mesmo sabendo que eu tinha mudado minha vida para ficar contigo. Depois que você conseguiu o seu estágio, suas viagens constantes tanto de trabalho quanto para Angra, só faz com que nos afastemos um do outro.

:- Júlia, por favor – ele tinha a testa enrugada e começava a entender aonde ela queria chegar, só que ela não deixou ele continuar.

:- Não estou te cobrando com relação ao Rodrigo, nem quero fazer isso. Mas, nos últimos três meses da para contar nos dedos quantas vezes nos vimos, seja por conta do seu trabalho ou do meu. Isso porque você pediu para mudar seu trabalho para Noronha.

:- Era a chance que eu vi de ficar perto do meu filho, por Deus, eu estava perdendo espaço na vida dele. Não vi o primeiro dente nascer ou a primeira engatinhada, a primeira palavra... Eu precisava estar presente dele. Você entende? - ele se levantou e passou a mão no rosto.

:- Justamente não te acuso quanto a isso, o que eu não entendo é você cometer o mesmo erro do passado, Pedro.

:- De que erro esta se referindo? – Ele se sentia acuado, Júlia derrubou suas defesas.

:- Porque não me disse que tem mais de seis meses que a Tais se separou do namorado dela? - Júlia viu Pedro preocupado engolir saliva na sua frente. – Ou melhor, porque não me disse que quando Taís descobriu que quase tivemos uma história, você brigou com Luisa por ter contado e pior disse que era algo não valia a pena.

:- Júlia, eu... Me expressei mal, fui pego de surpresa e estava perdido quando isso aconteceu.

:- Eu te vejo perdido agora Pedro. – Ela declarou firme, mas acabada por dentro.

:- Claro. Eu me dando conta que eu te perdi. – ele andou até ela e tinha os olhos marejados.

:- Se isso aconteceu, foi por sua culpa. – ela tirou as mãos que ele tinha colocado em seus braços. – Porque a verdade é que parece que você é um garoto indeciso, quando tem uma coisa que você queria muito, já mudou de ideia e não quer mais. Eu pensei que você mudaria quanto a isso, só que você continua o mesmo.

:- Do que está falando?

:- Que iniciou de uma forma errada tudo entre nós dois, pensávamos que éramos irmãos e essa história só não podia dar certo no final das contas. Porque com o tempo eu pensei que você não cometeria os mesmos erros Pedro, dei uma chance para o nosso amor e ele foi vivido só que eu chegou um momento em que comecei a remar sozinha e veio muitas tempestades, não tive forças Pedro. – Caiu a teimosa lágrima que ela evitava, bem diferente de Pedro que não escondia as suas, tristes.

:- Então nossa história acaba aqui? - ele fez a pergunta fatal viu que ela estava decidida, que não teria volta. Não queria que ela sofresse e se ele era o causador disso, esse era o melhor para os dois.

:- Não. Ela começa aqui. Um capítulo diferente para cada um de nós.

Pedro não podia evitar, estava desolado não conseguia enxergar como essa relação tinha chegado aquele ponto. Dessa vez ele puxou os braços dela e a abraçou forte, chorando também como poucas vezes chorou com uma perda.

:- Não quero que você se torne o rancoroso do ano passado, você viu como formou um buraco negro em sua volta e isso não te fez bem. Quero que daqui em diante, você se renove Pedro, se descubra quem é, o cara que generoso que eu conheci anos atrás e por quem me apaixonei. Seja o pai do Rodrigo. O filho do Vicente e também do Miguel. O irmão do Joaquim, do Luís, da Laila e claro também do Felipe. – Ela sentiu ele a abraçar mais forte e escutou um eu te amo, que agora sabia do fundo do seu coração que não correspondia mais.

E pela primeira vez nesse ano se sentiu em paz consigo mesma como há muitos anos não se sentia, sabia que agora vinha uma nova fase, tinha que se redescobrir. Que os próximos passos seriam difíceis só que ela conseguiria recomeçar de novo.

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