Eu andava na rua, cambaleante, com a visão turva e a boca seca. Ezequiel segurava a minha mão com suavidade, eu quase não conseguia senti-la, as ruas estavam escuras, poucas luzes funcionavam, e junto de nós havia duas meninas que conhecemos na festa.

Elas riam alto, assim como nós, e andávamos devagar e caindo,intercalando.

– Não me sinto muito bem gente.

Eles pareciam não me ouvir, ou não me entender. Minha cabeça estava girando e girando, as poucas luzes que eu conseguia ouvir foram enfraquecendo e meu estômago embrulhando.

– Eu preciso de ajuda ...

Caí no chão de joelhos e pus a mão na barriga. Ezequiel tentou me beijar e dizer que era apenas enjoo,mas eu não pude responder, era como se sua voz estivesse no final de um imenso túnel,e sua imagem dentro de um lago turvo. Eu apenas olhei dentro dos seus olhos e pedi por ajuda. Tudo que consegui ver, foi ele sorrindo e entrando no Táxi com as outras duas meninas.

Eu senti o chão frio, me tocando, senti o frio da solidão também,estava bêbada, suja e sozinha, era uma versão melhorada do meu pai, há anos atrás. Eu ja podia ver e ouvir muito bem, mas não queria chegar em casa, não queria chegar a lugar nenhum, queria ficar ali, só eu, e a minha mágoa. Talvez ela me esquentasse um pouco.

Por fim, comecei a chorar quieta, como na infância, a rua estava vazia, então ninguém viria com o papo furado de que tudo ficaria bem. Chorei o tanto que pude, tentei por em cada lágrima as minhas angústias,frustrações e solidão, fiz elas saírem de mim gota por gota, mas ainda me sentia vazia e rejeitada, minha cara metade me rejeitou,no frio.

– Confesso que não esperava.

Olhei com o rosto molhado e vermelho pelo choro.

– O que você quer aqui ?

– Eu as vezes saio de casa pra ... Eu que te pergunto. O que está fazendo aqui ?

– Você quer mesmo saber ?

Me levantei, ainda tonta, e o cutuquei com o dedo indicador no toráx.

– Depois de ser brevemente rejeitada por você, depois dessa paixão imbecil que me assolou quando te vi, aquele maldito campus, eu tentei por vezes esquecer você mesmo que nem tenhamos conversado muito,ai eu encontrei Ezequiel, um cara perfeito, lindo, inteligente,beberrão e idiota, bem diferente de você. Fomos a festas, bebemos,rimos e nos divertimos,mas eu igualmente idiota achei que tínhamos mais do que diversão, então ele me deixou aqui, no frio, sozinha e destruída.

No final, eu estava, sem fôlego, cansada e sem amor próprio. Tudo foi jogado fora, e agora só me restava a cara de pânico dele,a minha ressaca, e os caquinhos que eu teria que juntar, colar e remodelar meu coração, para aguentar todo o resto desta semana.

Ele me segurou por uma das mãos e me abraçou, foi o abraço mais quente que já havia recebido, ou apenas a falta de roupa que me fez sentir assim. Finalmente ele tinha me aceitado, ele tinha percebido que fomos feito um para outro, embora nada semelhantes.

– Acho melhor te levar para casa, acho que vai nevar.