60 dias apaixonado escrita por Mayara de Souza
Meu celular toca pela 12ª vez e eu ainda não me decidi se é uma boa idéia ou não atender. É um número restrito. Eu mudei de número milhões de vezes desde que voltei ao Brasil. Fugir é o que eu sempre faço. Mas eu acho que cansei de fugir.
Pego o celular da mesa e atendo antes que eu mude de ideia.
– Alô?
– Oi. Eu...
– Quem é? – interrompo a pessoa do outro lado da linha.
– Isabella? – é uma voz feminina. Uma voz assustadoramente familiar.
– É. Agora você pode me responder quem é você? – pergunto confusa e ela solta um risinho debochado.
– Adivinha meu amor. – ela diz e eu quase posso ver o seu sorriso, eu bufo.
Eu odeio joguinhos.
– Eu não vou adivinhar porra nenhuma. Fala logo quem é! – digo quase gritando.
– CHATA! – exclama. – É a Luana. – ela bufa. – Você continua uma enorme estraga prazeres.
– Luana? – pergunto incrédula e confusa.
– Eu! – ela diz animadamente aumentando alguns tons.
– Luana... – sussurro. – Certo. – concluo engolindo em seco.
Não, isso não está nada certo.
– Está surpresa? – reviro os olhos. – Porque você parece bastante surpresa. – ela diz.
Deus, isso não pode estar acontecendo, por favor não.
– Um pouco. – suspiro. – Você sumiu ou melhor me deixou em paz por um bom tempo. – ela ri, mas sinceramente ela não deveria.
– Só por um ano querida, não foi tanto tempo assim. – ela ri novamente, o que só faz com que aumente a minha irritação.
– O que é que você quer? – pergunto o inevitável.
– Você é sempre direta. Isso é irritante. – ela abafa um riso e eu bufo.
– É sério Luana, o que é que você quer? – é a vez dela de bufar.
– Eu estou no Brasil Isa... – eu parei de ouvir depois da primeira fase. Como assim no Brasil? E sim, eu estou surpresa e fudida, muito fudida.
– O que? – acho que a interrompi, mas não tenho total certeza.
– EU.ESTOU.NO.BRASIL – diz pausadamente, como se estivesse falando com uma criança. Só que é ela quem é a criança e não eu.
– Por quê? – pergunto automaticamente.
– Eu preciso te ver! – ela dispara e eu sei que está mentindo.
– Por quê? – modo automático continua ligado.
– Para de perguntar por quê Isabella e me encontra em quarenta minutos no Shopping Iguatemi.
– Certo. – suspiro.
– Tchau meu bem. – ela diz no tom mais cínico possível e desliga em seguida.
Que merda ela está fazendo no Brasil? O que é que a minha irmã está fazendo aqui? Deus! Minha irmã tem problemas, vários problemas para ser bem sincera e a maioria deles é em relação a mim. Ela sempre arruma um motivo para brigar comigo, ela gosta de me humilhar e de preferência na frente da minha família ou de algum público conhecido e faz o possível e o impossível para me prejudicar, é assim desde criança. E piorou quando meu irmão resolveu sumir. Eu não consigo imaginar o motivo que a trouxe de volta e sinceramente, eu não sei se quero descobrir.
Mas de uma forma ou de outra ela está aqui e eu não posso correr o risco dela estragar tudo para mim de novo. Nem que para isso eu tenha que manda-lá de volta para a casa dos meus pais. Manda-lá de volta para Manhattan.
(...)
– Alô? – ele atende sonolento e só agora eu me lembro que esqueci completamente do fuso-horário.
– Oi Henrique. – digo meio que como um pedido falso de desculpas, já que eu preciso falar com ele de qualquer jeito.
– Isa? Oi meu anjo. – eu até consigo imaginar o sorriso em seus lábios. Que saudade, do sorriso dele. Que saudade dele.
– A Luana me ligou. – ele fica em silêncio. – Ela está no Brasil Henri e o pior de tudo é que ela quer me ver. – ele suspira nervoso.
– Er... Eu... O que é que ela está fazendo aí? Como é que ela chego até aí porra? – ele parece estar mais confuso do que surpreso.
Nós sempre esperamos o pior quanto se tratava dela e é claro que era esperada uma atitude dessas vinda dela, mas para mim foi uma surpresa mesmo assim. Acredito que para ele não.
– Eu não sei. – digo.
– O.K – ele bufa. – O que você quer que eu faça? – eu fico em silêncio, por que eu não sei o que eu quero que ele faça. – Eu posso ir busca-lá! Ou eu posso ligar para o pai ir... É você quem sabe. – ele se apressa em dizer.
– NÃO. – gritei, não sei direito por que, mas o fato de reencontrar o meu pai ainda me apavora. – Primeiro me deixa falar com ela.
– Você tem certeza disso? – ele pergunta totalmente contrariado. – Só... Tente mandar ela de volta.
– Sim senhor. – ele ri e eu também. – Eu vou ver o que eu posso fazer por aqui.
– Qualquer coisa você me liga. – ele diz como uma ordem.
– O.K.
– Por favor, só não se matem. – solto uma gargalhada nervosa, porque eu sei que isso é bem possível.
– Prometo que vou tentar. – ele abafa o riso.
– Eu realmente preciso voltar a dormir agora. – eu sorrio.
– Beijos.
– Tchau. – e desliga.
(...)
Entro no shopping e corro o meu olhar pela praça de alimentação procurando por algum sinal dela. Lá está ela. Linda como sempre. Ela me olha e depois de alguns segundos só olhando na minha direção ela sorri. O maldito sorriso cínico dela, que eu odeio. É incrível como eu a conheço e é por isso que tenho tanto medo de ter ela por perto.
– ISA! – ela grita. Corre na minha direção e pula no meu pescoço. Eu tenho quase certeza que a intenção dela é me matar. Sufocada.
– Luana... – digo tentando afasta-lá.
– Eu estava com saudade. – maldito sorriso.
– Estava é? – pergunto mesmo já sabendo a resposta.
– Você sabe que não. – ela diz e se afasta para poder me analisar da cabeça aos pés.
– Eu sei. – respiro fundo e encaro seus olhos azuis. – Então... Você vai me dizer o que veio fazer aqui?
– Você ligou para a mãe ou pro pai? – ela me olha aflita e eu mordo o lábio inferior.
– Não. – seu sorriso aumenta e eu só consigo pensar em como eu deveria ter ligado ou pelo menos mentido que tinha ligado.
– Ótimo. Você não vai acreditar... O excelentíssimo Doutor Nícolas, o seu pai, queria me mandar para um internato na Irlanda. Na Irlanda. – ela diz como se fosse o maior dos absurdos. – Aí eu simplesmente decidi que estava na hora de vir te fazer uma visita. – ela dá de ombros quando termina de falar e eu fico realmente surpresa com a atitude do meu pai ou com a dela, eu ainda não tenho certeza.
– Deus! – sussurro e ela revira os olhos. – Luana você é louca? Você é menor de idade. Como é que você conseguiu chegar até aqui?
– Tem que ter algum lado bom em ser tão parecida com você, não é? – ela debocha. – E conhecer as pessoas certas também me ajudou bastante. – ela ainda sorri, agora o seu sorriso é vitorioso.
– Você só pode... – ela cruza os braços e me encara. – Merda! E o que especificamente você quer comigo? – pergunto desconfiada.
– Preciso de algum lugar para ficar. – diz simplesmente, como se fosse a coisa mais normal do mundo.
– Você... Sério? – fecho os olhos com força.
“Deus, por favor que ela esteja brincando ou melhor ainda, que isso seja um pesadelo.”
Abro meu olhos lentamente e ela ainda me encara á alguns passos distantes de mim. Bufo. Droga!
– E então? – ela questiona.
– Vem comigo. Eu vou levar você para a casa da Ana. – ela se limita em sorrir, novamente o sorriso vitorioso.
Isso significa que eu perdi. Outra vez.
Ela pega a única bagagem. Uma mochila de costas e me acompanha até o carro sempre alguns passos atrás de mim. O caminho todo até em casa foi em silêncio porque nenhuma das duas tinha ou tem interesse em conversar.
(...)
– É aqui que você mora? – pergunta assim que estaciono na garagem.
– É. – ela faz uma careta e me olha confusa. – O que foi?
– Eu prefiro a casa de Manhattan. – ela sorri e eu bufo.
– Vem logo. – começo a caminhar em direção á porta da entrada com Luana bem atrás de mim.
Abro a porta e me deparo com: NINGUÉM.
– ANAAAA. MARCELO. – grito.
– Até parece que você está na sua casa. – ela diz com uma careta.
– Eu estou n...
– Não. Você não está. – ela me interrompe e fica séria. E eu a odeio por ter razão.
– O que foi querida? – Ana pergunta assim que passa pela porta que liga o corredor onde ficam os quartos á sala de estar. Logo atrás dela, Marcelo e Marina.
– Quem é essa? – Marina aponta com a cabeça na direção de Luana.
– Minha irmã. – olho para Luana e ela sorri.
– É um grande prazer conhecer vocês. – ela mente descaradamente. – Eu sou a Luana.
– O prazer é nosso querida. – Ana sorri carinhosamente. – Este é meu marido Marcelo e aquela minha filha Marina.
– É incrível como vocês duas são parecidas. – Marcelo resolveu se pronunciar, fazendo nós duas nos encararmos. Ela sorri e eu não consigo.
É realmente incrível como temos os mesmos olhos azuis do meu pai. Os mesmo cabelos castanhos, quase pretos da minha mãe. A única coisa que nos diferencia é que o cabelo dela só é um pouco mais curto do que o meu. Arriscaria até dizer que os nossos sorrisos são idênticos. O meu pelo menos é sincero, o dela é totalmente forçado e calculado. Ela só tem dezessete anos, mas eu diria que ela é bem mais velha se não a conhecesse.
O Marcelo tem razão. Nós somos muito parecidas fisicamente, mas nada além disso.
– Ana... – suspiro. – Será que ela pode ficar por aqui alguns dias? – Marina me olha furiosa e ao mesmo tempo assustada, talvez porque ela saiba de toda a nossa conturbada história.
– Claro. – ela olha na direção da Luana e sorri. – Claro que pode. – e eu me culpo por mete-los nessa merda toda.
– Obrigada. – Luana diz e vira o rosto para sorrir na minha direção, eu me recuso a olhar para ela.
– Por quanto tempo você pretende ficar? – Marina questiona.
– Só por alguns dias. – Luana diz e Marina concorda com a cabeça.
– Ótimo. – digo por fim, querendo acabar o quanto antes com aquele circo.
(...)
Eu ainda não consigo acreditar que me deixei levar novamente pela Luana. E o pior de tudo é que eu ainda concordei com toda essa loucura. Não! Para falar a verdade eu não concordei, foi eu a pessoa quem sugeriu isso. Ah, mais que merda.
Eu não perdoei ela por tudo o que ela já me fez, não sei se algum dia eu vou perdoar e nem sei se ela é capaz de fazer o mesmo por mim, já que eu também já causei dor em vários momentos. Mas isso não muda o fato de que ela é minha irmã, minha irmã mais nova e que no momento eu sou e estou sendo emocionalmente obrigada a ajuda-lá.
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