Eu podia ver cada erro que eu havia cometido, cada dano que eu havia causado, as coisas pequenas e as coisas grandes. Cada dor que eu havia causado a Theo, cada ferida que eu havia dado a Thiago, foram aumentando em pilhas organizadas que eu não podia ignorar e nem negar.

Eu estava inconsciente conscientemente, eu podia sentir o tempo passar, eu podia sentir a vida seguir em frente menos que eu não participasse dela, eu apenas assistia as coisas acontecerem ao meu redor, sem tomar parte de nada.

Eu sentia como se tivesse de luto... Eu estaria de luto eterno, porque eu havia entregado, ou melhor, destruído qualquer possibilidade de reencontrar com a felicidade. Eu não estava me esforçando muito para isso também.

As semanas de teste acabaram, e minhas notas foram melhores do que eu poderia esperar, eu arriscaria dizer que elas foram perfeitas, isso porque eu usava cada espaço, cada segundo do meu tempo livro para estudar, e eu não senti nenhum alivio com o termino do teste como os outros alunos, porque agora eu simplesmente não teria uma desculpa perfeita para me excluir do mundo.

Nas poucas raras ocasiões em que eu encontrei com o Thiago, ele aparecia ser tão ele, tão leve livre que me afundou mais ao fundo do poço, eu não poderia culpá-lo por isso, mas eu era egoísta o bastante para me machucar mais com aquela atitude dele.

O Theo havia se transformado em outra pessoa, eu não conseguia mais reconhecê-lo, era como se ele tivesse tentando matar qualquer evidencia do garoto que eu havia conhecido e amado de certa maneira. Ele estava sempre envolta de um grupo de garotos de mau comportamento, e estranhamente agia como eles. Isso doeu na minha alma.

—Basta. —A Bell gritou alto demais, e algumas pessoas que estavam envolta no salão comunal olharam em nossa direção. Eu olhei para cima desviando meus olhos da revista na minha mão para encarar-la. —Você está encarando essa pagina a mais de meia hora.

Eu abaixei meu rosto novamente para a revista aberta na minha mão. Eu não estava lendo, na verdade eu nem havia reparado que a revista estava aberta em um anuncio de perfume.

—Já faz quando tempo que você e o Theo terminaram, quatro semanas? Um mês?

Eu não pude responder a essa pergunta, eu estava perdida demais no tempo.

—Já faz um mês que você se finge de morta o tempo todo. —A Bell disse carrancuda. —Eu quero minha melhor amiga de volta.

—Eu estou aqui. —Eu disse sem ter muita certeza do que ela estava falando.

—Eu disse que isso iria acabar acontecendo. —Ela resmungou mais para si mesmo do que para mim. –Ok. –Ela falou suspirando fundo e arrancando a revista da minha mão. O que estava acontecendo com a Bell. Eu a olhei pasma.

—Agora você vai me escutar. —ela ditou. —Você. Unicamente você. —Ela disse apontando seu dedo indicador no meu peito. —Você escolheu não ficar com o Thiago...

—Ele vai ser pai. —Eu disse com um suspiro abafado. —E Amanda ameaçou matar o bebê se ele não ficasse com ela, eu só estou tentando fazer com que ele não sofra. —Eu disse relembrando cada palavra que a Amanda havia gritado em seu desespero. —Não vai adiantar nada ele saber a verdade. As coisas não vão mudar a gente nunca vai poder ficar juntos, então pra que ele precisa sofrer também.

—Você pode ter razão. Mas você escolheu assim. —Ela disse voltando ao inicio. —E você escolheu ficar sem o Theo. —dessa vez ela não esperou eu argumentar. —Então, por favor, não fique se lamentando.

—Não dá.—Eu sufoquei um soluço.

—Você não está se esforçando.

—Não é isso.

—Ei Beto chega aqui. —A Bell gritou levantando a mão. —Vamos voltar a nossa vida normalmente. —Ela murmurou de volta para mim.

O Beto se aproximou sentando na nossa frente, ele lançou um olhar estanho na minha direção. Eu esperei pelas palavras da Bell.

—Nós queremos fazer alguma coisa... Divertida hoje. –A Bell disse entusiasmada. —Você pode nos ajudar?

O Beto olhou surpreso para mim, e eu tentei ignorar isso.

—Diversão é comigo mesmo. —O Beto disse entusiasmando.

—Ótimo é o que precisamos. —A Bell sorriu maliciosamente. Eu não achava que isso seria uma boa idéia. —Sabe de algo para hoje a noite?

O Beto suspirou fundo olhando para os lados.

—Bom, é o seguinte, hoje à noite o Pedro vai dar uma pequena festinha no apartamento dos pais dele as duas quadras daqui. —O Beto cochichou e entusiasmado.

—Isso não é permitido. —Eu lembrei-os.

—E quem se importa. —A Bell me repreendeu parecendo adorar a idéia.

—Eu posso levar vocês. —O Beto disse dando um daqueles sorrisos sem vergonha dele.

—Ótimo. —A Bell concordou batendo palmas.

—De quem é a festa mesmo?—eu perguntei não compartilhando da animação dos dois.

—Do Pedro. — O Beto disse por baixo do fôlego.

—A Dora sabe disso?—Eu perguntei interessada na resposta.

—Essa é a parte difícil do plano. —O Beto falou sem esconder o sorriso.

—A gente cuida disso. —A Bell disse pulando do sofá.

—É por isso que eu gosto de você morena. —O Beto disse piscando para a Bell.

Então ela saiu em seguida ,claro me arrastando junto com ela.

Eu decididamente não estava com animo de participar daquilo. Eu não tinha porque estar. Ao contrario da Bell que parecia que até iria para um baile. De tão empolgada, até mesmo a Dora estava animada depois da irritação inicial.

—Qual é o problema?—A Dora perguntou para mim enquanto me maquiava já que eu me recusava a fazer isso.

—E se o Thiago estiver lá?—Eu perguntei já sabendo o obvio.

—Ele vai estar lá, ele é amigo do Pedro. —Ela disse me encarando. —Não tem como correr, estudamos na mesma escola.

E era isso que tornava tudo pior.

—Por isso que eu não quero ir. —Eu disse tentando convencer a Dora de me deixar de fora dessa.

—Vamos lá apenas pra nos divertir, não pensar em mais nada, eu vou estar ao seu lado o tempo todo. —A Bell disse do banheiro.

—Eu não sei se posso.

—Pode como vai. —Ela disse determinada.—Vamos curtir como antigamente, dançar pra valer, beber, sem pensar no resto.

Eu não tive como discutir diante desse argumento apesar de saber que ele não era valido, nada seria como no passado.

Quando chegamos ao apartamento já havia algumas pessoas por lá. O Pedro foi nos receber na porta.

—O que? Vai vir temporal por ai. Você por aqui ruivinha. —Ele disse dando um abraço meio desajeitado. —Porque ninguém me falou nisso, eu tinha feito algumas apostas por ai e lucrado um dinheiro.

—Isso não teve graça Pedro. —A Bell disse atrás de mim.

Como eu havia previsto. O Thiago estava lá, eu percebei quando ele lançou um olhar na nossa direção, um breve e curto olhar e então se virou e voltou a conversar normalmente. Eu devia ser apenas uma garota que tinha dado um fora nele. Era meio esquisito pensar nisso assim, mas contando com todas as lembranças que ele tinha de nós provavelmente era isso. A Amanda não estava lá, na verdade ela não ia mais a escola deste do seu acidente, e assim ficavam bem mais fácil do Thiago ignorá-la já que ele agia como se ainda fosse solteiro. Saindo com todas as garotas que dessem mole para ele.

Eu não podia dizer que havia me divertido, mas também não havia sido tão ruim quando imaginei. A Bell ficou ao meu lado o tempo todo, dançamos muito.  Como nos velhos tempo, o Beto estava sempre presente mais eu acreditava que isso era mais por causa da Bell do que de mim.

Estávamos no meio da pista quando começou a tocar uma musica romântica.O Beto olhou sugestivamente para a Bell que balançou a cabeça.

—Podem dançar.—Eu disse não querendo atrapalhar nada.

—Não.—A Bell negou rapidamente.

—Podem sim. Eu estou cansada e vou pegar algo para beber.—Eu disse saindo em seguida. E o Beto agiu rápido com Bell. Eu peguei um copo de refrigerante e sentei num dos sofás vagos. Meus olhos correram pela pista de dança, aquilo me trazia dolorosa lembranças.

Porque parecia que tudo , tudo me feria. Porque o mundo parecia estar de mau comigo. Meus olhos pararam em um casal. Eu queria desviar o olhar, poder olhar para longe, apagar aquela cena. Contudo parecia que eu tinha virado masoquista torturadora de mim mesma. Porque eu não conseguia desviar o olhar do Thiago e da garota.

Eles dançavam agarradinhos, na verdade eles mais se beijavam do que dançavam e quando a musica finalmente acabou o Thiago puxou a garota para fora do apartamento.Aquilo não devia ter a menor importância.

Eu sabia como o Thiago era na verdade a escola inteira sabia. Mas velo nos braços de outra era o mesmo que sentir laminas entrando dentro do meu corpo.  Aquilo nunca seria possível para mim. E não havia como acabar com aquilo, tudo que eu queria e precisava naquele momento era desaparecer apagar. Mergulhar novamente no vazio...

—Sobreviveu sem mim...—A Bell perguntou sentando ao meu lado, mas parou de falar ao ver meus olhos cheios de lagrimas.—O que foi?—Ela perguntou preocupada.

—Nada.—Eu disse lutando contra minhas lagrimas.

—O que você esta bebendo?—O Beto perguntou chegando em seguida.

—Refrigerante.—Eu disse virando meu copo para ele. O Beto fez uma careta e nesse momento o Pedro apareceu.

—Beto ,temos problemas. —Ele parecia pálido.

—O que foi cara?—O Beto também percebeu.

—Vem.—O Pedro disse apenas sumindo indo em direção a porta.

O Beto seguiu sem entender absolutamente nada.