Apenas uma garota... escrita por Luana Nascimento


Capítulo 20
Capítulo 20 - Escolhas: Parte I


Notas iniciais do capítulo

Olá, gente :)
Estou ansiosa para que vocês leiam esse capítulo, então nos vemos nas notas finais.
Espero que gostem =D



Este capítulo também está disponível no +Fiction: plusfiction.com/book/626534/chapter/20

Terminei meu desenho na hora em que o despertador tocou. Eu estava acordada desde as 03:14 a.m. pensando em tudo o que podia dar errado no meu plano, analisando cada parte para que tudo desse certo. Estava fazendo isso desde o dia anterior de madrugada.

— Shelly! Hora da escola! — minha mãe e seus gritos às seis da manhã.

— Ok, mãe!

Guardei o projeto do caminho dos ductos, o desenho da sala de Eve e o desenho do meu plano junto da balestra, fiz minhas necessidades básicas, tomei banho, me vesti com uma blusa azul e uma calça jeans cinza. Ok, eu tenho que ficar calma. Azul é uma boa cor para isso.

Passei um pouco de corretivo, tentando disfarçar as olheiras das duas noites mal dormidas, e desci as escadas.

— Fazia tempo que você não usava essa blusa. — ela comentou num sorriso.

— Verdade, mãe. Bom dia também — brinquei. Ela rolou os olhos:

— Ok, mamãe. Você é a cara da sua avó.

Sorri.

— Não sei se é um elogio ou um insulto.

— É uma... característica. — a piscadela dela foi maliciosa.

— Huh. — ergui minha sobrancelha, sorrindo leve e ironicamente.

— Dormiu bem?

— Deu para descansar os olhos.

— Pois eu dormi lindamente bem. Tomou seu remédio?

— Estou estranhando sua educação, Lady Ann. Você já me teria feito engoli-lo a esse ponto.

— Eu posso ser gentil. Ou má! — ela gargalhou, falsamente maligna. Eu ri e ela colocou a pílula na minha língua, dando um beijinho na minha testa.

Podia não gostar de tomar remédios, mas se era importante para ela, eu o faria. Engoli, terminei o meu café da manhã, que consistia em um sanduíche, bolo de laranja e café preto e sem açúcar. Sem isso, eu dormiria na sala. Despedi-me da minha mãe, encontrei Jaden no ponto de ônibus. Ainda havia poças na rua da chuva de madrugada, mas o dia nasceu ensolarado.

— Essa mudança de clima acaba comigo — comentei, sorrindo amistosamente.

— Imagino. Bem, ao menos é sexta-feira.

— É.

O ônibus veio e trocamos algumas ideias sobre os snakes: como Clint era reservado, como os Callahan pareciam evitar o assunto "pai", a briga de Ben com a mãe. Então, Jaden me solta uma dessas:

— Você é nossa pequinês.

Senti-me vermelha:

— O quê?!

Ele riu:

— Sim. Uma pequinês. Pequena e brava.

Dei um soco em seu braço.

— Ei! — protestei. Ele continuou rindo e tentei ficar naquela vibe o tempo que eu conseguisse.

Chegamos à escola e notei que Ben estava estranho. O cara parecia meio pálido e abatido.

— Está tudo ok, Ben? — indaguei, preocupada.

— Só briguei com a minha mãe de novo. Fora isso, tá tudo ok. Vou ao banheiro antes de começar a aula, se vocês não se incomodam.

Assim que ele se retirou, Mel comentou:

— Essas brigas estão acabando com ele.

— Ele me parece pior hoje. — Dave incluiu-se na conversa.

— Concordo. — crispei meus lábios, sentando-me no lugar de sempre. Jaden sentou-se atrás de mim:

— Tem algo errado com ele, quase como se estivesse... doente.

— Tudo bem, gente — Clint interveio. — Se estiver algo errado, saberemos, certo?

Suspirei, esperando a aula de Filosofia. Ben voltou e o professor entrou atrás dele. Platão, democracia ateniense. Interessante o assunto, mas um ruído me incomodava: Ben tamborilava em um padrão que eu decifrei algo parecido com "Ouch".

Vai parecer estranho, porém tinha a tabela de código Morse no meu caderno, na última matéria. Também tinha o alfabeto grego e algumas fórmulas repetidas à exaustão. Juntei os dits e dahs que eu queria, amassei um desenho que não queria mais e joguei nele. Quando consegui sua atenção, indaguei em Morse:

"Por que você está fazendo 'ouch' em código Morse?"

"Você é tão estranha. Quem diabos entende código Morse de cabeça?"

"Você não respondeu a minha pergunta", retruquei, sem querer explicar como eu entendia.

"Estou com uma dor infernal no meu estômago".

Ao menos o “por que” estava mais fácil, já que eu o havia escrito antes.

"Por que não foi ao médico?", questionei. A resposta foi curta e simples:

"Odeio hospitais".

Ben baixou a cabeça por um momento, segurando-se na cadeira. Quando ele pareceu melhor, fiz minhas batidinhas:

"Você deveria ir".

"Vai passar. Não se preocupe comigo".

"Há quanto tempo você está sentindo isso?"

"Sei lá, começou na segunda".

— Qual é o lance das batidas estranhamente padronizadas aí atrás? — o professor indagou. Fizemos silêncio. — Bem, voltando ao assunto...

Esperei uns cinco minutos antes de falar com Ben de novo:

"Ben, como assim?"

"Hoje está horrível".

"Prometa-me que você vai para o hospital ainda hoje. Dor de estômago durando quase uma semana não é normal".

"Vou pensar", ele respondeu. Antes que eu protestasse, Ben levantou-se e saiu da sala. Jaden me passou um papel:

"Qual o lance das batidinhas na carteira?"

A caligrafia dele era um pouco confusa e nem um pouco bonita, mas legível. Escrevi:

"Estava conversando com Ben" e joguei o papel para trás. Ele voltou com uma nova letra, uma mais decente e inclinada:

"Código morse. Não peguei tudo. Na verdade, não peguei nada. O que foi? (Dave)"

"Tem algo errado com Ben. Acho que ele está doente. Reclamou de dores no estômago". Escrevi e joguei o papel para trás novamente. Demorei um tempo para decifrar o que estava escrito quando ele voltou:

"Não é que Jaden estava certo! (Clint)"

"Adoraria que esse papel voltasse para Jaden. Obrigada, de nada". Joguei o papel novamente para trás, mas veio com outra letra, mais bem-feita:

"Não nos culpe se o loiro é lento. Agora escreva o que exatamente Ben lhe disse (Mel)".

"Ele disse que está com essa dor desde segunda-feira". Joguei o papel e o mesmo demorou a voltar. Quando voltou...

"Caralho, esse cara é louco?! (J)".

"Ele quer se matar? (Dave)".

"Se ele quiser morrer, basta estar vivo (Clint)".

"Ok, Benners terá muito o que explicar no intervalo. Algo mais que precisamos saber? (Mel)".

"Acho que não".

Antes que eu pudesse jogar o papel para trás, tocou para o fim da aula e o professor se despediu.

— Ok, cadê Ben? — Mel parecia irritada e preocupada.

— Boa pergunta. — respondi. — Ele não disse aonde ia.

Ben entrou na sala e Melinda só faltou imobilizá-lo:

— Benners McCarthy, que história é essa de estar doente e não ir ao hospital?

— Porra, Shelly — o garoto resmungou.

— Ben, desde segunda — limitei-me a responder, olhando-o seriamente.

— Uma fucking semana, Ben! — Jaden explanou a gravidade da situação com a sua voz. — Isso pode ser algo sério!

— Eu estou melhor, gente. Sério. Nem estou mais sentindo dor.

— Benners... — Clint rosnou.

— Porra, é sério. Só deixem de pegar no meu pé, ok? Agora tenho que ir à aula de artes visuais. — ele pegou a sua mochila. — Qualquer coisa eu aviso a vocês.

Aproximei-me dele com a expressão mais intimidadora que pude.

— Ben, espero mesmo que você esteja bem. Prometa que vai nos avisar se houver algo errado.

— Ok, Shelly. Agora eu posso ir?

— Vá, antes que eu me arrependa.

Ben saiu da sala. Antes que dissessem algo, peguei minha mochila e saí para a aula de artes musicais. Jaden veio atrás de mim.

— Eu ainda acho que vai dar merda — ele comentou, preocupado.

— Bem, eu tenho certeza. — respondi suspirando.

Entramos na sala e o professor preparava um documentário para vermos. Não me orgulho de dizer isso, mas acabei por cochilar na metade da aula expositiva. Eu estava cansada, deem um tempo. Acordei com Jaden cutucando a minha costela. Estava no final do filme. Procurei me organizar na cadeira.

— Certo, alunos, preciso que vocês me entreguem um relatório sobre esse documentário na próxima semana. Bom fim de semana.

Saímos da sala.

— Insônia? — Jaden questionou.

— Sim — respondi esfregando a minha nuca. — Está difícil dormir.

— Ou não. — ele deu um sorrisinho. Olhei-o, a expressão irônica.

— Ei, e aí, como foi a aula de vocês? — encontramos Ben no corredor.

— Dormi. — fui direta. — Jaden?

Meu vizinho sorriu.

— Teve um documentário.

— Bem, tivemos análises de fotografias. Divertido. Vou beber água.

— Ok, Ben. — Jaden respondeu. — Iremos para o pátio.

Enquanto caminhávamos, pensei na mãe de Ben e quase entrei em um pico de ansiedade. Apenas fique calma.

— Talvez Wolverine.

— O quê? — voltei-me para Jaden, o cenho franzido.

— Wolverine. Você é canadense, marrenta, pequena...

— Ele tinha que cismar com isso de novo... — rolei os olhos.

— Ele cisma com o que, Shelly? — Mel perguntou numa voz estranhamente calma para os padrões dela.

— Cisma em querer arrumar um codinome para mim. — respondi.

— Pensei em Wolverine. — Jaden soou animado.

— Apoiado — Dave concordou.

— Genial. — Mel comentou quase rindo.

— Triste — Clint me representou.

— Tão clichê. — concordei com meu colega canadense.

Conversamos sobre estereótipos até que Mel indagou:

— Vocês viram Ben?

— Ele foi beber água. — respondi.

— Ele está demorando. — Clint notou.

— Verdade — Dave aquiesceu.

— Vou procurá-lo. — Jaden decidiu.

— Devíamos ir junto — opinei.

— E se ele vir para cá? — Mel argumentou.

— Qualquer problema, eu ligo, ok? Estou indo.

Jaden entrou no prédio.

— O jeito é esperar agora. — comentei tentando quebrar o gelo.

— É. — Mel assentiu limpando as unhas.

Depois de uns dois minutos, Clint tirou o celular do bolso e atendeu:

— Alô? Sério? Droga. Dave e eu estamos indo aí. — ele desligou e anunciou: — Ben está com problemas no banheiro. Vamos, Dave. — o afrodescendente o seguiu e fomos atrás. Clint parou e indagou: — Vocês realmente vão entrar no banheiro masculino?

— Existe algo chamado corredor. — ergui a sobrancelha com a afirmação simples e explicativa de Mel.

— Grossa como sempre. — Dave comentou. Voltamos a correr. Jaden estava na porta do banheiro, com Ben apoiado nele, a cabeça pendida, membros inertes. Algumas pessoas estavam ao redor.

— Isso não é nada bom. — sussurrei.

— Tudo bem, deem espaço — Dave fez sua voz ficar alta. — Onde fica a enfermaria ou qualquer coisa similar por aqui?

— Carreguem-no e sigam-me. — pedi. Clint segurou as pernas, Dave segurou-o pelo lado esquerdo, Jaden pelo outro lado. Viramos uns dois corredores e chegamos à enfermaria. Quando a médica viu, se surpreendeu:

— Por Deus! Deitem-no aqui — ela apontou para uma maca. — O que houve?

— Eu o encontrei caído no banheiro. — Jaden explanou, arfante. — Acho que ele está desidratado.

— E com algum problema estomacal sério. — Mel complementou estralando os dedos, aflita.

— Pedirei para transferirem-no ao hospital mais próximo. — a médica me pareceu bem firme.

— Hm... — ouvimos um resmungo vindo da maca e nos voltamos para Ben.

— Ben? — Mel correu até ele.

— Puta merda, que dor de cabeça.

— Você precisa de água para ontem. — Clint encheu um copo descartável e ofereceu a seu amigo, que bebeu a água sofregamente.

— Como você ficou desidratado, meu jovem? — a mulher perguntou quando Ben estava no terceiro copo d'água.

— Sei lá, vômito faz a pessoa perder líquido? — Ben era tão cabeça dura...

— E como! Ok, deixe-me terminar a minha ligação.

Enquanto a médica falava ao telefone, Ben parecia meio grogue ainda:

— Por que eu estou aqui? Como eu vim parar aqui? Isso está parecendo ressaca do dia seguinte...

— Encontrei você jogado no chão do banheiro. — Jaden cuspiu as palavras. — Tive que lhe carregar até a porta. Pode me amar, Ben.

— Ah, você era o maldito anjo loiro que me xingava?

Clint sorriu e acabamos por fazê-lo também.

— Jaden, o anjo xingador. — Dave caçoou.

— Achamos um apelido para você. — sorri, erguendo uma sobrancelha.

— Podemos ir à aula agora? — Ben indagou tentando sentar-se na maca, sem sucesso, pois pareceu tontear por um instante.

— De forma alguma. A ambulância está ali fora.

— Ah, por favor, não, eu não mereço isso na minha vida...

— Ben, você precisa se cuidar, cara — Clint argumentou. — Você disse que está com dor no estômago desde segunda-feira.

— Mais uma razão para ir ao hospital. — a médica reforçou. — Jovens são tão descuidados...

Paramédicos entraram na enfermaria.

— Precisamos de um acompanhante. Alguém de maior?

Todos ficaram em silêncio.

— Isso não é bom. — o segundo paramédico murmurou.

— Podemos ligar para alguém? Sua mãe...

— Meu pai. — Ben cortou, meio trêmulo. Ele pegou papel e lápis, anotou um número. — Você pode ligar para ele.

O garoto virou de bruços e abafou um grito no travesseiro, apertando o próprio abdômen.

— Ben... — tentei ajudá-lo, mas não podia.

— Levem-no para o hospital agora. — a médica pediu aos homens, séria. — No caminho vocês tentam.

— Ok.

— Para qual hospital vocês vão levá-lo? — Mel indagou.

Um dos paramédicos nos informou o local.

— Sei onde fica. — falei. — Iremos depois da aula.

Mel se aproximou de Ben e sussurrou algo que não entendi. Ele sorriu fraco e os paramédicos o levaram.

— Duvido que o professor de Matemática nos deixe entrar. — Dave considerou.

— Verdade — concordei.

— O que faremos? — Jaden indagou.

— Jogamos 21, é claro. — Clint puxou um baralho do bolso, sorrindo soturnamente.

*****************

Depois de assistir um horário de matemática e de jogar 21, embora ninguém estivesse muito no ânimo, pudemos ir ao hospital. A médica da enfermaria foi gentil em nos levar ao hospital. Quando chegamos ao local, agradecemos a carona, entramos no prédio e Mel correu à recepção, onde uma moça parecia atarefada:

— Procuramos por um amigo nosso, Benners McCarthy. Poderia nos informar como ele está?

— Permita-me procurar no sistema... ah, droga, o computador desligou.

— Posso consertar, se quiser. — Mel se ofereceu, meio desesperada.

— Bem, quem ganha é o hospital. Procurarei nas fichas.

Melinda quase voou para trás do balcão, sentando-se no chão e usando um extrator de grampos como chave de fenda.

— Há pessoas que fazem declarações de amor em praças públicas, outras compram rosas, mas devo dizer que consertar um computador com um extrator de grampos por amor é novidade.

— Não enche, Dave. — as mãos de Melinda deslizavam no ar, tirando peças, limpando, repondo. Quando ela tentou ligar, funcionou.

— Já sei quem chamar quando o meu computador der problema. — comentei.

— Achei a ficha do seu amigo. Benners McCarthy... ele está em uma endoscopia agora. Já foi devidamente hidratado e sua glicemia voltou ao normal.

— Achei que você era quem tinha hipoglicemia — comentei olhando para Jaden.

— Qualquer pessoa pode ter hipoglicemia — ele rolou os olhos. — Mas isso não vem ao caso. Onde ele está? Os pais dele já chegaram?

— Mr. McCarthy está próximo a sala de exame. Fica à direita, seguindo pelo corredor, na terceira sala à esquerda.

— Obrigada — a ameríndia agradeceu.

— Obrigada você. Facilitou a minha vida.

Sorrimos e nos dirigimos ao local indicado.

— Que bom que vieram. — William nos acolheu. — Ben tem bons amigos.

— Como ele está? — Mel indagou.

— O que ele tem? — Clint.

— O médico falou algo? — Jaden procurou manter a calma.

— O procedimento ainda não chegou ao fim. Eles estão a uns quinze minutos aí dentro. Ele foi sedado para a endoscopia por razões óbvias.

— Esperar? — indaguei, já sabendo a resposta.

— Esperar. — Jaden e William concordaram. Sentamos nas cadeiras e eu preferi ficar em pé. Estava um pouco tensa. Muito tensa. Ainda havia...

— O que houve com Ben, Will? — ouvi a voz e os saltos de Eve, que se aproximava. Optei por não olhar diretamente para ela.

— Ele desmaiou na escola. Desidratação e hipoglicemia.

— Por que ainda estamos aqui? — seu tom gélido conseguiu causar um calafrio em mim.

— Estão fazendo uma endoscopia nele. Desconfiam de algo no estômago. — William continuou a responder sua mulher. Os snakes pareciam desconfortáveis. Não podia culpá-los.

A porta da sala de exame foi aberta e todos se levantaram.

— Ben — William chamou. — Ben, meu filho, como você está?

— Parece que acabei de sair de uma máquina de lavar roupa — dito isso, o doente riu, entorpecido.

— Queria estar gravando isso, Ben. — Dave comentou em um sorriso preocupado.

— Puta merda, eu devo estar muito retardado — Ben sussurrou, ainda rindo.

— Vamos deixá-lo em observação por hora — o médico se pronunciou. — Meu nome é Edwin Reitz, um dos gastroenterologistas daqui. Estou responsável por Benners. Nome diferente, eu diria. — sorrimos. — O filho e amigo de vocês está com uma úlcera duodenal bem séria, mas tratável. Ele ficará aqui até a ferida parar de sangrar.

— Está tão sério assim? — Melinda mordeu o canto do lábio, séria.

— Um pouco. Como eu disse, Ben terá que ficar em observação.

— Quanto tempo? — a voz de Eve tão próxima de mim me fez estremecer levemente.

— Talvez esse fim de semana. — acho que nosso desânimo foi óbvio, pois Dr. Reitz procurou ser otimista: — Ah, vamos, ele vai ficar bem. Vamos colocá-lo no quarto 205. Apenas duas pessoas por quarto, preferencialmente.

Ben foi instalado no quarto, ainda sedado e dizendo algumas coisas sem noção, mas ao chegar no quarto, apagou. É, a vida tinha dessas. Os pais de Ben entraram no quarto e ficamos do lado de fora. Estralei meus dedos, nervosa. Eve tinha a chance de não ter que ir à reunião com Mr. Lewis. Se ela não fosse, não teria que seguir meu plano, o que seria um alívio. Eve McCarthy tinha que ficar com seu filho.

— Se você puder parar de andar de um lado a outro, agradeço, Shelly. — ouvi Jaden alfinetar, sorrindo.

— Desculpem-me. — murmurei, sentando-me em uma cadeira.

— Ele vai ficar bem.

— Eu sei. — cruzei os braços, angustiada.

Eve saiu do quarto.

— Decidam quem vai entrar.

— Pode ir, Mel. — Clint deu de ombros. Concordamos com a cabeça e Melinda entrou no quarto.

— Tenho que ir agora. — a mulher falou, ajeitando a bolsa. — Até logo.

O que raios ela estava fazendo?!

— Ei! — gritei. Os garotos deram um pulo em seus assentos. Eve voltou-se no fim do corredor com um olhar tão fuzilante que eu não teria encontrado as palavras se eu não estivesse tão surpresa: — Para onde a senhora está indo?

— Tenho uma reunião às cinco. Preciso me preparar para ela. — dito isso, ela virou-se novamente, partindo. Olhei para os meus amigos, incrédula, e eles me olharam do mesmo jeito. Senti-me meio indignada meio desesperada e fui atrás dela. Fui encontrá-la pouco depois da porta do hospital:

— Mrs. McCarthy! — chamei. Ela pareceu irritada ao olhar para mim:

— O que foi, Ms. Revenry? — arqueei uma sobrancelha. — Sim, eu me lembro de você e do seu nome. Eu nunca esqueço uma pessoa. O que você quer?

— Seu filho está internado no hospital. Ben está precisando da senhora agora. Por que está indo embora?

— Você é bem ousada para uma canadense antissocial e asmática. — minhas orelhas e meu rosto esquentaram com essa observação, mas procurei não baixar a cabeça. — Você teve uma chance de parecer alguém para mim, Shelly. Você poderia ter ficado do meu lado.

Meu nome naquele tom frio me pareceu tão... desprezível. Tentei me focar no que estava fazendo:

— Eu procurei ficar do lado que não houvesse dor para ninguém.

— Mas houve. Sabe por quê? Porque meu filho é impulsivo, como qualquer adolescente.

— Você fala como se nunca tivesse sido uma — retruquei. Coloquei meu cérebro no modo respostas boas e rápidas.

— Não importa. — ela meneou a cabeça. — Benners precisa aprender a domar seu gênio e a me obedecer.

— Estando doente? Mrs. McCarthy, ele precisa de você.

— É claro que sim. — a frase parecia prepotente, mas Eve usou um tom de voz lógico. — Como você acha que ele conseguiu aquela câmera polaroide? Quem você acha que vai pagar a conta do hospital? Eu garanto a sobrevivência e o bem-estar dele.

— Mas um ser humano precisa de mais do que isso! — naquele ponto, eu estava frustrada, irritada e desesperada. — Precisa de atenção e de amor! Seu filho está com uma úlcera, doente, hospitalizado. Por favor, não seja tão fria e teimosa. Reconcilie-se com Ben. Poxa, ele é um cara bacana, sensível como poucos hoje em dia.

— Shelly, eu tenho o meu orgulho tanto como Benners tem o dele. Sabe, adoraria me reconciliar com o meu filho, mas ele não me ouve.

— A senhora também não o ouve. — retruquei, tentando modular o tom de voz.

— Não, Shelly. Ele também não me ouve — as lágrimas em seus olhos negros quase a deixaram mais humana, mas ela rápida e imperceptivelmente se recompôs. — Se não se incomoda, eu tenho que ir.

— Se essa fosse a última escolha da sua vida, você a manteria? — questionei, fazendo a minha última tentativa. Ela pareceu parar e por um momento achei que conseguiria demovê-la, mas a mulher respondeu:

— Não sei. Mas é a minha escolha agora.

Ela deu as costas, mas antes que fosse embora, falei em voz alta:

— Desejo que você não se arrependa dessa escolha e que reveja suas prioridades, Eveline Fabocci McCarthy.

Virei-me, voltando à parte de dentro do hospital antes que ela perguntasse qualquer coisa. Elizabeth havia me contado o nome completo dela, o que ela fazia questão de escolher. Eu estava trêmula de raiva e de nervosismo. Que droga de frase contraditória foi aquela?! Ela iria para aquela maldita reunião com Christopher Lewis. A última escolha dela foi ir para uma maldita reunião ao invés de ficar com o filho. Tabarnak. Soltei um grunhido frustrado, encostando a minha cabeça na parede.

— Calma, Queen Marie. — Jaden pôs as mãos nos meus ombros. — O que houve?

Hostie! Aquela mulher é tão... capitalista! — reclamei não sabendo exatamente para quem.

— Tão fodidamente capitalista — Dave acrescentou um de seus advérbios podres de intensidade.

Respirei fundo, tentando me acalmar.

— Jaden, tem como eu falar algo com você em particular? Sem ofensas, rapazes.

— Ah, claro. Não somos seus amigos o suficiente. — Clint cruzou os braços.

— Por favor, sem ciúmes. — pedi, séria.

— Ok, Shelly. — Dave deu de ombros.

— Vamos lá, Queen Marie.

Fui para a saída do hospital e ouvi os passos do loiro atrás de mim. Parei no jardim e olhei o céu nublado, pensando no que eu poderia fazer. Precisava de um conselho.

— O que foi, Shelly? — ele indagou assim que parei de andar.

— Jaden, eu preciso de uma opinião externa.

— Uh... por que exatamente você está querendo a minha? — ele parecia confuso. Apontei para a minha perna direita, onde havia uma cicatriz de 10cm por debaixo da calça. Ele pareceu entender — Ah.

— Poderia lhe dizer as razões pelas quais lhe considero confiável, mas acho que você entendeu. O que você faria se tivesse que decidir entre a possibilidade de resolver um problema, por menor que seja a chance, ou dar um jeito de nunca mais encarar esse problema, mas ele ficar sem solução e torturando sua cabeça com a falta de solução para ele?

Jaden franziu o cenho:

— Depende do contexto.

— Esse é o problema. Eu não posso lhe contar o contexto. Preciso de uma resposta neutra.

Ele coçou a cabeça.

— Acho que eu tentaria resolver o problema, se ele for tão grave a ponto de causar tanto arrependimento se não resolvido.

— Vai por mim, é. — abracei-o rapidamente, agradecida. — Obrigada, Jaden. Diga aos rapazes que eu tenho algo muito importante para resolver e diga a Ben que aparecerei amanhã de manhã.

— Ok... — ele pareceu confuso. — Não entendi, mas lhe desejo boa sorte.

— Acredite, Jaden, eu vou precisar de toda a sorte que eu puder.

Porque Eve McCarthy fez a escolha dela. E eu fiz a minha.


Não quer ver anúncios?

Com uma contribuição de R$29,90 você deixa de ver anúncios no Nyah e em seu sucessor, o +Fiction, durante 1 ano!

Seu apoio é fundamental. Torne-se um herói!


Notas finais do capítulo

Gente, tretas maliiiiiignas :O
Considero esse capítulo essencial para entender o direcionamento que gostaria que essa história tome, que é algo mais reflexivo. O povo de humanas vai saber a questão-chave que esse capítulo tem, então peço que vocês pensem, comentando ou não.
Críticas, comentários, sugestões e desabafos abaixo vvvvvvvvvv
Até o próximo, que será eletrizante [não literalmente] o/



Hey! Que tal deixar um comentário na história?
Por não receberem novos comentários em suas histórias, muitos autores desanimam e param de postar. Não deixe a história "Apenas uma garota..." morrer!
Para comentar e incentivar o autor, cadastre-se ou entre em sua conta.