A Missão escrita por StefaniPPaludo


Capítulo 14
Capítulo 10


Notas iniciais do capítulo

Um dos meus capítulos preferidos. Onde tudo começa....



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O dia seguiu a rotina dos anteriores, parecia que seria sempre assim. A mesma rotina, as mesmas pessoas, as mesmas aulas. Eu já estava ficando um pouco entendiada. Não que eu já estivesse cem porcento acostumada e a vontade com os exercícios e os esforços físicos, não, nada disso. Eu estava mesmo era me acostumando a ser uma das piores aluna da turma.

As aulas de história (que pareciam mais aulas de amor a pátria, já que Alexandre não parava um minuto de exaltar Tazur e o governo), e as aulas de primeiros socorros eram as melhores e mais tranquilas. Ficávamos sempre na sala de aula, escutando o que os professores explicavam e lendo sobre o assunto. Após ler os livros de ambas as aulas eu já estava a par do conteúdo e conseguia entender muito bem o que os professores diziam. A aula de primeiro socorros falava sobre anatomia, sobre o que fazer ou não em cada situação e coisas desse tipo. Júlio tinha dito que logo, logo começariam as aulas práticas e aí sim a matéria ia começar de verdade.

A pior aula do dia, defesa pessoal, acabou sendo melhor que ontem. Tivemos que lutar hoje de novo, mas não uma dupla de cada vez e sim todos juntos. O bom foi que pudemos escolher a dupla que queríamos e eu fui com a Carol, que acabou pegando leve comigo e me dando algumas dicas. Alexandre não prestou muita atenção no que estávamos fazendo e sentou-se em um canto da sala, parecendo indiferente, enquanto esperava o tempo passar e a aula acabar. Assim pudemos praticar nossos golpes sossegados e sem preocupação.

Quando essa última aula acabou, todo mundo saiu da sala, inclusive eu, que fui tomar um pouco de água antes de voltar para a base de treinamento e fazer meus exercícios particulares de "reforço". Quando voltei, a base já estava vazia e decidi continuar os movimentos que estava fazendo ontem. Mas dessa vez fiquei de frente para a porta, para conseguir ver se alguém aparecesse e não correr o risco de ser surpreendida por ninguém.

Após uma meia hora que eu já treinava, como ontem, Júlio apareceu e me encontrou treinando. Ele entrou no local logo que me viu:

– Soldado. - ele falou firme, esperando que eu me aproximasse dele para continuar.

Imaginei se hoje ele seria mais severo que ontem e exigiria saber o que eu fazia novamente ali, ou se me mandaria para outro lugar. Seu rosto imparcial não dava nenhuma pista.

– Oi — eu me aproximei dele, dando um tímido sorriso, sem saber muito bem o que fazer ou dizer.

Ele pareceu desconcertado com meu oi e meu sorriso, mas tentou manter a pose:

– Ah sim, boa noite. - disse em tom formal.

Esperei olhando para ele, pelo o que viria a seguir. Ele me daria uma advertência? Me mandaria sair dali? Tentei controlar minha ansiedade pelo que estava por vir.

Júlio demorou um pouco para prosseguir. Ele parecia estar escolhendo as palavras e tomando coragem para dizê-las:

– Observei você treinando ontem a noite, e pude ver que hoje está aqui de novo. Imagino que esteja tentando melhorar seu desempenho físico e se igualar aos seus colegas.

– É... sim senhor. - ele mantinha a postura firme, realmente a postura de um soldado, enquanto eu parecia cada vez mais intimidada com sua presença. Será que deveria pedir licença, me retirar e voltar para treinar depois do jantar?

–Não pude deixar de notar que você tem muito o que aprender se quiser mesmo alcançar e até superar seus colegas, e estou aqui disposto a lhe ensinar.

Por essa eu não esperava!

– Não. Não precisa. - eu estava confusa. A última coisa que me passaria pela cabeça quando o vi me chamando era que se ofereceria para me ajudar. Isso não fazia sentido!

Eu já tinha recusado a ajuda de Danilo que era meu colega, porque aceitaria agora a ajuda dele, um estranho durão?

– Eu insisto. Gostei da sua força de vontade, seu empenho e sua dedicação. Quero lhe ajudar mesmo. Não podemos desperdiçar uma soldado com tanta determinação.

Danilo não tinha dito que seu irmão era quem havia o ensinado? Júlio era um bom professor e já tinha uma boa experiência em ensinar alunos como eu. Quem sabe não fosse melhor aprender com ele do que com qualquer outro? Imagina se eu me tornasse tão boa quanto ele!

Era fato que eu teria que engolir meu orgulho se quisesse que isso acontecesse. Mas, de qualquer jeito, eu não estava tendo muitos resultados treinando sozinha...

– Tudo bem — com um suspiro aceitei.

– Fez uma boa escolha soldado. Venha, vou lhe mostrar os movimentos corretos — ele deu um leve sorriso. O primeiro que eu vi em seu rosto. Aposto que se fosse um sorriso maior seria tão bonito quanto o de Danilo.

Ele se colocou em frente ao saco de pancadas em que eu estava antes, posicionado com a perna esquerda para frente e a direita mais para trás, os joelhos estavam levemente flexionados e o braço direito em posição pronto para dar o soco e o esquerdo posicionado em frente ao seu rosto.

– Repare em como estou — disse ele. - Para conseguir dar um bom soco não devemos prestar atenção somente no movimento do braço, mas sim no movimento do corpo inteiro. As pernas e o tronco devem estar posicionados corretamente. - ele gesticulou para sua posição. - Mantenha o calcanhar elevado no pé que estiver mais atrás. E quando for dar o soco gire o tronco e o quadril em direção ao seu alvo. Como você é pequena e tem pouca musculatura, isso lhe dará mais força.

Ele deu um soco forte e potente no saco de pancadas. Em seguida, deu outro quase em câmera lenta para que eu pudesse analisar bem seus movimentos. E fui o que fiz, olhei cada parte de seu corpo, memorizando cada detalhe.

– Agora tente você — ele gesticulou com a cabeça em direção ao saco de pancadas ao seu lado.

Fui para onde ele apontava e tentei ao máximo me colocar na posição correta. Julio continuava parado na mesma posição enquanto eu o olhava e o imitava, tentando deixar meu corpo igual ao dele. Logo que vi que estava quase igual soqueei o saco, um pouco melhor que as minhas tentativas anteriores, mas nada comparado ao soco dele.

Continuei em minha posição, enquanto ele veio para trás de mim, corrigindo o que estava errado.

– Não se esqueça do outro braço em frente ao rosto para proteger.- lembrou ele. Coloquei o braço onde ele pediu. - Isso, agora bata.

Soquei novamente, ainda fazendo errado. Ele ainda estava atrás de mim e pegou minha mão para mostrar o movimento correto. E falou com sua voz grossa, perto do meu pescoço, me causando um arrepio:

– Leve o braço reto, deixando a mão ainda aberta. - ele moveu meu braço em direção ao nosso alvo — Quando chegar no ponto certo, levante-o — ele levantou minha mão vagarosamente para bater, mas eu ainda estava com a mão aberta. Ele puxou de volta meu braço e encostou sua mão na minha, fechando a meus dedos. Senti uma sensação estranha com nosso toque, como se uma onde de choque passasse entre mim e ele. Tentei ignorar aquilo - O polegar sempre fica em cima dos demais dedos, mantendo os fechados. - prosseguiu ele, provavelmente sem ter sentido aquela estranha sensação - E só feche a mão quando for acertar seu alvo. Isso também lhe garantirá maior impacto. Agora tente.

Ele se afastou um pouco, me observando enquanto eu soqueava o saco de pancadas como ele havia me ensinado. Parti para a ação, tentando dar o melhor de mim e melhorar cada vez mais meus movimentos. De vez em quando ele me lembrava de alguma coisa que eu estava esquecendo.

Após um tempo eu já estava bem melhor e me sentia satisfeita com meu progresso.

– Acho que está na hora do jantar. Vá se alimentar um pouco. Se quiser podemos continuar depois. - Ele me fez parar e falou um pouco menos frio que o normal. Devia também estar feliz com minha melhora.

– Não estou com fome, podemos continuar.- pedi. Não queria desperdiçar um segundo que fosse.

– Vá lá rapidinho, não quero ninguém desmaiando aqui comigo. - seu tom foi autoritário. Provavelmente ele se lembrava do meu primeiro dia no quartel, quando eu fiquei várias horas sem comer e estava a ponto de desmaiar. Com essa ele não me deixou outra escolha e eu tive que cumprir suas ordens.

– Ok. Vou e já volto. - então reparei que eu não era a única que necessitava de comida para me manter viva. Ele também precisava se alimentar. — Você não vai ir jantar também?

– Não estou com fome e vou resolver umas coisas enquanto você janta. - ele deu de ombros.

Sai e fui em direção ao refeitório, quase correndo. Comi rapidamente, sozinha, e voltei o mais rápido possível para a base.

Quando cheguei Julio já estava lá, batendo pra valer em um saco de pancadas. Nada comparado aos soquinhos que havia me ensinado. Fiquei alguns segundos admirando seus belos movimentos, sua rapidez, habilidade e seu corpo perfeito.

– Voltei — anunciei, chamando sua atenção.

– Ótimo. Agora vamos fazer diferente. Em vez de treinar dar socos, vamos treinar defender-se dos socos. - ele foi para a minha frente — Qual sua mão mais ágil?

– A direita, eu acho — não entendi o que teria a ver com me defender.

– Vou tentar lhe soquear e você vai colocar essa mão na frente do meu soco antes que lhe atinja. - explicou ele como se adivinhasse meus pensamentos.

– Ta. - concordei, meio receosa por temer que agora eu começaria a me machucar de verdade levando vários socos.

– Não se esqueça de manter a outra mão protegendo o rosto. - lembrou-me ele.

Júlio se posicionou e começou a me atacar com socos lentos, para que eu pudesse ter tempo de me defender. Logo começou a acelerá-los, e um que outro me escapava, mas nenhum desses acabou me atingindo de verdade. Ele parava o movimento quando percebia que ia me bater.

– Agora mantenha a cabeça abaixada. Assim... - ele tocou em meu rosto e abaixou minha cabeça, fazendo com que o meu queixo quase encostasse no pescoço. Mais uma vez estranhei o toque quente dele. - Isso, sempre assim. Evita que o adversário tente acertar um soco em seu queixo.

Treinamos mais um pouco e ele resolveu que deveríamos mudar de posição:

– Você me ataca e eu me defendo.

– Tem certeza? -perguntei insegura

– Tenho. - falou já preparado para se defender, com os olhos atentos aos meus movimentos. - Bata pra valer, com toda a sua força e técnica. - comecei devagar e tentando fazer como ele, dar socos que se o acertassem não machucassem de verdade. - Vamos Liss! Bata com força. - dei mais alguns golpes fracos - Vai! Mais forte!

Continuei no mesmo ritmo que antes e ele se irritou largando sua posição de defesa pra me perguntar:

– Qual o problema? - sua voz era agressiva, levemente incomodado por eu não estar lhe obedecendo.

– Não quero lhe machucar. - soltei, sendo sincera.

Ele deu um suspiro cansado e irritado:

– Você não vai me machucar, nem que tente. E se você quer mesmo se dar bem aqui dentro, deverá esquecer esse tipo de preocupação.

Era verdade. Pelo pouco tempo que eu conhecia o quartel já havia percebido que não tinha espaço para aquele tipo de pensamento bobo.

– Ta bom, desculpe. Vamos de novo. - me sentia mal por ter sido repreendida. Eu tinha que conseguir ser como eles.

Fiz como ele queria e comecei a bater com toda a minha força, logo ele pediu pra mim também, bater mais rapidamente e mesmo assim continuou se defendendo de todos os meus golpes. Nenhum passou por ele, e minha preocupação em feri-lo se pareceu mais idiota ainda.

Quando soou o toque de recolher eu me sentia cansada, mas feliz com meu corpo e com o que tinha aprendido. Gostei de Júlio me ensinando, havia conseguido aprender bastante coisa em pouco tempo.

– Obrigada pela ajuda. - eu lhe disse com um sorriso. Era a única forma que eu tinha para agradecer.

– Não tem do quê. - ele me respondeu sério, assumindo novamente a postura de soldado que ele havia deixado um pouco de lado enquanto me ensinava. - Vai querer treinar amanha de novo?

Eu ergui as sobrancelhas e sorri. Ele iria querer me ajudar de novo amanha? Fiquei surpresa com essa possibilidade. Por que estava fazendo isso? Por que estava perdendo o tempo que poderia ser gasto com coisas melhores, comigo? Me ensinando. O que ele ganharia com isso?

– Sim, mas você não precisa vir. Já me deu uma grande ajuda. Deve ter coisas mais importantes para fazer. - tentei dizer convicta, mas não tenho certeza se minha indecisão não foi visível.

– É, na verdade eu tenho — Julio pareceu se lembrar de alguma coisa — Mas mesmo assim virei novamente.

– Então, até amanha. - Me senti feliz por saber que poderia contar com ele como meu professor durante mais um dia. Tinha sido bom. Bem diferente de outras ocasiões em que tínhamos estado juntos. Júlio não parecia ser um cara tão ruim assim.

Fui me retirando da base, e quando eu estava na porta, já saindo, ele me chamou:

– Soldado?

– Sim? - me virei pra trás o encarando, temendo que ele tivesse desistido de me ajudar.

– Você foi muito bem. - ele me elogiou sem esboçar o mínimo sinal de um sorriso, indiferente.

– Obrigado. - me retirei, sentindo um sorriso em meu rosto. Não era todo dia que recebia um incentivo do meu professor. Ainda mais de um professor do quartel. Era bom saber que até eles estavam percebendo meu progresso.


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Notas finais do capítulo

E ai o que acharam?



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