A notícia dos últimos dias foi que a caloura mais talentosa da escola não é mais caloura. Shay foi adiantada pela direção da Academia. Adivinhem quem foi a pessoa que ficou mais puta da vida com essa, digamos, novidade? Sim, Karmen!

Eu pude vê-la comentando com as amigas sobre antes de uma de nossas aulas.

Cheguei a ficar surpreso, mas mais por ser repentino por parte da direção. A Shay já é uma artista pronta ao meu ver. Ela já sabe cantar, dançar e deu aquele tremendo show na frente da escola toda. Teve a festa da vó dela também.

Athos foi o primeiro a saber e depois contou-nos. Mas não foi da boca dele que ficaram sabendo não. Provavelmente foi uma das amigas da Karmen. É a única explicação para ter se espalhado tão rápido, apenas algumas meras horas.

Eu encontrei com a Shay no pátio e conversamos:

–Fala ai, veterana.

–Para com isso, Nil. Não tem graça ficar me zoando.

–Não está feliz?

–Eu sei lá! Eu nem passei por uma “grande escalação” como você ou os outros e o meu debut será no ano que vem já.

–Fica tranquila, Shay. Pelo menos você está em algo que quer. Eu acho! Você quer seguir carreira solo, né?

–Quero. Nisso eles acertaram. Só acho que foi um pouco demais me jogarem um ano acima. Eu queria continuar a estudar com a Brit e a Miranda.

–Te disse que são eles que escolhem o seu futuro aqui. Foda-se que você gosta das suas aulas de 1º ano, vamos te colocar no ano seguinte porque você tem talento de sobra. É assim que eles são!

–Percebi isso rápido até demais. Mas é que tem outra coisa também.

–O que?

–Brian.

–Quem ser este ser?

–Só uma pessoa que eu não ver nunca mais na minha vida. É meu ex!

–Saquei. Mas... O que tem ele?

–Ele vai estudar aqui. E não é pelo talento musical dele.

–Não precisa nem explicar. Já sei!

–Por que será que os homens nunca entendem que quando acabou, é acabou mesmo.

–Mudando de assunto, Shay. E a gravação? Você não vai mais fazer com as meninas né?

–Não! Mas ainda estarei com vocês lá na sexta. Elas conseguiram arrumar outro encaixe com um grupo da turma delas.

–Já te botaram para fazer gravação em menos de dois dias de “novo ano”?

–Sim. É o que eles estão fazendo lá.

–Eu já acho difícil fazer trabalhos assim em quarteto, imagino você que está fazendo sozinha.

–Mas é ai que tá. Eu não estou tecnicamente sozinha, eu tenho vocês, a Vollux.

–Terceirizando o trabalho, Shay. Deixa a sua professora saber disso.

–Problema dela. Eu não sou a deusa indiana que tem oito membros. Preciso de ajuda.

E rimos.

***

Finalmente chegou a sexta a noite, o dia da gravação. Enquanto maioria da Academia ia para a “balads”, lá estávamos nós subindo para o estúdio. Eu nem sabia onde a Senhorita Shayera estava. Sério, cara! Esse horário é o pior de todos.

Primeiro, discutimos quais seriam as duas músicas que gravariamos.

–Então, galera. O professor pediu uma música cover e uma autoral. - começou Joseph

–A cover vai ser o Mirai do Mamoru Miyano. Já decidimos isso antes. - completou Athos

–Claro! Mas e a autoral? - indaguei

–É só abrir o seu caderno de músicas em qualquer página, Niels.

–Muito engraçadinho, Stefan.

Ele fez careta e Athos soltou em seguida:

–Que tal Garota Alaranjada? É uma música muito boa!

–Athos, não, cara!

–E por que não, Niels? Ela cumpre o que queremos. Mais puxada para o pop.

–É só a gente incluir uns backings para nós três e você canta o resto.

Sim, o garoto de voz rouca carrega os vocais da Vollux nas costas com essas três vozes de esquilo. Eu não tenho algo que possa definir a voz dos meus amigos. Eles não cantam, só melhoraram porque se esforçaram nas aulas. Mas claro, esse nunca foi o foco deles. Eu nasci para ser vocalista, eles não.

Eu perdi na votação, então, cantaríamos Garota Alaranjada. Discutimos rapidamente como seria o instrumental. Seria um rock-balada, se é que existe esse termo. Ia gravar a minha parte primeiro, usando a guitarra de apoio, gravando-a também. Sim, tive que passar a cifragem que fiz para o violão para guitarra em uns cinco minutos. Coisas que o Niels tem que fazer. Nada fora do normal!

Escolhemos a mesma coisa em relação a música cover.

E lá foi o Niels para a cabine de gravação sozinho. Joseph foi a mesa para ajeitar as entradas da mesa. Testamos o microfone, pluguei a guitarra e testei. Ele foi ajustando os níveis para que tudo ficasse agradável e certo, para ficar mais fácil de mixar depois.

–Bem, Niels, vamos começar a gravar?

–Vamos, cara!

Respirei fundo para me preparar, foi ai que a Shayera chegou.

–Olá, pessoas! Desculpem a demora. Já começaram?

–Ainda não. - respondeu Stefan – Niels vai começar a gravação agora.

Eu estava tranquilo uns dois segundos atrás, por que o meu coração começou a pular no meu peito do nada? Merda! Merda! Merda!

–Niels, tá tudo bem, cara? - perguntou Joseph

–Tá. Eu acho!

Shay acenou e sorriu, me cumprimentando. Respondi repetindo o gesto. Fale mentalmente comigo para ter calma. Inspirei forte e mandei começar a gravação.

Os primeiros acordes ecoaram nos meus ouvidos e eu comece a cantar a canção. Não pude deixar de pensar na primeira vez que eu gravei essa música. Eu tive uma briga feia com a Shay e essa música foi o meu jeito de pedir desculpas a ela. Mas quando mandei o vídeo a ela daquela vez, eu não fiquei nervoso, não fiquei nada. Será que é por tudo o que aconteceu entre nós que eu estou assim?

Porque se for interpretar essa música de uma outra forma, pode ser uma declaração de amor.

Pude ver a Shay sorridente ouvindo minha voz cantar.

Cantei a cover na sequência e finalmente sai da cabine. Os garotos entraram e foram gravar os backings deles e o resto do instrumental. Shay me questionou:

–Você quem escolheu cantar a música que fez para mim?

–Foram eles! Gostou da versão nova?

–Eu adorei!

–A Academia toda vai conhecer a música agora. Isso vai para a rádio da Von Elfstein.

–Sério? Então a minha deve ir também né?

–Sim! Alias, cadê as cifras pra gente tocar para você?

–Estão aqui. - ela mostrou o papel – Também vou mostrar a original para vocês terem uma ideia.

Alguns minutos depois, eu entrei com os garotos para poder fazer o instrumental do cover da Shay. E na guitarra de apoio de novo. Ela quem gravou do lado de fora, só que eu tive que dar uma explicada no funcionamento daquela mesa cheia de trilhas e entradas e fios.

Depois a ajudamos a gravar e também na mixagem. Ia dar meia-noite quando saíram três músicas prontas. Foram longas de discussão e quem estava no computador, Stefan, estava com os dedos sangrando de tanto editar.

Trancamos o estúdio e deixamos a chave pendurada no lugar dela, perto dali. Ninguém tinha disposição para sair, apesar de ainda ser cedo para essas festas de sexta-feira.

Stefan, Athos e Joseph voltaram ao dormitório na frente, enquanto eu e Shay viemos conversando atrás. Athos fez o gesto de “Tô de olho em vocês” para mim. Tive que rir!

–Obrigada por me ajudar hoje, Niels.

–Por nada, Shay. A Vollux está aqui para isso. Será que não rola uma colaboração depois?

–Claro que sim. Preciso falar com a minha empresária. - riu – Ela aprova!

–Depois combinamos com mais calma isso. Acho que os outros vão curtir a ideia. Mas temos outras coisas a resolver antes.

–Eu sei, Nil. Desejo sorte a vocês amanhã.

–Valeu! - sorri

E assim alcançamos o dormitório feminino, o ponto onde tínhamos que nos despedir.

–Amanhã te conto como foi.

Suando frio e batimento acelerado, de novo. Mas por que caralhos?

Fora do meu controle consciente, meu rosto foi chegando cada vez mais perto do dela, até que nos beijamos. Quando nos beijamos que eu percebi o que havia feito.

–Desculpa, Shay. Não era para eu ter feito isso.

–Não tem problema. - ela disse olhando para baixo, sem me encarar, depois levantou e falou – Vai lá! Terá um dia importante amanhã. Boa sorte em!

Shay subiu três degraus, se virou, fez um pequeno aceno, que respondi. E continuei a minha caminhada.

Tomei um banho e apaguei na cama em segundos.

Amanhã é um dia muito importante para a Vollux, para minha carreira musical e talvez até para a minha vida.

O rock parece estar em cada um de nossos corações. Mas será que eles vão entrar em sintonia? Espero que sim.