A Beautiful Winter Day escrita por Summertime Sadness


Capítulo 10
Estilhaços na Tempestade


Notas iniciais do capítulo

Nossa, finalmente consegui terminar esse capítulo! Me dou um prazo de uma semana pra escrever e atualizar, mas nem sempre dá. Semana que vem recomeço a faculdade, mas não vou deixar a história de lado. Bem, enfim...

Boa Leitura :)



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Demorou alguns segundos para John formular uma resposta.

— Se ele foi morto, então o assassino... –

— Sim – Mycroft concordou um pouco impaciente – É o mesmo. Pelo que compreendo, meu irmão só foi uma queima de arquivo. O verdadeiro alvo era Magnussen. Agora que o segundo e provavelmente último assassinato foi feito, isso vai acelerar as investigações que já estavam em andamento.

— Espera, então por que vocês não... –

— Fiz o possível para a Scotland Yard te manter afastado; você não estava em condições – analisou-o atentamente – de ajudar em alguma coisa.

Sabia que era verdade. Não poderia ter feito nada e sua fascinação pela existência transcendental de Holmes lhe tirava todas as outras coisas da cabeça. Bem, mas não era como se pudesse virar as costas pra isso novamente.

— Mas agora eu estou bem – falou – O assassino ainda pode estar por perto, nós devemos... –

Mycroft ficou ainda mais sério; provavelmente poderia interromper John o resto da tarde.

— Não, John, nós não vamos fazer nada. Eu é que vou fazer alguma coisa – seu sorriso foi tão caloroso quanto um cubo de gelo – Você vai voltar pra casa e para sua vida feliz e doméstica.

— Não...

— John, ele está certo, nós... –

— Não! – insistiu mais alto – Eu posso, eu vou ajudar!

Fechou inconscientemente uma mão num punho.

— Como eu disse você não estava – Mycroft girou a maçaneta – e também não está agora.

Watson deu dois passos a frente.

— Do que você tem medo? Tem medo que eu o mate!? Não deveria ter pena do assassino de Sherlock!

Mycroft voltou-se para ele. Sherlock somente observava.

— Não, Dr. Watson, eu não tenho pena. Até porque matá-lo não é uma coisa que você faria.

— Você se surpreenderia.

— Não, Dr. Watson. Você é quem se surpreenderia.

John respirou fundo, não querendo continuar a discussão. Passou por Mycroft e saiu do escritório. Havia sido bom memorizar todo o caminho. Ele estava mais escurecido, mas pode guiar-se facilmente pelos corredores. Foi só quando ultrapassou a porta da frente que percebeu a ausência de Sherlock. Olhou ao redor, sem qualquer sinal dele. Pensou em chamá-lo, mas desistiu. Se quisesse vir, já teria vindo. Talvez John não passasse mesmo de um mensageiro.

Viu a massa cinza de chuva a alguns metros, fora da cobertura. Lembrou com desânimo que se esquecera do guarda-chuva no escritório. Argh. Seria mais um para a coleção do Governo Britânico. O taxista não ficou muito contente quando entrou no carro completamente encharcado. Mas só fez uma cara de desaprovação e seguiu viagem.

Encostou a cabeça no vidro embaçado, e acalentou a respiração. Levou cerca de cinco minutos para dizer ao motorista para seguir à Baker Street. Sabia que o encontraria lá e se não encontrasse, não demoraria a aparecer. A verdade é que desconfiava que Holmes havia ficado pra trás só para tentar aparecer para o irmão. Era também verdade que aquilo não aconteceria, mesmo que tentasse todos os dias. John se lembrava que havia sido constantemente seguido por Sherlock, antes do médico poder enxergá-lo. Não sabia como funcionava exatamente, talvez estivesse certo em supor que o amigo havia gastado energia para que conseguisse vê-lo. É claro que isso significava que Sherlock havia sacrificado por John, e talvez não pudesse repetir com ninguém mais.

Talvez John não merecesse. E Sherlock não soubesse disso. Ou talvez soubesse e ignorasse.

O carro e tão rápido quanto pode, entrou no 221. Tudo estava sombrio, o tempo conturbado se misturando ao anoitecer, retirando qualquer vestígio de vida dali. Não havia nenhum morador ou Hudson por ali, e tratou de subir as escadas silenciosamente. Tudo na verdade estava em silêncio, a não ser pelo turbilhão do lado de fora. Pegou a chave correta e abriu. Desde que viera pela primeira vez depois da morte dele, sempre mantinha a chave junto de si.

Trancou a porta e caminhou.

— Sherlock?

Sem surpresa, ele não estava. Ficaria esperando mesmo. Iria até sua poltrona, quando viu a janela quebrada. O vidro jazia em estilhaços pelo chão, e o vento e chuva sopravam livremente. Foi até lá e desceu o vidro reserva. Pensou no barulho que ele e Hudson haviam ouvido mais cedo. Começou a procurar o que poderia ter atravessado a janela, mas não havia nada. Abaixou-se e tocou nos estilhaços na poça d’água. Sherlock poderia ter feito aquilo num descontrole emocional. Ele obviamente não estava nas melhores horas atrás.

Afastou-se daquilo, determinado a pensar com clareza.

— John.

Virou-se. Sherlock não parecia nem um pouco surpreso – ou feliz – por ele estar lá. John pensou seriamente se o amigo não estava naqueles enfadonhos dias de não querer conversar com ninguém. Deveria deixá-lo em paz por alguns dias, até ter seu humor resolvido. Mas não podia esperar. Isso não podia esperar mais.

— Precisamos conversar.

— É claro que precisamos – respondeu sarcástico.

Holmes se sentou no sofá, um pouco curvado, as mãos na beirada do sofá, os olhos fitando o chão, certamente além dos cacos e água espalhados neste. Não disse mais nada, e John estranhou.

— Eu... Tudo bem. O que há com você?

— Nada.

— Você ficou para trás pra tentar falar com Mycroft?

— Não – ainda olhava para o chão.

— Você tentou e não conseguiu.

— Eu achei que você queria conversar.

Sherlock o encarou com seus olhos de aço. John ficou em dúvida se ele estava com raiva ou apenas entristecido. A mistura desses dois não fazia desses olhos o paraíso que costumavam ser. John respirou fundo, prestes a começar.

— Eu não sei – Holmes cortou antes mesmo de ele começar.

— O quê!?

— Está claro o que vai perguntar, então não se dê ao trabalho. Não sei quem o assassino é. Desculpe por perder a viagem.

Sherlock falava como se não soubesse quem fizera seu café, e não de alguém que cometera seu próprio assassinato. John o encarou, imaginado seriamente se o detetive era o software de uma máquina e não um fantasma. Tentou reencontrar as palavras.

— Você sabe quem é. Tem que saber – insistiu.

— Eu não sei. Usava uma máscara e mesmo se não a usasse, era certamente um desconhecido. Acha mesmo que se eu soubesse de alguma coisa, não faria nada!? – estreitou os olhos – Eu apreciava viver.

— É isso que preocupa, será que não entende? Ele poderia estar de máscara, mas ainda assim poderia saber tudo sobre ele! Sua massa corporal, altura, experiência no jeito que segurava a arma, a postura, sexo. Se quisesse, já podia ter chegado até ele.

— Não deduzi nada, estava morrendo!

Ele se recostou no sofá. John pensou em perguntar o porquê dele não querer falar disso, porém ficou quieto. O observava e era obvio que havia algo errado, talvez algo mais profundo do que a conversa.

— Sher... - mas sua voz morreu quando alguma coisa começou a acontecer com o amigo.

Holmes colocava as pontas dos dedos de uma mão numa têmpora, como que tendo um latejar mental. Mas não era o que lhe chamara a atenção. Tudo nele – tudo – ficou translúcido. Pouco a pouco a transparecia lhe vestia, de mais branda à assustadora similaridade de desaparecer. Como se a qualquer momento ele fosse se desfazer no ar, uma mera ilusão que suportou tempo demais. John olhava, mas não queira olhar. Foi durante poucos segundos, o suficiente para o amigo olhá-lo num pânico silencioso e John ter seu coração congelado a mais intrínseca célula. Nada lhe saía dos lábios, e mesmo se saísse, não faria a menor diferença.

Sherlock olhou suas mãos e depois voltou a olhar a olhá-lo. O azul, cinza, todas as cores de suas íris mágicas sumiam. O perderia mais cedo que pensava. Mas sabia que ainda seria cedo mesmo que tivessem se passado trinta anos.

Demorou uns segundos a mais para ele perceber Sherlock o chacoalhando pelos ombros, numa clara tentativa de acordá-lo do estupor.

— John!

Watson agarrou os pulsos dele, palpáveis como nunca, e o afastou. Não sabia exatamente como andava sua expressão, mas não devia ser das mais agradáveis. Havia pouco fôlego, verdade, porém disse mesmo assim;

— O quê... O que aconteceu aqui! – a voz era mais alta do que pretendia – O que diabos aconteceu com você!? Você estava sumindo!

— Não se preocupe...-

— Não se preocupe!? – repensou em lhe dar um soco – Você estava sumindo! Eu achei...-

— John, você não é bom em achar em nada, então pare. Eu só... Estou cansado.

Como que para ilustrar, Holmes voltou a sentar-se no sofá. Não deveria se cansar, tecnicamente deveria ser impossível. Deus, se estivesse vivo poderia dizer ele aparentava estar doente, no mínimo apático. Normalizou com dificuldade a respiração que a pouco se acelerara; e tentou entender com o que já sabia.

— É melhor que você não tente se mostrar para mais ninguém – disse, gentil – Sinto muito, mas eu acho que fui a primeira e única pessoa pra quem você conseguiu fazer isso.

Holmes não disse nada, só deitou, seus olhos virados para o teto.

— Só não exija tanto de si mesmo – repetiu.

— Eu não estou exigindo nada de mim mesmo, e mesmo se fizesse, o pior que poderia acontecer comigo já aconteceu. Pense. O único ponto positivo de morrer é que nada de pior pode te acontecer.

John balançou a cabeça.

— Podia parar de dizer essas coisas.

— Por quê? Quer que eu fale de minha morte de forma poética? É uma coisa que você faria.

— Não sou poético – protestou - quem deixou uma mensagem para um ente querido foi você, não eu.

— Não disse nada poético lá. De novo, quem faria uma coisa dessas é você.

John aproveitou a deixa.

— Então o que estava escrito lá?

— Nada demais.

— Por que você quebrou o vidro?

Sherlock desviou o olhar do teto e o fitou.

— Está escolhendo coisas aleatórias para me questionar. Sente tanta falta dos velhos tempos que quer enxergá-los aqui? Posso tecnicamente ser a vítima, mas não sou nenhum cliente. Não preciso da entrevista que acha que eu preciso.

Voltou a encarar o teto, parecendo irritado. John se aproximou e sentou-se na mesinha de centro de centro perto dele. Pôs os braços nos joelhos.

— Eu não entendo – admitiu – se não quer descobrir quem te matou, então por que você está aqui?

Holmes suspirou.

— Para onde mais eu iria? Você pode acreditar que existem outros planos, realidades astrais, ou o que seja. Mas eu não.

— Você não pode ter certeza.

— Eu prefiro não ter.

— Sherlock, o simples fato de estar aqui já é inexplicável. Quer dizer, não consigo ver nenhum motivo para esses outros lugares não existirem. Pessoas do mundo todo querem esse tipo de prova, e você tem. Nós temos.

Sherlock suspirou novamente, dessa vez mais aborrecido.

— Por que você simplesmente não psicografa um livro espírita e seja feliz!? E só pra constar, eu não vou te ajudar! – como costumava fazer quando brigavam, ele virou de costas e se encolheu no encosto do sofá, como se não tivesse mais que cinco anos de idade.

Cruzando os braços, Watson vislumbrou a janela. Infelizmente a tempestade não diminuiu. Se pagasse às cegas por outro taxista, corria o risco falir como previra.

— Ás vezes eu acho que você tem medo de ver a luz – comentou.

— Precisa parar de ver esses filmes. E não, não há nenhuma luz.

— Talvez se sinta feliz com isso, assim não precisa escolher em entre ir e ficar.

De súbito, Sherlock sentou-se e o fitou profundamente.

— Acha que eu já não faço isso? Não estou preso aqui, John, nunca estive. Sei que a qualquer momento eu posso ir, não sei para onde ou como, mas eu posso. É como uma informação gravada na minha cabeça depois de morrer, a única coisa que tenho certeza. É uma coisa tão fácil quanto piscar os olhos; todos os dias penso que deveria deixar tudo para trás, e seguir esse... Instinto. Mas eu não posso. Porque eu não consigo ver que exista qualquer coisa além disso – ergueu um pouco os braços como que mostrando a Terra – Você diz o tempo todo que eu sou um fantasma, então por que raios eu não vejo ninguém como eu!? Tenho a impressão de que sou o único, e que nem deveria estar aqui. Como um tipo de erro da natureza, que quando for embora só vai deixar de existir. Assim como todos os outros que morrem.

John desviou os olhos, inseguro. Bem, ambos estavam inseguros, provavelmente sempre estiveram. Como acreditar na luz, quando era muito mais fácil acreditar no vazio? Não era isso que a morte era, o vazio da não-existência? Mas Sherlock não poderia ser apenas um erro de cálculo do universo.

— Você nunca deixará de existir. Nunca.

— Só vou existir nas suas memórias.

— Ser lembrado é existir.

Sherlock olhou-o com algo próximo a pena. Não o suficiente, mas próximo.

— Não importa – murmurou – Esquece. Não devia ter te contado. Quer dizer, isso não é nada.

John foi para o lado dele.

— Então se soubesse que há um lugar pra você além daqui, você iria? Não acredito que isso se resume ao seu medo do desconhecido. Deve haver uma outra razão, não sei. Se não é sobre isso ou sobre seu assassinato, então...-

— John, pare – sua voz era séria – está tentando encontrar coisas que não existem, problemas que não estão aqui. Tenho a impressão de que você não está suficientemente satisfeito com a vida que leva atualmente, mas saiba que é o máximo que pode ter agora.

— Estou feliz com a vida que venho levando – contrapôs – Assim como antes.

— Antes você andava por aí caçando vizinhos rebeldes em áreas abandonadas cheio de viciados em drogas. Hoje está querendo ajudar pessoas mortas. Não está feliz, mas saiba que isso é o melhor pra você.

— Você não sabe o que é melhor para mim.

— Você é como a maioria, John. Não é difícil supor que uma família e um emprego estável seja a base de vida que deseja, mesmo com suas inclinações para situações perigosas. É estúpido, realmente, mas as pessoas fazem qualquer estupidez para não ficar sozinhas, você não é exceção.

— Não tenho medo de ficar sozinho – negou.

— Claro que tem – falou de modo obvio – não se culpe, pessoas com mentes normais são assim.

— Quem tem medo de ficar sozinho aqui é você.

Sherlock sorriu achando graça daquilo.

— Eu gosto de ficar sozinho, isso não mudou.

— A primeira que você fez quando morreu foi vir até mim.

— Isso é diferente.

— Não é nenhum pouco diferente.

— Se acha importante demais.

— Você me trancou no seu flat, como quer que eu não me ache importante?

Ficaram se encarando sérios por alguns segundos. E depois riram. John apoiou uma mão no ombro dele, aliviado por ainda poder tocá-lo. Seus olhos pousaram nos cacos no chão, depois foram à janela. Pela fresta da cortina, um raio perpassou a escuridão, iluminando olhos de Sherlock fracamente, dando-lhes tons violáceos. O raio se foi e em segundos seu trovão cantou os céus.

— Eu não deveria gostar tanto de ter você aqui – disse John, num surto de sinceridade – Não é como se fosse ficar pra sempre.

Sherlock não respondeu. Havia voltado a ficar sério e a olhar para o chão, inerte. Os braços nos joelhos.

— Sherlock? E então?

— E então o quê?

— Vai ficar por quanto tempo?

Holmes fitou-o rapidamente, o desbravando até a alma. Respondeu despretensiosamente:

— Não sei. Por quanto tempo planeja viver?

Podia ser errado querê-lo trancá-lo na Terra, mas ficou feliz ao ouvir aquilo. Era egoísta, mas o que podia fazer? John não seria aquele que o mandaria para a luz, mesmo que fosse a coisa certa a se fazer. Sentia saudade dos velhos tempos; se a luz o roubasse também sentiria falta desse Sherlock feito de raios de luar. Deus, ter saudade dele era tão fácil quanto respirar.

Watson o abraçou, não se importando por Holmes permanecer estático.

— Ás vezes eu sinto sua falta, mesmo você estando aqui – John murmurou.

— Não achava que você ficaria tão... – tentou buscar uma palavra - Ferido. Com a minha partida, quero dizer.

John se desvencilhou gentilmente.

— Não estou ferido. Estou bem – reforçou - assim como você.

Sherlock assentiu.

— Ótimo – Holmes disse baixo – Eu queria poder acreditar em você.

John podia dizer o mesmo para ele. Porém ficou quieto, disposto a agir em diante como se aquele fosse mais um dia normal, o típico sem graça que compartilhavam ente os casos. Começou a limpar os cacos para ocupar a mente. Queria que sua vida fosse tão fácil quanto recolher estilhaços.

(...)


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Notas finais do capítulo

O Feedback de vocês é muito importante, lembrem-se :)
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Pessoas, eu e minha amiga da faculdade criamos recentemente um blog ( http://triboletras.blogspot.com.br/ ), mas como ainda sou uma novata na Blogosfera, não conheço muitos blogs para seguir. Então, se algum de vocês tiver um Blogger, me deixe o link por MP ou nos comentários adicionais, como preferirem. Agradeço desde já.



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